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Portela apresenta diferente identidade estética, faz desfile pautado pela emoção, mas acabamento de alegorias e fantasias pode atrapalhar os planos da escola

Por Lucas Santos e fotos de Nelson Malfacini

Depois de um desfile do centenário em 2023 para esquecer, a Portela reformulou sua equipe artística apostou nos jovens carnavalescos André Rodrigues e Antônio Gonzaga. O movimento gerou uma Portela com uma identidade visual diferente dos últimos anos, com uma proposta de enredo pautado na emoção, no afeto, e apresentando a africanidade e ancestralidade tão bem casado com a essência da Portela. O afeto deram ao enredo uma história muito tocante que chegou até o público, e a evolução, tão problemática no carnaval passado, desta vez foi um alívio para o portelense, ainda que no início na dispersão, a escola tenha corrido um pouco para colocar bem os carros na Avenida. Outros quesitos como casal e comissão de frente passaram bem, e o samba teve um rendimento satisfatório na boca dos componentes. Segunda escola a se apresentar na última noite de desfiles do Grupo Especial, a Portela apresentou o enredo “Um defeito de cor” em um desfile de 1h07.

Comissão de Frente

Coreografada por Léo Senna e Kelly Siqueira, a comissão “Sagrado Feminino Ensinamento” representou o afeto, o respeito à ancestralidade, o sagrado feminino como importantes pilares da Portela. E sob suas asas, a Comissão de frente teve como missão realizar o maior sonho do narrador deste desfile Luiz Gama contar a história de sua mãe e promover o tão esperado reencontro. O elemento alegórico foi inspirado em uma escultura africana chamada “O Círculo da Vida”, e continha grandes imagens de mulheres de braços dados, em um círculo, onde juntas formam um templo que guarda saberes ancestrais como o poder da criação.

Dentro desse grande abraço, as bailarinas, vestidas das essências e raízes, simbolizando as conexões ancestrais e atemporais, dançavam em cima do elemento, com muita ancestralidade, enquanto o espaço girava e permitia um interessante efeito. Depois, a personagem principal, Kehindé se destacava das demais guerreira, quando uma figura feminina representando a ancestralidade, com asas de anjo, a Grande Mãe surgia ao lado de Omuotunde/ Luis Gama, filho de Kehindé, e a exibição terminava com um grande abraço dos dois. O encontro tão esperado por este enredo surge logo na comissão que sem grandes truques apresentou muito bem a proposta do enredo, o afeto e a ancestralidade. Passou bem, sem problemas.

Mestre-sala e Porta-bandeira

Iniciando uma nova parceria para este carnaval, o primeiro casal Marlon Lamar e Squel Jorgea representavam a Saudação à Terra, através dos Orixás mais antigos que são cultuados na região do Benin. Squel representou Nanã Buruku, a orixá mais antiga, portadora de sabedoria e mistérios, aquela que viu o mundo nascer e moldou em barro os primeiros homens. Já o mestre-sala representou o pouco conhecido Sapatá, o Vodun da Terra, Rei da Lama e da Palha. Ambos são orixás assentados juntos.

A vestimenta de Squel trouxe o colorido partindo do espectro de cores do azul da Portela, passando para o roxo até tons mais cítricos como o amarelo e laranja. A de Marlon possuía esse colorido na parte de trás da fantasia enquanto o corpo do mestre-sala era tingido de branco. E toda essa representatividade religiosa foi percebida também na dança, que contou com diversos momentos em que a dança mais ancestral, mais das religiões de matriz africana, se fez presente. A dupla mostrou muito entrosamento e fizeram os movimentos bem cravados e com bastante sincronia. O único ponto a se considerar que não se transformou em um problema foi no primeiro módulo em que a bandeira encostou um pouco na cabeça da porta-bandeira. Mas, nada que tenha prejudicado a dança. Apresentação muito segura.

Harmonia

A escola cantou bastante durante o desfile. O portelense mostrou que gostou bastante da obra bastante elogiada no pré-carnaval, ainda que a expectativa por um sacode existia, o que não aconteceu. A intensidade do canto diminuiu um pouco na parte final do desfile, com alguns componentes já um pouco mais desgastados. O samba esteve sempre em uma boa cadência que facilitou o trabalho da escola, e os ensaios mostraram ser fundamentais para o resultado na Sapucaí. Ainda que as expectativas mais altas não tenham sido cumpridas, o quesito teve um rendimento satisfatório para conseguir a nota.

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O desempenho de Gilsinho mais uma vez foi o esperado, dessa vez, com um samba muito bom, o cantor esteve livre para brilhar, fazer seus chamados e contou com boa resposta do público. A voz do cantor sempre se sobressaia aos apoios, mas teve uma boa ajuda e o trabalho harmônico do carro de som casou bem com o que o samba pedia.

Enredo

O desfile teve como inspiração “Um Defeito de Cor”, nome de um romance escrito por Ana Maria Gonçalves e que se trata de uma obra ficcional que concebe uma história para Luísa Mahin, mulher guerreira que povoa o imaginário de luta do Movimento Negro brasileiro como símbolo de força e resistência. No primeiro setor, a Portela trouxe a Kehindé, com as mulheres de sua família primordial; sua mãe e avó. Depois, em um segundo momento, a escola contou a relação de Luísa com sua fé e a força dos voduns e dos orixás, concretizada em uma miragem lírica da grande mãe dos mares, a negra Iemanjá, e também colocando sua infância em Salvador e seus questionamentos sobre a opressão da Igreja Católica na adoração aos santos brancos.

Seguindo o desfile, a Majestade do Samba falou sobre a Casa das Minas, os voduns cultuados aos pés das árvores, o misticismo da iniciação e os espíritos que se revelavam nesta casa, e os relatos de Kehindé, sobre quando chegou ao terreiro comandado por Nã Agontimé, em São Luís do Maranhão. O desfile segue apresentando a visão de Luiz Gama em que sua mãe Luísa Mahin deveria ser coroada rainha do Brasil pela pluralidade de uma mulher que desempenhou diferentes papéis, sendo a única sujeita que carregava as marcas mais humilhantes da formação social brasileira.

Por fim, o desfile se encerra com as últimas palavras do livro Um Defeito de Cor. A Portela apresentou em barcos as mães que perderam seus filhos para a violência de uma sociedade que vê neles um defeito de cor, tal qual fizeram com Luís e Kehindé. Um desfile que de modo geral teve bom entendimento, boa leitura, e cumpriu a proposta de emocionar.

Evolução

A evolução da escola tão problemática em 2023, foi um ponto positivo neste ano, ainda que a parte de arrumação na concentração tenha sido um pouco mais caótica na hora de colocar os carros na pista. No abre-alas algumas esculturas ficaram pelo caminho antes do desfile. A finalização do quarto carro para entrada também deixou a escola um pouquinho mais parada depois da apresentação do casal. Mas, nada grave.

Em geral, os componentes evoluíram de forma bastante fluida, com espontaneidade. A ala “a travessia” fazia uma performance coreografada que gerava um bonito efeito nas saias. Em um momento, o segundo tripé que vinha logo atras dessa ala demorou um pouco a avançar quando a ala da frente se movimentou em frente ao terceiro módulo de jurados, o que não chegou a gerar um buraco, mas um espaçamento um pouco maior.No geral, apenas esses detalhes e nada que tenha comprometido um desfile da Portela realizado com muita fluência.

Samba-enredo

Definido por muita gente como uma das melhores obras desta safra, o samba é de autoria de Rafael Gigante Vinicius Ferreira, Wanderley Monteiro, Bira, Jefferson Oliveira, Hélio Porto e André do Posto 7. A composição tem caráter bastante melodioso, mas possui também algumas partes mais valentes como o refrão principal “Saravá Kehindé..”, em que o verso final” Em casa um de nós derrame o seu axé” é um estouro até para o canto, a parte de maior vigor. O refrão do meio “Salve a lua de Benin”, organizado em um sexteto, é uma das partes de maior gingado. Na segunda do samba, a partir do “Em cada prece, em cada sonho nega…” começa os versos de melhor qualidade melódica, talvez deste carnaval, em que toda a relação afetuosa entre mãe e filho que o enredo possui está representado ali até que se chega ao refrão de baixo.

Ponto alto também para a letra da obra que é muito bem trabalhada e traz o enredo com poesia. A composição ainda atingiu mais ainda o seu auge a partir das bossas de mestre Nilo Sérgio, uma delas com o agogô de duas bocas, e pelo bom andamento. A obra encontrou uma boa ressonância no público que cantou em diversos momentos junto com a escola, ainda que não tenha sido o estouro que talvez fosse esperado pela obra tão festejada no pré-carnaval.

Fantasias

Com uma estética diferente do que vinha apresentando nos últimos anos, a estreia dos carnavalescos André Rodrigues e Antônio Gonzaga reservou para a Portela o uso de novos materiais, novos designs e o espectro de cores diferentes. No início um trabalho mais volumoso apostando em tons terrosos e com a utilização de muita palha, como pede o enredo, na ancestralidade africana negra. Isso foi bem perceptível nas alas “matriarcas” e “culto vodum””. Após o abre-alas também se seguiu com a ala “presentes de branco”.

O Azul da Portela se fez presente em contraste com o Preto na ala “a travessia”, que por conta da coreografia, gerava um bonito efeito pelas saias. Depois, antes do segundo carro, a espectro namorou um pouco com o branco como por exemplo na ala ” santidade menina Jejê”. Após o segundo carro a escola volta a palha e tons terrosos e durante todo o desfile é o espectro que mais se destaca ainda que bem intercalado com outras cores o que facilitou para que no visual não ficasse repetitivo. Apesar de boas soluções estéticas e de material, a escola não manteve a qualidade no acabamento e na volumetria das fantasias. Alguns setores estavam com a qualidade inferior, principalmente dos primeiros

Alegorias e adereços

A Portela levou para a Sapucaí um conjunto alegórico formado por cinco alegorias e dois tripés. O carro abre-alas desfilou desacoplado, mas como a escola só levou cinco alegorias para a Sapucaí não gera problema nenhum para o quesito. Esta primeira alegoria Terras de “Daomé”, inclusive, era onde estava a águia da Portela, desta vez apresentada em um estilo diferente. O carro, todo em tons mais terrosos, trouxe os ibêjis protegidos entre os galhos do Iroco e pelo espírito da Águia que sobrevoava a árvore sagrada, tudo era guardado pelos espíritos de Bessen, que são os espíritos da cobra, o vodun do culto Jeje.

Na alegoria, foi possível ver as costelas da cobra, como grandes marfins, que traziam em seu interior os soldados daomeanos em esculturas de bronzes (típica arte do Benin). Ladeando estavam também os cavaleiros do reino iorubano, também imitando o bronze. Uma das esculturas do carro foi deixada na pista. A alegoria número quatro “Cortejos à Rainha do Brasil”, que representou a coroação de Kehindé segundo o imaginário de Luiz Gama apresentou problemas de acabamento, um pano sobrando sem estar encaixado no turbante pode ser considerado um problema e pode gerar despontuação. Nela, a dupla de carnavalesco representou esta coroação com Luíza ladeada por leões de Xangô, cortejada pelos enormes sombreiros de Maracatu e adornada de fitas da Congada.

O segundo carro “Salvador Pagã”, que representou a relação de Luísa com a religião na infância, era muito bonito, todo branco, com boas soluções estéticas, mas também com um acabamento na parte de trás não tão primoroso. O ponto alto do quesito foi o último carro “Em cada Porto, nosso Ninho” que representava o encerramento da história de “Um defeito de cor” com os barcos trazendo as mães que perderam seus filhos para a violência de uma sociedade que vê neles um defeito de cor, tal qual fizeram com Luiz e Kehinde. Muito de muita emoção e que tocou a Sapucaí. No geral, apesar de boas e criativas soluções estéticas, as alegorias não tiveram um acabamento tão primoroso em comparação com outras escolas.

Outros destaques

A fantasia dos ritmistas da Tabajara do Samba representava a riqueza maior, a liberdade, através do ouro de Oxum. O figurino em tons de ouro e preto é adornado com espelhos, referência ao Abebé carregado pela entidade. Mestre Nilo Sérgio veio de Luiz Gama e a rainha Bianca Monteiro de Oxum, que sempre acompanhou Luisa Mahim. A fantasia proposta para os/as passistas da Portela fez referência à rainha Agontimé e à sua realeza, através da representação da pantera preta. Na cabeça, havia uma coroa estilizada com uma máscara negra de pantera. O figurino adornado em ouro traz o misticismo e a beleza do ritual Nilce Fran, representou uma das mulheres mais importantes na vida de Kehinde, a Agontimé. Esta personagem é quem recria os laços de Luísa com sua ancestralidade através da espiritualidade.

As baianas da Portela trouxeram o abraço feminino de Dúrójaiyé em seu manto azul. O uso de estamparias africanas acolheu o branco da renda, misturando a representação das vestes de uma anciã, guardiã da ancestralidade de sua família. A presidente de honra da Portela, Tia Surica, veio a frente da escola no tripé “Raízes de Savalu” que falava da terra primordial onde começa a vida de Kehindé. A musa Wenny Isa veio com a fantasia “o sagrado secreto” simbolizando nome escolhido pela personagem principal do enredo, sua identidade ancestral. No esquenta, Gilsinho cantou “Portela na Avenida” de Clara Nunes.

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