Formada em Educação Física e História, Evelyn Bastos ocupa há uma década o posto de rainha de bateria da Estação Primeira de Mangueira. Nascida e criada na comunidade da Zona Norte do Rio, a beldade possui uma ligação com a agremiação que vem de família. A avó paterna, por exemplo, desfilou durante anos como baiana da verde e rosa; enquanto a materna foi passista da escola. Já sua mãe, Valéria Bastos, reinou à frente dos ritmistas entre 1987 e 1989.

Ainda na infância, Evelyn deu início a trajetória no mundo do samba desfilando pela Mangueira do Amanhã, agremiação mirim da verde e rosa. Lá, atuou em diferentes funções até chegar ao posto de rainha de bateria em 2004. Aos 11 anos, migrou para escola mãe e se tornou a passista mais jovem a desfilar pela Estação Primeira. Posteriormente, atuou como destaque de chão e no ano de 2012 venceu um concurso do extinto programa “Caldeirão do Huck”, da Globo, representando a Mangueira. No ano seguinte, conseguiu mais uma façanha, só que dessa vez em outra competição, tendo sido eleita a Rainha do Carnaval de 2013. Depois de tantos sucessos, ela acabou sendo alçada ao cargo à frente da “Tem Que Respeitar Meu Tamborim”.

“Quando eu chego em 2014 para ser rainha de bateria da Mangueira existia uma preferência, até do público carnavalesco, por rainhas celebridades. Isso acontecia por diversos motivos. Era algo que a gente respeitava, mas que nós, meninas da comunidade, queríamos muito que isso mudasse. Teve um momento, um pouco antes do Carnaval de 2016, que me marcou muito. Eu estava dentro de um táxi, conversando com o motorista, e ele falou que adorava a rainha de bateria da Mangueira, que adorava a Gracyanne. Ou seja, na cabeça dele, a rainha ainda era a Gracyanne Barbosa. Na hora, não corrigi, não falei que era eu, porém fiquei pensando, fazendo uma narrativa sobre aquilo na minha cabeça. Ali me caiu uma ficha do quão difícil era para as meninas de comunidade fazer com que as pessoas te reconhecessem enquanto rainha de bateria de uma escola de samba até mesmo em um período que já se fala de Carnaval. Afinal, isso aconteceu por volta de janeiro. Foi a partir daí que comecei a falar muito”, analisou a rainha de bateria mangueirense durante participação no programa do YouTube “Resenha CARNAVALESCO”.

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Fotos: Léo Queiroz/Divulgação

Com o tempo, Evelyn Bastos não passou só a ser reconhecida pelos admiradores da festa, como também se tornou um dos nomes mais populares dentro e fora da bolha carnavalesca. Tendo isso em vista, ela se transformou em uma espécie de referência para diversas meninas de comunidade que nos últimos anos passaram a ganhar mais espaços dentro das escolas, chegando a alcançar até mesmo o posto de rainhas de bateria.

Atualmente, metade das agremiações do Grupo Especial possuem pratas da casa reinando à frente dos ritmistas. Dessas, Evelyn é quem está por mais tempo no cargo, seguida de Bianca Monteiro, da Portela, que fez sua estreia no posto no desfile de 2017. A lista ainda conta com Giovana Angélica, da Mocidade Independente de Padre Miguel; Mayara Lima, da Paraíso do Tuiuti; Maria Mariá, da Imperatriz Leopoldinense; e Lorena Raíssa, da Beija-Flor de Nilópolis.

“Vi uma matéria, não tem muito tempo, que trazia um levantamento mostrando que o público prefere atualmente rainhas de comunidade. Isso soou como música para os meus ouvidos. Foi ai que fiquei pensando. Realmente, estamos em um outro conceito, um novo momento, uma nova era. As pessoas esperavam, tinham na cabeça delas, aquela beleza e o encanto de uma Luma de Oliveira, que dificilmente vai se repetir. Pode pegar qualquer celebridade, a mais incrível do mundo, e botar na frente de uma bateria que você não vai ter como comparar com a Luma. Ela era um fenômeno, algo que acontece de 100 em 100 anos, que entrou para história. As pessoas ficaram muito tempo tangendo alguém a Luma de Oliveira e nunca deu certo. Acho que até por isso saiu de moda celebridade como rainha de bateria. As famosas continuam sendo bem-vinda, porque o Carnaval é isso, é plural e tem que ser assim”, declarou Evelyn.

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Diante das mudanças no cenário da folia carioca, a beldade não descarta uma representatividade ainda mais abrangente entre as rainhas de bateria nos próximos anos. Uma delas é a possibilidade de terem mais mulheres trans no cargo. Hoje em dia, no Carnaval do Rio, o único caso é o de Thalita Zampirolli, na Unidos de Padre Miguel, na Série Ouro.

“Talvez chocaria a sociedade em geral. Se bem que tem um público do Carnaval que, não sei como, insiste em ser conservador em alguma vertente da vida deles. Isso é muito confuso para mim. Por mais que a gente respeite as diversas opiniões, é muito estranho ser pró movimento carnavalesco e ao mesmo tempo ter um conservadorismo morando em você. Não deveria chocar ter uma rainha trans em uma escola de samba. Em São Paulo já tem, no acesso do Rio também. Acredito que mais cedo ou mais tarde, como parte desse progresso, a gente também tenha uma no Grupo Especial do Rio, por que não?”, avaliou.

Além dos compromissos como rainha de bateria, Evelyn Bastos também ocupa, desde 2022, a presidência da Mangueira do Amanhã. Na ocasião, ela foi convidada pela presidenta da escola mãe, Guanayra Firmino, para assumir o comando da agremiação mirim ao lado do eterno mestre-sala Marquinhos. Indo para o segundo desfile da sua gestão, a beldade não esconde os desafios que enfrenta no posto, mas ressalta a importância de se investir nas crianças e adolescentes da comunidade.

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“As escolas mirins, assim como agremiações das séries Ouro, Prata e Bronze, não tem um local adequado para fazer Carnaval. A gente passa um sufoco muito grande, já cansei de ir de madrugada para Via Binário resolver problemas causados por essa falta de estrutura, de localidade. Essa é uma problemática que a gente deveria dar uma atenção maior, porque quando se fala em desfile de criança, é o futuro da festa que está em jogo. Se a gente não alimenta, não fomenta, não investe no mirim, vamos estar fadados a não ter Carnaval daqui a X anos. Além disso, existe uma burocracia extremamente exacerbada que envolve crianças no Carnaval e que precisa ser revista. A gente precisa ter uma regularização, tem todo um cuidado maior por se tratarem de menores de idade, mas não precisa ser do jeito que está. Vou dar o meu exemplo, minha primeira vez desfilando foi em 1998 na Mangueira do Amanhã. Tinha quatro anos e vim do lado da minha mãe. No meu processo de crescimento, sendo uma criança um pouquinho maior, não enfrentei essa burocracia toda”, relatou Evelyn.

No ano que vem, a Estação Primeira de Mangueira será a quarta agremiação a passar pelo Sambódromo da Marquês de Sapucaí na segunda-feira de Carnaval, dia 12 de fevereiro, segundo dia de apresentações do Grupo Especial. A verde e rosa terá como enredo “A Negra Voz do Amanhã”, uma homenagem a cantora Alcione. O desfile contará com a assinatura da dupla de carnavalescos formada por Annik Salmon e Guilherme Estevão.