Um evento recheado de emoção, com pavilhões consagrados, aconteceu na Fábrica do Samba. Vai-Vai, Camisa Verde e Branco, Nenê de Vila Matilde e Unidos do Peruche, juntas, fizeram uma grande festa com um leque de sambas-enredo. Todas estas escolas são resistência do carnaval paulistano. As velha-guarda, com exceção da Águia da Zona Leste, aqueceram a festa e cantaram sambas históricos, principalmente, os de roda, que costumavam fazer na época.

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Fotos: Fábio Morais e Gustavo Lima/CARNAVAESCO

Os sambistas da época sofreram todo o preconceito da cultura do carnaval. Eram marginalizados, mas resistiram. Nomes como mestre Tadeu e Fernando Penteado no Vai-Vai ainda estão ativos na agremiação. Dentro do Peruche, Seo Carlão é um ícone e será enredo no Carnaval 2025. Já no Camisa Verde e Branco, pessoas como Carlos Alberto Tobias e Zulu, residem na memória dos sambistas. Por fim, o saudoso Seo Nenê, tão importante para a cultura do samba, também está na memória. Essas são poucas das grandes personalidades das gigantes agremiações fundadas entre os anos 1930 e 1950.

Para tanto, um festival de samba-enredo foi preparado pelo Vai-Vai após a apresentação das fantasias. As baterias das quatro escolas se posicionaram cada uma em um canto do palco e os intérpretes se revezavam cantando sambas-enredo históricos, especialmente dos anos 70, 80 e 90. Todos os cantores oficiais estiveram presentes: Luiz Felipe (Vai-Vai), Igor Vianna (Camisa Verde e Branco), Agnaldo Amaral (Nenê de Vila Matilde) e Renan Bier (Peruche).

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É tradição e o samba continua

Presidente do Vai-Vai, Clarício Gonçalves se diz feliz em ter todas estas entidades juntas em um evento. O gestor ainda pondera que, mesmo com as dificuldades que todas vêm enfrentando, seria gratificante tê-las no Grupo Especial, pois são pavilhões que nunca deveriam ter saído do mais alto patamar. “Eu acho que isso é mais gratificante para mim, porque era um sonho de reunir essas escolas para um evento. Eu queria fazer um evento aberto onde a gente sentisse realmente a parceria, e aqui infelizmente o chão é meio abafado, mas conseguimos reunir essas raízes do carnaval, não menosprezando as coirmãs. Mas seria interessante se nós tivéssemos todas essas agremiações no Grupo Especial. Não que a disputa não seja saudável com as outras coirmãs, mas é interessante essa coisa raiz. Quem viveu lá atrás é uma emoção diferente pelas condições de cada uma, que é um sofrimento tanto para mim quanto para eles para tentar colocar a entidade deles em lugar que não deveria ter saído”, afirmou.

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Antigamente havia relatos de forte rivalidade entre as escolas, mas Clarício afirmou que isso só existe dentro da pista. “A rivalidade, como é o discurso de todos os presidentes, só existe quando se passa a linha amarela. Fora disso, todas são irmãs”, disse.

O carnavalesco Sidnei França preza muito pela história do carnaval paulistano. Desde sempre foi um estudioso da história. O artista deu um longo depoimento, exaltando a força das matriarcas do samba, que segundo o próprio tem muito a ensinar às escolas novatas. O profissional também citou a Lavapés, agremiação dos anos 30 fundada por Deolinda Madre, nome dado à Fábrica do Samba. “Quando decidimos fazer o evento, ficamos pensando quais atrações poderiam vir. Juntou a necessidade de ter uma atração para uma festa importante para, com a necessidade também de reunir essas quatro matriarcas carnaval de São Paulo. Aliás, eu preciso dizer que sinto muito da Lavapés não estar, porque é uma escola que eu também tenho muito respeito, mas eu tenho certeza que ela também vai galgar seu caminho e retomar estrutura. É uma festa que o Vai-Vai promove, convida as coirmãs, no intuito de criar mais ainda o encontro, sinergia, o entendimento das tradicionais como guardiãs da tradição, como escolas que têm fundamentos muito densos. São escolas que têm um lastro histórico que também tem muito a ensinar para o carnaval atual, porque hoje ele é muito tomado por escolas novatas e elas obviamente vão muito bem na pista, desenvolvem o desfile de uma forma magistral em todos os quesitos. Mas eu acho que a tradição nunca pode ser deixada de lado. A gente não pode pensar que uma escola nova pise no sambódromo sem entender os fundamentos, sem pedir licença para Exú. É muito sério a se discutir e hoje acho que essa manutenção da tradição é muito importante para estabelecer a perpetuação da força do carnaval de São Paulo”, declarou.

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Estou falando de você…

O presidente Mantega, da Nenê de Vila Matilde, falou do prazer de fazer parte do evento e relembrou os títulos das agremiações para exaltar a grandiosidade das entidades. “É um prazer enorme estarmos aqui, pois é uma festa grandiosa e pesada. Nenê, Vai-Vai, Camisa e Peruche. É a tradição do carnaval de São Paulo. Realmente Nenê e Vai-Vai tem o maior número de títulos, têm um peso grande. Camisa também, são nove títulos, ainda mais o Peruche… Se for contar a história só de títulos tem carnaval que não acaba mais”, destacou.

O gestor contou da amizade que as escolas vivem entre si. “Nossa relação é muito boa, tanto Vai-Vai, Camisa e Peruche. São só amigos, não só dos dirigentes, mas da comunidade também. Temos uma relação boa com todos da comunidade. Sempre frequentei Vai-Vai, Camisa e Peruche, como sambista, como amigos que temos em todas as escolas e a relação é muito boa. Hoje é bacana encontrar todos”, comentou.

nene mantega

O mandatário, que comanda a Águia da zona leste desde a década passada, relembrou histórias que viveu com estes pavilhões na sua vida de sambista e, assim como disse Clarício Gonçalves, a rivalidade só fica na passarela. “O que temos são só histórias boas. Estamos aqui eu como presidente, sambista, componente de harmonia de escola de samba que é a minha origem, a minha essência. Já pulei na pista para ajudar o Peruche uma vez que eles tiveram um problema com o carro alegórico, o Vai-Vai, o Camisa, temos uma relação muito boa. Graças a Deus são amigos, em todos os lugares que nós vamos. O Camisa, a barraca do coquinho que íamos, coisa de mil anos atrás. Era a rua do samba… Toda a diretoria do Vai-Vai aí são parceiros, somos amigos há uns três ou quatro anos. Aqui no samba não tem rivalidade. Somente na faixa amarela é uma querendo superar a outra. Querendo ser melhor, mas sem querer que a outra seja pior. É alegria, samba e confraternização em todos os momentos”, completou.

Sagrado manto

O presidente da Unidos do Peruche, Alessandro Zóio contou que a festa foi o início de um projeto que provavelmente vai acontecer mais vezes em eventos das outras escolas. ”Arrepia só de entrar e saber que tem as quatro matriarcas do samba. As outras coirmãs também tem o nosso respeito, o Peruche, Camisa e Nenê, fazem a diferença. É uma festa que precisa acontecer mais vezes. É um projeto que a gente está aqui, vai passar pelas outras entidades. Vai acontecer no Peruche e acho que vai acontecer também no Nenê e no Camisa”, revelou.

zoio peruche

Zóio disse que são escolas que ajudam a Filial do Samba. Os presidentes das agremiações ligam constantemente para saber da situação de carnaval, e que pode contar com a ajuda. “Além de ter o respeito que é gigante, são escolas que desde quando eu assumi a nossa gestão em 2019, são as três escolas que ajudam o Peruche. Entenderam a necessidade e eu conto com a ajuda delas todo ano. Eu colho material e corpo humano também. O próprio Mantega, o Clarício e a Érica, sempre estão entrando em contato perguntando como estão as coisas, falando que pode contar com eles”, comentou.

O gestor falou das relações de sambista que teve com as escolas. De acordo com Alessandro, frequentava ensaios de todas as coirmãs e tinha um tio presidente da velha-guarda, especialmente no Camisa Verde e Branco para ver o seu tio presidente da velha-guarda. “Eu sou frequentador de ensaios. Antigamente acabava o Peruche e eu ia para o Camisa. Meu tio Bolão, que é o presidente da velha guarda no Camisa, eu ia lá para ver. O Vai-Vai quando eu ia na Bela Vista era aquela emoção total. Eu frequentava mesmo a zona leste, até pela distância, sou da Casa Verde. Mas sempre que tive essa oportunidade, sempre estava também no terreiro da Nenê. Novamente, respeito todas as coirmãs, mas essas quatros fizeram o samba de São Paulo”, finalizou.