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Dia da Consciência Negra contará com uma roda de samba em homenagem à Dona Ivone Lara

As ruas e bares da Tijuca, Maracanã e Vila Isabel sempre foram palcos de diversas manifestações artísticas populares, incluindo as famosas rodas de samba, já que as regiões abrigam escolas de samba tradicionais do Rio de Janeiro, como a Mangueira, Unidos da Tijuca, Salgueiro, Vila Isabel e Império da Tijuca. Os bairros também entraram para a história das carreiras de diversos sambistas imortais: Cartola, Carlos Cachaça, Jamelão, Beth Carvalho, Nelson Sargento, Noel Rosa e entres outros baluartes. No dia 20 de novembro, Dia da Consciência Negra, a partir das 14h, a Estácio Maracanã – na rua Morais e Silva, 40, na Tijuca – promoverá uma roda de samba para homenagear Dona Ivone Lara, unindo o movimento negro, a luta pelos direitos das mulheres e, logicamente, o samba.

roda ivone
Foto: Divulgação

A iniciativa faz parte do tributo à grande “Dama do Samba”, justamente no ano de seu centenário, no projeto Estátua de Brilho. Neste dia, além da roda de samba, será realizada a inauguração do super campus Estácio Maracanã, que apresentará ao público, pela primeira vez, a estátua de bronze de Dona Ivone Lara. Os tijucanos elegeram a sambista após um mês de votação que ocorreu por meio da internet. A roda de samba – evento aberto ao público e totalmente gratuito – será composta somente por cantoras negras que fazem parte do circuito carioca de samba da atualidade. Já confirmaram suas presenças André Lara (neto da Dona Ivone Lara) e Alex Ribeiro (filho do também músico Roberto Ribeiro), além de outros convidados.

Dona Ivone Lara, mulher negra da década de 20, foi a primeira cantora a assinar um samba-enredo e a fazer parte da ala de compositores de uma escola. Agora será uma das primeiras mulheres negras brasileiras a receber uma estátua de brilho em sua homenagem.

Vale ressaltar ainda que a atração será a primeira de muitas que o novo campus Estácio Maracanã vai proporcionar aos moradores do bairro da Tijuca e de toda a cidade do Rio de Janeiro.

“Nossa bandeira será fincada com uma estátua de bronze com o nome de uma joia rara, o que deixa a gente bem feliz, afinal de contas, a logomarca da Estácio também é uma joia: um diamante. A homenagem à Dona Ivone Lara vai valorizar ainda mais os nossos acervos e patrimônios, fortalecendo a história da Cidade do Rio de Janeiro”, afirma Eduardo Guedes, diretor de Marketing da Estácio.

Serviço:

Evento – Roda de samba e apresentação / inauguração da estátua de brilho de Dona Ivone Lara
ABERTO AO PÚBLICO E GRATUITO – AO AR LIVRE
Dia – 20 de Novembro – Dia da Consciência Negra
Hora – a partir das 14h
Local – Novo campus Estácio Maracanã
Endereço – Rua Morais e Silva, 40, na Tijuca

PARAÍSO DO TUIUTI: samba-enredo o Carnaval 2022

Compositores: Cláudio Russo, Moacyr Luz, Júlio Alves, Alessandro Falcão e W. Correia Filho
Intérprete: Celsinho Mody, Grazzi Brasil e Carlos Jr.

Olodumarê mandou
Oxalá me conduzir pelo céu da liberdade
Me falou Orunmilá
Vai meu filho semear pelo mundo a humanidade
Nos caminhos de Exu
Me perdendo encontrei nua e crua essa verdade
Que a raiz do preconceito
Nasce do olhar estreito da cruel desigualdade
Sou Alabê gungunando o tambor
Trago cantos de dor, de guerra e de paz
Pra ver secar todo pranto nagô
E gritar por direitos iguais
Meu sangue negro que escorre no jornal
Inundou um oceano até a Pedra do Sal

Eh! Dandara!
A espada e a palavra eh!
Não vai ser escrava
Hei de ver noutras negras minas
Um baobá malê que nasceu do chão
Pra vencer a opressão com a força da melanina

Negro é cultura e saber
Ka ri ba ti yê caminhos de sol
Por onde Otelos, Stellas e Teresas de Benguela
Se fazem farol
Pra iluminar alafins
E morrer só de rir feito mil Benjamins
E cantar! Cantar! Cantar!…
A beleza retinta que veio de lá
E cantar! Cantar! Cantar!…
Pra saudar o meu orixá

Ogunhiê! Okê Arô!
Laroyê! Meu pai kaô
Tem sangue nobre de Mandela e de Zumbi
Nas veias do povo preto do meu Tuiuti

Nota: O intérprete Carlos Jr. está com o pé quebrado e não pode vir ao Rio de Janeiro para os últimos ensaios do Tuiuti.

Sossego: samba-enredo o Carnaval 2022

Compositores: Diego Tavares (in memoriam), Marcelo Adnet, Junior Fionda, Marcelinho Santos, Thiago Martins, Yago Pontes, Diego Nogueira, Rod Torres, Deodônio Neto, Gabriel Machado e Paulo Beckham
Intérprete: Nino do Milênio

PAJÉ VOLTOU PARA CONTAR QUE O CÉU DESABOU
FUMAÇA TRAZIAM SAGRADAS VISÕES
NA DANÇA ANCESTRAL ME REVELOU
DAS ERVAS EVOCOU OS GUARDIÕES

XAPIRI ME PERDOE DO QUE NÓS FIZEMOS DE URIHI
XAPIRI ENSINOU A CUIDAR E VAMOS DESTRUIR
A RAZÃO ANCESTRAL EVOCOU SUA VOZ
SÓ NÃO DEIXE O MUNDO CAIR SOBRE NÓS

OMAMA ESCONDEU NA FLORESTA
PEDAÇOS DO CÉU CONTRA OS OLHOS DA AMBIÇÃO
A GANÂNCIA SENTE FOME
E O MAL QUE NOS CONSOME MATA O HOMEM E O QUINHÃO

XAMÃ CURA A TERRA DA GUERRA DA GENTE
DOS MITOS QUE DEIXAM A TRIBO DOENTE
ENFIM DESCERÁ DE UMA ESTRELA UM ÍNDIO GUERREIRO
DE PELE VERMELHA CABOCLO FLECHEIRO

OKÊ OKÊ ARÔ… ODÉ ODÉ
A JUREMA QUE DESMATA TEM A CURA E O AXÉ
OKÊ OKÊ ARÔ… ODÉ ODÉ
“APESAR DE VOCÊ” EU AINDA MANTENHO A FÉ

EU NÃO LARGO DA BATALHA… SOSSEGO
NOSSA ALDEIA NUNCA FALHA… AUÊ AUÊ
SACUDINDO A POEIRA DAS CINZAS VOU RENASCER

 

De volta ao Especial, Tucuruvi propõe reflexão sobre o carnaval

De volta ao Grupo Especial de São Paulo, o Tucuruvi já toca sua preparação para o desfile em 2022. O site CARNAVALESCO visitou o ensaio de canto. A escola levará para o Anhembi o enredo “Carnavais…De lá pra cá o que mudou? Daqui pra lá o que será?”.

Rodrigo Delduque, diretor de carnaval, comentou a volta dos ensaios. “O sentimento era de saudade. Voltar a fazer o que sempre fizemos, com amor, dedicação. Estamos nos preparando para a volta triunfal. Nossa programação será toda quinta e sábado”.

Intérprete oficial do Tucuruvi, Leonardo Bessa, falou do entrosamento com a bateria. “É uma alegria muito grande. Passamos mais de um ano sem contato com as pessoas que gostamos tanto. Poder voltar é a certeza que tudo voltará ao normal. Vamos fazer o carnaval da melhor maneira possível. A Tucuruvi está preparada. O nosso samba é um grito de alerta para o povo do carnaval e do samba. Fizemos um desfile de alto nível em 2020, a sintonia é perfeita do carro de som e bateria”.

Diretor harmonia, Gabiru, ressaltou a vontade dos componentes da escola. “A gente já está trabalhando com máscara. Estamos seguindo os protocolos. Temos que estar preparados para tudo. O componente está consciente. Se tiver que desfilar com máscara vamos cumprir. Nossa comunidade está com muita vontade e energia. Será um ano em que a comunidade vai agregar ainda mais. Podem esperar um canto forte e alegre. O samba e o enredo pedem”.

Comadante da bateria do Zaca, mestre Serginho explicou o sentimento da volta dos ensaios com os ritmistas. “As pessoas estão muito animadas. Tivemos bastante calma para trabalhar o samba e fazer os arranjos. Vamos levar três bossas para Avenida. Será uma sequência, como fizemos em 2020. A expectativa é grande. Estou em casa com essa comunidade. A bateria é uma família”.

Para o casal de mestre-sala e porta-bandeira, Luan Caliel e Waleska Gomes, revelou que não parou de ensaiar.

“É sinal de superação. Passamos por tudo isso e estamos aqui. É um encontro, renascimento. Estamos novamente com nosas famílias. A nossa preparação sempre foi bem intensa. Mesma na pandemia, a gente não parou, apenas reduzimos. O condiciamento ainda não é o mesmo de 2020, mas já estamos desde julho no Anhembi e seguindo no trabalho para conseguirmos o melhor resultado para escola. O que posso dizer da fantasia é que o nosso carnaval é passado, presente e futuro”, citou a porta-bandeira.

“A pandemia foi difícil para todo mundo. Dançar é muito importante para gente. Reencontrar a comunidade e conversar é maravilhoso. Sentir o nosso clima. O ensaio é também para o psicológico. Já estamos com entrosamento legal, a coreografia acertamos algumas coisas e podem esperar um ano muito melhor. Vamos abrir o carnaval com tudo. Nossa fantasia é imponente”, completou o mestre-sala.

VEJA FOTOS DO ENSAIO

BEIJA-FLOR: samba-enredo o Carnaval 2022

Compositores: J. Velloso, Léo do Piso, Beto Nega, Júlio Assis, Manolo e Diogo Rosa
Intérprete: Neguinho da Beija-Flor

A NOBREZA DA CORTE É DE ÉBANO
TEM O MESMO SANGUE QUE O SEU
ERGUE O PUNHO, EXIGE IGUALDADE
TRAZ DE VOLTA O QUE A HISTÓRIA ESCONDEU
FOI-SE O ACOITE, A CHIBATA SUCUMBIU
MAS VOCÊ NÃO RECONHECE O QUE O NEGRO CONSTRUIU
FOI-SE O ACOITE, A CHIBATA SUCUMBIU
E O MEU POVO AINDA CHORA PELAS BALAS DE FUZIL
QUEM É SEMPRE REVISTADO É REFÉM DA ACUSAÇÃO
O RACISMO MASCARADO PELA FALSA ABOLIÇÃO
POR UM NOVO NASCIMENTO, UM LEVANTE, UM COMPROMISSO
RETIRANDO O PENSAMENTO DA ENTRADA DE SERVIÇO

VERSOS PARA CRUZ, CONCEIÇÃO NO ALTAR
CANINDÉ JESUS, Ô CLARA!!
NOSSA GENTE PRETA TEM FEITIÇO NA PALAVRA
DO BRASIL ACORRENTADO, AO BRASIL QUE NÃO SE CALA

VERSOS PARA CRUZ, CONCEIÇÃO NO ALTAR
CANINDÉ JESUS, Ô CLARA!!
NOSSA GENTE PRETA TEM FEITIÇO NA PALAVRA
SOU O BRASIL QUE NÃO SE CALA

MEU PAI OGUM AO LADO DE XANGÔ
A ESPADA E A LEI POR ONDE A FÉ LUZIU
SOB A TRADIÇÃO NAGÔ
O GRÊMIO DO GUETO RESISTIU
NADA MENOS QUE RESPEITO, NÃO ME VENHA SUFOCAR
QUANTAS DORES, QUANTAS VIDAS NÓS TEREMOS QUE PAGAR?
CADA CORPO UM ORIXÁ! CADA PELE UM ATABAQUE
ARTE NEGRA EM CONTRA-ATAQUE
CANTA BEIJA-FLOR! MEU LUGAR DE FALA
CHEGA DE ACEITAR O ARGUMENTO
SEM SENHOR E NEM SENZALA, VIVE UM POVO SOBERANO
DE SANGUE AZUL NILOPOLITANO

MOCAMBO DE CRIOULO: SOU EU! SOU EU!
TENHO A RAÇA QUE A MORDAÇA NÃO CALOU
ERGUI O MEU CASTELO DOS PILARES DE CABANA
DINASTIA BEIJA-FLOR!

Cubango inicia ensaios de comunidade

O Acadêmicos do Cubango inicia nesta quarta-feira, a partir das 19h, os ensaios de comunidade para o próximo Carnaval. A escola convoca todos os componentes para participarem do treino. As inscrições para os interessados em desfilar nas alas de comunidade da escola também ocorrem no mesmo dia. É preciso levar: duas fotos 3×4; xerox do comprovante de residência, xerox da identidade e a xerox do comprovante de vacinação contra a Covid-19.

patricia cubango
Foto: Magaiver Fernandes

No próximo Carnaval, o Cubango desfile com o enredo “O amor preto cura: Chica Xavier, a mãe baiana do Brasil”, do carnavalesco João Vitor Araújo. A quadra do Cubango fica na Rua Noronha Torrezão, 560, bairro do Cubango, Niterói.

Madrinha do carro de som da Portela, Pipa Brasey lança releitura do clássico ‘Retalhos de Cetim’

Considerado um dos maiores clássicos da música popular brasileira de todos os tempos, “Retalhos de Cetim” acaba de ganhar uma releitura na voz de Pipa Brasey. Gravado no lendário estúdio Abbey Road, em Londres, com a participação de uma orquestra de violinos da Rússia, o single marca uma nova fase da carreira da cantora e celebra os 80 anos do compositor Benito Di Paula, que lançou a canção em 1973.

pipa novosingle

Gravar “Retalhos de Cetim” era um sonho antigo de Pipa, que sempre fez questão de cantá-la em seus shows. Além disso, a música tem um valor afetivo muito especial em sua vida. “Eu sempre amei essa música, porque ela emociona e deixa todo mundo arrepiado. No meu caso, tem uma razão ainda mais forte. Meu pai, que já faleceu, gostava muito dela, e eu lembro que foi a última música que pude cantar para ele. Então, além de reverenciar a obra do mestre Benito Di Paula, essa gravação também é uma forma de homenagear meu querido pai. Cada frase dessa canção consegue despertar em mim essa alegria de um laço eterno de gratidão, amor e muita saudade”, revela Pipa.

Com produção musical de David Cabral, o single reuniu profissionais de diversas partes do mundo. A base da faixa foi feita na cidade de São Paulo. Para colocar a voz, no entanto, Pipa esteve no Abbey Road, o estúdio mais famoso do mundo, na Inglaterra, onde astros como os Beatles e Roberto Carlos já gravaram. O arranjo contou, ainda, com o talento de músicos russos.

“Retalhos de Cetim” já foi regravada por nomes como Jair Rodrigues, Alcione, Elymar Santos, Xande de Pilares, entre outros ícones da MPB. A releitura de Pipa Brasey, que já está disponível em todas as plataformas digitais, confirma a força deste clássico que atravessa gerações e gerações de brasileiros, quase cinco décadas após seu lançamento.

Morando na Suíça há 30 anos, Pipa Brasey, Madrinha do carro de som da Portela, escola de samba que mais vezes venceu o carnaval do Rio, a artista participa dos desfiles da agremiação na Marquês de Sapucaí há sete anos. Em 2020, deixou o posto de destaque de carro alegórico e aceitou o convite para cantar o samba-enredo com o intérprete oficial Gilsinho.

Outra marca importante de sua carreira é o intercâmbio musical. Mesmo com a agenda de shows interrompida por causa da covid-19, a cantora realizou, desde março de 2020, mais de 20 lives com alguns dos maiores nomes da música brasileira, entre eles Jorge Aragão, Leci Brandão, Dudu Nobre e Xande de Pilares. No mesmo período lançou um EP com as canções autorais “Forte e Ascendente”, “Pode Chorar” e “Virou Saudade”, disponíveis nas plataformas digitais.

Samba da Grande Rio para o Carnaval 2022 fica em primeiro lugar na terceira pesquisa do CARNAVALESCO

A Acadêmicos do Grande Rio terminou em primeiro lugar na terceira etapa da pesquisa do CARNAVALESCO sobre os sambas-enredo do Grupo Especial do Rio de Janeiro para o Carnaval 2022. A escola de Duque de Caxias fechou com 9,93. A Mocidade e a Viradouro em segundo com 9,92 e Beija-Flor e Tuiuti em terceiro com 9,89.

Unidos da Tijuca com 9,86. Vila Isabel teve 9,85. Portela com 9.84, Imperatriz com 9.83, Salgueiro com 9,80. São Clemente com 9,79 e Mangueira com 9,78.

Abaixo, você confere o ranking dos sambas do Grupo Especial após as três etapas da pesquisa. A quarta e última etapa será de 18 de novembro até 30 de novembro.

Grande Rio (OUÇA AQUI O SAMBA): 29.63
Beija-Flor (OUÇA AQUI O SAMBA): 29,59
Mocidade (OUÇA AQUI O SAMBA): 29,42
Viradouro (OUÇA AQUI O SAMBA): 29,40
Unidos da Tijuca (OUÇA AQUI O SAMBA): 29,36
Paraíso do Tuiuti (OUÇA AQUI O SAMBA): 29,35
Vila Isabel (OUÇA AQUI O SAMBA): 29,33
Imperatriz (OUÇA AQUI O SAMBA): 29,23
Salgueiro (OUÇA AQUI O SAMBA): 29,16
Portela (OUÇA AQUI O SAMBA): 29,15
Mangueira (OUÇA AQUI O SAMBA): 29,11
São Clemente (OUÇA AQUI O SAMBA): 29,04

Leonardo Antan: ‘Louvar sua própria história é o grande trunfo das escolas para o retorno da folia’

Ao longe, acho que já dá para ouvir o rufar das batucadas. Parece distante, é bem verdade, mas não tanto quanto o maior hiato que o desfile das escolas de samba já enfrentou em sua história. Sei lá, talvez eu esteja ficando doido após tanto silêncio. Mas o cenário é favorável para que possamos nos reencontrar com o chão cinza e as arquibancadas de concreto da Marquês de Sapucaí. É um reencontro com quem somos, nossa gente, nosso país e nossas histórias. A cada desfile, somos atravessados pelas subjetividades e emoções que nos fizeram amante dessa festa.

Ao longo de oito décadas de cortejos, nunca tivemos tanto tempo para maturar os enredos a serem desenvolvidos. E pensar que até a década de 1970 era comum agremiações anunciarem seus temas só depois da virada do ano, hoje é algo impensável. Desde março de 2020, já temos enredos e sinopses sendo anunciados e, assim, ao longo dos meses, essas narrativas vão se reconstruindo, ganhando novos sabores e se remodelando até ganharam seu contorno final nos dias da folia. Pra isso, o ritmo na Cidade do Samba aos poucos vai se acelerando, a maioria dos barracões já deu alguma largada para a produção dos seus desfiles.

Mas que cenário é esse que vivem as escolas de samba de 2022? O que dois anos de hiato ensinaram para as agremiações? O contexto municipal é completamente diferente, saí o Bispo e entra o sambista, mas ainda enfrentamos governantes ignorantes da potência da nossa festa em diversas esferas. A crise social e econômica que enfrentamos fez sumir de vez os temas patrocinados e, no contexto artístico, já parece clichê afirmar o surgimento de uma “nova geração de artistas”. Das seis primeiras posições de 2020, a maioria era assinada por artistas que surgiram no Especial há menos de dez anos.

E o que isso trouxe de frescor para os temas a serem desenvolvidos? Tudo. Vivemos hoje um carnaval que se importa muito mais com o “discurso”, mesmo que o artístico e administrativo ainda entrem em conflito, gerando contradições instigantes. Se houve um tempo esteve em moda falar em patrocínio, hoje, parece fundamental falar de pautas socias e cotidianas. Pensando nisso, é impossível não começar falando do carnaval que se aproxima sem apontar a predominância dos chamados “enredos afro”.

O que levanta várias outras questões. Primeiro, a de se debater o que de fato abarca essa terminologia genérica e suas múltiplas possibilidades. O que é um enredo afro? Existe apenas um eixo ou vários? Podem ser as narrativas com foco nas religiões afro-brasileiras, caso de Grande Rio e Mocidade, ou que versam sobre figuras pretas, como Vila Isabel e Mangueira. Há ainda reflexões críticas e que abarcam a questão social, como Salgueiro, Tuiuti, Portela e Beija-Flor. É um leque complexo e instigante, sobretudo por se tratar, em sua grande maioria, de narrativas muito bem desenvolvidas e necessárias.

Temos, sem dúvidas, uma safra forte e potente de enredos a serem levados para a Avenida em 22. Temas que dialogam com o nosso momento histórico, dos casos de racismo que foram discutidos nos contextos nacional ou internacional. E, não, nunca é “demais” temas dessa natureza. Ainda mais quando a própria variedade de oito narrativas chamadas “afro” nos indica diferentes vertentes e prismas para repensar a diáspora africana, as religiosidades brasileiras, questões sociais e, principalmente, a presença negra na cultura brasileira. Definitivamente “enredo afro” não é tudo igual.

O que mais me chama atenção num primeiro olhar dessas narrativas é a forma como algumas agremiações costuraram seus enredos a si mesmas, louvando sua própria trajetória. Fazendo uma analogia básica, a mesma peça de roupa em várias pessoas possui caimentos diferentes. Parece ser o mesmo caso. Uma escola de samba é um corpo coletivo único, com uma identidade forjada ao longo das suas trajetórias, com signos que ajudam a reconhecê-las comunitariamente. Sejam desde signos mais básicos, como cores e mascotes, como os enredos e o tipo de sambas que melhor vestem essas agremiações.

Pensando nisso, é de grande valor quando uma instituição cultural consegue costurar de maneira natural ao seu enredo a sua própria história e seus personagens. É um exercício tanto de memória, que ajuda a consolidar os nossos artistas do carnaval, como de afirmação dos valores que ajudam a consolidar essa noção de pertencimento coletivo. Quase todas as agremiações conseguiram trazer esse valor para os seus enredos. Ou seja, tornar aquela narrativa única a partir do seu próprio olhar.

A Portela é uma escola que ficou conhecida por usar bastante esse tipo de recurso. Seja qual fosse o enredo, geralmente estão lá citações a Paulo da Portela, Candeia, Clara, Natal e tantos outros. Mas em um país que cuida tão pouco da sua memória, quem vai cuidar melhor do seu legado senão ela mesmo? Por mais que as vezes o excesso seja um pecado, quando esse processo é bem feito gera identificação e mais valor ao desfile.

Ao cantar “Igi Osè Baobá”, a Águia de Madureira certamente não deixará de louvar os frutos de sua jaqueira e da sua Velha Guarda. E, dessa vez, nada mais propício do que costurar a resistência da cultura afro-brasileira através do próprio samba e de suas escolas. Esse mesmo recurso narrativo é presente mais visivelmente nos enredos de Salgueiro, Beija-Flor e Mocidade. A verde e branco explora a ligação do orixá Oxóssi com a sua bateria, aproveitando para louvar seus ritmistas e músicos. Desde o lendário Mestre André como nomes que vão ser apresentados ao grande público através do seu cortejo, como Quirino e Tia Chica.

É o mesmo caso de Cabana, um dos grandes intelectuais da Beija-Flor que será louvado pela azul e branco dentro do fio narrativo que envolve “Empretecer o pensamento é ouvir a voz da Beija-Flor”. O título já deixa claro a intenção de valorizar a voz da própria escola. Isso seja tanto pelos seus artistas em destaque, como Selminha e Neguinho, como toda a comunidade preta que rasga o chão da Sapucaí ano a ano. É um traço que traz originalidade e assinatura para uma escola acostumada a cantar os chamados “enredos afros”, ainda mais após uma mal sucedida auto-homenagem em 2019.

Outra agremiação com tradição nessa linha temática, o Salgueiro não poderá deixar de se incluir como uma das formas de “Resistência” do seu enredo assim batizado. Para isso, podemos aguardar referências aos seus carnavais históricos da década de 1960. E por falar da própria folia, há casos em que contar sua história é o grande trunfo e mote principal da narrativa. Entram nessa categoria, os temas de Vila Isabel, Imperatriz e Mangueira, como o trio “Angenor, José e Laurindo” na verde e rosa; o negro rei Martinho na azul e branco do bairro de Noel e o histórico carnavalesco Arlindo Rodrigues na verde e branco da Leopoldina.

E não para por aí. Em alguns outros exemplos, essa ligação não estão tão explícita, mas também se faz presente. A Grande Rio, por exemplo, busca um elo com a comunidade de Duque de Caxias ao usar como figura-chave a filósofa urbana Estamira, que habitava o aterro sanitário de Gramacho, em seu enredo sobre Exú. No caso da Unidos da Tijuca, o fio que conecta a narrativa de Jack Vasconcelos com história da azul e amarelo é a afirmativa de resgatar os enredos indígenas que foram desenvolvidas por Oswaldo Jardim na agremiação.

Enfim, são múltiplas ligações, múltiplas leituras que nos ajudam a perceber o ponto forte de cada narrativa. Esse texto, serviu apenas como um panorama do que teremos em temos de enredo para o carnaval que se desenha. Ao logo das próximas semanas, eu volto nesse espaço gentilmente cedido pelo Carnavalesco para explorar outras vertentes e potências para 2022, trazendo escolas que ainda não foram citadas e aprofundando outras.

  • Leonardo Antan é mestre e graduado em História da Arte pela UERJ, com pesquisas sobre o carnaval carioca. É ainda curador, editor e produtor cultural, ligado ao coletivo multiplataforma Carnavalize. Lançou recentemente o livro “Laroyê Xica da Silva” e a exposição virtual “Sal60”.

Império da Tijuca 2022: samba-enredo oficial

Compositores: Paulinho Bandolim, Guilherme Sá, Edgar Filho
Intérprete: Daniel Silva

Clamo a presença dos ancestrais
Arde a chama na candeia, a luz dos seus ideais
Livre, o samba faz escola, manifesto no terreiro
Sou quilombola
Vou de pé no chão
Resgatar a pureza dos meus carnavais
O novo pavilhão
Foi Oxum quem bordou de dourado e lilás
Vem maracatu do caboclo lanceiro
Dança o caxambu, jongueiro
Saravá lundú, afoxé, capoeira
No rabo de arraia não leva rasteira

Puxa o partido pro mestre versar (Candeia!) BIS
Firma na palma da mão a noite inteira
Risca no amoladinho, ioiô
Ô iaiá, vem mexer com as cadeiras (vem sambar)

Sou da arte negra sentinela
Um quilombo em cada favela
Contra toda forma de opressão
Sou a poesia sem mordaça
Tambores em dia de graça
Heróis e heroínas da abolição
Sou o canto forte de Palmares
A vibrar pela cidade
Um grito sufocado a resistir
Inspiro a verdadeira liberdade
Valeu, Zumbi

Quem leva a noite na cor BIS
De verde e branco é rei
Mostra seu valor
No Império da Tijuca
Negritude é lei (Negritude é lei, é lei)