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Líderes religiosos desfilam no abre-alas da Alegria da Zona Sul e clamam pelo fim da intolerância religiosa

Por Gabriel Leal

Sob forte chuva, a Alegria da Zona Sul levou para avenida o enredo “Saravá, Umbanda” nesta sexta-feira de carnaval, sendo a segunda escola a escola a desfilar. Na missão de exaltar a única religião fundada no Brasil, a Alegria convidou líderes religiosos e praticantes não só da Umbanda, como também do Candomblé, para integrar o desfile em seus carros, alas e composições.

Abre ala ZSCom uma abertura abençoada pela linhagem dos Pretos Velhos, a escola trouxe em seu abre-alas a simplicidade e o aconchego de um “Congá”, uma casa de Umbanda, o popular terreiro. Uma grande escultura de um preto velho e esculturas de jarros de porcelana davam o tom do Congá azul e branco do carro. A escola embarcou na proposta como manda o figurino, trazendo os componentes de pés descalços e trajando a cor oficial da religião: o branco.

Por conta da opção estética de recriar uma casa de Umbanda, o carro abre-alas apresentava uma grande área baixa, na qual os componentes desfilaram livres para evoluir na alegoria. Um dos convidados para correr a gira da Alegria da Zona Sul foi o Pai de Santo Marcelo do Caboclo Tanaju, dirigente de um terreiro de Umbanda em Realengo. Ele convidou todos os filhos de santo de seu centro, que o acompanharam no desfile.

Tanaju ZS“É uma festa grande. Somos uma família, nada mais justo do que a gente comemorar junto. Eu acho muito importante você ter, hoje, o sincretismo da nossa religião sendo representado na própria avenida. Trabalhamos por este reconhecimento há anos. Não temos que ter briga, ter preconceito, temos que nos unir e formar uma comunhão só. Porque sofremos uma discriminação constante nas ruas, e isso tem que acabar”, protestou o líder religioso estreante na Sapucaí.

Banhadas na ancestralidade, baianas da Alegria da Zona Sul salvam Vovó Maria Conga em fantasia leve

Por Gabriel Leal

Baianas Alegria ZSSegunda escola a desfilar na sexta-feira de carnaval, a Alegria da Zona Sul levou para avenida o enredo “Saravá, Umbanda”. Uma homenagem à religião brasileira fundada no século 19 que contou com três alegorias e 17 alas. Banhada na ancestralidade da temática, a escola trouxe em sua abertura uma ala das baianas comovida pelo tema e satisfeita com a representação da fantasia dentro do enredo.

Conforme a tradição do mundo do samba, a figura das baianas reverencia as mães de santo, as mães do samba, figuras femininas fundamentais no nascimento do samba carioca, elementos que personificam os ideais de sabedoria e aconchego. Para contar a história da Umbanda, a Alegria da Zona Sul optou por incorporar estes ideais juntamente com uma homenagem à linhagem dos Pretos Velhos, na figura da entidade: “Vovó Maria Conga”.

A ala das baianas geralmente conta com número expressivo de mulheres adeptas da Umbanda e do Candomblé. Em 2019, este fator foi fundamental para o brilho das mães do samba na avenida que trajaram uma armação de bambu e tecidos leves, aliados a um adereço na cabeça, sem enfeite na mão. No entanto, mais que a plástica do figurino em si, a força do significado da fantasia foi o toque especial que fez o coração do componente bater mais forte, como foi o caso da baiana Edinalva Ferreira, que descreveu o sentimento de pisar na avenida defendendo as religiões de matriz africana.

“Mexe muito comigo, tenho uma Preta Velha que caminha junto com Vovó. São amigas! Fico feliz! Maria Conga é uma negra africana que veio num navio negreiro. Vamos abraçar Maria Conga. Salve Vovó!”, comemorou a componente.

Nem a chuva que já caía fraca no momento de armação da escola, por volta das 22h45 da noite de sexta, foi capaz de apagar a garra do componente. “Eu sou sambista acima de qualquer coisa. Torço muito pela minha Mocidade. Iansã mandou essa chuva para lavar, para tirar tudo de ruim, para renovar as energias. A chuva só deu mais vontade de desfilar. Sangue nos olhos”, comentou a baiana Adriana Paixão dos Reis, de 50 anos, moradora de Bangu e também baiana da Acadêmicos do Sossego – mais uma escola a levar para avenida um enredo ligado à religiosidade.

Para além da identificação dos componentes com a temática, o enredo “Saravá, Umbanda” levantou discussões acerca do cenário de intolerância religiosa, segundo os desfilantes. Grande parte dos componentes acredita que iniciativas como esta ajudam na discussão desta problemática para os não conhecedores das religiões de matrizes africanas.

“É uma homenagem. O enredo ajuda aos preconceituosos refletirem sobre o assunto. Quem faz a religião somos nós. Quando a escola fala isso, ela está levantando a nossa bandeira, a bandeira da Umbanda e do Candomblé”, finalizou dona Edinalva, candomblecista há 41 anos.

Último carro da Ponte homenageia mãe Stella de Oxóssi

Por Lucas Lunus

A Unidos da Ponte encerrou o seu desfile prestando uma homenagem a uma das mais importantes mães de terreiro do Brasil: a Ialorixá, Mãe Stella de Oxóssi, que comandava na Bahia o Ilê Axé Opó Afonjá, terreiro de candomblé fundado em 1910 por Eugênia Ana dos Santos e Tio Joaquim, no bairro de Cabula em Salvador.

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Famosa por ser a primeira Ialorixá a escrever livros sobre a religião, Mãe Stella foi eleita por unanimidade para a Academia de Letras da Bahia além de ter conseguido que o terreiro Ilê Axé Opó Afonjá fosse tombado pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan).

No desfile, a homenagem ficou muito clara na última alegoria da escola que trazia a velha guarda e representava um terreiro, com paredes brancas destacadas em iluminação azul, com um chafariz e os diversos orixás em cima do carro alegórico.

Mãe Stella morreu em dezembro de 2018 aos 93 anos depois de 42 no comando do famoso terreiro da Bahia. A homenagem à líder religiosa causou comoção em uma das componentes da alegoria que fez sua estreia pela escola.

“Fico muito orgulhosa, porque é uma representação das religiões de matriz africana, nossa cor, toda a nossa luta e também pela intolerância que muitas vezes a gente sofre. Fico emocionada por estar aqui e pela escola trazer uma guerreira como a Mãe Stella de Oxóssi” conta Luana Ferreira.

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Outro integrante da alegoria, Djalma Santos, da velha guarda da escola, que desfila na ala há 12 anos, não escondeu a alegria de fazer parte da homenagem a mãe Stella no retorno da Unidos da Ponte à Sapucaí.

“Depois de muito tempo fora da Marquês de Sapucaí, trazer um carro desses, com uma homenagem dessas, dá uma energia muito grande para os componentes novos que estão chegando e pro pessoal que está retornando agora. E, esse carro dá uma leveza muito grande para esse desfile debaixo dessa chuva toda. É sempre uma responsabilidade muito grande pela Mãe Stella, que representa uma religião tão marginalizada pela sociedade, e também é uma responsabilidade pela própria Ponte, pois o campeonato de uma escola, qualquer uma que seja, é uma responsabilidade muito grande por mostrar a garra de um povo sofrido e de uma comunidade”

Colorado do Brás apresenta conjunto visual simples e tem no samba trunfo para lutar por seguir no Especial

Por Guilherme Ayupp. Fotos: Magaiver Fernandes

Colorado Desfile2019 2A Colorado do Brás foi a primeira escola a desfilar na noite de abertura dos desfiles do Grupo Especial em São Paulo. A vermelha e branca apostou em um conjunto de fantasias modesto com materiais bastante simples para uma escola da elite do carnaval, embora não pisasse no grupo desde 1993. De positivo o conjunto alegórico e o samba-enredo, aspectos que podem ajudar a escola a lutar pela sonhada permanência. A Colorado conclui seu desfile em 62 minutos e apresentou o enredo ‘Hakuna Matata – Isso é viver’.

Comissão de Frente

Colorado Desfile2019 29A proposta da comissão de frente foi mostrar a ligação entre o homem e o mundo espiritual, onde nada pode acorrentar o espírito livre e só a fé conforta e nos livra das algemas. Formado por um grande xirê, as fantasias foram inspiradas em orixás que bailavam e davam força para o escravo, que mesmo com sua dor não se deixava, através da sua fé, enfraquecer o espírito. As fantasias dos orixás se basearam em uma proposta lúdica, que criava um figurino livre sem a necessidade de seguir indumentárias dos cultos religiosos. Exú, Oxalá, Oxóssi, Logun Edé, Xangô, Obá, Oxum, Oxumaré, Ogum, Iansã, Nanã, Omulu, Iemanjá e Ossain foram os orixás representados na comissão da Colorado.

A apresentação contou com uma coreografia simplificada, porém sem erros nas duas primeiras torres de julgamento. Os bailarinos tinhas costeiros volumosos e os movimentos se deram de uma forma bastante sincronizada. A jurada da primeira torre de julgamento acompanhou com bastante atenção a atuação dos bailarinos, observando possivelmente a pasta de defesa do quesito. Os integrantes tinham maquiagens no rosto nas cores do figurino apresentado.

Mestre-Sala e Porta-Bandeira

Colorado Desfile2019 39O primeiro casal da Colorado se apresentou com a indumentária intitulada ‘O Nascimento do Continente’. A fantasia representava o símbolo de força e sabedoria africana, tendo em sua composição a grande mãe África. A roupa trouxe elementos do nascimento do povo africano dentro da proposta de cores e mistura de cultura do povo africano. A fantasia da porta-bandeira teve a intenção de mostrar a riqueza de formas do continente e gerar a vida, como uma verdadeira mãe, carregando nas suas costas um bebê cênico que criava um elo da maternidade e amor entre a África e seu grande fruto: a vida. O mestre-sala, com sua fantasia inspirada em tribos, seguia o poder de proteger este amor entre a mãe e seu filho, tendo papel patriarcal com o fruto carregado nas costas da mãe África. Assim como os guerreiros africanos que defendem sua cultura, o dançarino defendeu a cultura carregada no continente representado pela porta-bandeira.

Ruhanan Pontes e Ana Paula apresentaram-se de maneira correta nas duas primeiras torres de julgamento do quesito. O destaque sem dúvida foi o belo jogo de cores da indumentária da dupla. A saia possuía plumas nas cores verde, laranja e roxo. E Ruhanan também possuía muitas plumas em tons que combinavam com a de sua parceira.

Harmonia

Colorado Desfile2019 60A harmonia teve uma atuação irregular na apresentação da Colorado do Brás. As alas do primeiro setor do desfile praticamente não cantaram o samba-enredo, o que melhorou nas alas intermediárias. Antes do final do desfile novamente foi possível detectar com facilidade componentes em alas que não cantavam. Por fim a ala final, com camisas de apoio, cantou bastante o samba-enredo da escola encerrando bem o desfile.

Enredo

Colorado Desfile2019 67No carnaval 2019, a Colorado do Brás decidiu brincar com a música ‘Jambo Bwana’, do grupo queniano Boney M. que, que lançou para o mundo em 1983 a expressão “Hakuna Matata”, representando “sem problemas”, “seja livre” e “seja feliz”. A música tinha como objetivo atrair turistas para o país que acabara de se libertar de uma ditadura.

A Colorado teve bastante dificuldade de realizar bem sua proposta na avenida. Embora os carros e fantasias tenham tido um bom aspecto visual, a leitura do enredo ficou bastante dificultado devido à complexidade do tema, que acabou não se comprovando na avenida, através do conjunto plástico apresentado.

Evolução

Colorado Desfile2019 79O quesito deve causar algumas perdas de décimos na escola. Ao entrar no primeiro recuo de bateria, abriu-se um buraco entre os ritmistas e a ala que vinha posteriormente. Outro aspecto que pode acarretar na perda de pontos é o fato de praticamente todas as alas terem passado pela avenida andando, ao contrário de evoluírem com destreza e espontaneidade.

Samba-Enredo

Colorado Desfile2019 96O samba-enredo da Colorado iniciou sua apresentação no Anhembi cativando bastante o público presente nas arquibancadas, frisas e até camarotes. A obra se mostrou ser bastante popular em sua comunicação com o público no Sambódromo. Ao longo da apresentação seguiu-se um bom padrão de desempenho do samba, sob a competente condução do intérprete Chitão Martins e da bateria. Ao final do desfile as arquibancadas dos últimos setores cantavam e aplaudiam o samba.

Fantasias

Colorado Desfile2019 88O conjunto apresentou-se com materiais simples, porém não haviam alas mal acabadas. Duas se destacaram perante as demais. A ala de baianas, com uma belíssima indumentária, com direito a tons de tecidos diferentes entre as senhoras. Outra ala que causou bastante impacto na avenida veio no último setor da escola, totalmente verde, com folhas sintéticas. A maioria das alas apostou em tecidos sublimados, dando um efeito de estamparia diferenciado.

Alegorias

Colorado Desfile2019 72Os destaques do abre-alas na parte superior na frente da alegoria se apresentaram pouco carnavalizados. O abre-alas era acoplado e vermelho e preto. Foi o mais imponente do conjunto, como era de se esperar. O material de cesto de palha na segunda alegoria pintado deu efeito bonito na avenida. Assim como as fantasias, os carros se apresentaram com materiais simples mas sem falhas de acabamento. A alegoria da aranha causou impacto na avenida, embora materiais de acabamento simples. O única a apresentar falhas de acabamento foi o quarto carro, apesar de bastante bonito e imponente

Bateria

Colorado Desfile2019 53A bateria da Colorado ajudou a impulsionar os melhores momentos de canto da escola, com duas paradinhas em destaque. A primeira quando a letra do samba exaltava o orixá Xangô. A segunda foi um dos pontos altos do desfile, quando o samba falava em ‘canção e sentimento’ um paradão obrigava a escola cantar.

Outros Destaques

Colorado Desfile2019 9Antes do desfile iniciar a Liga SP e a Prefeitura de São Paulo prestaram uma homenagem muito bonita ao Mestre Sabu, o locutor da avenida durante 28 anos. Uma placa foi entregue à esposa dele, que morreu na semana do carnaval. Durante o desfile a ala de baianas emocionou com uma fantasia muito bonita. A indesejada chuva acabou afetando o desfile da escola. Com meia-hora de apresentação a água começou a incomodar e atingiu seu ponto de maior força aos 48 minutos, mas no final perdeu força.

Ponte 2019: Galeria de fotos do desfile

Galeria de Fotos do desfile da Colorado do Brás no Carnaval 2019

Debaixo de chuva, baianas da Unidos da Ponte se orgulham de representar mães de terreiro em desfile

Por Lucas Santos

Ponte desfile2019 11Primeira escola a desfilar, com a reedição do enredo “Oferendas”, de 1984 – que faz reverência aos ritos feitos para cada orixá nas religiões africanas – a Unidos da Ponte trouxe logo no início do desfile as grandes sacerdotisas que chefiam os terreiros de Candomblé “queto”. A ala das baianas foi responsável pela justa homenagem às Ialorixás, líderes e responsáveis pelas principais decisões dentro dos terreiros por meio da consulta aos búzios.

Vestidas de branco, com uma roupa bem tradicional e simbólica, as baianas desfilaram com bordados prateados na saia, esplendor e penas também prateadas. Outro detalhe que chamou a atenção foi uma pomba prateada que se destacava na parte frontal da saia da fantasia.

Uma das mais antigas na agremiação, dona Regina Antunes, que desfila há 36 anos na Ponte e há 18 só na ala das baianas, se disse orgulhosa pela escola representar um enredo que homenageie as religiões de matriz africana.

“A escola vem trazendo todos os orixás: começo, meio e fim, além de trazer um Xirê (dança ou roda utilizada no candomblé para invocação dos orixás) completo. Hoje em dia, a nossa religião, muitas vezes, não é tão aceita, mas nós mostramos na avenida, com toda garra, o porquê de ela existir: a arte africana, os negros, os orixás. E a ala das baianas representa as Ialorixás”, disse.

Elenice Francisca, que marcou presença na ala das baianas pelo terceiro ano, fala sobre a forte chuva que atingiu a Sapucaí no início do desfile da Unidos da Ponte. Ela, que desfilou pela primeira vez debaixo de chuva acredita que, apesar de desafiadora, a chuva possa ser um sinal dos céus de aprovação ao desfile.

“Este ano, a roupa das baianas está representando os orixás, a relação das mães de santo com os orixás, as Ialorixás, que são as guias dos terreiros. Só a chuva que está atrapalhando, mas é bom. Tudo que Deus manda está bom! É muita emoção! E representa uma grande responsabilidade ao mesmo tempo”, afirmou.

Ponte desfile2019 15Já dona Nereide Alves, uma das mais antigas da ala das baianas, com 38 anos defendendo o estandarte da agremiação, confessa que não entende muito sobre o Candomblé, mas se diz muito feliz com a escolha do enredo.

“Além ala das baianas representa as Ialorixás, as mães de santo e está dentro do enredo que vem falando sobre as oferendas. Estou muito feliz. O enredo fala de respeito. Eu não entendo muito porque eu não faço parte do Candomblé, mas estou muito feliz de desfilar na escola e por ela respeitar as religiões de matriz africana”, comemorou.