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Entre Ratos e Engrenagens: A Alegoria Crítica do Porto da Pedra

A Porto da Pedra trouxe como primeira alegoria em seu desfile o abre-alas “Distopia Fordista”, com o tradicional Tigre no carro. A alegoria trouxe um tom crítico logo no primeiro setor da escola, chamado “Tapajós: Das Origens à Distopia Que Ergueu a Cidade Arredia”.

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Com as cores cinza e vermelho, a primeira alegoria do Tigre de São Gonçalo representou o sistema de produção em massa criado por Henry Ford, que, diferente dos povos indígenas, que viviam sua relação com o mundo e a natureza em comunhão, os não indígenas tinham uma visão extremamente racional e econômica, com o consumo em massa baseado em processos automatizados, linha de produção, exploração de trabalhadores e produção em série. Totalmente oposto ao modo de vida dos povos originários.

O capitalismo, como o centro e causa maior desse problema, é reproduzido no carro, que apresenta um bicho feroz na sua frente, o tigre, em um carro sem cor, sem a beleza da natureza, que apenas visa o metal-capital.

Os componentes da alegoria vieram fantasiados de ratos, simbolizando o trabalho desenfreado e explorador dos trabalhadores. O ator Amin Richan, de 21 anos, estreou na Porto da Pedra na composição do abre-alas e contou ao carnavalesco a crítica que a alegoria traz.

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“Esse carro é sobre o fordismo e fala sobre exploração, tanto que tem o explorador com o seu chicote em cima do carro, que está explorando a gente, os ratos que estão trabalhando nessa produção em série, exploratória, e seguem sofrendo nesse mundo sem felicidade, com tristeza, depressão, causada pela exploração”, contou o ator.

O coordenador e coreógrafo da alegoria, Breno Silva, detalhou a concepção da alegoria e tudo aquilo que ela veio representando.

“O carro é todo baseado no filme Tempos Modernos, do Charlie Chaplin. E a ideia é a gente trazer justamente esses movimentos de fábrica, como era o fordismo, onde tudo era mecânico e sem parar. E é um carro repleto de ratos, ratos trabalhadores, que estão aqui justamente servindo ao Ford. Podem reparar que o carro está infestado de ratos, e eles vão transitar a todo momento, fazendo essa movimentação, trabalhando. Eles interagem com a escultura do Ford que está lá em cima. É basicamente uma representação do trabalho exploratório”, disse o coreógrafo, de 29 anos.

A professora Daiane Colli veio compondo o carro e falou sobre as críticas que cercam a concepção da alegoria e algumas das camadas sobre a crítica ao capitalismo devastador, que tanto destruiu e ainda destrói as nossas matas.

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“Nós viemos representando os ratos. O nosso carro representa uma fábrica abandonada na floresta amazônica. E nós somos os ratos que ainda estamos trabalhando nessa fábrica como operários, aqueles operários que são sempre submetidos a trabalhos exaustivos, trabalhando sempre na mesma coisa. Nós somos essas pessoas meio fantasmas, meio o que sobrou dessa fábrica. Além disso, o carro vem criticando o capitalismo exacerbado, que vem destruindo a floresta, que não pensa nas pessoas que estão habitando ali e, assim como o samba diz, a sua engrenagem passa por cima de tudo que aquele lugar tinha antes de a fábrica existir”, declarou a professora, de 27 anos.

Alegoria e crítica se misturaram no desfile da Porto da Pedra, trazendo à avenida uma reflexão sobre o impacto do capitalismo na floresta e na vida das pessoas. A representação dos ratos operários evidenciou a exploração desenfreada, enquanto a ausência de cores no carro reforçou a frieza desse sistema.

Resistência na avenida: bateria da Unidos de Bangu representa a luta dos povos originários do Rio contra a repressão do Estado

Com o enredo “Maraka’ Anandê – Resistência Ancestral”, o desfile da Unidos de Bangu na Série Ouro do Carnaval 2025 homenageou a Aldeia Marakanã, comunidade indígena no Rio de Janeiro, situada ao lado do Estádio do Maracanã. O local se tornou um símbolo de resistência indígena, por estar constantemente no centro de conflitos territoriais com o Estado. A bateria da escola representou o episódio de 2013, quando um grupo de indígenas foi removido do local durante as obras do Maracanã para a Copa do Mundo de 2014. Desde então, os indígenas seguem reivindicando sua importância cultural e histórica na região.

“A mensagem é bem clara e o enredo é bem direto. A bateria, que é a maior ala da escola, vem vestida de policiais do choque, que inúmeras vezes tentaram expulsar os indígenas da sua Aldeia. O samba tem uma parte que fala sobre o militarismo, e a nossa ideia é fazer esse paralelo demonstrando a força que o índio tem para vencer essa guerra. Faremos uma coreografia que coloca o índio e o policial frente a frente, e no final do conflito, o índio sai vencedor e decreta a paz, como deveria ser na vida real”, explica Lion, mestre de bateria, que defende com firmeza a escolha de retratar a Aldeia Marakanã como representação da luta indígena no país.

“É um recorte que vale a pena ser falado, porque não estamos fazendo uma crítica, estamos fazendo uma denúncia. Ao falarmos do Rio, aproximamos essa realidade para muitas pessoas que vêm nos assistir hoje”, acrescenta o mestre.

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“Quando fiquei sabendo que a nossa fantasia seria de policial do BOPE, fiquei surpreso, mas depois entendi. Mostrar a repressão aos indígenas para um público tão grande é uma forma de conscientizar a população sobre um tema que não pode ser esquecido. Não é porque o episódio retratado aconteceu há algum tempo que outros iguais não continuem acontecendo até hoje. Temos que manter essa lembrança viva, e o Carnaval traz essa visibilidade”, ressalta o chocalheiro Cléberson Archanjo, de 22 anos, que descobriu mais sobre a história ao entrar para o time de ritmistas da escola.

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Esse desfile foi muito especial para a Vermelho e Branca, que foi uma das escolas afetadas pelo incêndio na fábrica Maximus Confecções, em Ramos, perdendo grande parte de suas fantasias. Tudo isso deu um toque ainda mais emotivo à apresentação, que já abordava um tema sensível para a sociedade.

“A emoção de fazer parte desse desfile já está vindo desde o dia do incêndio, que foi muito triste para a nossa agremiação. Agora, ainda mais, eu, os diretores e todos os ritmistas temos a responsabilidade de entregar o melhor junto com a nossa escola, para contar a nossa história também”, destaca Lion.

O ritmista Leandro Martins, de 49 anos, estreante na escola da Zona Oeste, fez um paralelo entre a tragédia e a resistência dos povos originários, tema do enredo.

“Um dos maiores ensinamentos dos nossos ancestrais é a superação, e neste ano, a Bangu demonstrou que absorveu essa lição ao dar a volta por cima e fazer um excelente desfile, mesmo sem competir. A nossa bateria veio para pedir à sociedade, por meio de todos os que assistiram ao Carnaval, que valorizem os nossos ancestrais e respeitem as causas indígenas. Para mim, é gratificante estar participando desse momento único”, complementa o componente.

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Bangu Carnaval 2025: galeria de fotos do desfile

Império de Casa Verde 2025: galeria de fotos do desfile

Fotos: Rebeca Schumacker

Ibérico sim, brasileiro sempre! Baianas da União do Parque Acari discorrem sobre o violão

A União do Parque Acari desfilou, nesse sábado, na Marquês de Sapucaí, o enredo “Cordas de Prata – o Retrato Musical do Povo”, sobre o violão. Ponto marcante de qualquer desfile, as baianas representaram as origens do instrumento na Península Ibérica. O lenço de suas saias fez clara referência à estética cigana.

“A ala das baianas, não só da Acari, como de todas as escolas co-irmãs, são as mães do samba. É um segmento de muito respeito, como a Velha Guarda, como a Bateria. A Bateria é o coração da escola e as baianas são as mães do samba”, declarou a coordenadora da ala de baianas Neucy Gomes, de 56 anos.

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“Desfilar como baiana, para mim, é muito gratificante, porque é como se fosse a continuidade de uma religião. A ala das baianas teve início no povo de Santo, de raiz africana. Além disso, é uma representatividade por ser uma ala matriarca composta apenas de mulheres”, disse a pedagoga Claudeni, de 48 anos, que desfila há dois anos pela Acari.

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Em 2025, a União do Parque Acari se debruçou sobre o mais famoso dos instrumentos de cordas, eternizado, no Brasil, por sambistas como Paulinho da Viola e Noel Rosa.

“A importância do violão para a música brasileira é muito grande, porque ele participa da Bossa Nova, ele tá no samba, ele tá no pagode. Ele é que dá vida. A música, as cordas, os instrumentos de corda dão a vida à coisa. É muito legal a escola falar sobre o violão, uma coisa que ninguém prestou atenção e é um instrumento muito legal que famosos compositores usaram para poder evoluir a música. Eu não vivi essa época, mas eu percebo que era um instrumento mais próximo para eles, questão até de financeiro. Era mais fácil deles conseguirem o violão do que qualquer outro instrumento”, explicou a mediadora Maria Luzia Silva, de 57 anos.

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“É difícil imaginar a música, a parte musical sem um violão, porque o violão dá o tom, pro compositor, pro intérprete, o violão, o cavaco, o banjo para poder a música acontecer”, desenvolveu Neucy.

“O meu sonho é tocar violão, mas nunca soube tocar, então hoje eu vou realizar meu sonho ao desfilar pela Acari”, compartilhou a saladeira Inês Ramos, de 71 anos, que vai para o segundo ano na agremiação.

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Nascido na Península Ibérica, no entanto, o instrumento se tornou, na visão das acarienses, essencialmente brasileiro.

“Na época do Jamelão, eu não era nem nascida e ele vinha no carro do som com Clóvis do violão. O violão já faz parte da cultura brasileira”, garantiu a coordenadora da ala.

“Já virou, virou. Todo mundo quer tocar violão. Até quem não sabe quer aprender, como eu. Ele é brasileiro. Não é mais espanhol, não”, reforçou Inês.

 

Acadêmicos de Niterói leva quadrilheiros para a Sapucaí

Com o enredo “Vixe Maria” e um samba com o ritmo contagiante do forró, a Acadêmicos de Niterói promoveu uma verdadeira festa junina no Sambódromo, na segunda noite de desfiles da Série Ouro.

“Hoje a Niterói está representando uma festa que é importante para o Brasil inteiro. De Norte ao Sul do país, todo mundo sabe fazer quadrilha, mesmo que com suas características regionais”, diz Nicolas Benício, quadrilheiro e diretor da primeira ala da escola, que vem representando as quadrilhas do Brasil. Para fazer isso com fidelidade, a Azul e Branca juntou componentes de diversas quadrilhas do Rio de Janeiro.

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“Eu sou quadrilheiro desde criança, quando acompanhava meu tio nas festas juninas. Até tentei gostar de outros ritmos, mas não teve como, me apaixonei 100% pela quadrilha. É um amor que foi passado de família. Me encantei pelos brilhos, pelas estampas dos tecidos e pelas comidas típicas” compartilha Thales Amaral, de 25 anos, quadrilheiro da São Judas Show, de Anchieta.

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Apesar da maioria dos integrantes serem cariocas, Nicolas garante que as características da ala não tem distinção regional.

“A nossa ala traz uma representação da quadrilha do Brasil. Dançaremos os passos tradicionais de toda quadrilha, que são aqueles que vocês aprenderam na escola, como o anarriê, o alavantou e o túnel”.

O veterano Douglas Amaral, que dos 45 anos de idade já é quadrilheiro há mais de 20, estando atualmente na Gonzagão do Pavilhão, dá detalhes da fantasia da ala, e fala sobre como a endumentária se relaciona ao enredo.

“Estamos caracterizados com as cores nordestinas, bem vibrantes, na chita. Também trazemos os elementos de cangaceiros na roupa das damas, que tem uma saia grande de filó, então estamos bem juninos”.

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A apresentação foi feita em duplas, onde cada moço tinha a sua moça. Para contrastar com a experiência de Douglas, seu par era Lavínia Bruna, de 22 anos, que tem apenas um ano como quadrilheira na Gonzagão do Pavilhão. O pouco tempo não impediu a moça de desfilar pela Niterói, e ela fez questão de compartilhar seu sentimento em relação a isso.

“É gratificante ajudar a colocar a junção do Carnaval com festa junina na avenida. Por mais que não pareça, as duas festividades estão conectadas pelo amor pela folia”.

 

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“A quadrilha foi uma dança da corte europeia, que o povo mais humilde passou a reproduzir de uma forma jocosa, por isso, é conhecida como o teatro do povo, assim como as escolas de samba. Dessa forma, nada melhor do que uma escola no Rio de Janeiro mostrar o que é uma festa popular para o Brasil inteiro” complementa Nicolas.

Vigário Geral Carnaval 2025: galeria de fotos do desfile

Cordas de Prata: segundo carro da União do Parque Acari celebra Moacyr Luz e a Velha Guarda

A União do Parque Acari foi a segunda escola a se apresentar neste sábado na Marquês de Sapucaí. A agremiação apresentou o enredo “Cordas de Prata – O Retrato Musical do Povo”, sobre o violão, na tentativa de conquistar a tão sonhada ascensão ao Grupo Especial. A terceira e última alegoria da Acari, nomeada “Cordas de Prata”, exibia um grande violão prateado, em torno do qual vieram destaques e fotografias de grandes nomes da música brasileira, como Cartola, Beth Carvalho e Paulinho da Viola.

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“Esse carro representa a corda de prata, a Velha-Guarda, toda essa importância deles na composição da escola. Na frente, Moacyr Luz, o compositor do samba, com os amigos dele. A gente vai completar com a Velha-Guarda e, em cima, o destaque Júnior Bispo. Teve também as meninas”, disse o diretor da alegoria Richard de Oliveira Jesus, de 18 anos.

“As fotos desses artistas representam a nossa história, de como surgiu o samba. Muita gente gosta de samba, mas não sabe como começou o samba nem a música popular brasileira. Foi a origem de tudo. É muito bom homenagear não só esses artistas, os músicos, como também a Velha Guarda, que são os que entendem bem melhor do que a gente tudo o que já aconteceu durante todos esses anos de samba na Avenida”, declarou a designer de joias Thauany Miranda, de 34 anos, que desfila há dois anos pela União do Parque Acari. Apaixonada pelo mundo do samba, Thauany cresceu frequentando a quadra da Unidos do Amarelinho e da Favo de Acari, que se uniram para formar a atual agremiação.

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Em 2025, a União do Parque Acari decidiu homenagear o mais tradicional dos instrumentos de corda, o violão, cuja influência é incontornável na história da música popular brasileira.

“O meu pai era violonista. O violão, para a música, é tudo. Vários compositores, cantores, tocavam violão. Paulinho da Viola é hors concours. O nome já diz: Paulinho da Viola. Dentre outros que tocam violão até hoje. Eu vou desfilar na Sapucaí pela minha comunidade. E pelo meu pai, o Seu Humberto, o Vascão, lá de Acari, que, graças a Deus, ainda é vivo”, compartilhou Washington Peixoto, conhecido como O Amoroso, de 54 anos, integrante da Velha Guarda. Washington está há cinco anos na escola.

“O violão tem muita importância para a música. Violão faz tudo na escola, em qualquer lugar. Violão faz qualquer tipo de música, qualquer movimento”, explicou a dona de casa Rita de Cássia, de 52 anos, que desfila há dois anos pela Acari.

Vigário Geral coroa Vagalume como Rei da Folia em alegoria que homenageou o cronista da cultura negra carioca

A Acadêmicos de Vigário Geral apresentou na Marquês de Sapucaí a história de Francisco Guimarães, mais conhecido como Vagalume. Importante cronista da virada do século XIX para o XX que jogou luzes sobre a cultura negra e periférica carioca e se tornou uma das maiores referências das práticas momescas. Em sua terceira alegoria, a Vigário coroou Vagalume como Rei da Folia e trouxe à frente da alegoria a família do saudoso cronista da cultura negra e periférica carioca.

Luciano Guimarães, bisneto de Vagalume, falou ao CARNAVALESCO sobre a homenagem que a Vigário está prestando a Vagalume. “É uma honra muito grande pela história de vida dele, pela luta que ele teve para abrir espaço para a cultura negra e periférica na sociedade carioca. Saber que uma figura como o Vagalume teve uma relevância na sociedade, o impacto de suas crônicas, a maneira como ele abordou as pessoas que não tinham visibilidade naquela sociedade, uma figura realmente que trouxe uma transformação. E saber que o Vagalume ainda é meu bisavô é uma honra dobrada”, declarou emocionado.

Impactada com a homenagem, Tasília Guimarães, neta de Vagalume e mãe de Luciano, revelou que o desfile foi uma oportunidade maravilhosa de celebrar o legado do avô. “Nunca frequentei escola de samba, é a primeira vez que eu venho aqui. Para mim, é uma homenagem enorme. Estou muito feliz. Estou bastante impactada porque é uma homenagem linda. Até o trecho samba, o nome do Francisco Guimarães, meu avô, eu fico emocionada. Eu acho que está sendo um momento maravilhoso para mim”, declarou.

Quem marcou presença como destaque principal da alegoria foi o ator Rodrigo França. O artista representou o Vagalume coroado da Vigário e falou sobre a importância do cronista para o protagonismo do povo preto. “Francisco Guimarães Vagalume mostra o quanto nós sempre tivemos uma intelectualidade preta que pensou o tempo, o espaço em relação à nossa cultura, das nossas necessidades de direito, de liberdade, o quanto a gente sempre buscou subverter uma lógica escravocrata que se perpetua até hoje, de uma certa maneira. Escravocrata de ideias, de comportamento, ainda muito eugenista”, afirmou.

Para ele, Vagalume foi pioneiro por abrir espaço para que a cultura negra e periférica resistisse ao projeto eugenista que predominou como política do Estado brasileiro. “A gente está num momento eugenista onde se nega a cultura negra no Carnaval, a cultura de matriz africana no Carnaval, no Brasil inteiro. Vagalume foi pioneiro e continua existindo na nossa vida em relação a estar dentro da estrutura, estar dentro do sistema e subverter e buscar o melhor para a nossa gente”, declarou.

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No fim da alegoria, uma faixa com uma frase do cronista saia das mãos da escultura de um Pierrot, em que se podia ler: “O maior sucesso do samba é o carnaval (Vagalume)”.

A emoção do retorno: comunidade celebra volta da Tradição à Sapucaí

A segunda noite de desfiles da Série Ouro teve um gostinho especial para a Tradição, que retornou ao Grupo de Acesso depois de 11 anos desfilando na Intendente Magalhães. Apesar do longo tempo fora do brilho da Sapucaí, a escola honrou o nome ao manter uma comunidade fiel, que permanece ao seu lado nos altos e baixos.

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“Acompanhei a Tradição durante todos esses anos na Intendente Magalhães, onde ela enfrentava a falta de reconhecimento da mídia, que resultava na falta de estrutura e de dinheiro também. Por isso, vejo como ela é uma escola de garra”, comenta Sérgio Santos, de 51 anos, morador de Cascadura, que criou um carinho pela Azul e Branca desde que desfilou pela primeira vez na vida em 2001, ano da homenagem a Silvio Santos. O rapaz, que desfilou este ano na ala da bruxaria, ainda destacou que a comunidade está empenhada em fazer deste um momento histórico.

“Todo mundo está muito contente, pode-se notar pela quantidade de pessoas que estão desfilando aqui. Assim como diz o samba, a Tradição voltou, realmente! E voltou para o lugar de onde nunca deveria ter saído.”

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A agremiação de Madureira vem de uma linhagem da realeza do Carnaval carioca, já que é dissidente de ninguém menos que a Portela. Além de dividirem a Águia Majestosa como símbolo principal, as Azuis e Brancas também dividem o coração dos torcedores.

“Estou vivendo um sonho. Sou fanática pela Tradição, porque eu digo que ela é a filha da Portela, minha escola do coração. Sendo assim, eu amo também a Tradição. Estou super honrada em participar deste retorno à Sapucaí”, orgulha-se a baiana Penha Thomaz, de 69 anos.

“Estou muito feliz por estar fazendo parte de uma escola tão tradicional no Carnaval carioca, a qual tenho certeza de que vai continuar desfilando na Sapucaí, seja no Acesso ou no Especial. Estou confiante. E dá para ver pela plástica que ela fez um bom trabalho. O samba está muito forte, o qual a comunidade abraçou e está cantando muito. Está com muita harmonia, a escola está com uma pegada muito bacana, muito bacana”, conta, orgulhoso, o passista David Marques, de 38 anos, que desfilou acompanhado do seu amigo Marcos Vinícius, que também expressou a felicidade de representar a escola.

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“Sempre admirei a escola, que tinha diversos sambas antológicos que eu adoro, como o lendário samba do Silvio Santos. Quando surgiu a oportunidade de desfilar, nem pensei em recusar. Estou muito feliz por representar essa escola que, assim como o nome diz, é de tradição”, bradou Marcos Vinícius.

“Vamos dar o nosso melhor neste desfile, dançando e cantando bastante e entrando com muito axé, que reza não costuma falhar”, garantiu a dupla ainda na concentração.

A Tradição veio com um enredo forte, que celebra a espiritualidade humana representada por diversas crenças religiosas.

“A nossa ala fala sobre o direito de existir. Vem toda a população LGBTQIAP+, falando sobre a nossa necessidade também de rezar. É a nossa inserção no meio religioso, ao qual também temos o direito de pertencer. Nós também merecemos a espiritualidade. Por isso, estou muito feliz em desfilar em uma escola que teve a coragem de levar esse tema para a avenida”, relatou o dentista Gualter Silva, de 36 anos.