No próximo carnaval, a Paraíso do Tuiuti levará para a avenida a história dos Búfalos e toda ligação deles com a Ilha de Marajó, no Pará. Desenvolvido pela dupla de carnavalescos Rosa Magalhães e João Vitor Araújo, o enredo “Mogangueiro da Cara Preta” propõe contar a história da chegada dos Búfalos à Ilha, além de mostrar as lendas, mistérios e a vasta cultura que existe nessa região do Brasil. A agremiação de São Cristóvão será a primeira escola a desfilar no segundo dia de desfiles do Grupo Especial e a obra escolhida para embalar o cortejo é da parceria de Claudio Russo, Moacyr Luz, Gustavo Clarão, Júlio Alves, Alessandro Falcão, Pier Ubertini e W Correia.
O site CARNAVALESCO dando continuidade à série de reportagens “Samba Didático”, entrevistou o compositor Claudio Russo para saber mais sobre os significados e as representações por trás dos versos e expressões presentes no samba da Paraíso do Tuiuti para o carnaval de 2023. Claudio explica o olhar sobre o enredo que a composição vencedora tomou para dar o seu recado.
“A gente faz muita alusão ao ritmo paraense, o samba foi construído assim, principalmente ao carimbó, o samba foi construído também com uma nomenclatura com utilização de palavras comuns ao estado do Pará, principalmente da Ilha de Marajó e eu acho que deu um samba muito autêntico, muito original quanto a isso”, conta o compositor.
Num mar de tempestade e ventania
Foi trazendo especiarias que o barco naufragou
Nós moscada, cravo, iguarias
No caminho para as Índias a história eternizou
O marinheiro se perdeu na madrugada
O mogangueiro correu para o igarapé
“O enredo do Tuiuti começa com a rota para as índias, o caminho das Índias. E a busca por especiarias. Que que acontece nesse período das grandes navegações, um navio vindo das Índias naufraga no litoral brasileiro próximo à Ilha de Marajó e esse navio ao invés de trazer somente especiarias traziam de búfalos. E ele acaba naufragando e os búfalos chegando na terra firme. Alguns búfalos se salvaram. E desses búfalos que se salvaram nasceu o maior rebanho de búfalo do Brasil na ilha de Marajó. O enredo começa aí e vai entrelaçando a história do Búfalo que se adaptou a Ilha de Marajó. Com a própria história de Marajó. Então no começo nós temos esse primeiro momento no mar de tempestade, ventania foi trazendo especiarias que o barco naufragou. É isso que conta a história, a gente já falou da do caminho das Índias, da herança da Índia, das especiarias e como o Búfalo chega em Marajó”.
O marinheiro se perdeu na madrugada
O mogangueiro correu para o igarapé
A curuminha entoou uma toada
Enquanto abria-se a flor do mururé
E nesse encontro entre o rio e o oceano
A grande ilha que cultiva o carimbó
Dizem que bichos ainda falam com humanos
Há muitos anos na Ilha de Marajó
“Depois no samba a gente fala o marinheiro se perdeu na madrugada, por quê? Porque com o naufrágio a maioria dos marinheiros morreram, mas pra não dizer morreram eu digo se perdeu na madrugada, o mongangueiro que é o búfalo correu para o Igarapé, o que se salvou. A curuminha entoou uma toada. Por que a curuminha? Enquanto aconteciam naufrágio a vida em Marajó seguia. E a Curuminha faz parte da vida de Marajó. Então ela entoou uma atuada pra natureza que se abriu em flor. Que é a flor do mururé. Que é uma planta típica do norte brasileiro principalmente da área ali da Ilha de Marajó, prosseguimos e neste encontro entre Rio e Oceano. Por quê? Porque Marajó é uma ilha que uma parte dela é voltada para o Rio e outra parte dela é voltada para o mar
aberto. Então, neste conto entre o Rio e o oceano a grande ilha, Marajó que cultiva o carimbó. O carimbó nasceu na ilha de Marajó. E como é uma ilha fantástica, cheia de mistérios, lindas, histórias, crenças, uma dessas crenças é que um determinado momento os bichos falam com os humanos homens e animais se falam. Por isso que a gente fala dizem que bichos ainda falam com humanos há muitos anos na ilha de Marajó”.
É! Batuqueiro no samba de roda curimbó
Quero ver você cantar como canta o curió
Okê caboclo onde vai a piracema?
Rio acima segue o voo de uma juriti pepena
“Os batuques e Marajó são muito conhecidos o carimbó, mas tem outros ritmos. E o que que a gente vem logo no refrão no primeiro refrão? Ê batuqueiro no samba de roda curimbó. Curimbó é o quê? É o tambor. Parece carimbó, mas é curimbó. É no Samba de Roda Curimbó. Quero ver você cantar como canto curió. Curió apesar de estar espalhado por todo o Brasil, curió, curió do bico doce. É muito frequente na área do Marajó. Oke Caboclo é o natural da índia, onde vai a piracema? A piracema que é a subida dos dos peixes, pelo rio acima segue o voo de uma juriti pepena. Juriti é uma ave também característica da região”.
Há mão que modela a vida
No bairro Marajoara
E o búfalo que pisa
Esse chão do parauara
“Marajó que também é muito conhecida pela sua arte no barro, a sua cerâmica e não poderia ser ter sido deixado de lado esse fator. A gente abre a segunda com esse fator. Mas remete que o búfalo está totalmente integrado a esse chão. Então, a mão que modela a vida há de existir a mão que modela a vida. No Barro Marajoara. E o Búfalo que pisa esse chão. Esse chão do Parauara. Parauara é o nativo do Pará. Também é um é uma nomenclatura conhecida da região. E o Búfalo está ali”.
Chama o mestre damasceno
Pra entoar esta canção
Das cantigas da vovó
Do tempo da escravidão
“O mestre Damasceno é a figura mais emblemática da cultura marajoara, é um artista, compositor, cantor e a gente chama ele porque ele tem uma ligação muito grande com os ancestrais, ele valoriza muito isso. A gente chama o mestre Damasceno para entoar essa canção, mas que canção é essa? É a canção daquelas das cantigas da vovó do tempo da escravidão que clamava por liberdade”.
É lá! É lá! É lá!
Canoeiro vive só morená
É lá! É lá! É lá!
Mas precisa de um xodó
“Logo depois a gente faz outra alusão ao Mestre Verequete com é lá é lá é lá. Canoeiro vive só a morena. É lá, é lá, é lá. Mas precisa de um xodó. Aí nesse segundo refrão a gente faz muita alusão ao ritmo do Carimbó. A gente o tempo todo no samba quer trazer essa mistura de samba com carimbó, fazer alusão aos ritmos do Pará. E nesses dois refrões o primeiro e o segundo ficou bem marcante”.
Cadê o boi?
O mogangueiro, o mandingueiro de oyá
Meu Tuiuti não tem medo de careta
Traz o boi da cara preta, do estado do Pará
“E partimos pro último refrão, é um samba com três refrões que depois de contar a história do Boi em Marajó junto com a própria história de Marajó, tem o Búfalo bumbá, tem várias características do Búfalo em Marajó. Por que que as vezes eu chamo o boi? Porque mesmo não sendo da mesma família, o búfalo em Marajó é chamado de boi. Eles não são da mesma família, mas guardam um certo parentesco, o nosso boi é o búfalo, o mogangueiro, o mandingueiro de Oyá, e foi isso que a gente trouxe pro refrão, trazer um refrão mais alegre, brincar com essa coisa, porque todos sabemos da ligação entre Iansã e o Búfalo. Iansã se transforma em borboleta, mas também se transforma em búfalo. A gente diz que é um mandingueiro de Oyá. E no final, lembrando as cantigas de roda bem conhecidas em todo o Brasil, dizemos que o Tuiuti não tem medo de careta traz o boi da cara preta do estado do Pará”.