Padim Ciço conduz fieis para o desfile da Unidos de Padre Miguel no Carnaval 2024
A Unidos de Padre Miguel apresenta o enredo “O Redentor do Sertão” no Carnaval de 2024. Em um ano especial, no qual Padre Cícero completaria 180 anos, o enredo da escola tem como foco exaltar um dos maiores símbolos de identificação e devoção do povo nordestino, apresentando uma narrativa a partir da visão do imaginário popular sobre a vida do religioso, com grande influência da literatura de cordel.

Padre Cícero Romão Batista, conhecido como Padim Ciço, foi um líder religioso e figura importante na cidade de Juazeiro do Norte, no estado do Ceará, Brasil. Nascido em 1844, ele se tornou padre e ganhou grande popularidade devido a relatos de supostos milagres e curas atribuídas a ele, principalmente pelo acontecimento chamado “o milagre da hóstia”, onde, durante uma missa em 1889, acreditou-se que uma hóstia consagrada se transformou em sangue na boca de uma fiel chamada Maria de Araújo. Esse acontecimento contribuiu para sua reputação de homem santo. Ele também desempenhou um papel ativo na vida social e política da região, defendendo os interesses dos mais pobres. Padre Cícero faleceu em 1934, mas sua influência persiste até hoje, com muitos devotos considerando-o um santo e visitando seu túmulo em Juazeiro do Norte.
Toda essa fé invadiu o pavilhão da Unidos de Padre Miguel e, em entrevista concedida ao CARNAVALESCO, tivemos a oportunidade de saber um pouco mais sobre essa devoção tão grande. Jaqueline Santos, responsável pela ala das crianças da escola, abriu seu coração e compartilhou conosco sua linda história de fé e confiança com Padim Ciço:
“A minha história com o Padim Ciço é bem antiga. Foi na época do diagnóstico. Eu tenho um filho que é autista, na realidade eu tenho dois, mas o meu mais velho tem 19 anos, e na época do diagnóstico dele, ele era uma criança muito complicada e não tinha diagnóstico fechado. Sempre fui devota de Nossa Senhora, mas vi uma reportagem, não vou saber te dizer exatamente, era sobre o Padre Cícero, né, a fé do nordestino e tudo mais, e assim, tudo que eu via dele era de um amor tão grande, era de uma compaixão tão grande com aquele povo todo, que é um povo muito sofrido e as pessoas tinham uma fé tão grande nele que isso me comoveu. E mesmo antes de ver tudo, de saber a história toda, eu já tinha me apaixonado por Padim Ciço, que para mim eu falo que ele é o meu padrinho. E aí na época que fecharam o diagnóstico do meu filho, ele era uma criança muito difícil, muito difícil, e aí eu pedi a Padim Ciço que tomasse conta dele, que me ajudasse nisso. Eu já pedia a Nossa Senhora também, mas pedi a ele que tomasse conta do meu filho, que eu entregava meu filho para ele, para que ele tomasse conta, que melhorasse a cabeça dele, apesar de eu saber o que é o autismo e tudo mais, hoje em dia eu sei muito mais do que naquela época, naquela época para mim ainda era, assim, um mistério, mas hoje em dia o meu filho faz tudo que eu nunca imaginei que ele fizesse, ele tem 19 anos, ele cursou o ensino médio, ele cursou o ensino fundamental, ele cursou o ensino médio normal, numa classe normal, hoje em dia ele já tem a vida dele, como é que eu vou te explicar, uma vida independente, coisas que eu não imaginava que ele fizesse, o meu filho era extremamente agressivo nessa fase de infância, até uns 9 anos de idade mais ou menos, e aí o meu amor só cresceu, e tudo, tudo que eu preciso na minha vida, eu entrego na mão de Padim Ciço, porque assim, para mim, é o meu padrinho, é tudo de bom, digamos assim, falar dele para mim é muito difícil, porque assim, eu me emociono, porque ele é assim, a minha luz”.
A fé e a devoção têm um papel importante na vida das pessoas, são conhecimentos e sentimentos passados de uma geração para outra como parte das tradições familiares. Esses valores espirituais desempenham um papel crucial na formação da identidade e na criação de laços significativos entre pais e filhos. O presidente da Unidos de Padre Miguel, Lenilson Leal, compartilha sua história de devoção ao Padre Cícero, uma conexão que teve início com seu pai nos anos 50, quando este migrou para o Rio de Janeiro, trazendo consigo uma grande devoção pelo padre:
“Minha ligação com o santinho se deve ao fato do meu saudoso pai ter migrado para o Rio de Janeiro nos anos 50 e com ele a devoção ao santo. Em suas aflições meu pai recorria às orações ao santo e todos nós de casa, crianças, passamos a conhecer a história de Padre Cícero. Trago nas lembranças os momentos delicados, quando meu pai recorria à fé ao Padre Cícero Romão, que era um homem de personalidade forte e meu pai carregava esse perfil do nordestino arretado e ele falava que se inspirava em padre Cícero porque não abaixava a cabeça para ninguém. Por isso, o mesmo foi esquecido pela igreja católica, não deram o devido reconhecimento ao milagre da hóstia Maria. Confesso que carrego em mim essa personalidade”.
O Boi Vermelho da Vila Vintém está determinado a buscar o título de campeã da Série Ouro. Com a direção dos carnavalescos Edson Pereira, Lucas Milato, e do pesquisador Leandro Thomás, a escola pretende iluminar as histórias e relações que conectam o cotidiano do sertanejo às ações e influências atribuídas ao Padre Cícero Romão Batista. A proposta é criar uma apresentação rica em simbolismo e significado, enaltecendo a figura do Padre Cícero e sua importância na vida e na cultura do sertão brasileiro. O enredo, que busca trazer à tona a devoção e a fé, foi recebido como um sinal para os componentes do pavilhão.
“Quando veio, nós teríamos um outro enredo que acabou não sendo, e aí quando veio a ideia de um enredo de Padim Ciço, eu me emocionei de uma forma tão grande, que assim, para mim ali foi a confirmação de tudo, entendeu? De que daria certo, de que esse ano a gente pode confiar, que se for realmente da vontade de Deus, dos santos, esse campeonato é nosso, porque Padre Cícero é amor, é união, que é tudo que a gente tem na UPM. É uma escola que ama os seus componentes, que literalmente ensina a amar o samba, que nos encanta, não tem uma pessoa que chegue perto da gente, mesmo vindo de outra agremiação, que fale assim, cara, o amor pela UPM é diferente, e o Padim Ciço é isso, é esse amor diferente, é essa devoção, porque eu falo assim, tem pessoas, a grande maioria das pessoas da nossa comunidade, são devotas da UPM, porque amam a UPM incondicionalmente. São apaixonadas por tudo que a UPM representa para nossa comunidade, esse enredo veio abrilhantar a história. Veio confirmar tudo que a UPM sempre demonstrou, que é todo o amor, todo o carinho pelo seu componente, é estar ali para o seu componente, o que o componente precisa, é dar apoio, dar ajuda, dar um abraço, a gente está ali para isso, a UPM é isso na vida. Acho que esse enredo veio casar e veio exemplificar, entendeu? Veio dar o exemplo de tudo que a UPM é. A UPM é esse amor, essa devoção, essa coisa que transborda, como a fé das pessoas em Padim Cícero, como a história de Padim Cícero, como transborda amor na história dele, como transborda compaixão na história dele. Então assim, Padre Cícero é isso, e a UPM também é isso. Então assim, digamos que é uma casadinha, é uma dupla de sucesso, Padre Cícero e a UPM. É assim, maravilhoso, é uma confirmação, não só para mim, porque para mim veio como confirmação de tudo aquilo que eu acredito, de toda a minha devoção, de uma vida de 12 anos de devoção, o Padre Cícero que nunca me decepcionou, assim como a UPM nunca me decepcionou. E não decepciona os seus componentes. Mesmo quando a gente vai lá e bate na trave, o amor dos nossos componentes continua. Ninguém desiste, ninguém larga a mão de ninguém, é todo mundo junto o tempo todo, entendeu? Não faz diferença se não nos dão a nossa vitória. O importante é que a gente faz sempre o melhor. Que é mais ou menos como a história de Padim Cícero. Mesmo quando ele foi expulso da igreja, não importou para ele. Ele continuou fazendo o melhor dele, independente do que a igreja dizia. Era o que estava dentro do coração dele, era essa fé que movia ele. E é essa fé, a fé na vitória, que move a UPM”, revelou Jaqueline Santos.
O presidente Lenilson comentou sobre o que podemos esperar do desfile, destacando a tradição da escola em enredos afros e a decisão de explorar um tema diferente neste ano.
“A UPM é reconhecida no mundo do samba como uma escola forte em enredos afros e o fato desse enredo fugir do tema, vamos poder mostrar que somos uma escola que estamos preparados para continuarmos mostrando grandes carnavais fora do tema afrodescendente, essa foi a base para a escolha do enredo. Estamos preparando um desfile do tamanho da UPM, um desfile que vai mais uma vez impactar o mundo do samba. Temos uma comunidade forte, gritando o samba na ponta da língua e com o desejo enorme de estarmos na elite do carnaval. Temos ciência de nossas responsabilidades e sabemos que o mundo do samba já está nos esperando há muito tempo no especial. Estamos confiantes que esse ano o ‘milagre vem'”.
Lenilson enfatiza a diversidade e a capacidade da escola em brilhar em diferentes temas, destacando a preparação para um desfile que impactará o mundo do samba. A forte identidade da comunidade, o entusiasmo pela escola e o desejo de alcançar a elite do carnaval são elementos que impulsionam a Unidos de Padre Miguel na busca pelo título. A referência ao “milagre vem” sugere a confiança e a esperança da escola em alcançar o sucesso no carnaval.
“O nosso desfile vai ser lindo. As fantasias estão maravilhosas. Os carros estão lindos. A escola está com gás. A gente sempre tem muito gás. A comunidade, vamos ser sinceros, UPM tem um chão que poucas escolas têm. A gente sempre faz um carnaval de nível de grupo especial. Isso não é segredo nem mistério para ninguém. Isso todo mundo sabe, que a gente faz um carnaval de excelência. E nós temos uma coisa que muito, que algumas escolas têm, mas não são todas. Nós temos o amor do nosso componente. Então esse carnaval vai ser grande, vai ser lindo. As fantasias estão lindas. O samba é maravilhoso. O samba cresce de uma tal forma. Vai ser muito lindo. Vai ser assim, um espetáculo. O que vocês podem esperar da UPM esse ano é novamente um espetáculo ainda melhor do que os espetáculos que nós vemos dando todos os anos”, revelou Jaqueline, responsável pela ala das crianças.
O pedido dos componentes da Unidos de Padre Miguel é que Padim Ciço abençoe a escola que almeja o acesso ao grupo especial. Através da fé e também do trabalho árduo de todo o pavilhão, eles esperam que suas orações se realizem.
“Hoje sou devota do padim Cícero após o nosso enredo e tudo que eu venho pedindo a ele graças a Deus tenho recebido. Peço para que tudo caminhe bem em nossos ensaios, nossos trabalhos e que aos poucos com sacrifício estão se concretizando. É só colocar fé que vai, estou muito orgulhosa com nossa diretoria e todos os envolvidos para esse grande espetáculo que é desfilar na Marquês de Sapucaí”, comentou Carminha que se tornou devota depois do enredo, responsável pelo Depto Feminino da escola.
A Unidos de Padre Miguel será a quinta escola a desfilar no sábado de carnaval, 10 de fevereiro, e a prece é por um desfile alegre e emocionante, buscando encantar o público e os jurados durante a apresentação na Marquês de Sapucaí.
De olhos nos quesitos: falhas dos cantores e seus auxiliares são cada vez mais comuns nas justificativas de Harmonia
O site CARNAVALESCO traz uma análise do quesito Harmonia para a série ‘De olho nos quesitos’. No texto que vai falar sobre o quesito que aborda o canto da escola na avenida há uma grande polêmica que suscita debate entre os sambistas. O carro de som (intérpretes e cordas) deve ser julgado dentro da harmonia? Devendo ou não, é um fato que o número de justificativas em cima de falhas dos cantores e seus auxiliares são cada vez mais comuns nas justificativas dos jurados.

Nossa reportagem avaliou os últimos cinco anos de justificativa do quesito harmonia. E os jurados que irão julgar em 2024 citaram o carro de som, seja por eventuais desafinação, excesso de cacos, desencontro com a bateria ou afinação de instrumentos de corda, 13 vezes desde 2018. A questão divide opiniões, pois o carro de som não é um sub-quesito oficial estipulado pelo manual do julgador, como por exemplo é na Série Ouro. Entretanto tais justificativas tem causado até demissão de intérpretes por eventuais notas em harmonia.
Julgadora estreante
A jurada Júlia Félix é uma das estreantes no corpo de jurados para o desfile deste ano. Os demais participantes do júri de harmonia conta com Bruno Marques, que julgou os últimos quatro carnavais, Jardel Maia, presente nos últimos três e Rodrigo Lima, que está desde 2022. Analisando os critérios de cada um encontramos uma forma diferente de avaliar de cada um.
O mais experiente deles é Bruno Marques. Em quatro anos julgando, o jurado aplicou apenas 13 notas 10 em 51 que foram possíveis. Índice de 25%. Nenhuma escola passou ilesa pelo crivo de Marques, daquelas que estiveram nos quatro desfiles desde 2019. Os melhores desempenhos foram de Viradouro, Grande Rio e Vila Isabel, que conquistaram duas notas 10 e duas 9,9 com ele. Unidos da Tijuca e Paraíso do Tuiuti não conseguiram nenhum 10.
Bruno Marques é bastante atento à afinação do canto dos componentes durante a apresentação da escola. Embora seja um critério extremamente rígido, afinal de contas trata-se de um apresentação carnavalesca e o julgador não está na pista para julgar com afinco, Marques justificou notas abaixo de 10 em 16 vezes nos seus quatro anos como julgador alegando problemas de afinação no canto dos componentes. Alas que passam sem cantar, canto com intensidade diferente em partes distintas do samba e falhas no carro de som foram outros aspectos abordados com regularidade em suas justificativas.
Beija-Flor ‘gabarita’ com jurado
Reconhecida como uma das melhores harmonias da avenida em todos os tempos, a Beija-Flor de Nilópolis é a única escola que participou dos três desfiles sob o crivo de Jardel Maia e não tirou nenhuma nota abaixo de 10. Julgando desde 2020, o jurado aplicou 16 notas 10 nesses últimos anos, índice de 45%. Tuiuti e Tijuca ainda não conseguiram nenhuma nota 10 com este julgador. Portela, Mangueira e Grande Rio conquistaram duas notas 10 e uma 9,9.
Jardel usa como principal critério a constância do canto das alas. De suas justificativas apontadas de 2020 pra cá, 15 vezes foi citado a passagem de alas que não cantavam ou apresentavam canto inconsistente no momento em que passavam em seu módulo de julgamento. Maia também é bastante atento ao andamento das baterias, embora não seja o seu quesito. Em seis oportunidades ele citou o andamento do ritmo como um complicador para o canto da escola.
Seis escolas gabaritaram com Rodrigo Lima
Julgando o Grupo Especial desde 2022, Rodrigo Lima costuma usar como critério de julgamento a generosidade. Nada menos que 62,5% de suas notas aplicadas em seus dois anos foram 10. Imperatriz, Salgueiro, Viradouro, Beija-Flor, Grande Rio e Vila Isabel possuem 100% de aproveitamento com ele.
Como julga a pouco tempo, Rodrigo ainda não possui um gama elevada de justificativas a ser analisada. Novamente, Tijuca e Tuiuti têm os piores desempenhos do quesito sem uma única nota 10. Em dois anos julgando o que mais fez o jurado tirar ponto das escolas foi a passagem de alas sem cantar sob o seu módulo de julgamento. Mas ele citou ainda falhas como problemas de afinação no canto, carro de som, andamento da bateria prejudicando o canto, desencontros entre o canto da escola e a bateria e problemas de afinação no canto da escola como um todo.
Em único ensaio técnico, comunidade do Morro de Casa Verde solta a voz no Anhembi e é destaque
Por Gustavo Lima e fotos de Fábio Martins
É claro que é sempre decepcionante cair de divisão. Para o Morro de Casa Verde é pior ainda, pois caíram para a terceira prateleira do carnaval paulistano após ter conseguido se manter em 2022, que era o seu objetivo. Entretanto, o que foi visto no ensaio, mostra que não é motivo para abaixar a cabeça. A comunidade pisou no Anhembi e deu o recado. Cantou forte o samba, que é um dos melhores do carnaval e teve a presença do intérprete Wantuir. Sem dúvidas a harmonia foi o quesito destaque da escola neste ensaio. Com a força da negritude, a verde e rosa da Zona Norte quer alçar voos maiores.
Este foi o único ensaio da escola na temporada, e com o enredo “O canto de Omnirá: Negra é a raiz da liberdade!”, a agremiação será a décima a desfilar pelos desfiles do Acesso II, no próximo dia 03 de fevereiro. O tema é assinado pelo carnavalesco Ulisses Bara.
Comissão de frente
A ala, que tem o comando de Ana Carolina Vilela, foi um dos destaques do ensaio. Era fácil de entender. Mostra uma grande mensagem da força de negritude, sobretudo das mulheres, visto que a personagem principal é uma moça, cujo sua vestimenta era diferente das demais, pois estava com um turbante. Essa integrante era exaltada em determinada parte da apresentação.
Os bailarinos dançavam pela pista, saudavam o público e faziam danças afro. Homens estavam vestidos de saiotes marrons com pinturas brancas pelo corpo e mulheres de saias brancas.
Mestre-sala e Porta-bandeira
O casal Gabriel e Juliana fez um ensaio satisfatório. A porta-bandeira, principalmente, lutou contra as rajadas de vento que por vezes assombravam a pista. Isso é um grande temor para quem carrega o pavilhão, pois corre o risco de enrolar o pavilhão, mas a dançarina se comportou muito bem diante da questão.
O ponto chave da dança foi o diferencial da porta-bandeira na finalização da dança. O mais comum é o mestre-sala estender o pavilhão para o jurado, mas observando a cabine ao lado do recuo de bateria, notou-se uma movimentação onde apenas Juliana deu um passo a frente para apresentar o pavilhão e finalizar a dança.
Harmonia
Cantar o samba-enredo é um diferencial para o sucesso de uma escola. Ter um dos melhores sambas do ano de São Paulo e ainda interpretado pelo renomado cantor Wantuir, é um grande privilégio para a comunidade da verde e rosa da Zona Norte. Por isso, o canto dos componentes ecoou forte no Anhembi. Nitidamente todos os desfilantes sabem a enorme obra que tem em mãos e estão fazendo valer a pena cada verso.
Evolução
O andamento da escola fluiu normalmente, sem qualquer preocupação. As fileiras estavam compactas e os componentes se movimentavam bem entre si. O que é uma dúvida é a questão do espaçamento entre a comissão de frente e o que vem atrás. Isso engloba todas as escolas. No caso do Morro, vinha uma ala coreografada. Às vezes, abria um espaço, não chegava a ser um buraco, mas se não tivesse atenção, poderia acontecer. Como citado, tal situação foi vista em outros ensaios de outras agremiações. Pode ser um espaçamento limite no quesito.
Samba-enredo
Realmente um dos melhores sambas do ano. Por isso é tão cantado, somado a comunidade e outros fatores mencionados acima. É uma melodia de ‘guerra’ e possibilita uma dança maior entre os componentes. Embalado pelo intérprete Wantuir, estreando no Anhembi com o Morro, ficou ainda melhor. Os refrões são os mais cantados, porém o samba todo é forte.
Outros destaques
Vale sempre ressaltar a presença de Dona Guga, lendária baluarte paulistana e ativa na agremiação. Sempre respeitada e querida por onde passa.
A “Bateria do Morro”, do mestre Fábio Américo, teve uma performance satisfatória, principalmente quando soltava o apagão. Foram três ou quatro. Isso é muito válido, pois foi de suma importância para sentir a harmonia da escola.
A ala das baianas também entrou na onda do samba. Estavam vestidas com a camisa da escola e com turbantes e saias brancas. O Morro de Casa Verde levou um pequeno tripé que soltava serpentinas com o passar do tempo. É sempre importante brincar com o público. A corte de bateria teve presença da rainha Bruna Costa e a musa Hariane Diaz.
Canto da comunidade se destaca em último ensaio técnico do Camisa Verde e Branco
Por Lucas Sampaio e fotos de Fábio Martins
O Camisa Verde e Branco realizou seu terceiro ensaio técnico na última sexta-feira no Sambódromo do Anhembi em preparação para o carnaval de 2024. A comunidade se fez presente e foi o destaque do treinamento encerrado após 60 minutos e que contou com a presença do ex-jogador Adriano Imperador, que será homenageado no desfile. O Trevo da Barra Funda será a primeira escola a se apresentar no dia 9 de fevereiro pelo Grupo Especial de São Paulo com o enredo “Adenla – O Imperador nas terras do Rei”, assinado pelos carnavalescos Renan Ribeiro e Leonardo Catta Preta.
Apenas o Camisa Verde e Branco e o Rosas de Ouro tiveram a oportunidade de ensaiar três vezes na Passarela do Samba, e a ascendente apresentada pelo Trevo mostra que a escola soube aproveitar as oportunidades que teve para se preparar para a missão de permanecer na elite da folia paulistana após 12 anos no Grupo de Acesso.
Comissão de frente
A coreografia da comissão de frente do Camisa esteve dividida em dois atos marcados por passagens do samba, com protagonistas distintos que contracenaram com os demais atores. Na primeira parte, o personagem identificado como o orixá Exu interage com um dos coadjuvantes ao longo da dança, e a transição dos atos ocorre quando ele troca de lugar com o ator que interpreta Oxóssi, que passa a comandar a dança.
Uma coreografia que ficará mais clara quando todos os componentes estiverem fantasiados, que segue um estilo de comissões mais tradicionais e garante uma abertura clara e leve do desfile e cumprir o seu papel. Os atores tiveram uma boa performance no geral, sem apresentar irregularidades ao longo dos módulos em que foram observados.
Mestre-sala e Porta-bandeira
Apesar do vento que resolveu incomodar ao longo do ensaio, Alex Malbec e Jessika Barbosa tiveram um bom desempenho em todos os módulos em que foram observados. Uma dança segura dentro das exigências do quesito, onde o mestre-sala chamou atenção pela sua expressividade e a porta-bandeira por lidar bem com a incômoda situação adversa.
O casal falou a respeito da preparação para dançar diante do frio presente ao longo de toda a noite de ensaios.
“A gente se aquece para não ter uma lesão muscular, e o aquecimento não é só quando está frio, mas também quando está calor. Por vezes, fazemos movimentos de extensão, o que pode causar uma lesão, mas a gente forma um casal que enfrenta tudo que vem. Se está ventando, a Jessika não desce o pavilhão. Não deixamos de economizar o que temos que fazer mesmo com todas as dificuldades. Óbvio que é ruim, mas usamos o que tivemos de imprevisto para nos adaptarmos para uma outra situação. Não deixamos de fazer nada, seja na chuva, no vento, estamos sempre ligados. Se ela não dança, qualquer problema com ela também é comigo. Estamos juntos e estamos trabalhando juntos para resolver tudo. O importante é o pavilhão”, disse Alex.
“Sendo bem sincera, quando a gente passa a faixa amarela, eu não sinto mais nada e o braço incluso. Eu volto a sentir o braço quando já estamos mais próximos do último módulo. Só nessa hora eu sinto porque cai a adrenalina, mas fora isso, para mim, é tranquilo”, apontou Jessika.
Harmonia
A comunidade da Barra Funda emocionou quem anseia por uma performance digna da escola nove vezes campeã do Grupo Especial. O desempenho da harmonia no ensaio foi impactante, com todos os segmentos apresentando canto claro e elevado ao longo de todos os módulos observados. A confiança ficou clara nos diferentes momentos em que a ala musical jogou para os demais desfilantes, que deram conta e formaram um intenso coral.
O diretor de carnaval João Victor fez uma análise do desempenho da harmonia do Camisa no treinamento, apontando as melhorias observadas após três ensaios técnicos.
“Teve uma crescente, foi o melhor ensaio dos três. Achei que a escola cantou muito mais que no último ensaio. Vamos analisar agora após ensaio, mas achei que a escola estava muito mais organizada, cantando muito mais, contingente maior. É o caminho, estamos trabalhando e hoje foi o último treino aqui. Vamos resolver algumas coisas dentro da quadra para dia 9 estarmos afinadinhos, passarmos redondos”, declarou.
A presença de Adriano Imperador no ensaio, na opinião de João Victor, foi positiva para o desempenho da escola.
“Vocês sentiram aí a escola vibrando demais. É muito importante ele estar aqui para as pessoas verem o que de fato ele está sentindo, e vocês puderam ver que ele estava solto, tirando onda, na frente da bateria e cantando o samba”, afirmou.
Evolução
O Camisa Verde e Branco evoluiu com fluidez ao longo de toda a Avenida, cumprindo as exigências do quesito mesmo com a presença de um contingente maior de componentes participando do ensaio. A tranquilidade com a qual o Trevo realizou seu cortejo foi tanta que poderiam ter fechado os portões aos 57 minutos, mas encerraram com uma hora cravada após os diretores formarem uma linha para saírem da pista com o pé direito juntos. A escola demonstrou estar pronta para realizar um desfile sem preocupações tecnicamente.
Samba-enredo
O bom samba do Camisa Verde e Branco foi defendido por uma ala musical empenhada, liderada pelo intérprete Igor Vianna. Ao longo do ensaio era notável que algo não estava correto com a voz principal do Trevo, que em diferentes momentos cessou o canto sem motivo aparente. Ao avaliar o desempenho do quesito no ensaio, o artista revelou que sentiu um incômodo antes de entrar na Avenida e fez questão de exaltar seus colegas de carro de som.
“A nossa ala musical vem trabalhando incansavelmente junto com a minha diretoria musical, Marquinho, que tem o apoio do Fabiano Sorriso e dos parceiros dele. A gente vem trabalhando incansavelmente, cobrando a rapaziada, a rapaziada vindo forte. Logo que eu entrei na Avenida eu tomei um golpe de ar, e isso deu uma esfriada na minha cabeça. Eu fiquei igual o carro velho para voltar a pegar, e eu não parei de cantar em nenhum momento, porém, a potência da minha voz sim, deu uma baixada, e a potência dos cacos também, não estava com a potência que tem. Só voltou quando a gente saiu do segundo recuo da bateria para cá. Eu vou te falar a realidade, se não tem esses caras aqui comigo, se não tivesse cada um deles aqui comigo eu estaria encrencado, de verdade. Eu tenho muito que exaltar as vozes da minha aula musical”, declarou.
Faltando duas semanas para o desfile da escola, Igor Vianna deixou uma mensagem para a comunidade do Camisa Verde e Branco.
“Alô Camisa Verde! Alô Barra Funda! Meu Trevo querido! Eu só tenho a pedir a cada um dos componentes do Camisa, a cada torcedor do Camisa Verde e Branco, para que acreditem no nosso trabalho. Semana passada eu fui ao barracão e está digno do Camisa Verde e Branco, está um trabalho feliz dentro do barracão. As fantasias prontas, as alegorias. No domingo passado eu posso dizer que eu vi 90% das alegorias prontas e essa semana com certeza já estará com 100. Se não está com 100, está com 97, 98%. Vou pedir para a comunidade da Barra Funda acreditar no trabalho que estamos fazendo, que a nossa presidente está fazendo, que a nossa diretoria está fazendo porque está sendo feito com muito amor. E a você, torcedor do Camisa Verde e Branco que está afastado, o carnaval está aí, está feliz, está lindo. A escola está de volta com as bênçãos de Oxóssi! A escola está de volta ao Grupo Especial, e para a escola permanecer e voltar a brigar só depende dos torcedores do Camisa Verde e Branco. O Camisa Verde e Branco está junto, vai brigar para quê? A escola já sofreu tanto tempo no Grupo de Acesso. Para que é que vai brigar? Eu estou fazendo um apelo, e o meu apelo é esse. Voltem, vem, cai para dentro que a escola precisa da comunidade, essa é a verdade”, clamou.
Outros destaques
A bateria “Furiosa da Barra” chamou atenção não apenas por causa da ilustre presença de Adriano Imperador à frente dos ritmistas, cantando e aproveitando o ensaio com irreverência e simpatia. Foi também uma atuação de alto nível, com bossas criativas que levantaram o público que esperou até o último instante para ver o Camisa Verde e Branco passar. Mestre Jeyson, líder dos ritmistas do Trevo, avaliou positivamente o desempenho da bateria no ensaio.
“Graças a Deus tivemos e esse tempo para acertar os detalhes que a gente viu que estavam faltando. A gente conversa com a rapaziada da bateria para fazer ensaios, a diretoria autoriza e a gente vem aqui, na rua e na quadra. De todos os ensaios, hoje sem sombras de dúvidas foi o melhor”, disse.
O mestre fez um balanço geral após os três ensaios do Camisa, demonstrando otimismo para o desfile.
“No primeiro ensaio a escola veio pequena. Muita gente queria um comparativo porque estamos retornando para o Especial. O que eu tiro de exemplo é que já deu certo, e o melhor ensaio de fato vai ser o desfile botando para quebrar”, completou Jeyson.
Tom Maior causa suspiros em ensaio técnico competentíssimo no Anhembi
Por Will Ferreira e fotos de Fábio Martins
Escolher apenas um destaque no segundo (e último) ensaio técnico da Tom Maior, realizado nesta sexta-feira, é uma tarefa hercúlea. Com ótimo rendimento em absolutamente todos os pontos passíveis de avaliação, a vermelho e amarelo está pronta para defender o enredo “Aysú: Uma História de Amor”, idealizado pelo carnavalesco Flávio Campello, que será exibido no segundo horário do sábado de carnaval – 10 de fevereiro. Para destacar uma das mais elogiadas canções da temporada, porém, esse será o enfoque da análise.
Samba-enredo
Tido como uma das melhores músicas que embalarão desfiles no carnaval 2024, a agremiação soube trabalhar muito bem com o samba – e, também, potencializá-lo ainda mais. Cantado por absolutamente todos os componentes, a obra ganhou brilho extra com um competentíssimo carro de som capitaneado por Gilsinho.
Com um regulamento que pede para que o intérprete foque na condução do samba-enredo, sem muitos cacos, Gilsinho, intérprete da agremiação, faz um alerta: “Eles querem ouvir mais o canto e o samba. Acho legal, acho pertinente. Só que a gente não pode pedir a alegria que a gente transmite ao fazer certos cantos e chamadas. Acho que isso não vai interferir em nada. Vamos ter que dosar um pouco mais, mas usar a mesma vibração de sempre”, pontuou.
Harmonia
Com uma canção tão elogiada e bonita, o trabalho do quesito, é bem verdade, fica facilitado. Mas, mostrando o belíssimo trabalho da Harmonia vermelha e amarela, a obra ficou ainda mais ao agrado dos amantes do samba. Os três apagões feitos pela Tom 30, bateria da escola, fizeram o canto ficar ainda mais forte. Com um canto regular e forte ao longo de toda a pista, a maioria dos staff que ficavam no corredor pouco cobravam dos componentes – algo raro no ambiente carnavalesco. Mais do que isso: após o último apagão realizado, um dos harmonias berrou: “Está bonito demais!”, em cena ainda mais incomum.
Mostrando que o trabalho coletivo é o ponto chave da agremiação, Bruno Freitas, diretor de carnaval da agremiação, fez questão de citar outro importante componente da equipe: “Vocês não vão ver imagem, mas tem um cara que faz um trabalho fenomenal, que é o Gerson: ele coloca essa escola com um andamento absolutamente confortável. O canto hoje foi o teste. Tinha um suspense em relação ao paradão. Com a caixa de som não vai ter mais as atravessadas? Pelo que eu senti, passou limpo. Estamos para lá satisfeitos e não vamos parar mais. Agora que temos quadra, nós vamos fazer ensaio de canto e uma reunião para dia 10 passar aqui muito forte”, prometeu.
Mais do que concordar com a avaliação, Gilsinho acredita na primeira colocação da vermelha e amarela. “Com toda a certeza a escola está pronta para voos maiores! A Tom Maior é uma escola que está em uma crescente. Vem desenvolvendo muito os trabalhos e carnavais que faz. A diretoria se esforça muito para colocar o melhor na avenida. Acho que a escola está muito pronta para ser campeã, tudo vai depender da cabeça dos jurados”, fez mistério.
Evolução
Com bexigões coloridos, os movimentos dos componentes ganhavam ainda mais brilho – e trazendo ainda mais pontos para o quesito em si. O último setor, com duas alas inteiramente coreografadas, merece destaque por toda a dinâmica, tal qual a bateria – que merece linhas à parte. Antes de entrar no recuo, ela fez giros à frente da Arquibancada Monumental, empolgando os presentes no Setor B. Com a escola já parada, ela virou à direita, mas não entrou completamente, aguardando o alinhamento da ala de passistas que vinha logo atrás. Conforme os ritmistas entravam no box, os passistas centralizavam-se – logo, sem deixar clarão algum. Em cerca de cem segundos, toda a Tom 30 estava no box e a agremiação não deixou clarão algum, de forma criativa e eficiente.
Com os pés no chão, Bruno teve bastante sobriedade ao falar do ensaio: “Para quem está querendo o primeiro título, acho que cada ensaio é fundamental. A gente está dando o nosso e quem passar vai precisar vir com a gente. Óbvio que respeitando sempre, não somos melhores que ninguém, mas estamos trabalhando muito e olhando cada detalhe. Fomos para a rua, fizemos reunião, analisamos vídeos, grade a grade, espaçamento de casal, de destaques e deu certo”, destacou.
Comissão de frente
A temática indígena, como não poderia deixar de ser, também inspirou a comissão de frente da agremiação. Com um grande tripé, que veio inteiro ensacado na cor amarela e com um componente em cima dele, alegoria e integrante não tiveram interação alguma com os demais bailarinos, que estavam no chão. E, lá, haviam três grupos de pessoas: os anjos, em maior número e que cortejavam três casais. Dois desses casais vieram fantasiados tal qual os duos de princesas da Disney; o terceiro, protagonista, era formado por uma índia e por um homem fantasiado tal qual um europeu – semelhante a outra história muito conhecida de povos originários, mas da literatura: Iracema, escrito por José de Alencar. Não foram identificados erros na coreografia, que marcou o samba em cada passagem da canção.
Mestre-sala e Porta-bandeira
Conhecidos no universo do carnaval paulistano pela velocidade, Ruhanan Pontes e Ana Paula Sgarbi tiveram mais uma ótima (e célere) apresentação. Desde o primeiro módulo, ambos não economizaram nos giros nem mesmo longe dos locais onde ficarão os módulos de julgamento – e, em especial, os pés do mestre-sala tiveram destaque, com rapidez que impressionava. Vale destacar os momentos em que ambos interagem com o samba-enredo: quando a canção canta “é flecha certeira no peito”, ele emula uma flechada certeira nela – que finge sentir o golpe. No primeiro módulo, a agremiação seguiu evoluindo enquanto o casal se apresentava – o que fez com que a exibição fosse mais enxuta quando comparada a outros casais; nos demais, os componentes foram segurados pela Harmonia.
A temperatura mais baixa não foi um problema para o casal: “Se você se alongar bem, se preparar bem antes, aquecer o corpo, não tem grandes problemas. Não pode chegar lá na Concentração e querer fazer tudo de uma vez, vai ser difícil. Mas, se você se aquecer antes e se alongar, vai para cima!”, energizou Ruhanan. Ana Paula, por sua vez, destacou outro fenômeno climático que a afeta: “Como preparação, não vejo tanto problema na parte muscular. O que me desestabiliza é o vento. O vento, para o pavilhão, é péssimo. Temos que fazer mais força, o giro fica mais comprometido… é pior que a parte muscular quanto à dificuldade. O vento acaba comigo”, confessou.
Seguro, o casal também não se importou muito com fazer “apenas” dois ensaios técnicos no ciclo carnavalesco: “Não atrapalha em nada. A escola veio preparada para dois ensaios, se programou para dois… e são dois que fizemos, muito bem feitos. No dia nós vamos entregar. Jogo é jogo e treino é treino: às vezes, a ‘campeã do ensaio técnico’ chega no dia e não dá em nada. O ensaio técnico é bom, mas, se a Tom Maior acha que dois são o suficiente, acabou”, comentou Ruhanan. Outro aspecto relativo à escola também foi pontuado por Ana Paula: “A gente tem se preparado porque o ensaio de rua tem um percurso ainda maior que o Anhembi. É muito grande! Para a gente, cada ensaio de rua é, praticamente, um ensaio técnico. A gente já vem se preparando faz um tempo. Dois, para a Tom Maior, foi o suficiente”, relembrou, sem citar nominalmente a rua Sérgio Tomás, onde a Tom Maior faz suas atividades na comunidade ao ar livre.
Outros destaques
Sem economizar nem mesmo no ensaio técnico, o pede-passagem à frente do abre-alas da Tom Maior, em alguns momentos, tinha uma explosão de papel picada – alegrando os presentes na arquibancada. À frente da Tom 30, esteve Andréia Gomes, madrinha de bateria da agremiação.
Com fé, Mestre Carlão, comandante da Tom 30 e presidente da agremiação, destacou o ótimo ensaio protagonizado pela agremiação: “A gente fez exatamente o que foi feito no ensaio específico de terça-feira. Graças a Deus deu tudo certo, Deus foi bondoso, os ritmistas foram focados e foi um bom ensaio”, comentou.
Sobre os três apagões realizados pelos ritmistas, ele falou da união entre dois quesitos da vermelha e amarela: “Isso foi o trabalho da harmonia juntamente com a bateria, fomos testando e veio pegando. Hoje a escola canta, o samba é muito bom e graças a Deus passou no teste. Agora não tem jeito, vai para o desfile. Acredito que esses apagões valorizam muito o canto da escola. É isso que nós queremos”, finalizou.
Freddy Ferreira: ‘Introduções das baterias antes do samba: seus riscos e o efeito da padronização’
Uma questão que vale reflexão envolve as introduções das baterias antes da execução do samba-enredo oficial. De antemão, é possível afirmar que bate uma saudade danada daquelas arrancadas com uma passada ou duas sem bateria! Aquele clima animado e descontraído se perdeu praticamente por completo no primeiro recuo onde sobe o ritmo. Claro que esse fato faz parte de uma decisão estratégica de acelerar o início do desfile, permitindo a Comissão de Frente se apresentar tão logo o samba comece e consequentemente a bateria suba. Mas, indubitavelmente, as já padronizadas introduções estão engessando musicalmente as largadas, sem contar alguns riscos que podem gerar impactos, sobretudo sonoros em toda a bateria.

Saudosismo à parte, as introduções funcionando como uma espécie de fórmula pronta ajuda a padronizar o espetáculo, sobrando poucas peculiaridades entre uma subida de uma bateria ou outra. Uma coisa que pode vir a ocorrer é, devido à dificuldade envolvendo a introdução, o arranjo acabar sendo executado de modo ineficiente. Por vezes isso afeta de modo direto o índice anímico dos ritmistas. É como se o clima subitamente pesasse sobre os ombros da bateria, que não executou o desafiador arranjo inicial de modo funcional, deixando a dúvida sobre seu desempenho pairando no ar por alguns minutos. Esse fato, inclusive, é capaz de mexer com o psicológico tanto de ritmistas, quanto de diretores. Um erro que não será despontuado, que não está sendo avaliado, mas que ainda assim pode deixar o clima de toda galera com aspecto tenso. Fora isso, também há a possibilidade concreta da aceleração do andamento, quando se comemora o êxito de uma introdução bem feita, subindo o ritmo da bateria em seguida do momento que por si só carrega emoção. Nesses casos, se faz necessário pedir concentração, ponderação, além de educação musical a todo o ritmo.
Outro momento que é primordial um cuidado extremo diz respeito a arranjos iniciais musicalmente desafiadores e baterias que sobem o ritmo logo após a introdução complexa e de difícil execução. O desafio é garantir que a bateria não suba “torta”, garantindo um ritmo integrado, sem desencontros rítmicos ou as clássicas emboladas. Algumas vezes, em virtude da extrema dificuldade, a bateria acaba subindo de forma que não privilegiará a fluência entre os naipes, ao menos nas primeiras passadas, até o ritmo assentar após a subida. No fundo, toda introdução que prejudica que o ritmo comece de modo fluído e orgânico deveria ser revista, garantindo assim sempre uma subida da bateria correta e coesa.
Até que ponto as já padronizadas introduções auxiliaram no processo de esfriamento do desfile? Embora seja bonita a execução de arranjos iniciais antes do samba do ano ser entoado, isso tirou sem dúvida parte da magia da largada, aquele momento mais solto em que se cantava o samba sem o ritmo acabou de perdendo. É possível dizer, inclusive, que parte da emoção de um momento pra lá de especial foi sendo musicalmente mutilada, com os arranjos cada vez mais frequentes antes do samba do ano. Aquela adrenalina e frio na barriga do ritmista dentro do primeiro recuo praticamente nem tem mais tempo de acontecer, já que quando iniciar a introdução logo o ritmo subirá com o samba do carnaval. Sem contar as subidas sem a pressão característica de cada agremiação. Baterias que historicamente subiam no repique mudando sua identidade, outras que antigamente subiam com tapas de todas as peças, virando sem o impacto sonoro de outrora.
Dificilmente para o Carnaval 2024 o quadro estará diferente da atual padronização envolvendo as introduções. Embora, algumas baterias ainda preservem suas raízes, efetuando sua tradicional e clássica subida. Como é o caso da bateria Pura Cadência da Unidos da Tijuca, que comandada por mestre Casão insiste em resistir e até hoje sobe seu ritmo com tapas em sequência de todos os naipes, garantindo uma pressão sonora peculiar, provocada principalmente pelo impacto grave dos surdos. O fato ainda dá esperança que, ao menos para o Carnaval do ano que vem, as coisas melhorem nesse tema. Refletir de forma crítica sobre os rumos musicais dos ritmos das baterias é uma necessidade contemporânea de todos os mestres e diretores. Não tenham medo de mudarem algo que parece uma evolução, mas no fundo pode ser retrocesso, já que nossa folia está intimamente ligada a laços envolvendo resistência, tradições e pertencimento cultural.
Emerson Dias, intérprete do Salgueiro: ‘A força do nosso samba ficou comprovada no ensaio técnico’
Desde 2019, Emerson Dias é o intérprete principal do Acadêmicos do Salgueiro. Após muitos anos no carro de som e no microfone oficial da Grande Rio, o cantor foi contratado a peso de ouro pela diretoria salgueirense da época. Logo no primeiro carnaval como voz guia da escola, Emerson teve a oportunidade de interpretar ‘Xangô’, um samba aclamado como um dos melhores daquele ano. Em parceria com o saudoso Quinho, seu mentor, teve uma atuação brilhante. E ali já começava a ficar nítido que o intérprete tinha a cara do Salgueiro. Isso se confirmou ao longo dos carnavais seguintes, com Emerson demonstrando toda sua garra, energia e amor pela vermelho e branco.
Mas para o carnaval de 2024, surgiu uma dúvida entre muitos sambistas. A força da mensagem do samba salgueirense parecia não combinar com o estilo vocal de Emerson. Alguns chegaram a criticar a atuação do cantor na gravação oficial. Porém, o intérprete já demonstrava nos ensaios de rua que os críticos estavam enganados. Se ainda restava alguma dúvida, o desempenho de Emerson no ensaio técnico deixou claro que seu jeito de interpretar casa perfeitamente com a obra musical do Salgueiro. Em entrevista ao site CARNAVALESCO, Emerson Dias revelou a certeza de todos na escola sobre a força do samba em sua voz:
“Lavamos a alma literalmente. Mesmo com aquele temporal que a gente pegou, conseguimos concluir a primeira parte do nosso objetivo, que era ver o samba na avenida, na Marquês de Sapucaí, já testando se ele é isso tudo mesmo que as pessoas falam. Uma coisa é você falar, outra coisa é você provar todo o rótulo que ele tem. E ficou mais do que comprovado o nosso ponto, a força do samba. Realmente, ele é o grande protagonista do Carnaval 2024. Agora só mais uns ajustes daqui e dali com o Salgueiro. A gente tem que botar na nossa cabeça que não tem nada ganho. Sabemos que no dia do desfile, com fantasia, carro alegórico, com o joelho na Presente Vargas para entrar na avenida, aquilo tudo se modifica, então é outra coisa. Mas a gente está bem satisfeito de ver o que aconteceu no domingo”, disse o cantor.
Durante o ensaio técnico, uma frase ficou muito marcada de tanto que Emerson a repetia. Ao interagir com o público presente na Sapucaí, o intérprete dizia “Preciso da ajuda de vocês”, com bastante energia, o que deixou muitos arrepiados. Mas ficou a dúvida da razão desse pedido. Alguns acreditavam se tratar de um clamor para que os sambistas ajudassem o Salgueiro por conta da pista molhada pela forte chuva. Na verdade, o motivo foi outro, como ele nos explicou:
“O caminhão de som não estava muito bom. O que aconteceu é que a gente demorou um pouco para entrar. Eu chamei o Seu Elmo, o Helinho, o presidente André, e a gente conversou com eles que iriamos largar daquele jeito. A gente precisava, porque tínhamos certeza que o samba iria acontecer. O caminhão de som, obviamente, tem uma importância muito grande, mas naquele momento ele seria coadjuvante. E foi o que aconteceu. A gente fez o certo, porque era uma convicção”, revelou Emerson.
Ao analisar o desempenho do samba do Salgueiro no ensaio, através de sua própria atuação em conjunto com a bateria dos mestres Gustavo e Guilherme, Emerson revelou que ambos mudaram um pouco suas características para se adequar à obra:
“A gente vai aprendendo com o tempo, vai jogando a regra do jogo. Então, hoje eu procuro me conter na questão de caco, até na questão de volume de entrega mesmo. Eu sou um puxador que eu me jogo mesmo. Mas isso tem duas vertentes. Tem o lado do julgamento e o lado do público. Eu sempre visei muito o lado do público, e às vezes, abdicava até um pouco do julgamento. Hoje, eu considero uma coisa até um tanto divertida, precisar jogar o jogo do campeonato e, ao mesmo tempo, agradar o público. Então, eu acho que foi isso que aconteceu no domingo. Eu me contive, a bateria se conteve, com um andamento sensacional, um andamento que o samba pede. Não adianta a gente querer tocar numa outra métrica, porque o samba não pede. A métrica do samba é aquela ali. Eu acho que foi justamente isso o grande sucesso do nosso tempero no ensaio técnico”, falou o intérprete.
Uma polêmica que se formou neste pré-carnaval foi a disputa entre os torcedores de Salgueiro e Mocidade sobre quem teria o grande samba do carnaval. As duas canções vem liderando o número de reproduções nos streamings, mesmo com estilos bem diferentes. Emerson confessou gostar muito do samba da verde e branco, mas afirmou que o Salgueiro já tem o grande refrão e samba de 2024:
“Eu acho que ‘Ya temí xoa’ já é o refrão do carnaval. No domingo eu respondi uma pergunta muito pertinente sobre o samba da Mocidade. Eu adoro o samba do caju. Acho que faz parte do processo. O carnaval precisa voltar a ter sambas e enredos como esse da Mocidade. Mas são bastante diferentes. O ‘Hutukara’ tem uma redação muito forte, uma temática muito forte. É uma mensagem bem mais forte do que um tema muito mais carnavalizado que é o caju. Então, por isso eu acho que o ‘Hutukara’ está na frente. Porém, os dois são muito carnaval”, afirmou Emerson.
É com essa força na mensagem e no samba-enredo que o Salgueiro vem disputar o carnaval de 2024, buscando seu décimo título na história. A escola será a terceira a desfilar no domingo, dia 11 de fevereiro, na Marquês de Sapucaí.
Série Barracões: Saudando São Jorge, Bangu leva história e sincrestimo para Sapucaí
São Jorge com certeza é uma das figuras mais populares da fé no Brasil. Venerado como mártir da fé em Jesus Cristo no catolicismo, é sincretizado com Ogum no candomblé e na umbanda, e de forma especial com Oxóssi no candomblé baiano. A figura do soldado romano que enfrenta o dragão, a quem chamamos de “santo guerreiro” de forma tão especial, traz a muitos brasileiros esse aconchego de fé e perseverança em meio as batalhas da vida, e será sobre esse personagem muito importante da religiosidade brasileira que a Unidos de Bangu irá fazer seu carnaval em 2024, com o enredo “Jorge da Capadócia”, desenvolvido pelo carnavalesco Robson Goulart.

Robson contou que a proposta veio da diretoria da escola, e foi aprovada por ele. Dali, ele foi para a fase de pesquisas, encontrando muito para ser falado sobre o santo e sua história. Porém, haverá o enfoque na parte antes da conversão de São Jorge, afinal ele foi soldado de Roma, onde chegou a ser comandante do exército, sob as ordens do imperador Diocleciano. Depois a escola virá com o sincretismo dele com as religiões de matriz africana.
“Nós fizemos esse diferencial para separar a escola em três setores”.
Durante a pesquisa do enredo, Robson conta que algumas lendas atreladas ao santo chamaram a atenção, mas a lenda ao redor da lua foi muito interessante de ser contada na Sapucaí. É com o sentido que ela tem para os mais antigos que a escola vai passar na avenida.
“Todo mundo fala da lenda da lua, São Jorge mora na lua, no clarão da lua cheia, mas tem o sentido que essa lenda tem para os mais antigos, a crença que eles têm nessa lenda, a crença que eles têm nesse santo, a devoção que eles têm por tudo isso fez um grande diferencial para a gente poder contar uma história bem bacana na Unidos de Bangu”.
Os trunfos da escola para o Carnaval de 2024 serão algumas surpresas, de acordo com Robson, preparadas pelas alas coreografadas e a comissão de frente, que tem como elemento cenográfico para a apresentação: “uma coisa que vai fazer um diferencial, uma coisa bem diferente. Nós partimos esse ano mais um pouco para a grandiosidade do carnaval de Bangu”, garante ele.
Falamos com o carnavalesco também sobre a situação de trabalho na Série Ouro, mais precária em comparação com o Grupo Especial, e como isso influencia no trabalho de fazer de carnaval para ele e para a escola. Robson contou que apesar da estrutura escassa do barracão, o projeto do carnaval está ficando bem estruturado, bacana, criando um boa expectativa com a escola, na busca por um desfile diferente.
“Nós temos um barracão que é um pouco escasso de estrutura, de espaço, de tamanho, de altura, então a gente nunca tem uma visão completa de como vai ficar o carro, só mesmo na avenida que fica montado”.
Sobre a questão do barracão ele ainda continuou falando sobre a situação em dias de chuva, dias em que os barracões da Série Ouro em geral sofrem um pouco mais. No caso da Bangu a questão é com as esculturas:
“Quando cai essa chuva forte fica um pouco escasso o espaço aqui para trabalho. Mas, graças a Deus, de danificar não danificou nada, aqui não alaga, graças a Deus, é menos mal. É só mesmo umas goteiras que caem do telhado, a gente cobre as esculturas para não danificar nada e a gente vai levando, que o negócio tem que ficar pronto”.
Robson descreveu, entretanto, o prazer de fazer carnaval na Unidos de Bangu pelo segundo ano, especialmente pelo apoio que tem da escola para realização do desfile, seja da diretoria ou da comunidade em si.
“Para mim é muito prazeroso mesmo estar fazendo carnaval na Unidos de Bangu, na Série Ouro, estar ali entre grandes escolas que já foram do Grupo Especial, é um grande desafio para mim”, finalizou ele.
Conheça o desfile da Unidos de Bangu
Em 2024, a Unidos de Bangu vem com 1.800 componentes, mais três alegorias e um tripé. Com carros coreografados, e três das alas também coreografadas. A Vermelho e Branco de Bangu será a sétima escola do segundo dia de desfiles da Série Ouro. Assim Robson Goulart detalhou o desfile da escola ao CARNAVALESCO:
Setor 1: “O nosso primeiro setor a gente começa desde a comissão de frente até mais ou menos a sexta, sétima ala. A gente começa falando de Jorge. Não Jorge santo, o Jorge soldado, o Jorge que se torna comandante do exército, Jorge que é obrigado a seguir as ordens do rei Diocleciano e a partir daí a gente começa a partir para o martírio que ele sofre ainda no exército, mas sobre alguns martírios. O rei desafia ele de diversas formas e em todas elas, ele sobrevive”.
Setor 2: “Aí que ele se torna santo, onde começa o nosso segundo setor, que é o setor religioso do cristianismo, a gente fala do santo São Jorge. Ele vem como santo, onde faremos uma grande alvorada em homenagem ao santo, onde vamos mostrar os devotos de São Jorge, os milagres que ele proporcionou para algumas pessoas naquela época da Capadócia. A gente fala dos santinhos, fitas, lembranças, dos festejos. Mais a parte mesmo do catolicismo”.
Setor 3: “E a gente finaliza o terceiro setor com São Jorge sincretizado na umbanda e candomblé, que é Ogum, que é Oxóssi. Festejos de feijoada, muita cerveja, os devotos do candomblé, devotos da Igreja Católica, todos em uma grande festa em homenagem ao santo guerreiro”.
Série Barracões: Porto da Pedra promete fincar as garras no Especial com desfile imponente e repleto de brasilidade
De volta ao Grupo Especial após 12 anos, a Porto da Pedra vai levar para a Marquês de Sapucaí um desfile de muita brasilidade. Com o enredo “Lunário Perpétuo: A Profética do Saber Popular”, do carnavalesco Mauro Quintaes, a escola de São Gonçalo contará a história do almanaque que prometia decifrar desde a previsão do tempo até o comportamento dos insetos. Durante 200 anos, foi o livro mais lido do Nordeste brasileiro.

E para marcar este retorno, a agremiação promete entrar na Passarela do Samba repleta de riqueza e imponência: ao todo, serão nove alegorias – entre um tripé e a acoplagem do abre-alas. O tigre, tradicional mascote e símbolo da Vermelha e Branca gonçalense, pode chegar a 22 metros de altura e tem o mesmo tamanho em comprimento – o maior já feito pela equipe. Segundo Quintaes, o desfile terá como proposta quebrar barreiras e mostrar que o lugar da Porto da Pedra é na elite do carnaval carioca.
“O desfile da Porto da Pedra vai mostrar que tudo é possível. Acredito que a gente não tem que se conformar com a mecânica que, durante alguns anos, existe no carnaval. Estamos aqui para derrubar as paredes, criar novos parâmetros e mostrar que uma escola que sobe pode sim vir bonita, preparada, bem acabada, com um investimento alto e com a autoconfiança do desfilante em poder representar o seu município. Tudo isso, agregado ao momento da escola, vai, sem dúvidas, criar um grande sucesso no desfile”, afirma o carnavalesco.
Desde o início, o projeto tem como ideia tornar cada carro alegórico uma pequena comissão de frente, como explica o carnavalesco. Para isso, a escola realiza um trabalho focado na plástica, com setores que vão proporcionar momentos únicos e de fácil entendimento, além de alegorias autoexplicativas. Com essa proposta e a chegada em peso do povo de São Gonçalo, a expectativa é de um grande retorno do público.
“Cada alegoria terá um momento diferenciado. Vou citar como exemplo o carro dos profetas da chuva: talvez chova na Avenida. No carro das benzedeiras, talvez elas possam passar uma erva, queimar um incenso. Em cada carro alegórico nós tivemos a preocupação de criar um momento impactante, porque isso faz com que o espectador se divirta, se interesse e assim possa existir uma troca entre Avenida e público. Para que essa troca ocorra, é preciso que eles (público) tenham o entendimento. Serão setores de fácil compreensão e um enredo de fácil leitura – desde o samba que é maravilhoso até o impacto da plástica”, detalha Quintaes.
Do almanaque ao enredo
O Lunário Perpétuo foi escrito por Jerónimo Cortés Valenciano e publicado em 1594, na Espanha. Repleto de ensinamentos e um verdadeiro almanaque, o livro serviu de orientação para a agricultura, astrologia e até para a previsão do tempo: se a abelha agia de tal forma, era sinal de chuva. No Brasil, desembarcou no século XVIII com tradução de Antônio da Silva de Brito e, de acordo com o historiador Câmara Cascudo, foi o livro mais lido do Nordeste por 200 anos. Em 2002, serviu de inspiração para o espetáculo musical “Lunário Perpétuo”, do artista Antônio Nóbrega.
Justamente através da obra de Antônio Nóbrega surgiu a ideia do enredo. Mauro voltava da comemoração do título do Grupo de Acesso, no ano passado, quando ouviu no rádio um documentário sobre o Movimento Armorial – do escritor e filósofo Ariano Suassuna – e lembrou do trabalho de Nóbrega. O estudo e elaboração da proposta contou com o apoio do enredista Diego Araújo.
“Dentro deste documentário citaram o Quinteto Armorial, que tem a figura do Antônio Nóbrega. Daí eu lembrei que ele tem um trabalho de 2002, que é o Lunário Perpétuo, e fui buscar o que era, já que eu conhecia somente pela sonoridade da palavra. Quando me aprofundei, passei para o nosso enredista, Diego Araújo, que se aprofundou ainda mais. A partir daí criamos o ‘Lunário Perpétuo: A Profética do Saber Popular’, que é justamente a história desse almanaque que ultrapassa os séculos educando e informando”, explica.
Para o carnavalesco, o fato do Lunário ser o livro mais lido do Nordeste brasileiro por mais de 200 anos dá ao enredo uma cara de brasilidade. Após o campeonato da Imperatriz Leopoldinense, que falou sobre Lampião, o enredo escolhido pela Porto da Pedra foi uma maneira de reavivar, com outro foco, o olhar para a região, como afirma Quintaes.
“Foi uma maneira da gente reavivar esse olhar nordestino, mas com um foco totalmente diferente. Quando descobrimos que por 200 anos o livro foi o almanaque mais lido do Nordeste – que alfabetizou, educou, orientou a agricultura e mostrou caminhos – entendemos que isso deu ao enredo uma cara muito forte de brasilidade. A partir daí, nos convencemos que o Lunário Perpétuo, além de ser um almanaque medieval escrito por um grande alquimista, se torna brasileiro e tem o cunho de importância que é colocado dentro do desfile”, comenta.
Desfile
Entregar algo impactante é fundamental para abrir a noite de apresentações da elite do carnaval. Hoje a única escola de samba representante de São Gonçalo, a agremiação aposta na plástica, na força do canto da comunidade e no orgulho de levar o nome da cidade ao Sambódromo.
Mauro acredita que os avanços no cenário carnavalesco elevaram o patamar dos desfiles. Com a responsabilidade lá em cima, o grande trunfo da escola na Avenida será mostrar a força de seus quesitos e da comunidade gonçalense, além da constatação que a Porto da Pedra acompanha a evolução do mundo do samba e veio para ficar.
“O carnaval naturalmente já está muito disputado. O sarrafo está muito alto, por conta dos novos valores, das novas estéticas que são impostas e pelo novo olhar político que a Marquês de Sapucaí transformou-se – ela se tornou um grande palco de manifestações, interesses e anseios políticos. A Porto da Pedra consegue visualizar tudo isso, porque é uma escola moderna e de gente nova. Estamos muito bem inseridos neste contexto. O nosso desfile será bem pertinente e que também terá o olhar político”, destaca o carnavalesco.
Uma das inovações anunciadas pela Liesa, o novo sistema de iluminação da Marquês de Sapucaí também será utilizado pela Porto da Pedra. Ao site CARNAVALESCO, Mauro Quintaes revelou que o efeito será usado tanto na comissão de frente quanto no abre-alas e também, em algumas outras alas. Segundo ele, o recurso terá um impacto principalmente na comissão de frente, com momentos pontuais que serão muito valorizados pela iluminação.
Questionado sobre o que considera características de seus desfiles e que não podem ficar de fora neste ano, o artista destacou a cenografia e a preocupação em que cada alegoria não se pareça com a outra.
“Não sou um carnavalesco de grandes adereços, fitinhas e babadinhos. Meus carros são grandes cenografias, daí me apego justamente nos pequenos detalhes. Eu gosto de criar cenografias dentro de uma grande cenografia que é o carro alegórico. Outra coisa muito importante é que um carro não pode se parecer com outro em nada – não só na técnica, mas no uso de materiais e formas. Ou elejo alguma leitura artística, ou crio uma estética própria com essa preocupação de não me repetir muito. O espectador é a extensão do julgador. Se ele se encanta, certamente consigo chegar no coração do julgador – se não tiver erros técnicos. A minha história se resume a isso: momentos que agradam ao olhar”, afirmou.
Já sobre o tigre – que será o maior levado para a Passarela do Samba pela escola – o carnavalesco conta que foi um pedido feito pelo presidente da agremiação, Fabio Montibelo. De acordo com Quintaes, o mascote faz parte de um conjunto de abertura e estará dentro do contexto da alegoria e do enredo.
“Ele (Fabio Montibelo) ficou 12 anos sob o comando da escola e esperando por este momento. A primeira coisa que me pediu quando assinamos o contrato é que eu fizesse o maior tigre que a Sapucaí já viu. Fizemos um tigre de 22 metros e que também chega nesta altura, porque ele dá um grande bote na Avenida. Ele é o nosso grande mascote e símbolo da Porto da Pedra. A ideia é fincar essa garra no Grupo Especial e não sair mais”, revela.
Conheça o desfile da Porto da Pedra
O Tigre de São Gonçalo vai abrir a primeira noite de desfiles do Grupo Especial, no dia 11 de fevereiro. A escola vai para a Apoteose do Samba com 22 alas, seis alegorias e um tripé. Ao todo, serão 2800 componentes.
Setor 1: “Ele conta sobre Jerónimo Cortés Valenciano. A figura dele surge no abre-alas, daí já vamos ter essa mística dos alquimistas, magos, laboratórios. A gente tem água, fogo, terra e ar. É o grande momento onde teremos a ala das baianas, comissão de frente. A comissão está muito integrada ao primeiro setor e ao abre-alas. Não é uma coisa à parte, porque, às vezes, vemos algumas comissões que não tem muito a ver com o que vem atrás. Eu gosto de fazer com que essa onda estética leve o observador para dentro da história. Cada setor será uma página do Lunário. A gente abrirá com essa criação e escrita medieval do Jerónimo”.
Setor 2: “O Lunário decodifica o comportamento dos insetos. Isso porque ele ensina que se a abelha age de tal forma, a florada será de um jeito; se o cupim segue um caminho, irá chover. Isso é fantástico, estamos falando de 1500”.
Setor 3: “A gente dá uma ‘virada’ mais contemporânea depois dos insetos. Teremos Manoel Caboclo, que foi o nordestino que também utilizou os ensinamentos do Lunário Perpétuo. Ele traz o Lunário em seus conselhos e editou cordéis ligados ao almanaque”.
Setor 4: “Partimos para as benzedeiras. As raízes, ervas e os ensinamentos do Lunário de como curar, como se prevenir. Teremos uma grande benzedeira, que é o ‘xodó’ do barracão. Todos quando passam por ela fazem o sinal da cruz e benzem-se, porque ela está aqui para proteger a Porto da Pedra. É um carro, entre aspas, muito cinematográfico e teatral. Nele vamos homenagear os fundadores da escola. Estarão ali, de alguma maneira representados – as pessoas vão ter que descobrir onde eles estão”.
Setor 5: “Falo do Armorial, do Ariano Suassuna – que também está na trajetória do Lunário. Vamos misturar um pouco essa coisa do medieval com o medieval brasileiro, com as armas, ferros de marcar gado e com as estampas do (Gilvan) Samico, que foi a estética que escolhemos para representar o Armorial. Neste setor teremos o Ariano Suassuna e o Auto da Compadecida”.
Setor 6: “O Armorial de Suassuna (setor 5) abre para o Quinteto Armorial. Surge a figura do Antônio Nóbrega, que foi o inspirador do enredo e virá fechando o desfile. Um grande brincante nordestino, nome fortíssimo da cultura brasileira. Reforçamos a história do Antônio, que é o grande representante contemporâneo do Lunário Perpétuo”.