Início Site Página 1379

Alegoria do Tuiuti recria batalha épica em plena Sapucaí

 

tuiuti desfile 2020 106Fechando o segundo setor da escola, a alegoria “O Encantamento de Dom Sebastião na Batalha de Alcácer Quibir” foi um dos destaques do desfile da Paraíso do Tuiuti. Todo o carro, incluindo grandes esculturas de cavalos, foi coberto por uma textura artística que, com a iluminação especial, reproduziu com perfeição os areias do deserto marroquino. Na região se desenrolou a batalha que levou à derrota do exército comandado por Dom Sebastião e o misterioso desaparecimento do monarca. Com o trágico resultado da batalha, o Rei, que ganhou uma figura central na alegoria, passou a viver nas lendas e no imaginário popular pelos mais diversos recantos do mundo.

O embate entre soldados mouros e cristãos foi representado pelas composições da alegoria da Tuiuti.

Alexandro Borges, 37 anos, desfila há 11 anos na Sapucaí. Ele aceitou o convite para integrar a segunda alegoria da Tuiuti após conhecer a proposta da escola.

“Fiquei encantado com o trabalho desenvolvido pelo carnavalesco João Vitor Araújo. Assim que eu vi o volume e a textura do carro, tive a certeza de que viríamos pra disputar o título, não só pra ficar entre as campeãs. A escola está com sangue nos olhos”, afirmou o componente.

Alexandro representou um soldado mouro: “Fui vencedor na batalha no deserto do Marrocos e agora quero vencer na avenida também!”

Álvaro Junior, de 44 anos, desfilou pela primeira vez na Sapucaí. Ele contou como foi preparada a performance executada no carro. “Ensaiamos duas vezes por semana por mais de dois meses. Já simulamos a batalha na Cidade do Samba. A alegoria ficou maravilhosa com esse cenário tão realista do deserto. Entro orgulhoso para esse desfile. Os cristãos perderam a batalha mas na Tuiuti todos vieram pra ser vitoriosos. Eu tenho certeza de que a escola volta no desfile das campeãs”, apostou Álvaro.

Fotos: Desfile do Paraíso do Tuiuti no Carnaval 2020

Grandiosidade e emoção no conjunto alegórico do Paraíso do Tuiuti

tuiuti desfile 2020 054

O carnavalesco João Vitor Araújo estreou na Paraíso do Tuiuti com um conjunto de alegorias que fez a comunidade de São Cristóvão confiar no retorno da escola entre as campeãs. O jovem artista afirmou que este é o carnaval de sua vida.

Para narrar a ligação entre o monarca Dom Sebastião e o santo padroeiro da cidade do Rio, João Vitor apostou na imponência e grandiosidade, como já se podia ver no abre-alas. A alegoria que abriu o desfile da azul e amarela era composta por três chacis acoplados. Nas cores da escola, o carro intitulado “Sob as Bênçãos do Santo e para a Glória de Portugal: Viva o Rei Desejado” trouxe uma das marcas do trabalho do carnavalesco: as esculturas caprichadas.

Fernando Oliveira, 38 anos, veio de São Paulo para estrear como desfilante no carnaval carioca. Vestido como cavaleiro de Sebastião, o componente contou que tem um carinho especial pela Paraíso do Tuiuti: “É uma escola que sempre chamou a minha atenção e vem crescendo bastante. Achei que era a hora de eu participar dessa história. Vendo a alegoria na concentração, sinto que escolhi o momento certo para a minha estreia na Tuiuti”, disse o paulista.

A segunda alegoria representou o encantamento de Dom Sebastião na Batalha de Alcácer Quiber, e manteve o padrão de qualidade e grandeza do conjunto da escola.

O terceiro carro seguiu a linha definida pelo carnavalesco e apresentou um visual diferenciado das demais alegorias. Em tons de prata, azul e verde, João Vitor criou o palácio marinho de Dom Sebastião. O desenho e o acabamento das esculturas se destacava, deixando as composições orgulhosas. Luís Augusto Martins, de 36 anos, foi convidado para representar uma criatura do fundo do mar.

“Fiquei muito impressionado com a qualidade do material das fantasias e com o acabamento do carro. Com a iluminação especial, tenho certeza de que vai criar um grande impacto na avenida. A escola está luxuosa, volumosa, tem tudo pra surpreender e alcançar as primeiras colocações”, contou.

tuiuti desfile 2020 095

A alegoria seguinte trouxe um visual sombrio para representar a lenda maranhense do touro negro coroado, que se enfeita com as vestes do Rei. Rosa Tomas, 49 anos, vive no Caribe há 25 anos, mas retornou para desfilar no carro.

“Essa alegoria tem uma relação com o sobrenatural, a magia. Eu digo que é um carro do além, ele mexe muito comigo. Era um sonho pra mim desfilar num carro tão impressionante”, revelou Rosa.

Para fechar o desfile com a mesma grandiosidade apresentada desde o abre-alas, o carnavalesco trouxe uma imponente figura de São Sebastião, o Santo protetor de Dom Sebastião. O carro chamado “O Cortejo vai Subir pra Saudar Sebastião” representou um grande altar onde a cidade do Rio de Janeiro pede proteção. A alegoria trouxe votos de paz e de respeito às diferenças. A questão social estava clara na fantasia de Leonardo Diniz, 46 anos, que interpretou Dom Sebastião dos Pobres. Na capa do destaque havia imagens de crianças que foram vítimas da violência no Rio de Janeiro.

“Quando cheguei à concentração, várias crianças vieram me perguntar o que eram estas fotos, e pude perceber a comoção de cada uma delas. A imagem de São Sebastião neste carro vai provocar uma emoção semelhante em todo o público da Sapucaí”, apostou o figurinista.

Mangueira casa plástica requintada com desfile tecnicamente perfeito

mangueira desfile 2020 142 Copy

Por Diogo Sampaio. Fotos de Allan Duffes, Isabel Scorza e Magaiver Fernandes

Como seria caso Cristo retornasse hoje em dia? Onde iria nascer? Qual seria sua aparência? Propondo esses questionamentos, a Estação Primeira de Mangueira trouxe para Marquês de Sapucaí o “Jesus da Gente”, um moleque pilintra, do Buraco Quente, que tem rosto negro, sangue indígena e corpo de mulher.

Em uma apresentação tecnicamente perfeita, aliada com uma excelente plástica, a Mangueira se credenciou com uma das grandes favoritas ao título, no seu caso, ao bicampeonato. Terceira agremiação da primeira noite de desfiles do Grupo Especial, a Verde e Rosa encerrou sua passagem pela passarela do samba com 67 minutos.

Comissão de Frente

mangueira desfile 2020 103 Copy

Intitulada “Seu Nome é Jesus da Gente”, a comissão de frente assinada pelos coreógrafos Priscilla Mota e Rodrigo Negri trazia uma síntese do enredo, com a encenação das possíveis situações de vulnerabilidade que Jesus Cristo passaria caso nascesse no Brasil dos dias atuais. Os integrantes vestiam figurinos feitos de jeans estilizados, com a presença de alguns acessórios como bonés e bandanas complementando as caracterizações. Eles usavam como elementos de apoio cubos espelhados, com leds em verde e rosa nas arestas, que se transformavam em diversas coisas ao longo da performance.

mangueira desfile 2020 036 Copy

Com uma coreografia teatralizada, que mesclava passos de hip hop com street dance, a comissão tinha seu primeiro grande momento quando os componentes formavam a imagem da santa ceia. Seu segundo momento de destaque acontecia quando os cubos eram abertos e formavam um painel, simulando um muro com o nome de Jesus escrito nele. Nesse momento, Cristo junto com seus “discípulos” era enquadrado pela polícia, que o revistava e o agredia.

mangueira desfile 2020 031 Copy

Na sequência, já com Cristo ausente, vinha o terceiro momento da comissão, em que os cubos viravam caixas de som e formavam uma espécie de paredão funk durante a passagem do refrão “Favela, Pega a Visão”, com direito a efeitos de fumaça. O momento final acontecia quando atrás do paredão aparecia uma representação do Morro da Mangueira, com Jesus ressurgindo no alto da favela, trazendo agora a imagem do sagrado coração em seu peito.

Mestre-Sala e Porta-Bandeira

mangueira desfile 2020 040 Copy

Com uma fantasia nomeada de “Margem Poética”, o primeiro casal de mestre-sala e porta-bandeira, Matheus Olivério e Squel, desfilou vestido com as cores verde, o rosa, o dourado e o branco. Enquanto o figurino dele era mais tradicional, o dela ousava ao abrir mão do uso de costeiro e chapéu, além de trazer a parte de cima da roupa em modelo espartilho e “tomara que caia”. Apresentando uma dança de ritmo cadenciado, sincronizada e com gestos graciosos, a dupla não cometeu falhas expressivas nos módulos de julgamento, apesar do vento forte ter atrapalhado Squel durante performance para segunda cabine.

mangueira desfile 2020 039 Copy

Harmonia

mangueira desfile 2020 006 Copy

Todas as alas entoaram o hino mangueirense do início ao fim, mesmo com as arquibancadas frias durante a apresentação. Até mesmo alas coreografadas, como a 05, “O Joio e o Trigo”, cantaram os samba a plenos pulmões. A interação com o público não é quesito, mas pode influenciar a avaliação do julgador.

Enredo

mangueira desfile 2020 011 Copy

Através do enredo “A Verdade Vós Fará Livre”, a Mangueira propôs um questionamento acerca de como seria a volta de Jesus à Terra no contexto da realidade atual, de uma sociedade marcada pelo preconceito e pela intolerância. No decorrer de cinco atos, o desfile retratou o nascimento, a vida adulta, os algozes, o martírio e a ressurreição de Cristo. Com uma plástica refinada e de fácil leitura, a mensagem era transmitida ao público sem dificuldades, não sendo preciso recorrer ao roteiro de desfiles ou a textos de apoio para ter uma clara assimilação do que estava passando pela Avenida.

Evolução

mangueira desfile 2020 015 Copy

A Mangueira não apresentou falhas no quesito, mesmo com um ritmo um pouco mais lento no início. As alas se apresentaram bem arrumadas e enfileiradas, mas com componentes soltos e alegres. Também não houve encontro ou embolamento de componentes entre elas.

Samba-Enredo

mangueira desfile 2020 048 Copy

A obra composta por Luiz Carlos Máximo e Manu da Cuíca foi conduzida com segurança pelo intérprete Marquinhos Art’Samba, que manteve o rendimento dela mesmo diante dos problemas com o sistema de som da Sapucaí. O entrosamento entre o carros de som e a bateria foram outro ponto alto, assim como o canto forte dos componentes da escola.

Alegorias e Adereços

mangueira desfile 2020 097 Copy

Um dos grandes destaques da apresentação mangueirense foi o conjunto alegórico apresentado. Rico em detalhes e com excelentes acabamentos, os carros eram cenográficos, mas carnavalizados. A quarta alegoria, chamada de “O Calvário”, pode ser mencionada como uma das de maior impacto junto ao público ao trazer a figura de um jovem menino crucificado em uma gigantesca cruz.

Fantasias

mangueira desfile 2020 118 Copy

Assim como o conjunto alegórico, as fantasias foram outro ponto alto da apresentação. Volumosas, criativas e de boa leitura, podem ser citadas como destaques as roupas da alas 03 (“O Bom Pastor”), 04 (“Milagre da Multiplicação”), 09 (“O poder de Roma” – passistas) e 13 (“A intolerância é uma cruz” – baianas).

Outros Destaques

mangueira desfile 2020 125 Copy

Logo na abertura da escola, antes da comissão de frente, um grupo de pessoas representando os mais diversos credos religiosos vinha trazendo uma faixa com os dizeres: “Independente da sua fé, o respeito deve prevalecer”.

mangueira desfile 2020 140 Copy

Algumas alas da Mangueira, com viés mais crítico, tiveram grande comunicação com o público, dentre as quais se destacou a número 17, “Maria Madelena Ano 2000, que trazia uma representação atualizada como se fosse uma drag queen.

mangueira desfile 2020 146 Copy

Outro ponto foi a sempre aguardada passagem da rainha da “Tem que respeitar meu tamborim”, Evelyn Bastos. Mantida em segredo até a hora do desfile, a fantasia da beldade fazia alusão a Jesus Cristo, com direito até a uma coroa de espinhos na cabeça. Causa estranheza a rainha do samba no pé não ter sambado em nenhum momento. O personagem é legal, mas fez muita falta o ritmo que é próprio da rainha mangueirense.

mangueira desfile 2020 071 Copy

Ala da Mangueira trouxe componente carregando cruz escrita “Bandido Morto”

Terceira escola a pisar na Marquês de Sapucaí na noite de domingo, a Estação Primeira de Mangueira falou a respeito de um Jesus da gente. Como se fosse nascido e criado na comunidade da escola nos dias atuais. A campeã do carnaval 2019 desfilou com enredo “A Verdade Vos Fará Livre”, utilizando a história do Cristo que exaltou os humildes e condenou o acúmulo de riquezas. De um Jesus que insurgiu-se contra o comércio da fé, desafiou a hipocrisia dos líderes religiosos de seu tempo, foi torturado, padeceu e morreu.

mangueira bandido morto 2

O Jesus da Mangueira levanta a voz em favor da dignidade humana e é contra o pensamento de extermínio. A verde e rosa relacionou a questão da violência e do encarceramento com as mazelas oriundas da escravidão. Segundo dados do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), cerca de 65% da população carcerária do Brasil é preta ou parda. A 15ª ala da Mangueira foi inspirada em uma frase popular, utilizada inclusive em campanhas eleitorais: Bandido Bom é Bandido Morto.

A componente Carla Regina, de 35 anos explicou que o enredo é necessário nos tempos de intolerância.

“Esse enredo fala muito da gente. Jesus vem só trazendo um carma que a gente já carrega. Nossa ala veio vestida de ‘bandido’. Tem várias pessoas que são tidas como bandidos, pagando por coisas que não fizeram. Enquanto bandidos de verdade estão soltos por aí. Essa é a uma das nossas formas de protesto. Nem todo mundo é bandido”.

Composta por uma calça azul e parte de cima com tons bege, marrom e dourado, a fantasia da ala ainda possuía os dizeres “fé no pai” na altura do peito. Os componentes vinham apenas com os olhos e as mãos à mostra, com uma coroa de estrelas sobre a cabeça, carregando nas costas uma cruz escrito “Bandido Morto”.

mangueira bandido morto 3

Para Carla, Jesus seria vítima de preconceito se voltasse nos dias atuais como um morador do Morro da Mangueira.

“O Jesus vindo da Mangueira seria mal julgado, por ser de comunidade, infelizmente a gente é muito rotulado nesse tipo de situação. Na verdade ele já foi visto como bandido lá atrás, julgado de ladrão. Provavelmente porque ele não tem interesses. Quem não tem interesses e luta pelo povo geralmente é tido como bandido”. Ela afirma não temer que as pessoas façam julgamento ou discordem da proposta da ala. “A gente não está preocupado com o julgamento, ele já tá vindo desde o início. A gente quer tocar na consciência das pessoas”, desabafou a componente.

Cortejo sobe e Tuiuti saúda padroeiro São Sebastião em sua última alegoria

O último trecho do samba-enredo do Paraíso do Tuiuti serviu de inspiração para a última alegoria da escola de São Cristóvão. Para encerrar o desfile, o cortejo subiu e saudou Sebastião. Com um enorme altar saudando a cidade do Rio de Janeiro. Que foi fundada durante o reinado de Dom Sebastião, outro homenageado do enredo.

No topo da alegoria havia o sincretismo religioso entre Sebastião e Oxóssi. A figura emocionava o público desde o setor 1 até a dispersão. Os componentes também se mostravam muito emocionados ao ver santo e orixá lado a lado. Desfilando pela primeira vez no Tuiuti, Ana Laidley afirmou ser um privilégio participar do espetáculo proposto pela escola.

tuiuti ultimo carro 1

“É uma experiência inacreditável, me sinto privilegiada. Fiz uma oração ainda na concentração, pedi proteção para que tudo fosse muito bonito em nossa homenagem ao padroeiro”, contou.

A alegoria focou na parte mais religiosa do enredo, e nela, vieram beatas e guardiões num grande altar. Completando 5 anos de Paraíso do Tuiuti, Gustavo Krelim contou o que representava sua composição do carro.

tuiuti ultimo carro 2

“Viemos representando guerreiros guardiões no último carro. Achei super legal do carnavalesco fechar com nosso padroeiro, super bem amarrado tanto a parte de Portugal quanto a do Rio de Janeiro e fazendo esse link com o Tuiuti. Fico muito feliz com essa costura”, concluiu Gustavo.

Jesus da Mangueira tem rosto negro, sangue de índio e corpo de mulher

materiafacesjesus

Atual campeã do Carnaval Carioca, Mangueira traz em 2020 o enredo “A Verdade Vos Fará Livre”, falando sobre a figura de Jesus. Mas não é um desfile que simplesmente narra as passagens da Bíblia e o martírio de Cristo. A tradicional verde e rosa propôs uma indagação sobre como seria o retorno de Jesus nos dias atuais, em um contexto de intolerância, preconceito, violência e perseguição. O Jesus da Gente, “moleque pilintra do Buraco Quente (região do Morro da Mangueira)”, como diz a letra do samba, tem “rosto negro, sangue de índio e corpo de mulher” e está do lado do samba.

Para desenvolver esse enredo de inspiração religiosa, a Mangueira se transformou na Estação Primeira de Nazaré, unindo a região do Oriente Médio com o morro que dá nome a escola. A figura de Jesus foi representada em faces distintas, encontrando pontos de contato com minorias, em que as pessoas de comunidade passam a representar Cristo. Mayara Bonfim, desfilando pela terceira vez na ala de passistas da escola, estava orgulhosa em fazer parte desse desfile, porque se identificou com o enredo.

“Ta falando do preto, do pobre, do favelado, do gay… Eu tô muito feliz porque me representa como mulher negra nessa sociedade com tanto preconceito”. As passistas vieram de vermelho, branco e dourado, representando o ‘Poder de Roma’, onde Jesus é preso sob alegação de conspirar contra o Império Romano.

Mayara acredita que Cristo iria sofrer se voltasse hoje como morador de comunidade. “Sofreria muito preconceito por se juntar aos mais necessitados, aos mais pobres, com os gays, com os negros, os oprimidos… Acho que ele sofreria bastante, como a gente está sofrendo hoje em dia”.

Thiago Noronha, de 37 anos, fez sua estréia na Mangueira desfilando na ala dos ‘Fariseus’, que foram ameaçados pela mensagem difundida por Jesus, ao invés de se arrependerem, uniram-se para estimular a sua morte. Ele também crê que o Cristo não se daria muito bem se voltasse no Rio de Janeiro do tempos atuais.

“Jesus estaria bem encrencado com as pessoas que estão aqui governando o nosso país. Com as ideias dele, muito progressistas, acho que ele ia ser ‘enquadrado'”.

“Essas questões políticas tem que estar cada vez mais presentes no samba”, completou Thiago. Sua fantasia tinha predomínio das cores verde, dourado e amarelo, com algumas pedras vermelhas. Muitas penas compunham a parte da cabeça e o adereço de mão trazido pela ala, causando um efeito de luxo e requinte. Outra ala que caprichou nos detalhes do figurino era ‘O Cordão da Liberdade’, que trazia no estandarte de mão dos componentes um Jesus-POP, totalmente carnavalizado. Muitas cores faziam parte do visual da ala, que era a última da escola. Mara Lúcia, de 63 anos, uma das integrantes da ala ,desfilou pela quinta vez na Mangueira.

“Estou emocionada, achei tudo muito lindo”. Ela é mais uma mangueirense a concordar que Cristo não teria vida fácil ao voltar. “Se voltasse hoje Jesus ia ser muito perseguido. Ia ser igual mesmo ao que aconteceu na história que contam. Acho que muitos políticos não iriam gostar”.

velhaguardamanga

A baiana Rosângela Rodrigues, de 66 anos, desfila há 14 carnavais pela Estação Primeira. Batizada de “A Intolerância é uma Cruz”, a ala representou o preconceito com as religiões, principalmente as manifestações de matrizes africanas. A fantasia, toda branca e dourada, trazia uma cruz vazada no costeiro. Búzios, laços, espelhos e o rosto coberto com fios brilhantes faziam referência a Oxum, orixá da beleza. Rosângela elogiou o figurino, que além de visualmente rico, segundo ela, era bem confortável para evoluir. Para ela, se Jesus voltasse hoje, “melhorava a população. O pessoal tá muito desumano”.

Nagib Jaime, de 64 anos, sendo 40 só de Mangueira, é integrante da velha guarda e segue a mesma linha de raciocínio da baiana Rosângela: “O amor é o caminho pra tudo”. A tradicionalíssima velha guarda mangueirense veio elegante, de terno e calça rosa, gravata e camisa verde e chapéu panamá. Eles simbolizavam As Cores de um Coração em Festa.

“Se todos soubessem que o amor é a base da vida não teria guerra. Todas as pessoas seriam unidas, umas com as outras, seria tudo maravilhoso”, desabafou Nagib.

Fotos: Desfile da Mangueira no Carnaval 2020

Mangueira dá à luz a Jesus negro em seu abre-alas

Que Leandro Vieira já deixou de ser uma promessa para ser realidade todo mundo sabe. Em 2016, ele entrou de vez para o “hall da fama” dos carnavalescos consagrados na Sapucaí. Tirou o jejum da Mangueira com um desfile espetacular sobre a menina dos olhos de Oyá, Maria Betânia. Em 2019, conquistou seu segundo título marcado pela irreverência e por colocar os verdadeiros heróis do Brasil na avenida. Sempre repleto de lucidez e, principalmente, questionando os diversos problemas sociais que o Brasil enfrenta, mais uma vez o carnavalesco da Estação Primeira de Mangueira apresentou um majestoso abre-alas no qual evidencia uma das verdades que a escola tentou transmitir pelo enredo: Jesus era preto e tinha sangue índio.

mangueira aa 1

Além disso, Leandro Resolveu usar as divindades de Mangueira para representar duas figuras do cristianismo. Nelson Sargento foi José e Alcione, Maria. Ambos vieram na área frontal do carro ao lado da escultura que apresentava o Cristo negro, envolto de uma toca, fazendo referência a parte indígena.

A alegoria trazia a imagem do presépio cristão, aos olhos de Leandro Vieira. Por todo o carro havia animais como cabras, carneiros, bois, ovelhas e pombas brancas. Ao redor do abre-alas, anjos com cornetas e violinos anunciam o nascimento do Cristo, numa coloração barroca e com acabamento arrebatador. O grande destaque vai para a escultura enorme do menino Jesus, negro e com vestes cheias de pedras brilhantes e uma enorme coroa, em referência ao Cristo rei.

mangueira desfile 2020 118 Copy

As composições do carro representavam em sua maioria a simplicidade daqueles que trabalham no campo e sofrem no dia a dia sem ter importância para o restante da sociedade. Mas com muita humildade e fé. Um dos integrantes do carro, Nivaldo Bueno, chegou diretamente de Campinas e conta que adorou a fantasia.

“Escolhi a fantasia pelo site já que sou de Campinas. Diante da proposta do enredo, achei que estava tudo maravilhoso no desfile e a fantasia super confortável. O público interagiu, fantástico”, contou Nivaldo.

De maneira geral, o carro repensava toda a estética referente ao nascimento de Jesus e seus simbolismos. Traçados desde a primeira devota do cristianismo, Maria, até os dias atuais que criticam e questionam a veracidade dos fatos, principalmente sobre a etnia de Jesus Cristo e sua situação perante as diversas opressões que algumas religiões sofrem em seu nome. Em Mangueira, a verdade se fez livre.

Análise da bateria da Mangueira no desfile do Carnaval 2020

Por Matheus Mattos

Campeã do último carnaval, a bateria da Mangueira apresentou um ritmo firme, sem oscilações e aproveitamento do timbal. A sonoridade do timbal é aproveitado em praticamente todo samba-enredo. A levada é notada com mais frequência na primeira estrofe, com alternada de variações. As três paradinhas também contaram com desempenho preciso do naipe.

mangueira desfile 2020 001 Copy

O prato também foi usado com certa frequência. Na execução do trecho “contra a opressão”, o instrumento tem toque trabalhado no contratempo.

A bossa executada com mais frequência foi a que se inicia no trecho “Favela, pega a visão”. A convenção apresentou uma boa divisão de naipes. Observados de forma separada, a execução não tem grandes dificuldades. Mas, quando juntos, demonstram um bom conjunto de informações. Outro destaque é o arranjo do próprio timbal que aproveita o grave e o agudo do instrumento antes retomada.

É importante destacar que a bossa teve um efeito geral, não só na escola, mas em toda arquibancada. As cordas aproveitam a paradinha “Eu sou da Estação Primeira” pra acompanhar as frases da bateria com solos de cavacos.