Quem conhece e vive de perto a realidade das escolas de samba sabe que as agremiações estão muito além de um desfile. Muitas possuem projetos sociais capazes de mudarem a vida das pessoas, e em diversos casos salvarem da criminalidade, quando se trata das agremiações que estão localizadas em áreas de alta periculosidade. Some-se a isso o fato de que elas geram diversos empregos diretos em seus barracões e quadras, além de indiretos com seus eventos e ensaios de rua.

Entidades não filantrópicas, as escolas de samba possuem responsabilidade social. E o caso que o CARNAVALESCO relata mostra como às vezes até sem intenção, as agremiações podem desempenhar um papel de salvar a vida de uma pessoa.

O ano era 2017. O torcedor do Cubango tem motivos para esquecer o desfile daquele ano. Cheio de problemas, um dos piores da história recente da agremiação de Niterói. Mas para uma componente muito especial aquela apresentação foi a mais importante da sua vida. Rafaella Dociane lutava contra depressão e síndrome do pânico. De acordo com dados da Organização Mundial de Saúde (OMS), 5,8% da população brasileira sofria de depressão em 2017. Em tratamento contra as duas doenças, ela recebeu o convite de amigos para desfilar no Cubango no ano que a escola homenageava João Nogueira.

Como acontece com todas as pessoas que sofrem da Síndrome do Pânico, Rafaella em um primeiro momento relutou ao convite devido à grande aglomeração de pessoas nos desfiles da Sapucaí. Mas ela foi convencida pelos amigos e voltava a desfilar, atividade que fez por muitos anos em sua vida. O desfile jamais sairá da cabeça da componente, pois segundo ela foi um momento determinante para se curar das duas doenças, como a própria relata à reportagem do CARNAVALESCO.

“Eu tive uma depressão pós-parto muito forte. Eu desfilei muito tempo da minha vida. É um distúrbio terrível, a sensação de medo o tempo todo. Eu pensei que jamais conseguiria novamente frequentar lugares públicos. Mas aí veio essa ideia de amigos de desfilar no Cubango, que falaria do João Nogueira. Em um primeiro momento eu senti muito medo, não queria ir. Mas eu fui convencida. Foi a melhor coisa que eu fiz na vida, pois afirmo que foi determinante para me curar”, relata Rafaella.

Componente se emociona com convite para desfilar

A história de Rafaella com o Cubango veio à tona através das redes sociais. A escola postou um pedido aos componentes da verde e branco para que eles levassem amuletos de antigos carnavais que estariam na terceira alegoria da escola no enredo ‘Igbá Cubango – a alma das coisas e a arte dos milagres’. Márcia comentou a postagem afirmando que seu amuleto era a própria Cubango, relatando sua história de superação. O caso sensibilizou a dupla de carnavalescos Leonardo Bora e Gabriel Haddad, que tomou a decisão de convidar Márcia para estar no carro que trará amuletos e contará a relação do brasileiro com os ex-votos e as promessas.

“É uma história extremamente tocante. A gente vive um momento de tamanho ataque à cultura do carnaval, e recebemos um presente desses, porque uma história como a da Rafaella é algo que não tem como não emocionar a gente. Pensar que um desfile, onde milhares de pessoas estão envolvidas, pode significar tanto para uma pessoa. Fazemos questão de convidar Márcia para estar no nosso desfile, na nossa alegoria dos ex-votos. Ela é o nosso grande amuleto para o desfile de 2019”, conta Leonardo Bora.

A reportagem do CARNAVALESCO preparou uma grande surpresa para Rafaella. Não avisamos que ela seria convidada a desfilar. Dissemos que seria uma reportagem sobre a sua história. Ao chegar ao barracão, durante a entrevista, Leonardo Bora e Gabriel Haddad chamaram-na para desfilar e a componente não segurou a emoção, algo que tocou a todos presentes na sala dos carnavalescos.

“Não consigo nem traduzir em palavras algo como isso. Não esperava mesmo que a minha história fosse comover assim. Estou muito emocionada. Vocês não sabem o bem que estão me proporcionando. Eu amo o carnaval e foi ele quem salvou a minha vida. Eu jamais vou esquecer uma homenagem como essa”, declarou Rafaella aos prantos.

O carnavalesco Gabriel Haddad reforça que o carnaval está muito acima de um desfile de escola de samba e disse à Rafaella que quem estava os ajudando era ela e não o contrário.

“O pesquisador e historiador Luiz Antônio Simas tem uma frase que eu acho fundamental. As escolas não existem porque desfilam. Elas desfilam porque existem. A avenida é um dia. Claro que todos querem ganhar, mas o papel de uma escola de samba está muito acima de um resultado, de um quesito. Histórias como essa da Márcia é que deixam claro o porque da existência das agremiações. É ela quem está nos ajudando, podem ter certeza disso”, relata Haddad.

A Acadêmicos do Cubango encerra o desfile da Série A no sábado de carnaval, apresentando o enredo ‘Igbá Cubango – a alma das coisas e a arte dos milagres’. A dupla Leonardo Bora e Gabriel Haddad desenvolve o tema da escola pelo segundo ano consecutivo.

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