Apostando em unir a experiência e a juventude na construção criativa, o Tuiuti constituiu uma parceria entre Rosa Magalhães e João Vitor. Com sete títulos no Grupo Especial por Imperatriz, Império Serrano e Vila Isabel, Rosa fará sua estreia na Azul e Amarela de São Cristóvão buscando voltar a produzir um desfile que volte às colocações de cima. Já João Vitor, após desenvolver o carnaval do Cubango em 2022, está de volta ao Tuiuti, escola que produziu um carnaval bastante elogiado em 2020. De pano de fundo para essas novidades, estará o enredo “Mogangueiro da Cara Preta” que vai contar a chegada dos búfalos e sua adaptação a Ilha de Marajó, além de aproveitar para levar para Sapucaí toda a riqueza cultural da região insular no estado do Pará. Após o vice-campeonato em 2018 com um carnaval digno de título, e sustentando grandes sambas nos últimos anos, ainda há expectativa de que a escola de São Cristóvão possa repetir a dose e surpreender produzindo um carnaval que figure mais uma vez entre os melhores do ano.
João Vitor Araújo conta que o enredo foi sugerido pelo próprio presidente Renato Thor e desenvolvido até tomar a forma que tem hoje pelo próprio carnavalesco e pela professora Rosa Magalhães.
“A ideia surgiu do nosso presidente. Ele deu esse ponto de partida para a gente por ser apaixonado por Belém e pelo Pará em geral. Queria que a gente contasse alguma coisa relacionada ao estado. Ele acha que é um estado muito rico de cultura, formações. Eu questionei o fato da Imperatriz já ter feito, a Viradouro já ter feito e de forma muito bem feita. Aí a Rosa também fez o mesmo questionamento sobre esses dois carnavais exaltando o Pará feitos de forma magnífica. A gente teve uma certa liberdade nesse desenvolvimento. Foi quando a gente decidiu partir para a Ilha de Marajó e não fazer aquele tradicional enredo C.E.P que todo mundo está acostumado, sobre a colonização, sobre a formação, e etc. Nós decidimos ir a partir da figura do búfalo, o nosso ‘Mogangueiro da Cara Preta’, que se tornou o protagonista dessa história toda”, explicou João Vitor.
A carnavalesca Rosa Magalhães já havia tido contato com a região por trabalhos que havia feito fora do carnaval. Na pesquisa realizada pela dupla, João Vitor conta que os dois passaram a conhecer muita coisa sobre a riqueza cultural da região e história, inclusive descobriram um local para festa bem parecido com a folia que acontece na Marquês de Sapucaí.
“Tudo era muito interessante, porque era uma história desconhecida até então. A gente partiu em busca de algo diferenciado e tudo para gente era novidade. Acho que ninguém conhecia de fato como os búfalos chegaram ao Brasil, como eles se adaptaram tão bem ao clima brasileiro. E a gente não sabia a importância que eles têm na Ilha de Marajó, a forma que eles são tratados, a forma com que as pessoas dependem desse animal para sobreviver. É um animal presente na vida de todos os moradores dali e de diversas formas. Tudo nessa pesquisa foi uma novidade para a gente. Até descobrir, por exemplo, que nos dias de carnaval a rua principal se transforma em um Bufódromo. A gente tem o sambódromo, Parintins tem o Bumbódromo, e em Marajó tem o Bufódromo. Isso é sensacional”, acredita o carnavalesco.
Mesmo sem viajar ao estado no período de pesquisa, Rosa e João realizaram a pesquisa da melhor forma possível, trocando bastante informações. O carnavalesco conta que a expectativa pelo carnaval do Tuiuti não é só da população regional da Ilha de Marajó, mas o enredo conquistou outras regiões do estado.
“Não chegamos a viajar. A Rosa já conhece Marajó, já fez alguns trabalhos na época dela de televisão e eu estou indo na última semana a Belém para falar um pouco sobre o trabalho, vou participar de um outro evento, mas obviamente estão todos curiosos para saber como está esse carnaval do Paraíso do Tuiuti, como vai se desenrolar essa história do Mogangueiro da Cara Preta. Inclusive é um enredo que é bem focado na Ilha de Marajó, mas todo o estado do Pará está muito mobilizado. Eu recebo muitas mensagens nas minhas redes sociais das pessoas dizendo que nem conhecem carnaval mas que o Tuiuti vai ganhar pelo enredo. A corrente do povo de lá é gigantesca. Uma corrente do bem, uma corrente positiva para que dê tudo certo”.
Desfile terá mestre Damasceno como narrador
Uma das figuras mais expressivas da cultura popular do estado do Pará, e em especial da cultura marajoara, é mestre Damasceno. Cantor de carimbó, compositor de sambas, repentista, poeta, pescador e artesão. Tudo isso e muito mais formam a história de Damasceno Gregório dos Santos que terá função muito importante no desfile do Paraíso do Tuiuti em 2023.
“Mestre Damasceno é o cantador dessa história toda. Na verdade, tudo é uma descoberta, o Igor(assessor de imprensa do Tuiuti) apresentou para mim e para Rosa mestre Damasceno, que ela trabalhava de lá, e eu trabalhava de cá e tinha o Igor ali também trabalhando enriquecendo esse enredo. Ele trouxe para mim um relatório dizendo que esse homem tinha que estar dentro do enredo. Levei para a Rosa e ela se apaixonou pela importância do mestre Damasceno na Ilha de Marajó, e é como se ele estivesse contando essa história toda para o público. Ele é o grande narrador do Mogangueiro da Cara Preta”, revela João Vitor Araújo.
Segundo a EBC, o artista tem mais de 400 composições entre toadas de boi-bumbá, carimbós, xotes, chulas, sambas e até bregas. Em 2010 recebeu do Ministério da Cultura o “Prêmio Maria Isabel” por sua dedicação à cultura marajoara. Mestre Damasceno também foi o criador do “Búfalo-Bumbá”, adaptação do Auto do Boi, tendo como figura o animal expoente da Ilha de Marajó, o búfalo.
Divisão de trabalho da dupla Rosa e João
O Tuiuti tem apostado em grandes nomes para comandar seus carnavais. Em 2022, Paulo Barros produziu “Ka Ríba Tí ye”. Em 2023, a escola terá uma das maiores campeãs do carnaval, a professora Rosa Magalhães. Mas, a agremiação também apostou em trazer de volta um velho conhecido da casa que deu muito certo no carnaval de 2020, apesar de a escola não ter tido um julgamento tão condizente em termos de colocação. João Vitor chega já conhecendo a agremiação e esperando que a dupla com Rosa seja vitoriosa.
“Esse casamento, pode até parecer clichê, mas está dando muito certo. Não ficou pesado para ninguém. Obviamente que você se choca ao se ver de frente da figura da Rosa Magalhães. Eu não preciso me estender muito, todo mundo conhece a importância que ela tem para a cultura, a importância que ela tem para o carnaval, e foi um processo muito tranquilo. A pesquisa foi uma delícia. Ela trabalhava da casa dela, eu trabalhava da minha. A gente juntava as informações. Tinha tanta coisa bacana nesse enredo que infelizmente nós não pudemos manter por causa do tamanho do carnaval. Hoje nós levamos cinco setores para o desfile, então é impossível compactar tudo isso. Mas, muita coisa bacana que a gente descobriu sobre esse enredo, que a gente teve acesso, e se a gente fosse colocar a gente ia ficar concentrado até a Praça da Bandeira”, disse o carnavalesco aos risos.
Com Rosa e João Vitor, a escola espera apagar a décima primeira colocação do carnaval passado, corrigir os erros que contribuíram para o mau resultado, e retornar a produzir um desfile que mexa com o público e gere no mínimo uma inquietação na briga pelas primeiras posições. Na produção de trabalho, há muita expectativa no que vai sair dessa união inédita entre os dois carnavalescos de gerações distintas. João Vitor contou mais sobre o entendimento que os dois artistas encontraram a respeito da produção artística para o Tuiuti.
“Na divisão, a Rosa ficou com a parte das fantasias e eu com a parte de alegorias. Mas isso não significa que ela faz o dela e eu faço o meu. Não, o tempo todo a gente estava em sintonia. Tudo que ela desenhava ela me chamava para ver. Tudo que eu desenhava eu chamava ela para ver, para que tudo isso tivesse uma unidade, para que tudo isso tivesse um casamento. A intenção nunca foi isso é meu, isso é seu. Não, isso é do Tuiuti, isso é do carnaval. Esse foi o nosso pensamento. Por isso acho que está tudo muito bem entrosado”, acredita o artista.
União do moderno com o tradicional na estética
Falar de qualquer tema relacionado ao Norte do Brasil gera sempre a expectativa de trazer para a Sapucaí uma diversidade cultural muito rica. É uma região que tem muito da nossa essência como país, daqueles que estavam aqui antes mesmo da mistura de povos e etnias que existe nesta nação tão miscigenada. O enredo fala especificamente da Ilha de Marajó, conta a história da chegada dos búfalos, mas também abre espaço para a arte de mestre Damasceno e para a cultura musical do carimbó. As lendas da região também se farão presentes. Por isso tudo, é fácil de se imaginar um Tuiuti com um colorido levando muito da força cultural que o Pará tem para a Sapucaí e transbordando esta diversidade na plástica da Azul e Amarela de São Cristóvão.
“Pode esperar um Tuiuti grande, coloridíssimo, cada carro tem o seu tempero, cada carro tem o seu charme. Você pode esperar formas diversas, cores diversas, peças diversas. Eu diria que é um carnaval múltiplo. Você encontra de tudo um pouco. Está tudo muito bacana, muito legal”, resume João Vitor.
Na união estética de Rosa e João Vitor, o carnavalesco promete uma escola não acorrentada a um único estilo ou a estereótipos, mas apresentando uma diversidade artística que combina com o tema e com a região que serve de pano de fundo para o enredo.
“Acho que tem a mistura do tradicional com o moderno. Acho que carnaval é isso. Tem lugar para tudo. Dá para ser tradicional, dá para ser vanguardista. Dá para fazer de tudo um pouco. Acho que aqui dentro do meu barracão a gente tem essa mistura. Tem um toque de modernidade. Tem um toque de ousadia, mas aí tem aquele lado mais tradicional que eu gosto, que a Rosa gosta também. Acho que dá para equilibrar”.
Retorno de João Vitor e escola motivada
Após produzir o carnaval do Cubango em 2022 sobre Chica Xavier na Série Ouro que terminou em um polêmico rebaixamento, João Vitor volta a ter chance no Especial. Após o desfile de 2020 no Tuiuti, foi contratado pela São Clemente, mas em meio a pandemia foi demitido e não chegou a desenvolver o enredo que sugeriu e que nem chegou à Sapucaí depois de ser trocado pela própria agremiação da Zona Sul. De volta ao Paraíso do Tuiuti, João está completamente motivado e com a vontade de conseguir um resultado diferente de 2020 que o artista mesmo questiona em relação à produção artística que apresentou na homenagem ao padroeiro da escola, São Sebastião.
“Na verdade é uma parceria, uma associação que já tinha dado muito certo. Estou retornando a escola, um carnaval depois, fiz o carnaval de 2020, já tenho uma intimidade, já conheço a característica da escola que é um carnaval lá atrás que teve uma colocação meio duvidosa, bastante questionada. Merecia uma colocação melhor, então acho que isso é um sinal. O João com o Tuiuti, dá certo, com Rosa mais ainda, tem tudo para dar certo e dessa vez a gente conseguir algo melhor. É uma escola merecedora, tem uma comunidade forte, tem muito esforço do presidente. É um ano complicado para muita gente pois nós viemos de um outro carnaval, não tivemos aquele tempo hábil de construir o carnaval. Não é uma reclamação, é só uma constatação. A gente emendou um carnaval no outro, a gente desfilou em uma época que normalmente estamos lançando enredo, divulgando sinopse, tem escolas até abrindo barracão. É um carnaval feito em 48 horas, digamos assim, para todas”, entende João Vitor.
O carnavalesco aposta em diversas armas do Tuiuti para surpreender neste carnaval e conseguir quem sabe figurar nas primeiras posições na quarta-feira de cinzas.
“São grandes trunfos que a escola tem. Pode esperar pela comissão de frente, podem aguardar uma comissão belíssima, e eu vou colocar minha rainha, parafraseando minha colega de trabalho ‘a minha rainha é belíssima’. E o canto. Eu digo sempre, o que esperar do Tuiuti? O Tuiuti tem a bateria que todo mundo quer ouvir. O Tuiuti tem a rainha da bateria que todo mundo quer ver. O Tuiuti tem o cantor que todo mundo quer escutar. E o Tuiuti tem comissão de frente, casal de mestre-sala e porta-bandeira, e uma comunidade que chega chegando”, finaliza o carnavalesco.
Conheça o desfile do Paraíso do Tuiuti
A dupla João Vitor Araújo e Rosa Magalhães vão levar para a Marquês de Sapucaí 2800 componentes divididos em 28 alas e cinco carros alegóricos. A agremiação também terá tripés. O carnavalesco João Vitor revelou como os setores de “Mogangueiro da Cara Preta” estão divididos.
Primeiro Setor: “A gente começa e não é segredo para ninguém, o samba já pontua muito bem que a gente inicia com a Índia”.
Segundo Setor: “Depois vamos falar sobre o comércio das especiarias que se tornou bastante comum ao oriente e ao ocidente”.
Terceiro Setor: “Neste setor falamos sobre o naufrágio perto da costa brasileira do navio que continha um carregamento de búfalos vindo da Índia”.
Quarto Setor: “Essa parte do desfile retrata a chegada dos Búfalos ao Brasil”.
Quinto Setor: “Neste está representada a Ilha de Marajó e a arte”.
Sexto Setor: “Por fim, representamos Mestre Damasceno e o rei do Bufódromo”.