Majestosa, a águia da Portela agora tem nome, fantasia e uma identidade misteriosa
A Portela agora tem um mascote para chamar de seu, idealizado pelo vice-presidente, Júnior Escafura, a mais nova componente da Portela fez sua estreia e se apresentou com a escola no ensaio técnico. O primeiro elemento que remete à Portela é a águia, símbolo mor e marca registrada da escola. Que desde sempre traz a ave em seu abre-alas, deixando todos os seus torcedores ansiosos para saber como ela irá vir no próximo carnaval.

Após diversas águias icônicas, como a águia redentora de 2015, a águia que segurava o pavilhão pelas garras em 2017 e a águia folia de 1995, a Portela apresenta a águia em forma de mascote. A ideia partiu do vice-presidente da escola, que visou atender uma demanda dos portelenses apaixonados.
“A Portela, tem uma legião de apaixonados, nada mais justo que a nossa águia, que é o nosso símbolo do carnaval, ser representado no mascote”, conta Escafura.
O mascote da Azul e Branco de Oswaldo Cruz e Madureira se junta ao time seleto de mascotes icônicos do carnaval, formado pelo Castorzinho, da Mocidade Independente, pelo Sabiá, do Salgueiro, o Reizinho, do Império Serrano, e o Tigrão da Porto da Pedra. Além de personificarem um símbolo da escola, esses mascotes são ativos nas ações e nas redes das agremiações, encantando e divertindo todas as gerações.
“É muito bacana, o carnaval precisa disso. Precisa dessa interação, as escolas cada vez fazendo mais ações juntas. Isso é ótimo, agrega muito ao carnaval”, comenta o vice-presidente da Portela e idealizador do mascote.
O mascote da Portela não é o primeiro, mas é a primeira, pois é a primeira mascote feminina das escolas de samba. A agremiação que traz, esse ano, um enredo sobre o matriarcado e a potência feminina, sempre apresentou nas redes o projeto de uma mascote feminina, diversos nomes foram propostos, como, Portelinha, Telinha, Dedé, Dodôzinha, Pepê, Tetela, Suriquinha, Altaneira, Vilminha e Monarca, a grande maioria deles fazendo referência a mulheres importantes para a escola. No entanto, Majestosa foi o nome escolhido pelos torcedores.
“A escolha do nome foi por votação, o público que escolheu, e aí ficou Majestosa. Um nome que eu acho maravilhoso, a Portela é isso, a Portela gosta de ter alcunha de majestade, então está aí a nossa majestosa”, revela Escafura.
A Majestosa encantou a todos quando passou pela Sapucaí com a Portela no ensaio técnico, porém, não teve a identidade revelada. Será que a identidade da Majestosa será um mistério eterno, assim como é a próxima águia do abre-alas da Portela?
Cadenciadíssima, Camisa 12 faz ensaio técnico com muito Sol no Anhembi
Por Will Ferreira e Fábio Martins
No domingo, último dia de ensaios técnicos no ciclo carnavalesco paulistano para 2024, uma escola estreou no Anhembi. Trata-se da Camisa 12, que defenderá o enredo “Meu Black é de Rei, Minha Coroa é de Chico. Chico Rei Entre Nós”, idealizado pelo carnavalesco Gleuson Pinheiro, contando um pouco mais sobre a história e o legado do histórico personagem em solo brasileiro. Sendo a sétima escola a desfilar no Grupo de Acesso II (ou seja, no dia 03 de fevereiro), a agremiação teve uma Evolução bastante adequada para a escola.
Evolução
Nos últimos anos, a Camisa 12 não costuma trazer tantos componentes para os desfiles. O estilo mais compacto da Pantera pode dar a impressão para muitos de que o ensaio técnico seria bastante rápido, mas não foi isso que aconteceu. Utilizando muito bem todo o staff, a agremiação encerrou o evento com 54m35s – dentro do limite para o Grupo de Acesso II, que tem 55 minutos como prazo para cada apresentação. E, para chegar a tal cronometragem, a agremiação, basicamente, liberou os componentes para passarem bastante soltos pelo Anhembi. Isso era nítido na grande liberdade que todos os desfilantes possuíam na passarela, algo raro no carnaval de hoje. E eles corresponderam, se movimentando e interagindo bastante. Como toda a agremiação teve andamento bastante cadenciado, o recuo da bateria, feito com uma dinâmica simples e que durou cerca de 120 segundos, esteve dentro de tudo que foi proposto pela instituição.
Samba-enredo
A safra do Acesso II de 2024 é bastante elogiada por muitos, e a canção da Camisa 12 está inserida em tal comentário. A obra, que trata de um assunto denso de maneira bastante leve, foi muito bem executada por Tim Cardoso e Clóvis Pê, intérpretes da agremiação. E, seguindo o ensaio técnico como um todo, a obra teve uma cadência especial da Ritmo 12, bateria da escola, comandada por Mestre Lipe. Com toda a ala musical no mesmo ritmo, todo o andamento foi bastante satisfatório.
Comissão de frente
Com um personagem destacado (que, muito provavelmente, é o próprio Chico Rei), o segmento tinha uma série de integrantes que participam de uma espécie de corte do personagem central do enredo – além de algumas pessoas empurrando um trono onde, por vezes, o protagonista sentava; sendo que tal trono, por sinal, era o único elemento alegórico existente. Em determinado momento, os comandados da gabaritadíssima Yáskara Manzini abrem uma espécie de cartaz – que não tinha nada escrito no ensaio, mas que atiçou a curiosidade para saber o que virá no desfile oficial.
Mestre-sala e Porta-bandeira
Com um dia de muito calor e Sol incomodando, chamou atenção a escolha de Luã Camargo e Estefany Righetti para ensaiar: uma roupa inteira preta, que fazia com que ambos, coreografados por Laís Moreira (de grande escola na coirmã Unidos de Vila Maria), sentissem ainda mais calor. Tal figurino, certamente, colaborou para que a exibição da dupla não tivesse qualquer tipo de ousadia, focando na segurança para cumprir todos os balizamentos obrigatórios pelo regulamento – e, em tal empreitada, eles foram muito bem. Também vale pontuar que, ao longo da passarela, Estefany trocou de calçado: ela iniciou com um salto e acabou com um antiderrapante; e que, no quarto módulo, é bem verdade, ambos, mais seguros, arriscaram um pouco mais.
Harmonia
A cabeça da escola, é bem verdade, cantou em bom som o samba-enredo – e, aqui, vale o destaque, já que o início de uma escola apresenta menos componentes que o restante da mesma. Após a alegoria que veio representando o abre-alas (algo que engrandeceu o ensaio técnico, por sinal), entretanto, os desfilantes não conseguiram sustentar o volume. O forte Sol que fazia na Zona Norte de São Paulo é a principal explicação para quem tal situação acontecesse, deixando todos na passarela cansados – inclusive a reportagem. Vale destacar positivamente a ala à frente do último carro, que ajudou bastante no canto da comunidade
Outros destaques
A corte da Ritmo 12 teve a rainha de bateria da agremiação, Vanessa Aggio.
Mocidade Unida da Mooca realiza segundo ensaio técnico com destaques para comissão de frente e harmonia
Por Gustavo Lima e fotos de Fábio Martins
Um ensaio técnico recheado de emoções foi realizado pela Mocidade Unida da Mooca neste último domingo. Isso porque a homenageada, Helena Theodoro, esteve presente e discursou para a comunidade antes do início. Foi um grande combustível para os componentes pisarem ainda com mais força no Anhembi. “Todo mundo tem uma Helena dentro de si”, dizia a escritora.
O canto da comunidade e a comissão de frente foram destaques. E também há de se destacar a total seriedade que a agremiação leva os seus ensaios técnicos. Fazem questão de levar tripés ao sambódromo para realmente demarcar os espaços de evolução.
Comissão de frente
Uma bela comissão foi apresentada no Anhembi pela MUM. Havia duas personagens principais, sendo uma delas a Helena Theodoro criança e a outra a orixá Iansã, que é mãe da homenageada na religião umbanda. O que se via na comissão, aparentemente, era uma interagindo com a outra e resumidamente a entidade passava bênçãos para Helena, que conseguia obter o seu dom de escritora. Dá para supor isso, pois logo depois da interação, a menina sobe no tripé e começa a escrever e movimentar o livro, como se tivesse jogando palavras para o público e arquibancada. Criativa apresentação da ala, que é comandada por Nilson Jaffer.
Mestre-sala e Porta-bandeira
O casal Jefferson Gomes e Karina Zamparolli, executaram um ensaio agradável. A dupla já mostra estar à vontade com o pavilhão da Mocidade Unida da Mooca. Deu para notar um ensaio estratégico, com giros horários e anti-horários somente nos momentos que se pede, que são os módulos. Nas demais partes, a dupla optou por se preservar e bailar estendendo o pavilhão, tendo como prioridade colocar a intensidade nos locais de julgamento.
Harmonia
É o ponto forte da escola e não é de hoje. A MUM tem uma comunidade engajada desde quando subiu e sempre compram todos os projetos de carnaval, que são liderados pelo presidente Rafael Falanga – O mesmo diz que “escola que canta, ganha”. E acabou virando um lema. Sendo assim, o samba foi aceito logo de cara, muito bem trabalhado nos ensaios de quadra e, posteriormente, levado ao Anhembi para concluir o objetivo. Uma melodia forte e para cima, especialmente nos refrões, facilitando o canto da comunidade.
A parte mais cantada pela comunidade é o refrão principal, com destaque para a frase: Axé Helena! Mojubá! Elegbará!”.
Evolução
A escola tem uma evolução um tanto criativa. Há muitos movimentos, giros, coreografias, corpos balançando para frente e para trás. Os componentes são instruídos a incorporarem a letra do samba. Com bexigões em vermelho e verde, nas cores da agremiação, dava um tom bacana na pista. A comunidade estava solta e compacta. Mesmo com os vários tripés, a evolução dos componentes não foi comprometida.
Samba-enredo
Grande atuação dos intérpretes Gui Cruz, Clayton Reis e a nova cara do time musical, Bico Doce. Vale destacar que nas caixas de som, percebeu-se a voz do recém-contratado mais forte que a dos dois jovens da casa. Entretanto, o fato é que todo o carro de som conseguiu o feito de potencializar a música, o que está a altura de uma homenagem para Helena.
Outros destaques
A bateria “Chapa Quente”, do mestre Dennys Silva soltou bossas e fez o que o samba pede: andamento acelerado para um samba que tem uma melodia para frente.
A rainha de bateria Valeska Reis teve toda uma coreografia somente para ela. Bailarinos faziam bela coreografia em volta da dançarina enquanto sambava. Uma apresentação diferente no que se diz respeito a uma rainha de bateria.
A ala das baianas foi inteiramente vestida com um belo saiote com estampas marrom e em desenhos de borboleta. Diferente vestimenta para as mães do samba. Vários tripés foram junto do ensaio, o que quer dizer que a MUM quer marcar o espaço corretamente.
Reserva de ingressos populares para o Rio Carnaval 2024 acontece nesta quarta-feira
O público que deseja garantir um lugar nas arquibancadas dos setores 12 e 13 do Sambódromo carioca para acompanhar de perto o Rio Carnaval 2024 já pode marcar na agenda a data para realizar a reserva. Os ingressos começam a ser vendidos nesta quarta-feira (31), a partir das 9h.

Os interessados em comprar as entradas populares para os desfiles do Grupo Especial devem acessar o site oficial da Liesa – www.liesa.com.br e seguir os passos descritos até as 11h. Aqueles que forem contemplados deverão, então, comparecer ao estande da Central de Vendas, montado atrás do setor 11 da Passarela do Samba, na Rua Salvador de Sá, no dia 3 de fevereiro, entre 9h e 15h, para realizar o pagamento em dinheiro, cujos preços custarão a partir de R$ 5 (meia-entrada). Cada pessoa poderá comprar um ingresso de meia-entrada e/ou quatro ingressos para cada dia. Será necessário levar a senha recebida no momento da reserva e um documento de identidade.
Já os foliões que buscam outros tipos de ingressos, como camarotes, podem seguir realizando a compra normalmente pela plataforma da Ticketmaster. Também há poucas vagas para arquibancadas especiais – apenas para o Sábado das Campeãs -, com os detalhes podendo ser obtidos em www.riocarnaval.com.br/ingressos.
Os desfiles do Grupo Especial deste ano acontecem nos dias 11 e 12 de fevereiro, com as seis melhores colocadas fechando o Rio Carnaval no dia 17.
Série Barracões: Abertura promete impacto no desfile da Estácio no Carnaval 2024
Marcus Paulo, carnavalesco da Estácio de Sá, recebeu o site CARNAVALESCO no barracão da agremiação, no bairro do Estácio para entrevista especial. Durante o bate-papo, o artista revelou o que o primeiro casal virá representando, contou a cronologia da escola, a origem do enredo e os problemas sofridos com o barracão de uma escola de samba que está na Série Ouro. O enredo da Estácio de Sá “Chão de Devoção: Orgulho Ancestral”, tem a ideia de trazer para a Sapucaí o povo preto que disseminou sua cultura e transformou a diáspora africana em solo brasileiro. Marcus Paulo comenta que não foi ele que propôs o enredo. Foi uma ideia da própria direção, principalmente, do presidente Marinho. E que a história tem relação com a herança e costumes da agremiação.

“A Estácio é muito devota de pretos velhos desde a fundação dela. A Estácio de Sá, quando foi fundada, tinha uma preta velha chamada Cambinda, que instruiu a eles de como fundar essa escola, benzendo e rezando. Nos dias atuais, eles cultuam essas entidades no fundo da quadra da Estácio, onde tem um terreiro, que essas duas pretas velhas, Vovó Cambinda e a Maria Conga, dão consulta pros Estacianos. Eu tinha outros enredos, e aí me propuseram esse enredo. No incio, eu fui um pouco reticente, porque eu tava com outras coisas na cabeça. Mas quando eu fui sentindo essa devoção da escola, por essa ancestralidade, por essa religiosidade. Eu entendi que para a Estácio de Sá – que inventou o samba de sambar, que criou a escola de samba – samba e macumba são a mesma coisa. Foi aí que eu tomei como ponto de partida buscar quem eram essas duas mulheres, de onde elas vieram, como elas chegaram aqui no país e o que levou elas a se tornarem entidades. Eu busquei a região, a mancha geográfica de onde vieram as duas, que é de uma região que era única, o Congo Angola. Era um reino só do Congo e as duas foram escravizadas ainda meninas, é uma história muito parecida. Uma tinha por volta de 7 anos e a outra, por volta de 9 anos, e mesmo assim, tão meninas, ainda chegaram aqui com o povo da diáspora africana e criaram essa consciência de lutar pelo seu povo e pela sua cultura. Cresceram com isso. O foco do enredo é isso, eu busquei elas ainda em vida, para mostrar essa cultura delas, esse colorido, o gingado, a dança, a culinária. Tudo ainda em África, para depois passar para essa parte que nós temos conhecimento aqui no Brasil. A gente conhece a partir dos tumbeiros, a partir do navio negreiro, o antes a gente não tem conhecimento, até porque é muito raro ter essas histórias do povo preto. Eu descobri também que a mancha geográfica desse local, o solo é muIto vermelho, é aquela argila bem vermelhona, por isso que eles têm muito artesanato. O que combina muito com a Estácio de Sá, sem contar o leão, que é um dos símbolos africanos e que é o símbolo da escola. Aí eu falei, realmente é um grande enredo e é esse enredo que eu vou desenvolver”.
Diante de um enredo e uma história tão forte e tão relacionada a Estácio de Sá, a primeira escola de samba, Marcus confessa que algumas questões o deixaram mais envolto na história.
“Descobrir efetivamente essa ligação da escola com essa ancestralidade foi um ponto. O meu título era outro que não tinha nada haver. E quando eu fui lendo, pesquisando, escrevendo o meu enredo, eu vi que a Estácio cultua a ancestralidade ali no seu chão, desde o início. Então, por isso que o título é “Chão de Devoção e Orgulho Ancestral”, que ela além de cultuar, ela tem muito orgulho dessa religião africana, ela tem muito orgulho de tudo que vem do preto. E também a Estácio fez pouquíssimos enredos africanos, apesar dela ter esse orgulho. Então, a parte que eu mais gosto do enredo é essa ligação, esse fio de ligação com essas entidades, desde a fundação até os dias atuais. Isso é o que me encanta no enredo”.
Para além do profissional, ele vê que o mais interessante não é enredo, não é a história em si, mas as descobertas que pode fazer durante a pesquisa. O ponto que pegou no coração do carnavalesco foi personificar essas mulheres para além do nome do rebatismo de quando chegavam ao Brasil. Afinal, naquela época o nome era imposto pela região que havia vindo da África.
“Foi quando eu descobri esses possíveis nomes dessas mulheres que a gente não conhece, só conhece o rebatismo. Cambinda e Maria Conga que chegam ao Brasil como mercadoria. Vem do Congo, então vai ser Maria Conga. Então a gente não sabe quem são essas pessoas, a gente não imagina como elas viviam. E descobrir ali esses possíveis nomes dentro da cultura delas. Descobrir que uma, na região da Cambinda, eles tinham os rituais que batizavam seus filhos com o nome de seres poderosos, para eles terem sorte. Descobrir que na região da Maria Conga eles batizavam seus filhos apresentando para a Lua, a luz da Lua, e a Lua soprava o nome no ouvido de seu pai, e se não soprasse ele tinha que voltar outra vez, e outra vez até soprar esse nome. Eu não sei o nome que soprou, mas por isso a gente deu o nome dessa menina de Mwana Ya Sanza, que é filha da lua, filha da luz da lua. Então, descobrir esses nomes, materializar essas meninas antes do navio negreiro, assim é o que me encanta”, confessa o artista.
A abordagem no enredo não é o que costuma aparecer na Avenida. Marcus quer dar novos olhares para África, aos negros e aos africanos. O foco do enredo é trazer a arte, a cultura e o colorido especial.
“A escola é apaixonada e eu estou contando essa história, eu estou pontuando muito que a Estácio. Nesse ano, eu como artista negro, a gente não vai se recolocar naquele lugar de chicoteado, de escravizado, de maltratado, de assassinado. A Estácio não trará os universais escravocratas. O que são esses universais? Correntes, grilhões, mordaças, chicoteamentos, que eu acho que eu particularmente já cansei desse lugar, de ver essa imagem, de recarregar essa imagem colonialista, do negro sofrido. Eu acho que já deu e dizem que é para que não aconteça de novo. Tá, mas eu acho que já deu. Vamos lançar um novo olhar. O foco da Estácio é nas estratégias que essas meninas e o seu povo tiveram para disseminar a cultura e não apresentando esses universais escravocratas que não são obras de artes. Não são peças para estar expostas, são vestígios de crime, é para ser investigado e não apresentado. Então, esse é o foco, o colorido, a cultura e as estratégias. O sofrimento não vai passar na avenida”, diz o carnavalesco.
O berço do samba, logo na cabeça do desfile, vai mostrar seu impacto. As cores da escola vão se diferenciar do que costumam representar como África.
“O vermelho, porque aqui é o solo do Congo Angola dessa região, que é um vermelho muito forte e a cor da nossa bandeira. Vai ser um choque muito grande esse cruzamento da cor da região africana com a bandeira da escola. Trazer essas cores, porque eu mesmo em outros enredos afro, na Unidos da Tijuca, na Acadêmicos da Rocinha, tinha esse vício que o carnaval tem de fazer a África em tons terrosos, dos marrons, que é o tom da terra, o tom da pele do negro, que vem sem nada. Ele vem só com pano amarrado na cintura, nem roupa ele vem. É a cor do tumbeiro, que é aquele tom da madeira, então a gente sempre coloca a África nesses tons. E ela é tão colorida. Tão magnífica, então isso me encantou, trazer essa cor para um enredo matiz da escola vai ser muito bonito”.
No entanto, transformar o desfile, as fantasias e alegorias em um espetáculo magnífico não é facil diante de tantas dificuldades na Série Ouro. A Estácio de Sá, que caiu do Grupo Especial em 2020, enfrenta os desafios de estar no Grupo de Acesso, sobretudo, com a ausência de uma Cidade do Samba e infraestruturas dignas.
“A precarização do barracão é muito caro para a gente, faz com que a gente atrase muito o trabalho. Por exemplo, agora a gente conseguiu uma lona na frente, porque a gente tem os avances das alegorias que não dão aqui embaixo do teto. Foi a semana inteira de chuva e não conseguimos mexer em nada lá na frente, nem pintar, nem decorar. Esse barracão, a Estácio conseguiu tem dois anos, só esse ano a gente conseguiu fazer uma cobertura, que nem coberto era. Conseguimos fazer um banheiro, porque o pessoal usava o banheiro do posto de gasolina da frente. As escolas que não estão no grupo especial, não que lá não mereça, tem que ser assim mesmo, eu acho. O espetáculo é tão grande que eu acho que a estrutura que está na Cidade do Samba ainda é pouca, tem que ser melhor. Mas tem que se olhar melhor para as outras escolas. Porque a gente é obrigado pela competitividade a fazer um carnaval equiparado com o do Grupo Especial, com uma verba que não se equipara e com os barracões que não tem nada a ver com o do Grupo Especial. Prejudica muito o trabalho. Se chover forte, já era, a gente tenta colocar a lona, mas o vento é tão forte que arrebenta as lonas, derruba as lonas”.
E as perdas são muitas, a partir delas são criados “truques” para sobreviver e se reinventar: “A decoração a gente teve que refazer. Tem que refazer lá na frente os avançes, a gente está refazendo porque a chuva não parou. Esses dias parou e a gente conseguiu montar uma lona. Agora, a gente vai ter que refazer a pintura e a decoração. Por exemplo, tem dois tripés que a gente já preparou e já não está mais aqui pela falta de cobertura, mas que vão voltar porque ainda faltam alguns detalhes. O tripé está no barracão da AESM Rio, que é o barracão das escolas Mirins e é um pouco mais coberto. A gente conseguiu uma parceria que eles deixaram a gente guardar lá enquanto estava temporal na cidade, e agora a gente vai pegar de volta. Lona o tempo inteiro, porque as laterais são abertas. A chuva de vento vai tudo em cima da alegoria, mas é muito precário mesmo. Todas as escolas de Samba merecem um local digno, seja no Especial, no Acesso, ou nas outras séries”.
Mesmo diante de tudo, o amor e o prazer de fazer carnaval não se modificam. Eles se transformam, se unem para alcançar o melhor resultado e fazer um desfile lindo. Afinal, se trata de resistência.
“É prazeroso, mas é doloroso pra caramba também. Ainda mais que eu venho de seis carnavais na Unidos da Tijuca, na Comissão de Carnaval, como carnavalesco. A gente tinha lá uma Cidade do Samba. Que tem toda a estrutura, as equipes vão à sua procura, são as melhores. Melhores equipes, você consegue oferecer condições melhores de trabalho para as equipes que vão trabalhar com você. O Grupo de Acesso não são tão boas. De ambiente de trabalho e de qualidade, você tem que estar do lado das pessoas o tempo todo mostrando, ‘Olha, a gente está na dificuldade, mas eu estou aqui junto com você, eu também estou passando por isso’, para que o descaso seja um pouquinho menor. Para a gente sentir o que o outro está sentindo também, para que o outro sinta que eu também estou sentindo que ele está na dificuldade, que ele não está sozinho. Mas é bem, é prazeroso sim, depois que a gente vê o trabalho terminado, que é com um sacrifício terrível, e depende da nossa mão mesmo. Aqui o carnavalesco tem que botar a mão efetivamente, ele tem que ser peça da treinagem para funcionar. Dá um prazer no final. Tem dia que bate aquele desespero, bate aquela tristeza e desespero mas esse amor pelo carnaval faz a gente retornar e pensar que no final vai ficar bonito e sentir prazer”.
Além do barracão que trabalha com uma média de 32 pessoas, o ateliê produz as fantasias, localizado na rua de trás da quadra, que funciona com 42 pessoas.
“O ateliê está a todo vapor, estão bem adiantados e vem funcionando há bastante tempo. A escola investiu bem a verba que tinha em fantasia e está bem antecipada. A estrutura é bem melhor. É um espaço alugado e são dois andares e é bem grande, o ateliê é bem confortável, oferece mais conforto para as pessoas que trabalham”.
Marcus Paulo se emocionou ao ver a roupa do primeiro casal de mestre-sala e porta-bandeira, o casal Feliciano Junior e Thais Romi, que brilhou no ensaio técnico na Sapucaí. Ele diz que é um dos destaques do seu desfile.
“Eu fui pra prova de roupa do meu primeiro casal, que já tá pronto. Chorei, a lágrima caiu, porque eu achei magnífico. O ateliê aquarela carioca, o Léozinho e o Pedrão arrasaram na roupa, fizeram com muito carinho. Eles são tão encantadores. Eles representam os rituais em liberdade, o som que embala a dança. O africano é muito musical, ele tem a ginga no corpo. Ele traz isso consigo, ele tem o ritmo. Apesar de eu ter o pezinho lá, eu sou horrível de ritmo, nós trazemos essa ginga na alma. Eles representam isso e a indumentária ficou magnífica e a dança deles, me encantaram, me fizeram chorar mesmo. Eu vi alí o locus, o que eles representam no enredo, o que eu escrevi e eu vi se materializando. Fiquei muito feliz”.
Além disso, ele diz que tem outro trunfo no desfile de 2024, que costuma sempre trazer como diferente nas escolas que passa.
“Eu sempre tenho um carro, seja na Unidos da Tijuca, seja na Rocinha, que eu faço com material completamente alternativo, que não tem a ver com carnaval. Esse ano é o meu tumbeiro, o navio. É um trançado que dá aquela sensação de cláusula, de prisão, mas é um transado com um material que não se usa no carnaval. Não é usual e eu acho que esse é o meu trunfo, que vai chamar atenção. É o meu queridinho do barracão”.
Na Estácio de Sá não falta comunidade, irá desfilar com 2200 componentes, um elemento cenográfico na comissão de frente, três alegorias e dois tripés.
“A escola virá bem grande, ela é, de fato, uma escola grande. A comunidade desce mesmo, né? Até porque todo mundo costuma dizer que a Estácio está jogando em casa. Eles têm uma descida do Morro do São Carlos que é dentro da Sapucaí. De componente ela não tem problema. A escola é bem grande”.
Marcus Paulo fala também um pouco sobre como a agremiação irá desfilar tão esperado. Em 2024, o Berço do Samba será a quinta escola a se apresentar na sexta-feira de carnaval.
Conheça como será o desfile
Setor 1: “Então, a abertura do enredo é ainda em África. Apresentando essas duas meninas, os rituais e as culturas e como elas viviam ainda numa África livre. Livre, totalmente livre, ainda sem esse horror da escravização”.
Setor 2: “O segundo setor é a parte da escravatura, quando o povo da diáspora é agredido. Tem essa agressão terrível da escravização e a chegada aqui no Brasil. Tratamos em que condições chegaram, de que forma chegaram e quais as estratégias que eles usaram para suportar tanto sofrimento até chegar aqui. Eu toco muito que essas estratégias são a força religiosa, a espiritualidade. E até no batismo de uma das meninas, que era um ser que protegia, uma Kianda. Na cultura deles é um ser também místico do mar, porque é em região costeira, então, eles têm muita crença no mar, a riqueza vinha do mar”.
Setor 3: “Quais as estratégias foram criadas para essa cultura ser espalhada aqui no nosso país. Mesmo proibidos, ameaçados de ser assassinados e castigados, não podendo fazer, praticar a cultura e a religiosidade, eles arrumavam jeitos às madrugadas, nas senzalas, no chão da senzala, que criavam rodas, de dança, de batuque”.
Setor 4: “O quarto setor é efetivamente a Estácio de sol olhando para o mar. Ela para essa crença e ancestralidade dela, que é o chão de devoção. Na verdade, mostra essas meninas já adultas e a passagem delas para o plano espiritual, quando elas se tornam espírito de luz e são batizadas por Oxalá e Zambi. Se tornam pretas velhas para continuar cuidando do seu povo e da gente até hoje. E aí essa parte, mostra que elas são as mães de todo Estanciano. Desde o início elas tiveram junto com a escola, estão até hoje protegendo e continuam protegendo no desfile. Então, esse último setor fala realmente dessa devoção da Estácio de Sá pela ancestralidade”.
Energia surreal! Após três dias do último ensaio técnico, Tatuapé evolui ainda mais no canto em novo treino no Anhembi
Por Gustavo Lima e fotos de Fábio Martins
Em um curto intervalo de tempo, o Acadêmicos do Tatuapé voltou a ensaiar no Anhembi. A escola havia realizado o seu primeiro treino na última quinta-feira, três dias antes. Naquela oportunidade, o destaque foi o canto. Agora, isso se mantém, e até melhorou. A harmonia da agremiação da Zona Leste está em outro patamar. Não tem mais para onde crescer. Todos cantam forte em sinergia, juntos nos apagões e tem empolgação do início ao fim. Não é de agora, mas talvez o canto atingiu o ápice. O contingente é grande, e o que resta é colocar em prática no desfile. No ensaio deste último domingo, novidades como o casal de mestre-sala e porta-bandeira, Diego e Jussara tiveram destaques em desempenho.
“A gente conversou aqui logo depois que terminou o nosso ensaio de quinta-feira e me foi perguntado o porquê dessa preferência de fazer os ensaios técnicos mais próximos do desfile. A nossa avaliação é que quinta-feira foi muito bom, mas ainda havia alguns ajustes a se fazer. Hoje eu tenho certeza absoluta que o nosso desfile foi ainda melhor do que o de quinta-feira. Eu tenho certeza que dia 9 nós vamos fazer melhor que tudo isso junto. Se Deus quiser vamos fazer o melhor desfile da nossa história, como a gente quer a cada ano”, comentou o presidente Eduardo Santos.
“Uma Joia da Bahia – Símbolo de Preservação! Entre Contos e Sabores, Viva a Mata de São João!” é o enredo do Tatuapé, sob assinatura do carnavalesco Wagner Santos.
Comissão de frente
Os bailarinos repetiram os movimentos realizados na última quinta-feira. Talvez a coreografia esteja concretizada, apenas o ensaio deste domingo foi para corrigir detalhes. Desta vez os componentes estavam vestidos com roupas de verão, tipicamente da Bahia. O elemento alegórico também foi usado da mesma forma.
A apresentação tinha capoeira, figura principal, entre outras danças. Tudo se encerrava em uma pose de estátua, cujo a maioria dos integrantes da comissão iam para o elemento alegórico e cada um fazia uma pose.
Mestre-sala e Porta-bandeira
O ‘casal foguinho’ Diego e Jussara, teve uma apresentação diferente da última quinta-feira. Aparentemente a estratégia do dia 25 era reconhecer o terreno junto à comunidade, para assim, no segundo ensaio, realiza-lo por completo. Na outra oportunidade, a dupla foi bailando estendendo o pavilhão por toda a pista, sendo raras às vezes de arriscar. Entretanto, neste domingo, observou-se alto sincronismo da dupla em todos os módulos, sobretudo quando se fala em realização de coreografias e finalizações de movimentos.
“Estamos felizes hoje. Já viemos bem no primeiro, e hoje foi para cravar para o grande dia. Viemos muito bem hoje, graças a Deus. Tudo que nós planejamos, que nós ensaiamos bastante para colocar em prática aqui, deu tudo certo. Como eu sempre falo, nós somos perfeccionistas, e a gente tem duas semanas para deixar mais certo ainda. Vai ter ensaio atrás de ensaio ainda para chegar no grande dia e representar com muita garra e muita honra a comunidade do Tatuapé. Essa comunidade é merecedora, não é à toa que eles entram na Avenida e dão o sangue, dão a alma pela escola. Dá para escutar de longe a escola cantando porque todo mundo aqui tem vontade de vencer. Sem desmerecer ninguém, mas quem entra na pista é para tentar buscar o título. Ninguém entra na pista para brincar”, disse o mestre-sala.
“Foi muito bom. É isso que o Diego falou, a gente veio muito bem no primeiro. O segundo já deu para gente completar o que a gente achou que faltou no primeiro, e daqui para frente, até o dia nove, a gente irá ensaiar. Vamos buscar essa nota para nossa escola”, completou a porta-bandeira.
Harmonia
Os adjetivos para enaltecer o canto da comunidade do Tatuapé são os melhores possíveis. É uma escola avassaladora quando se trata disso. Transmitem uma energia incrível e dá para sentir uma potência nas vozes quase no nível das caixas de som no ápice da melodia, como no refrão principal “Ê baiana..”. A análise de quinta-feira dizia que a harmonia deu um espetáculo. Então, agora, dá para concluir que foi uma catarse. Excessivamente todas as alas se dedicaram do início ao fim. O trabalho dos presidentes, principalmente de Edu Sambista, que é responsável pela harmonia da escola deve ser louvado.
O presidente Eduardo Santos agradeceu a comunidade por todo o empenho da comunidade. “Hoje foi uma energia maravilhosa, todo mundo se dedicando e se entregando como sempre. Esse coletivo que a gente tem de componentes é um negócio muito sério e contagiante. É a parte mais importante da nossa escola. É o nosso maior patrimônio e eu tenho que agradecer do fundo do coração todo o carinho deles pela escola. Essas duas últimas semanas foram exaustivas. Ensaiamos na rua, quadra e Anhembi. Ontem tivemos ensaio de quadra, hoje aqui e terça novamente lá na sede. Mas vemos uma escola que vibra, canta e se empenha demais. Só tenho que agradecer a todos eles”, declarou.
Evolução
O Tatuapé se mostrou uma escola compacta neste ensaio. As alas enfileiradas se movimentavam adequadamente dentro do samba, de um lado para o outro e todos respeitavam as marcações de alegorias. Os harmonias instruíam os desfilantes a darem o máximo o tempo todo. É óbvio que todos correspondiam, pois a sinergia estava em alta.
O samba não tem coreografia e isso permitiu que a comunidade se soltasse mais entre as suas alas. Também foi analisado na última quinta que houve um certo espaçamento (não foi buraco, mas poderia virar) entre o tripé da comissão e o casal de mestre-sala e porta-bandeira. Porém, isso não foi visto mais.
Samba-enredo
Se o canto da comunidade é forte, a ala musical liderada pelo intérprete Celsinho Mody tem participação fundamental nisso. Os arranjos, os espaços dados aos apoios, vozes femininas e demais fatos, fazem com que o samba vá lá para cima. É um carro de som diferenciado. Em coletivo, pode-se dizer que é o melhor do carnaval paulistano. Vale destacar o astral que eles têm. Todos dançando entre si em uma energia renovada.
“Rolou bastante. A gente queria fazer um ajuste maior no som. Já estava bom, mas a gente conseguiria ser melhor. Aí melhoramos para esse com a ajuda de um técnico de som que nós temos que é muito bom, chamado Gustavo. Eu gostei muito, a ala musical está muito entrosada, estamos desde julho ensaiando e gravando samba. A gente está apresentando um arranjo novo na avenida, que há muito anos não trazia, que é o canto das pastoras, valorizando ainda mais as vozes das mulheres. Eu estou muito feliz com o resultado e agora é crescer ainda mais para o desfile e também contar com a mão de Deus, que joga aquela purpurina, fica tudo mágico e vamos buscar esse campeonato”, declarou o intérprete Celsinho Mody.
Outros destaques
A bateria “Qualidade Especial”, de mestre Léo Cupim, soltou bossas e apagões. Tudo realizado com êxito. O mestre Léo Cupim falou sobre o ensaio. “Creio que a gente vem mantendo uma média de ensaios. Tanto os ensaios de rua quanto os dois técnicos foram bons ensaios, tanto para a bateria quanto para a escola no geral. Creio que a gente chega forte para sexta-feira”, avaliou.
O músico contou da ansiedade que está sentindo pela estreia na avenida com a comunidade da Zona Leste. “A ansiedade é grande. O frio na barriga já vem de alguns dias, principalmente depois da virada do ano, mas eu estou confiante. A bateria está vindo em um desempenho bom de ensaios, aquilo que a gente vai conseguir trazer a nota para a escola, que é o que a gente precisa”, concluiu.
Muriel Quixaba, Janaína Prazeres, Talita Guastelli e Carmen Reis estiveram à frente da “Qualidade Especial”. Se o canto foi forte, as baianas também participaram disso, com muita alegria.
Harmonia mostra a força do samba sobre Ifá no segundo ensaio técnico do Tucuruvi
Por Lucas Sampaio e fotos de Fábio Martins
Os Acadêmicos do Tucuruvi realizaram seu segundo ensaio técnico no último domingo no Sambódromo do Anhembi em preparação para o carnaval de 2024. O samba e o coral da harmonia foram os grandes destaques do treinamento, encerrado após 58 minutos na Avenida. O Zaca será a sétima escola a desfilar no dia 10 de fevereiro pelo Grupo Especial de São Paulo com o enredo “Ifá”, assinado pelos carnavalescos Dione Leite e Yago Duarte.
Um ensaio primoroso de uma escola que acredita no poder do samba e do enredo que possuem como há muitos anos não se via. A Tucuruvi realizou na Passarela do Samba um treinamento digno da eficiência que fez a escola ser vice-campeã em 2011, mas com uma força que talvez nem o fantástico desfile sobre os migrantes nordestinos de São Paulo teve. Não é todo dia que uma escola aparenta renascer diante dos olhares de tantas pessoas, mas é emocionante ver que o tão almejado “novo Tucuruvi” parece enfim estar tomando forma.
Comissão de frente
A comissão de frente da Tucuruvi vem dividida em três atos marcados por passagens do samba. No primeiro ato, todos os personagens atuam em cima do elemento alegórico. No segundo, por volta do refrão do meio, a maioria dos atores descem do tripé e coreografam no chão. No ato final, também por volta da metade do samba, eles voltam a subir na alegoria.
Há a presença de um protagonista nessa dança que representa Exu, carregando consigo em boa parte do tempo a tigela com seu padê. Sua atuação conteve elementos que lembram muito a coreografia consagrada pelo ator Demerson D’Alvaro no desfile campeão da Grande Rio em 2022.
Mas com exceção do momento em que os demais personagens descem do tripé para atuar no chão, o que ocorre ao longo de apenas um terço da performance, é muito difícil definir com clareza, da visão que a imprensa tem da pista, como a interação entre todos os personagens ocorrem em cima da alegoria da Tucuruvi. A altura em que ela fica claramente permite uma excelente visão da parte do público das arquibancadas e dos jurados da atuação que ocorre lá, mas do chão a observação fica muito comprometida pela concavidade que possui internamente no tripé.
Seria injusto tecer qualquer análise mais aprofundada da coreografia do quesito dessa forma, mas nos momentos em que os atores estiveram no chão demonstraram vigor e ousadia, com direito a movimentos muito corajosos. Aos leitores a sugestão é que se atentem para o dia do desfile oficial, pois pode estar prestes a acontecer um momento histórico no Sambódromo do Anhembi.
Mestre-sala e Porta-bandeira
Luan Caliel e Beatriz Teixeira realizaram o ensaio vestidos com as fantasias do carnaval anterior, o que permitiu ao casal ter uma experiência mais próxima daquela que enfrentarão no desfile oficial. A dupla teve um bom desempenho por todos os módulos em que foram observados, cravando os movimentos com leveza e tranquilidade.
Ao analisar o desempenho de ambos no ensaio, Beatriz e Luan falaram da importância de treinar fantasiados, além das orientações que receberam para evoluírem a dança praticada em relação ao treinamento geral anterior.
“Hoje foi ótimo para a gente fazer outro teste. Um teste com peso, peso de verdade de fantasia, é outra realidade. A gente ensaia aqui no Anhembi e vem com o saiote, mas mesmo assim é outra coisa. Não adianta a gente fazer um ensaio específico com a escola de samba para ver como que é no dia e não ensaiar com a fantasia em si. Não sentir o peso, que é completamente diferente. A gente já conseguiu ajustar mais coisas, ter uma visão mais geral de como vai ser o dia completamente. Mesmo com chuva, com tudo, essa é a nossa realidade. Para mim aqui hoje foi o nosso ensaio, ensaio geral, geral de verdade, que a gente pode sentir a escola, sentir como vai ser no dia literalmente. Para mim hoje foi um grande desfile. Algumas coisinhas que aconteceram durante a Avenida, mas para mim foi uma realização e eu espero que seja tranquilo desse jeito para a Avenida. Sair de ponta a ponta sorrindo, estou até sem dente, sem voz, já estou sem tudo. Mas para mim nota dez, graças a Deus”, declarou a porta-bandeira.
“Falar um pouco sobre o peso primeiro. Dançar com fantasia muda muita coisa. Dá para sentir mesmo o dia do desfile, que é uma fantasia do ano passado, então tem uma dimensão do que vai ser. No ensaio passado a Dani, que ajuda muito a nós e que é uma visão de fora, ela apontou alguns pontos principalmente na parte de finalizações, deixar um pouco mais lentas. Hoje deu para sentir isso, e acho que nós viemos arrumar isso. Começar a coreografia um pouco mais lentos, detalhar mais, sempre nos refrões. Sempre pontuar nessas frases, os braços, que eu acho que fica muito evidente que nós estamos dançando em cima do samba quando faz esses apontamentos. Eu acho que deu para acertar isso. No último ensaio foi muito bom, porém teve um pouquinho desses deslizes, eu posso falar, foi bem imperceptível. Hoje nós viemos para acertar, e eu acho que acertamos. Se Deus quiser, vamos fazer um lindo trabalho aí na Avenida”, explicou o mestre-sala.
Harmonia
O grande destaque do ensaio do Zaca. Há alguns anos que através de declarações de diferentes representantes é dito que a escola está passando por um processo de encontrar “um novo Tucuruvi”, e ao que parece o caminho para isso foi encontrado. Ter um samba forte e de qualidade em mãos atrelado a um enredo que une a comunidade faz toda a diferença, e como diz a letra da obra assinada pelo consagrado mestre Macaco Branco, da Unidos de Vila Isabel e que participou do ensaio, no Ilê da Cantareira há um povo feliz.
O samba do Tucuruvi foi clamado com intensidade ao longo de todo o ensaio. Destaque especial para a ala “Ikin”, logo no começo da escola, que tinha componentes cantando delirantemente a obra do Zaca sem parar. O diretor de carnaval Rodrigo Delduque falou a respeito da influência do enredo no resultado do ensaio e exaltou o trabalho da diretora de harmonia da escola.
“Para falar de Exu e de Ifá não tem como a energia ser diferente. Quando voltamos para casa reunimos todo mundo, conversamos e passamos o que queremos. A escola vem, cada vez mais, adquirindo nosso sistema de desfile na condução da Fabiana (Lopes), que é uma excelente diretora de harmonia e uma pessoa maravilhosa. Não tenho como descrever o ser humano que ela é. A parte profissional dela é sensacional, é o que você viu na pista. Tenho certeza de que, no desfile, vamos apresentar algo muito melhor que isso aí, com as nossas fantasias que estão nos esperando”, disse.
Evolução
Outro quesito seguro da Tucuruvi no ensaio. A escola evoluiu de forma fluída durante toda a passagem pelo Anhembi, não sendo observadas aberturas ao longo dos módulos em que foram observados. A escola veio bem compacta e organizada, realizando o recuo da bateria com exatidão e cuidado.
Rodrigo Delduque falou da importância de entender as regras do jogo para garantir a boa fluidez do Zaca ao longo do treinamento.
“Ajuste é ajuste. A cada ensaio, desfile e ano que passa, a gente vem procurando se adaptar cada vez mais ao regulamento e aos critérios. Nós optamos, no último ensaio, por ajustar mais a escola, um sentir a energia do outro, um puxar o outro. Dessa vez, compactamos mais a escola. Visualmente falando, deu certo”, afirmou o diretor.
Samba-enredo
Certamente um dos sambas que mais cresceu ao longo da temporada de ensaios técnicos. Não bastasse ser uma obra das melhores que já passaram pelo Anhembi nos últimos anos, o quesito está a cargo de uma ala musical recheada de talentos e liderada pelo intérprete Hudson Luiz, que esteve em mais uma noite inspirada. Os momentos em que o canto foi entregue para a comunidade foram cuidadosamente escolhidos, voltando de maneira cravada para os cantores de maneira fantástica.
Hudson fez uma análise geral do desempenho na escola no ensaio e demonstrou otimismo em relação às pretensões do Tucuruvi para o carnaval de 2024.
“Eu pude conversar um pouco com a harmonia antes de começar o nosso ensaio. A harmonia estava reunida, eu pude dar umas palavras com a licença da nossa diretora de harmonia, Fabiana. Eu pude, na concentração, me encontrar com vários componentes e poder passar uma energia positiva para eles, e eu acho que foi um ensaio sensacional. Eu sempre dizia para os componentes: ‘vamos acreditar que o que a gente quer está ali na frente’. A nossa alegria é o que transborda no nosso carnaval, e a Tucuruvi acho que pôde mostrar isso hoje. Fomos superiores do que no primeiro ensaio, e eu acho que isso deixa um pouquinho do que a Tucuruvi pode apresentar, do que a Tucuruvi quer para o carnaval. A gente não aceita no nosso eu um resultado menor que o campeonato. Isso não é só sonho para a gente, já passa a ser uma realidade porque a gente acredita nisso, e quando a gente acredita nisso, isso se torna uma realidade. Acho que a Tucuruvi se superou, e eu tenho certeza de que muita gente vai sair do Anhembi e vai dizer que é uma nova Tucuruvi, uma Tucuruvi diferente, irreconhecível para o lado positivo. Eu estou muito feliz com o resultado na escola inteira. Acho que não posso nem citar setores, acho que a escola inteira. Estou muito feliz de verdade e espero que seja melhor ainda no desfile”, declarou.
Nos dois ensaios que o Tucuruvi realizou na temporada, tanto na concentração quanto na dispersão, Hudson Luiz foi observado em um momento pessoal de orações. O intérprete falou sobre a importância da fé em sua preparação.
“Na minha vida Deus esteve sempre à frente de tudo que eu fiz. Se eu não acreditasse em Deus, não chegaria até aqui. Eu acho que acima de grandes talentos, existe a nossa fé. Como já disse, a fé move montanhas e sem Deus eu não seria ninguém. Antes de começar eu sempre agradeço por ter chegado até aqui e peço que me proteja, e ao término, independente de qual seja o meu resultado, eu agradeço porque eu acredito que tudo que aconteceu foi preparado por Ele. Sem a minha fé eu não iria a lugar nenhum. Eu só estou hoje aqui porque Deus me permitiu”, disse.
Por fim, Hudson deixou uma mensagem de motivação para a comunidade dos Acadêmicos do Tucuruvi que aguarda ansiosamente para desfilar no sábado de carnaval no Sambódromo do Anhembi.
“Comunidade, acredita. Acredita porque a Tucuruvi vai fazer o maior carnaval da sua história. Acredita dentro de nós. Acredita. Acredita. Acredite no nosso coração. Acredite na nossa fé, que assim nós chegaremos ao resultado que nós queremos que é a nossa estrela tão sonhada”, concluiu.
Outros destaques
Liderada pelo mestre Serginho, a “Bateria do Zaca” teve papel fundamental para o desempenho brilhante da Tucuruvi em seu último ensaio técnico. Bossas contagiantes em momentos-chave como no desfecho da segunda do samba, apagões perfeitamente encaixados e retornando com maestria. Influência da presença do colega carioca Macaco Branco, mestre da “Swingueira de Noel”? Só os Deuses do samba podem afirmar. Serginho fez uma análise da evolução do desempenho da bateria em relação ao ensaio anterior.
“Chego em casa, assisto tudo para ver como foi. No primeiro ensaio, na bateria, a gente veio bem. No segundo, fizemos alguns ajustes, colocamos o atabaque na frente para não ficar tumultuando. Antes eles executavam e metiam marcha. Toque de atabaque, agogô, com tudo isso envolvido em um sambaço tem que dar certo. Foram muitas noites sem dormir, a direção de bateria briga todo dia, mas quando a gente chega aqui é isso aí. Não sei como foi a escola, mas, em relação à ala musical e bateria está funcionando. Acho que evoluímos com o tempo”
Questionado sobre a influência da bateria para a aclamação do samba diante da opinião pública, o mestre falou sobre as escolhas que foram feitas para se chegar a tal resultado.
“Como foi pensado tudo junto, como foi um processo, com esquema de eliminatória, tínhamos uma coisa em mente. Encontramos esse samba, sentamos eu e o Rodrigo para escolhermos esse samba e fomos encaixando. Antes, o projeto de bateria era mais simples, não tinha tanta coisa assim, mas eu percebi que não poderia perder uma oportunidade dessa, com tantas deixas que o samba dá. ‘Respeite a minha ancestralidade’, ‘tolere a diferença na raiz’, aí é punho cerrado, sinal de resistência. Colocamos repique, atabaque, e quando apresentamos para o nosso produtor ele adorou. Fizemos os arranjos e tudo cresce. O samba é bom pra caramba, ele cresce com os arranjos e não é uma canção pesada. É tudo no seu lugar certinho e foi isso que fez o samba crescer. O samba é bom, tem a bateria que soma e fica tudo lá. É ótimo”, explicou.