O povo nordestino é forte como as raízes do mandacaru, planta típica do sertão que é capaz de sobreviver às difíceis provações que o semiárido proporciona. Histórias, costumes e a fé das pessoas dessa região estarão presentes no Sambódromo do Anhembi em 2024 através do desfile da Colorado do Brás, que apresentará o enredo “Os Encantos da Raiz do Mandacaru”. O carnavalesco Anselmo Brito recebeu o site CARNAVALESCO para falar a respeito do projeto da escola como parte da Série “Barracões”.
Raiz forte de mandacaru
Anselmo Brito explica que o enredo da Colorado do Brás faz uma analogia entre o mandacaru e os nordestinos para falar da formação histórica e cultural do Nordeste.
“A Colorado do Brás convida todo mundo para uma viagem muito bem arretada e divertida, como tem que ser quando se fala de Nordeste. É mostrar um povo que a gente tem um carinho imenso. Um povo muito aguerrido, construtor e cheio de histórias. Vamos começar a falar de história, prosear um pouco. Nós escolhemos como tema de enredo uma das raízes mais importantes do Nordeste, que é o próprio mandacaru. Uma raiz muito típica do Nordeste, marcante pela sua força, por se dar em lugares não tão esperados e levando sua beleza para aquele lugar. Nós vamos fazer uma analogia dessa raiz com o povo nordestino, porque o povo nordestino é isso. Ele é resistência, ele é força, ele tem histórias e gosta de história”, declarou.
O mandacaru no desfile se fará presente através dos contos de cordel, com a comissão de frente tendo o papel de apresentar o personagem que conduzirá a narrativa do enredo inspirado na força que a planta representa.
“Dentro desse enredo a gente estará vendo o povo nordestino através do mandacaru, mas a gente vai ter a presença do mandacaru no meio dessa história. Nós vamos ter na comissão de frente, aonde vamos trazer o cordel. O cordel retrata bastante isso, e nós vamos criar a história de um repentista. O repentista vai estar aos pés do mandacaru para fazer essa analogia”, contou Anselmo.
Folclore, fé e festividades: A Colorado em setores
A Colorado do Brás fará um desfile dividido em três setores, e o primeiro deles abordará o folclore nordestino. O principal destaque será uma história do período colonial inventada para espantar invasores de outros países interessados nas terras nordestinas.
“Nós vamos dar início ao nosso desfile onde a ambição aportou o mar. Quando os colonizadores avançam ao mar a encontro das Índias, e o destino fez com que eles se perdessem. O nordestino não fala que acredita no acaso, mas que era para ser assim. As caravelas chegam em território brasileiro, e quando chegam muitas delas encontram um mar muito hostil, revolto. Muitos desses navios não estavam preparados para essas condições e muitos deles naufragaram. Só que o português, ao chegar em terras nordestinas, se encantou com tudo aquilo que viu, e ali ele recebeu uma notícia. ’Olha, os holandeses também estão vindo para cá’, e como uma maneira de não ter novos invasores e não dar de mão, até porque na época os holandeses tinham uma estrutura naval muito maior do que os portugueses, eles criaram uma historinha que funcionou bastante. Eles começaram a espalhar que muitos navios lusitanos acabaram naufragando em mares brasileiros, especificamente do Nordeste aonde monstros, serpentes, engoliam esses navios e levavam para as profundezas do mar. Isso assustou os holandeses, que foram para outro caminho. Então você vê que uma história contada pelo povo nordestino, mas que faz parte do povo lusitano. É isso que nós vamos mostrar, que esse povo é rico em cultura, é rico em folclore. Nós vamos mostrar a importância da cultura nordestina”, explicou Anselmo.
O segundo setor passará a abordar a fé do povo nordestino, com destaque especial para o tradicional ritual da Lavagem do Bonfim, que ocorre todo mês de janeiro em Salvador, na Bahia.
“Em um outro momento nós vamos mostrar a importância da fé. Não tem povo que tem mais fé do que o povo nordestino. Ele chama por Mãinha, ele chama por Oxalá, ele chama por Buda, ele chama por tudo. É um povo que acredita em todas as crenças. É um momento em que na nossa segunda alegoria nós vamos mostrar isso. Nós vamos mostrar a lavagem do Bonfim, que é um ato de fé realizado em Salvador diante da Baía de Todos os Santos, onde baianas fazem a lavagem daquela escadaria todo mês de janeiro para pedir paz, purificar o corpo, trazer coisas boas, lavar tudo de ruim. Nessa mesma alegoria nós vamos contemplar a questão católica, que é muito forte. Toda casa nordestina tem que ter seja Padim Cícero ou Nossa Senhora, mas tem que ter. Tem que ter alguma coisa religiosa, e nós vamos trazer a figura de Nossa Senhora retratada no Auto da Compadecida e caracterizada de forma bem nordestina. O manto dela vai ser de chita para estar como se ela estivesse levando no seu próprio manto todo o povo nordestino, protegendo todos eles”, detalhou o carnavalesco.
A cultura do Nordeste ilustrada através das tradicionais festas populares será a encarregada de encerrar o desfile da Colorado do Brás, e Anselmo Brito garante que a alegria do povo nordestino será elemento de grande destaque nesse setor.
“Vamos terminar o nosso desfile no terceiro setor com muita alegria, como são as noites de São João. O céu enfeitado de balões, de bandeirinhas e a quadrilha das festas de São João. Também retrataremos a arte de Mestre Vitalino com os seus bonecos de barro, as bandas de pife, que se fazem muito presente no Nordeste todo. Nós vamos apresentar dessa forma a alegria, a dança e a cultura do povo nordestino, de um povo bem arretado. No último carro o mandacaru sendo presente, só que ele já não vai estar mais no chão rachado. Ele vai estar num espaço cultural, enraizado na cultura. É como se brotasse do chão numa noite de São João para dizer que essa é a raiz, esse é o fundamento disso, de uma raiz, e que ela está presente em todo momento”, afirmou.
Cordel e humor do nordestino encantam Anselmo Brito
Ao longo do processo de pesquisas para a construção do enredo, Anselmo Brito se deparou com incontáveis elementos da rica cultura nordestina, e uma das mais populares formas de expressão regional conquistou o carnavalesco.
“Foram muitos, mas eu me encantei com o cordel. Eu acho que o cordel é a maneira mais divertida e mais didática para você conhecer o Nordeste e o próprio nordestino. Eu me apeguei em obras de muitos artistas, através do próprio elemento, e mais do que isso. Da pesquisa de um dos personagens mais importantes do Nordeste, que é Ariano Suassuna. As obras dele são incríveis, e ele retrata muito bem isso”, revelou.
Além da cultura, uma característica do povo nordestino que encantou Anselmo é o humor. A forma alegre de levar a vida e falar de si próprio se fará presente ao longo do desfile da Colorado do Brás.
“O sorriso, a alegria do povo nordestino e o humor, que acho muito engraçado. O povo nordestino é muito divertido, ele conta até as suas mazelas de uma forma divertida, tanto é que o nosso Abre-alas é uma paródia de um momento trágico, que são os navios chegando para colonizar as nossas terras com um único objetivo, da ambição. A ambição aporta em terras nordestinas, e mesmo assim esse povo conta isso de uma forma engraçada e divertida. Eles criaram até lendas. Lendas contadas pelo seu próprio povo. Isso é uma tradição nordestina que a gente vê refletida aqui em São Paulo no Centro de Tradições Nordestinas. A gente tem um pedacinho de Nordeste ali”, concluiu.
Ficha técnica
Enredo: “Os encantos da raiz do mandacaru”
1.600 componentes
13 alas
3 alegorias