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Série ‘Barracões’: União da Ilha caminha na fé em Nossa Senhora Aparecida

A União da Ilha teve no seu último carnaval, muitos problemas técnicos graves, e acabou rebaixada no Grupo Especial. De 2020 para cá, muitas movimentações aconteceram internamente, inclusive, uma nova votação para presidência por conta do falecimento do ex-presidente Djalma Falcão. Com a chegada do presidente Ney Filardi, a tricolor insulana iniciou um processo de resgate da alegria característica da Ilha. Pensando em não repetir os mesmos erros de 2020, a equipe de direção de carnaval em conjunto com os carnavalescos Cahê Rodrigues e o falecido, Severo Luzardo, chegaram na definição do enredo ‘O Vendedor de Orações’. A equipe do CARNAVALESCO esteve presente no barracão da escola e participou da coletiva de impressa com Cahê Rodrigues e Dudu Azevedo. Cahê foi quem falou sobre o processo de escolha desse enredo, o que tem de influência do Severo Luzardo na preparação para esse desfile que promete apagar um ano carnaval desastroso da Ilha e qual a mensagem que a escola deseja passar na avenida.

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“Quem trouxe o enredo foi o Severo e o Ney enquanto devoto acaba abraçando. A direção de carnaval também entendeu que era um enredo adequado para o momento que a população vem enfrentando e seria bacana retomar o carnaval falando de esperança, de fé e milagres. O enredo foi abraçado automaticamente na primeira lida do texto da sinopse e o desfile em si tem muito do Severo, tem o sentimento inicial trazido por ele. O desenvolvimento foi feito por nós dois desde o primeiro momento, é claro que nossa amizade facilitava muito a troca. A gente tinha o mesmo sentimento em relação ao desfile. Severo era apaixonado pela Ilha, ele que me trouxe para cá, porque quando acontece a vinda do Laíla, o Severo não quis continuar e quem indica meu nome foi ele. Quando o Ney assume a escola, ele me mantém e convida o Severo para fazer parte da equipe, então todo processo criativo foi feito por nós dois. Hoje, com a ausência dele, toda a minha luta dentro do barracão é para a gente preservar a memória dele e suas ideias iniciais. É claro que aconteceram modificações, porque a partir do momento que se tem duas pessoas e uma delas não está mais, nós passamos a ter que tomar algumas decisões, mas nada que mudasse a ideia, roteiro e rumo do desfile. Não era muito uma questão de criar, era questão de enfeite e finalização de projeto”, afirmou Cahê Rodrigues.

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O enredo, “O vendedor de Orações”, traz a história do escravo Zacarias, que após fugido da fazenda em que era escravo, é perseguido e capturado por um capataz da fazenda e depois acaba acorrentado. Adiante, Zacarias será levado ao açoite e quando está no caminho para lá, ele passa na frente de uma capela, pede permissão para fazer uma prece antes do castigo e tem a permissão concedida. Zacarias se ajoelha e pede sua liberdade a Nossa Senhora Aparecida, como um milagre suas correntes se arrebentam, o capataz se rende aos pés da santa e Zacarias promete virar seu peregrino. A União da Ilha acredita que a história de Zacarias é a aposta certa para tirar da memória o clima pesado deixado na avenida no último ano, mas também acredita que sirva de inspiração para a quebra das amarras da vida através de fé e alegria.

“Quando olhamos para a história do Zacarias que foi um negro acorrentado que fugiu para ser livre, é perseguido, capturado e acorrentado e num momento de fé e desespero ele faz uma prece e essas correntes se arrebentam, a analogia que a União da Ilha faz para esse carnaval é que qualquer um de nós que tenha fé no coração é capaz de arrebentar qualquer barreira e qualquer corrente. Muitas das vezes nos vemos nesse caminho sem luz, principalmente, no que foi esse momento de pandemia, porque vivemos praticamente dois anos de incertezas, sem saber o que seria da gente, qual seria o nosso futuro, se vai ter trabalho, se vai ter comida na mesa. Como sobrevive com essas incertezas todas? Na história do escravo Zacarias nós vemos exatamente isso, vemos que nada é impossível quando você crê de verdade. Da mesma forma que as correntes dele foram arrebentadas, as nossas correntes do dia a dia também podem ser arrebentadas através da nossa fé e a mensagem que a Ilha vai levar para avenida é que nada é impossível para aquele que crê em algo”, explica Cahê.

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Para desenvolver um desfile em cima desse tema, a União da Ilha se preocupou desde o início do trabalho em estar em contato com a igreja. Por meio do carnavalesco Severo Luzardo, a escola fez o primeiro contato e enviou por escrito a sinopse do enredo com um pedido de autorização. Receberam o sim como resposta, desde que observassem as pontuações feitas na sua sinopse e modificassem os pontos. Com o sinal positivo dado pela igreja, Severo e Cahê iniciaram os trabalhos de elaboração do desfile, todavia, no meio do percurso o carnavalesco Severo Luzardo adoeceu e se afastou do barracão.

Com Severo distante, Cahê assumiu toda a frente do barracão e encontrou dificuldades na adaptação dos trabalhos sem seu colega e amigo, pois como trabalhavam em dupla eles fazia uma divisão de tarefas com objetivo de não sobrecarregar um ou outro, logo, havia informações de tarefas do Severo que o Cahê não tinha acesso e eram fundamentais para o desenvolvimento do trabalho.

“A gente tinha uma divisão de tarefas no processo para não sobrecarregar nem um e nem o outro, aí quando ele começou a se afastar do barracão acabou que muitas informações ficaram com ele e nós entendíamos que não poderíamos passar por cima dele, até porque a gente acreditava que ele iria voltar, só que ele foi começando a se agravar e quando começou uma pressão da Liga sobre as documentações e toda aquela coisa de defesa, tinham coisas que eu não tinha e que eram dele, aí foi quando eu liguei pro filho dele para entender o que realmente estava acontecendo. Severo era muito reservado nesse sentido, ele não abriu o jogo para ninguém, nem para mim e para o Ney. Aí o filho dele que foi falar que ele na verdade estava internado já fazia mais ou menos três semanas e ele falou ‘Olha, meu pai não vai ter condições de voltar para escola. Mesmo ele saindo do hospital, ele não terá condições de ir para o barracão, segue o trabalho, porque meu pai não está tendo nem mais condições de escrever direito’. Pedi para ele me trazer tudo que o Severo tivesse de informação. Procurei tudo que tínhamos em conversas, estudei a ideia dele e comecei a montar o quebra cabeça. Foi uma loucura, mas a gente conseguiu amarrar a história toda, conseguiu montar o quebra cabeça e graças a Deus eu hoje estou tranquilo, porque a Ilha vai para avenida respeitando a ideia e sentimento do Severo desde o início mesmo que eu esteja na frente do projeto”, relatou Cahê.

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Ainda sobre adaptação, é interessante saber que a União da Ilha se desfez de tudo referente ao carnaval que pretende ser esquecido. Começando pelo carro que parou na avenida e indo até as fantasias, porém, para não dizer que absolutamente tudo foi embora, a escola ainda possui as estruturas de ferro dos carros passados, porque o poder de investimento no Grupo de Acesso é bem inferior ao Especial. Por conta disso, a Ilha também montou o desfile de 2022 utilizando e resgatando peças do Grupo Especial, no entanto, como possui boa estrutura de trabalho, foram feitas modificações de design e cores de alguns elementos. Vale ressaltar também, que foram criteriosos na escolha das peças de reaproveitamento e para o público, não será fácil identificar os elementos vindos de outras escolas.

“A comissão será um ponto altíssimo, mas não vai ser o mais emocionante porque esse ano o desfile todo da Ilha será emocionante. Acredito que a presença do escravo Zacarias será muito forte e simbólica. E esse escravo virá em diversos pontos do desfile e em épocas diferentes, porque terá o escravo aprisionado, o processo de libertação dele e depois o vendedor das orações, então o público vai acompanhar toda trajetória desse escravo até ele ser abençoado por Nossa Senhora Aparecida, que em determinado ponto do desfile irá passar pela metamorfose do sincretismo religioso e virará mamãe Oxum. Vai ser um desfile gostoso, porque está muito didático, a leitura está fácil, as cores estão leves, tem o vermelho, o azul e tem muito dourado. Tem uma abertura de desfile com muito vermelho, porque falamos do sangue negro e da luta pela liberdade, mas depois resgatamos a nobreza africana através da liberdade… teve toda uma poesia na construção e acabou dando um desenho gostoso de acompanhar”, informou Cahê Rodrigues.

Entenda o desfile

1 º setor: Os mistérios da fé. Setor em que a Ilha conta um pouco da transição do escravo Zacarias desde a sua captura até o momento de sua libertação e quando acontece a metamorfose de um escravo aprisionado para um príncipe africano aos olhos de Nossa Senhora Aparecida. Esse primeiro setor vai da comissão de frente até o carro abre alas.

2º setor: Caminhos da fé. Setor que apresenta quando Zacarias se torna um peregrino vendedor de orações. É quando a escola mostra um pouco do andarilho e os cantos que ele percorreu mostrando a imagem da santa, as pessoas que ele conheceu na caminhada e a aventura que ele percorreu nessa libertação.

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3º Setor: As duas faces da mãe preta do Brasil. Setor em que a escola entra no sincretismo existente no Brasil, fala um pouco da transição, conta sobre a perseguição que os pretos sofriam por conta dos seus cultos chegando até a ‘Mãe do Ouro’, que é a alegoria que encerra o terceiro setor da escola.

4° Setor: A devoção da Ilha. Setor de encerramento, será aquele que mostrará toda a relação da fé do torcedor da escola. Será apresentada uma grande caminhada de devoção em que terão outros milagres da Nossa Senhora Aparecida e haverá o convite a todo o público a ser abençoado de alguma forma com o manto da santa.

Ficha técnica do barracão
Diretor de barracão: Luiz
Chefe de ateliê: Ana, Ricardo, Cleo e Tereza
Ferreiro chefe: Jhow
Madeira: Castelinho e Washington
Pintura de arte: Clécio e Sávio
Artista de Parintins responsável por dar movimento a algumas peças: Augles
Iluminação: Fuca
Desfile
Alas: 22
Alegorias: 3
Tripé: 2. Um tripé como elemento

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