Dando sequência à Série Barracões São Paulo, o site CARNAVALESCO visitou o barracão do Império de Casa Verde e conheceu o projeto que a agremiação desenvolveu para 2023. O tema do ‘Tigre’ para o próximo desfile se trata de “Império dos Tambores – Um Brasil Afro-Musical”. É um enredo afro, mas que será apresentado apenas para o lado da musicalidade africana. A equipe conversou com o carnavalesco Leandro Barboza e o enredista Tiago Freitas, que abrangeram o enredo.
Fotos: Gustavo Lima/Site CARNAVALESCO
“A gente começa com a comissão de frente trabalhando na questão da ancestralidade feminina. É um enredo que trabalha muito na feminilidade de uma forma bem transversal, mas o nosso foco é falar da musicalidade”, explicou o enredista.
Como surgiu
A escola não desenvolve um enredo afro desde 2003, quando subiu ao Grupo Especial do carnaval paulistano. Porém, o artista Leandro Barboza sugeriu o enredo e a diretoria acatou a ideia. Sendo assim, a entidade vem colhendo frutos, como um dos melhores sambas do ano. “Esse enredo era um sonho meu de falar sobre a música. Depois ele foi formando uma nova cara. Chegou um momento em que eu vi que estava saindo muito e foi que apareceu o Tiago. Quando caiu na mão dele, ele sugeriu o nome. A ideia era realmente falar sobre a música. A escola abraçou e, no primeiro momento, a gente já viu brilho nos olhos da comunidade e isso foi bem legal. Principalmente o presidente”, declarou.
Pesquisa do enredo
O tema afro, como dito pelos profissionais, será diferente. Abordará totalmente a música. Não vamos ver algo como o habitual. Porém, a história foi inspirada inicialmente em uma baiana da escola. “O ponto de partida, quando eu conversava com o Leandro, eu queria saber qual era a pessoa mais velha da escola. Ele de prontidão falou que era a baiana Ba. A narrativa nasce dela. Ela tem uma noite de sonho em transe e desenha todas as narrativas do enredo. A gente focou nessa caminhada de trabalhar a questão da identidade da Casa Verde. Trabalhar a emoção de um componente que queria um enredo afro há um tempo. A gente trabalhou essa África mais musical e alegre. Uma pesquisa muito rica no sentido em que a África pode trazer pra gente. O carnavalesco foi delimitando onde a gente poderia seguir e a gente já deu o nome das alas e dos carros. Foi um trabalho do que ele queria na avenida. A gente foi trabalhando e enriquecendo nosso trabalho e conjunto”, disse o enredista Tiago.
Novos relatos e o ótimo recebimento
Sempre é importante receber testemunhos do que se passa dentro da comunidade. Segundo o carnavalesco, que está presente nos ensaios, o ‘feedback’ tem sido positivo. “Esse enredo me proporcionou estreitar essa relação que eu tenho com os componentes. Como eu era muito presente dentro do barracão, eu não estava muito presente dentro da quadra. Nesse período de 2016 até o último carnaval, eu não participava tanto. Eu fui participar ano passado, quando eu assumi como carnavalesco. Eu tinha essa função de tirar o papel dos outros carnavalescos que estavam aqui, como do Jorge Freitas, Flávio Campello e do projeto também que era meu e do Mauro Quintaes. A parte de execução eu que coloco tudo em prática. Por isso essa dedicação toda com a escola me distanciou um pouco da quadra. Com essa história desse enredo e eu estando mais presente, cada dia é uma surpresa para o componente. Eu tenho escutado e tido contato”, contou.
Nova assinatura solo
Leandro chegou no Império de Casa Verde em 2016 com o carnavalesco Jorge Freitas. Porém, ele tinha a missão de cuidar apenas do barracão e foi assim até o ano de 2020. No carnaval de 2022, Mauro Quintaes chegou e finalmente o Leandro assinou um projeto em conjunto. Para 2023, Quintaes deixou a agremiação e o atual artista está assinando um tema solo pela primeira vez. “É uma experiência nova. Eu já estava preparado para isso há muito tempo. Claro que ter um projeto 100% na sua mão te dá uma liberdade maior do que você pensou, amarrou e defendeu. Tem um controle maior. Ano passado eu tinha, mas eu fazia questão de tocar junto com o Mauro”, disse.
Famosa plástica do Império
O ‘Tigre Guerreiro’ é famoso por ser a escola da plástica impecável e das alegorias gigantes. O luxo predomina nos desfiles e a agremiação faz questão disso. O famoso tigre, que é o símbolo, é sempre aguardado no desfile. Resta saber como ele virá no próximo carnaval. “A gente não vai deixar a desejar em alegorias. Acho que elas vêm gigantescas. Eu acho que com um bom acabamento, uma nova plástica também na parte das fantasias, mas não deixando de lado o luxo que é característica da escola. O presidente sempre quer isso. o tigre vem diferente. A gente deu uma nova roupagem para ele, vem cheio de significados e representações. Tanto no abre-alas quanto no último carro”, explicou.
Conheça o desfile
Setor 1: “A gente traz a majestosa África ancestral. Uma África enriquecida”.
Setor 2: “Navio dos ritmos e do torpor. A questão dos ritmos, das alegrias e da invasão cultural da África até o Brasil”.
Setor 3: “A África nas periferias do Brasil. Quando ela chega e se manifesta em várias identidades em São Paulo, no Rio, na Bahia, no Maranhão, no Pará, enfim, a gente vai trabalhar uma série de aspectos nessa questão cultural”.
Setor 4: “É o Império dos tambores, onde a gente chega no quilombo da Casa Verde nessa viagem, que nasceu na África e chegou na Casa Verde com uma das nossas fundadoras, a griô Bernadete que vai ser coroada na avenida. O quarto setor trabalha a identidade do território mesmo da Casa Verde”.
Ficha técnica
Quatro alegorias
Um tripé
Um elemento alegórico de comissão de frente
2400 componentes
Diretor de carnaval: Tiguês
Carnavalesco: Leandro Barboza
Enredista: Tiago Freitas
Carnaval é a época que podemos reverter posições na pirâmide social, onde o súdito pode virar rei. Assim, nesse clima, a Feira das Yabás de fevereiro abre o carnaval suburbano. A roda de samba de Marquinhos de Oswaldo Cruz fará um passeio nos antigos sambas de terreiro e sambas-enredo. A Feiras das Yabás recebe como convidado especial a banda do Cordão do Bola Preta. O evento acontece neste domingo, a partir das 13h, na Praça Paulo da Portela, em Oswaldo Cruz, Zona Norte do Rio de Janeiro.
Foto Divulgação/Cordão da Bola Preta
Além da boa música, o público ainda aproveita para experimentar a culinária típica do subúrbio carioca e pratos de origem africana nas 16 barracas expositoras, sob o comando das matriarcas das famílias mais importantes e tradicionais da região de Oswaldo Cruz: um imenso restaurante a céu aberto. Entre as muitas opções, estão: mocotó, Angu a Baiana, feijoada, cozido, tripa lombeira entre outras iguarias do mundo do samba.
Serviço:
FEIRA DAS YABÁS – CORDÃO DA BOLA PRETA
Roda de Samba de Marquinhos de Oswaldo Cruz recebe Cordão da Bola Preta
Quando: Domingo, 12 fevereiro de 2023.
Hora: a partir das 13h.
Local: Praça Paulo da Portela – Estrada do Portela – Oswaldo Cruz
Evento gratuito.
Mais informações: 21 – 97036-4543
Classificação: Livre
Para o folião que estiver no Rio, não faltarão opções para curtir o período de pré-Carnaval e os dias oficiais da festa, numa programação que vai além dos blocos e tradicionais desfiles na Marquês de Sapucaí, o Sambódromo. Na celebração mais democrática da cidade, as atenções também estarão voltadas para o Terreirão do Samba. Os ingressos são para lá de atraentes – R$ 20 – e podem ser adquiridos no próprio local, a partir de quinta-feira.
Foto: Divulgação/Riotur
O objetivo é privilegiar encontros entre artistas de diferentes gêneros e gerações. Samba e pagode continuam como protagonistas, mas o espaço também contemplará segmentos que dão ao público a oportunidade de assistir ritmos populares e para todos os gostos.
Com curadoria do presidente da Riotur, Ronnie Aguiar, a estreia acontece nesta sexta-feira, 10 de fevereiro, às 20h, num show que reúne o cantor de pagode Ferrugem e o rapper Delacruz. Já no sábado, dia 11, Diego Senna, grupo Coisa Séria, Suel, Caio Lucas e MC Maneirinho comandam a festa.
“Só o fato de estarmos nos palcos de novo, na estrada novamente, é muito especial. O Terreirão é um espaço de muito carinho, onde vai o nosso público. São pagodeiros de verdade, gente dos subúrbios do Rio, todo mundo vai em peso. Em todos os anos foi quente, a galera sempre canta junto e dessa vez vai ser sensacional de novo, eu tenho certeza. Estou super ansioso”, diz Ferrugem.
O rapper Delacruz usa a palavra responsabilidade ao comentar a sua estreia no Terreirão, “um lugar famoso, conceituado, que eu admiro”:
“E essa mistura de samba com rap, sendo bem feita, com carinho, com responsabilidade, com cuidado com a música, com amor, com certeza dá liga. Para resumir, são dois gêneros que são filhos da mesma mãe. Só tem que ter amor. E isso, modéstia à parte, a gente sabe fazer, porque ama muito o que faz. Estou ansioso por essa apresentação e espero que o público goste”.
Os demais shows no Terreirão já têm datas: serão nos dias 17 (sexta de Carnaval), 18 (sábado de Carnaval), 19 (domingo de Carnaval), 20 (segunda de Carnaval) e 21 (terça-feira de Carnaval). A última sequência de apresentações será na sexta-feira antes do Desfile das Campeãs (dia 24) e no sábado (dia 25).
O esquema de infraestrutura montado especialmente para os shows inclui a instalação de dois postos médicos, com uma ambulância em cada posto; 28 quiosques de venda de bebidas e comidas e 65 banheiros químicos. A segurança externa será feita pela Polícia Militar.
Criado para enaltecer e preservar a história local, fundamental da cultura popular brasileira, o espaço ganhou o nome de Terreirão do Samba Nelson Sargento, em julho de 2021, em homenagem ao compositor Nelson Sargento, que foi vítima da Covid-19 naquele ano.
Serviço:
Endereço: Rua Benedito Hipólito, 66 – Centro
Programação:
Sexta-feira 10/02: Ferrugem e DelaCruz
Sábado 11/02: Suel, Caio Luccas e MC Maneirinho
Horário: A partir das 20h
Preço: R$ 20
Foram 34 anos de espera até que a Grande Rio conquistasse o primeiro título. Campeã do carnaval de 2022, com o enredo “Fala Majeté! Sete Chaves de Exu”, a agremiação manteve sua equipe vitoriosa sonhando em não parar na primeira conquista e estabelecer uma dinastia da escola de Duque de Caxias. Leonardo Bora e Gabriel Haddad, carnavalescos muito festejados tanto no vice-campeonato de 2020 e no título de 2022, vão homenagear um ícone do samba e da música brasileira em geral, mantendo a pegada de enredos culturais, mas saindo um pouco da religiosidade, na verdade, nem tanto assim como será fácil de perceber nesta matéria.
Fotos: Lucas Santos/Site CARNAVALESCO
O enredo de grande título “Ô Zeca, o pagode onde é que é? Andei descalço, carroça e trem, procurando por Xerém, para te ver, para te abraçar, para beber e batucar!” vai buscar trazer mais que a vida e a obra de Zeca Pagodinho, mas em formato de crônica encontrar pelo subúrbio carioca e pela Baixada Fluminense lugares que fazem sentido tanto para a vida pessoal do artista quanto para sua obra. Zeca é vizinho da Grande Rio e já havia sido lembrado no carnaval de 2007 quando a escola fez um carnaval sobre o município de Duque de Caxias, hoje lugar de moradia e refúgio deste grande sambista. O carnavalesco Leonardo Bora explica que a dupla de artistas decidiu por essa abordagem do enredo a partir de conversas com Zeca e de um estudo mais detalhado de sua obra musical.
“O caminho narrativo do enredo veio da própria obra do Zeca. A gente encontrou esse fio depois de mergulhar em sua obra e de trocar com o próprio Zeca, entender esse estilo de vida que se confunde com a obra e que é o que torna ele um artista tão popular, tão próximo do povo brasileiro. É um enredo em formato de crônica porque a obra musical do Zeca é muito cronística, no sentido de que ela fala muito de lugares, de passeios por espaços da cidade do Rio de janeiro, principalmente dos subúrbios, no plural destacando a diversidade dos subúrbios do Rio de janeiro, a Baixada Fluminense, o samba, todos os aspectos da vida social e cultural do samba, do pagode, por extensão a cultura carnavalesca das escolas de samba. Tudo isso foi levando a gente por um caminho que não guiava o nosso olhar para uma homenagem monumental, para uma coisa laudatória, muito linear. A obra do Zeca é bastante diversa, imprevisível, ele tem essa característica no dia a dia, muito inquieto. Acho que o enredo precisava ter essas características. Ao longo das conversas, juntamente com o Gabriel, Vinícius Natal, a gente foi encontrando esse caminho”, explica o carnavalesco.
Leonardo Bora assina o carnaval com Gabriel Haddad
Leonardo Bora afirma que ao estudar a vida e principalmente a obra de Zeca, a dupla percebeu uma similaridade com outros grandes artistas do gênero tanto no estilo de vida quanto nos assuntos abordados pelas músicas.
“Nos arquivos da família Pagodinho a gente percebeu o quanto o Zeca era comparado a Noel Rosa e a João do Rio, ainda na década de 1980, início da carreira dele. Ele era descrito como o Noel Rosa do Irajá, porque havia pontos de contato muito explícitos entre a obra desses dois sambistas que passearam e cantaram o Rio de Janeiro em décadas tão diferentes. Ouvindo as músicas e viajando nas mais de 400 músicas dele, entre gravações, composições, parcerias, uma música em específico nos chamou a atenção “Zeca cadê você”, parceria do artista com o Jorge Aragão, que fala dessa procura muito jocosa e brincalhona, quase um repente, em busca do paradeiro desse artista que transita pelo Rio de Janeiro e que é encontrado em Xerém na Baixada Fluminense. Daí se desenrolou esse enredo, uma proposta nossa para a escola, que tem essa ligação com o chão caxiense, com a comunidade da escola”, revelou Leonardo Bora.
O carnavalesco também define que o desfile vai passear muito pelo subúrbio carioca e pela Baixa Fluminense, porque Zeca não era um artista muito dado a falar do Rio de Janeiro que é vendido lá para fora, para os turistas, a cidade das praias e da Zona Sul.
“O Zeca transforma Xerém em uma espécie de cenário mítico para o samba, um quintal coletivo e musical. A gente percebeu que estava tudo conectado e nos deixamos levar por esse passeio que não é aquele Rio de Janeiro do cartão postal a beira mar. É o Rio do botequim, da gafieira, da birosca, da cadeira na calçada, do chão de caquinho, do engradado de cerveja, da pipa, do saquinho de Cosme e Damião, da devoção a São Jorge em Quintino, dos quintais, da roda de samba. É esse Rio com toda a sua multiplicidade, com todo o seu colorido explosivo que vai aparecer na Avenida”.
Enredo em formato de crônica e religiosidade de Zeca Pagodinho
Durante o período de pesquisa, Gabriel e Léo mergulharam no universo de Zeca Pagodinho e, como dito acima, perceberam que a história não deveria ser contada de uma forma bibliográfica clássica. Zeca, além de um grande artista, é uma pessoa que oferece muitas histórias e que nestes seus pouco mais de 60 anos transitou por muitos lugares que estão enraizados na cultura e no cotidiano do carioca, talvez por isso o cantor seja tão festejado pelo chamado “povão” e seja tão representado como alguém que busca levar uma vida mais simples. A dupla de artistas da Grande Rio percebeu que esses aspectos da vida do sambista é que poderiam impulsionar uma grande homenagem ao artista e a tudo que ele valoriza.
“O que mais nos chamou a atenção como narradores é esse aspecto da crônica. É perceber o Zeca como um cronista. Um artista cuja obra expressa essa geografia musical. É uma obra bastante metalinguística como o próprio samba é enquanto gênero. Ou seja, é uma obra que fala muito do próprio samba. Tem muito esse olhar cronista para as pequenas coisas. E é algo que a gente sente falta para o carnaval. A festa já teve muitos enredos em formato de crônica como “Domingo” da Maria Augusta, pode pensar na obra de Luis Fernando Reis que cantou o subúrbio carioca pela Caprichosos de Pilares. A gente acha que foi uma oportunidade de fazer essa brincadeira”, esclarece Leonardo Bora.
Outro aspecto que também encantou a dupla foi a presença da religiosidade na vida de Zeca Pagodinho. Nos últimos dois carnavais a luta contra a intolerância religiosa e busca pelo respeito principalmente às religiões de matriz africana estiveram muito presentes e foram temáticas centrais no trabalho de Leonardo Bora e Gabriel Haddad. Neste desfile, contando a vida de Zeca, a dupla poderá mais uma vez falar sobre a fé.
“Também nos chama muito atenção a presença da religiosidade popular na obra do Zeca. É um volume muito grande. É um aspecto que nos viemos explorando nos últimos desfiles, olhar para obra do Zeca nos levou para um outro olhar para esse grande tema da religiosidade que engloba a umbanda, candomblé, e isso também vai aparecer no desfile. Na abertura do desfile temos a Alvorada de São Jorge, e no segundo setor temos como norte a música ‘minha fé’. A Grande Rio procura Zeca por terreiros,capelas, oratórios, igrejinhas, entendendo a dimensão dessa religiosidade popular sincrética do Zeca Pagodinho”, explica Bora.
Gabriel e Léo seguem na busca por linguagens diferentes e experimentações
Após dois grandes desfiles na Grande Rio e outros tantos elogiados no Grupo de Acesso, Leonardo Bora e Gabriel Haddad estão conquistando um espaço no carnaval carioca entre os grandes artistas da folia e vão ano a ano apresentando um estilo bem próprio de criação carnavalesca. A dupla não pensa em parar por aí, o enredo sobre Zeca Pagodinho é a oportunidade de mostrarem mais uma vez que tem um repertório amplo e que não se deixam acomodar.
“A busca por linguagens diferentes, essa inquietação criativa, é algo que nos anima demais enquanto artistas, eu e o Gabriel. A gente sempre tenta buscar caminhos pouco usuais, experimentais, brincar, ainda mais nesse ano que a gente está falando de samba de roda, de quintal, de brincadeira, a obra do Zeca também tem um aspecto muito voltado para a infância, não apenas devido a devoção a Cosme e Damião, mas por uma série de músicas que cantam as memórias infantis. Esse experimento, brincar com o fazer carnaval, é muito presente no nosso trabalho”, aponta Leonardo.
Em 2022, era possível perceber no enredo sobre Exu como cada setor da escola tinha as suas particularidades, até mesmo quase um estilo próprio sem comprometer a unidade narrativa do enredo. Para 2023, Gabriel e Leonardo devem trazer esse efeito de novo até por conta da diversidade temática presente na vida e na obra de Zeca Pagodinho.
“Esse ano a gente foi guiado pela musicalidade do Zeca para uma visualidade muito diferente, eclética. São cores mais saturadas, é uma miscelânea estilística dentro de um mesmo desfile. Algo que a gente já explorou principalmente em ‘Exu’, nosso último carnaval, que tinha sete setores com propostas estéticas bem diferentes. A gente continua nesse caminho da experimentação. E nesse ano também olhando bastante para a linguagem carnavalesca já que a obra do Zeca fala muito do fazer samba e do fazer carnaval. Exploramos mais matérias que mais rapidamente são associados à linguagem do carnaval das escolas de samba”, define Leonardo Bora.
Dupla confia em grande conjunto artístico
O desfile de 2022 da Grande Rio foi fundamentado em uma grande apresentação estética e de um grande desenvolvimento narrativo do enredo por parte da dupla Gabriel Haddad e Leonardo Bora. Mas além disso, o samba funcionou muito bem, a bateria foi aclamada e o primeiro casal fizeram apresentações irretocáveis, tudo bem fundamentado em um canto homogêneo e intenso da comunidade de Caxias, sem falar na comissão de frente que trouxe talvez a grande imagem do carnaval, não é a toa que um de seus personagens estampa a capa do CD deste ano. Essa eficiência coletiva que a Grande Rio apresentou em 2022 é o que Leonardo Bora espera que se repita em 2023, e esteja acima de qualquer coisa que os carnavalescos possam produzir na parte estética.
“Eu sempre espero que o grande trunfo de um desfile de escola de samba seja o samba. É aquilo que a Rosa Magalhães sempre fala, é escola de samba. Não é escola de visual. Nós carnavalescos damos um contorno para algo que é muito mais complexo, vivo e potente que é o samba, o chão. Espero que a bateria seja novamente um trunfo, a gente tem uma bateria espetacular comandada pelo Fafá. A gente espera que o samba interpretado pelo Evandro aconteça mais uma vez. Um samba com características bastante diferentes do Exu. A gente espera que a obra embale um desfile muito alegre e solto. A comissão de frente vem desenvolvendo um trabalho bastante regular, que é uma característica da trajetória artística do Hélio e da Beth Bejani. O casal de mestre-sala e porta-bandeira que está voando, Daniel e Taciana. Harmonia, evolução, enfim. O todo, o conjunto da escola, esse quesito que não existe mais, essa ideia de uma escola de samba como corpo coletivo, a gente espera que isso funcione bastante, seja muito potente, alegre, vivo e se a nossa contribuição que é o enredo, as fantasias, alegorias, for importante para embalar isso, que bom. A gente trabalha dia e noite para isso”.
Em relação ao título de 2022, que acabou com o jejum da escola se tornando a tão esperada primeira conquista da Tricolor de Caxias, é fácil imaginar que ela possa levar a dois caminhos neste carnaval imediatamente posterior: uma sensação de leveza por não existir mais a pressão pelo primeiro título, ou uma sensação de pressão para se manter no topo após dois grandes desfiles. Mas Leonardo Bora garante que nem uma coisa, nem outra assombram o cotidiano de trabalho da dupla de artistas da Grande Rio.
“Responsabilidade sempre existe. Todos nós carnavalescos e carnavalescas temos uma posição muito delicada em qualquer agremiação, é uma disputa, todas querem não apenas ganhar como apresentar um grande espetáculo. Sempre há cobrança. Isso em qualquer grupo e a gente tem experiência nisso, a gente começou no último grupo no carnaval da Intendente Magalhães. Agora, a forma como a gente lida com essa cobrança, é a chave dessa pergunta. No caso do título da Grande Rio, a gente entendeu automaticamente que não deveria cair na armadilha de tentar comparar um desfile com o outro. Porque cada desfile tem as suas características, têm os seus caminhos narrativos, texto escrito, samba, na visualidade. A nossa proposta foi brincar, festejar, celebrar, comemorar. É um desfile que a gente espera que seja muito feliz, muito festivo para a escola como estão sendo os ensaios. Como é o samba. Porque a gente precisa dessa dimensão da brincadeira, da festa. Envolve uma liberdade criativa grande. Felizmente eu e o Gabriel trabalhamos em uma escola que nos dá total liberdade criativa. Estamos exercitando essa liberdade com responsabilidade sempre. É um compromisso que a gente tem com essa comunidade de Caxias”, conclui o carnavalesco Leonardo Bora.
Conheça o desfile da Grande Rio
A Tricolor de Caxias vai levar para a Sapucaí em 2023, cinco alegorias e dois tripés. Em termos de contingente são 28 alas e 3200 componentes. O carnavalesco Leonardo Bora explicou à reportagem do site CARNAVALESCO como estão divididos os setores do desfile em homenagem à Zeca Pagodinho.
Primeiro Setor “Na abertura do desfile temos a Alvorada de São Jorge, o início deste enredo que é no formato de uma crônica que narra um dia mágico. A Grande Rio procurando o Zeca Pagodinho por lugares do Rio de Janeiro, lugares geográficos e afetivos. E nesse dia mágico podem se misturar o 23 de abril, 27 de setembro, inclusive o dia do desfile da escola. E a Grande Rio foi campeã no 23 de abril, também é um agradecimento a Ogum. Ele é o segundo orixá na Gira de Exu, então está tudo conectado. A gente começa a procurar Zeca na Alvorada de São Jorge, saudando essa religiosidade do homenageado e seu culto a Ogum”.
Segundo Setor
“Tem como norte a música ‘minha fé’. A Grande Rio procura Zeca por terreiros, capelas, oratórios, igrejinhas, entendendo a dimensão dessa religiosidade popular sincrética do Zeca Pagodinho. Umbanda, candomblé, catolicismo popular, tudo se mistura nesse setor que saúda os santos de cabeça do homenageado: Obaluaê, Oxum, presentes na obra dele e a extrema devoção que ele tem por uma infinidade de santos”.
Terceiro Setor
“Fala da faceta infantil da obra de Zeca. Mergulhando nessas memórias e nesses territórios, a gente vislumbra a devoção de Zeca, ainda pensando nos aspectos religiosos, a Cosme e Damião, e ao Irajá da doce infância. O velho Irajá. Zeca que cresceu entre Irajá e Del Castilho buscando saquinhos de doce, brincando em chão de caquinhos, soltando pipa, brincando com pião. Esse é o universo da ‘Patota de Cosme’, um disco muito importante para ele”.
Quarto Setor
“Se chama ‘raízes musicais’ e é a busca desse solo suburbano onde nasceu Zeca Pagodinho. Este artista que passa pelos Bohemios de Irajá, bloco de onde ele herdou o sobrenome artístico, saía na ala do pagodinho, transitando por serestas, e despontando para valer no Cacique de Ramos, no bairro de Olaria, nos arredores da Igreja da Penha onde ele canta ‘camarão que dorme a onda leva’ e dali sai para o estrelato, amadrinhado por Beth Carvalho, gravando um álbum coletivo. E esse setor foca essa musicalidade que embalou o jovem Pagodinho em direção ao sucesso”.
Quinto Setor
“Depois a Grande Rio pega o ônibus, trem, lotação, carona e vai a procura de Zeca por diferentes territórios simbólicos, cantados na música dele no setor intitulado ‘crônicas suburbanas’. Passamos por lugares que ajudam a gente a entender a cultura sambista e a cultura dos subúrbios cariocas. As esquinas, a feira, o campinho de futebol, o botequim, a gafieira, o trem com o vendedor ambulante”.
Sexto Setor
“Já no cair da tarde, início da noite, a Grande Rio toma o rumo da Baixada guiada pela música ‘Sapopemba e maxambomba’ gravado pelo Zeca, entendendo que a Baixada Fluminense pode ser entendida como grande subúrbio, expandida. A Grande Rio vai contando indiretamente a história dos fluxos migratórios que levaram tantas pessoas a morar nesta territorialidade com destaque para Duque de Caxias e Xerém. Inclusive o próprio Zeca que escolhe Xerém para morar no início da década de 1990. A gente passeia pela faceta menos conhecida e menos abordada, porém fascinante, que é o olhar para o samba rural, samba de roda rural, o diálogo com os repentistas, essas memórias nordestinas, de tantos migrantes que se fixaram no Rio de Janeiro e na Baixada Fluminense”.
Sétimo Setor
“Da Jaqueira ao Jaqueirão. No quintal do Zeca que é chamado de Quintal do Jaqueirão, que já se tornou esse espaço tão importante, para a gente pensar o samba e o pagode na contemporaneidade, a Grande Rio recebe todas as escolas de samba para uma grande confraternização, uma homenagem ao Zeca e ao aniversário da coirmã Portela. A Grande Rio que é a mais jovem das escolas do Especial saúda a memória da centenária Portela, a Águia Altaneira que fez ninho na Jaqueira, cantando, no Jaqueirão Pagodinho, em Xerém, a vitória das escolas de samba. A gente entende que ao celebrar o centenário da Portela estaremos celebrando a vitória da cultura sambista, é uma grande festa misturando Madureira e Xerém, e abordando esse aspecto da obra do Zeca que é o cantar das escolas de samba”.
Na tarde desta quinta-feira, 9, o Império Serrano recebeu uma visita mais do que especial em seu barracão. Enredo da escola para 2023, o cantor e compositor Arlindo Cruz, trazido por sua família, esteve na Cidade do Samba, proporcionando um momento de muita emoção aos funcionários e dirigentes da escola.
Babi Cruz, esposa de Arlindo, não conteve as lágrimas na visita. Ela revelou que sua primeira percepção sobre o enredo já indicou que o momento seria recheado de situações marcantes.
– Desde o momento que fiquei ciente de que o Arlindo seria o enredo, eu fiquei pensando em alguns momentos. A notícia do anúncio, a visita do Alex de Souza contando a história e o lançamento na quadra foram grandes emoções. E eu já imaginava o momento de trazer o Arlindo aqui para visitar o barracão, ver as alegorias e todos os funcionários que fazem esse carnaval que nós sempre respiramos. Tenho certeza que ele recebeu toda a energia positiva da família imperiana – diz Babi.
Responsável por desenvolver o enredo, o carnavalesco Alex de Souza destacou a importância de receber o grande homenageado no barracão do Reizinho. Para ele, será um desfile extremamente marcante para todos os amantes do carnaval.
– É muito honroso receber a visita de Arlindo Cruz e toda a sua família. Essa visita dele nos traz muita emoção e tenho certeza que será um desfile maravilhoso. Estamos trabalhando para fazer uma grande homenagem, que será inesquecível e muito especial – completa Alex.
O Império Serrano será a primeira escola a desfilar no Grupo Especial, no dia 19 de fevereiro (domingo), na Marquês de Sapucaí, com o enredo “Lugares de Arlindo”.
No segundo ano consecutivo trabalhando na Rosas de Ouro, Paulo Menezes, está em seu terceiro carnaval em São Paulo e cada vez se sente mais adaptado com o trabalho em solo paulista. Para 2023, trouxe o enredo ‘Kindala’,na Rosas de Ouro, e a busca de abordar o racismo, mas com um combo extra que será os dias atuais, como está a luta. A Roseira será a quinta escola a desfilar na sexta-feira, dia 17 de fevereiro.
Fotos: Fábio Martins/Site CARNAVALESCO
Sete vezes campeã do carnaval, a agremiação da Freguesia do Ó, Zona Norte de São Paulo, venceu pela última vez em 2010. Depois bateu na trave com três vices consecutivos em 2012, 2013 e 2014. Enquanto Paulo Menezes assinou carnavais no Rio de Janeiro, fez parceria com Paulo Barros, e conquistaram o carnaval de 2017 na Portela.
Paulo Menezes em São Paulo
Em 2020, chegou em São Paulo junto com Paulo Barros para assinar o projeto do Gaviões da Fiel, e desde então permaneceu no carnaval paulista. Seguiu para a Rosas de Ouro no início de 2020, mas explodiu a pandemia, carnaval adiado. O enredo de 2022 foi um dos mais premiados, sobre a cura, mas no resultado ficou em 9ª lugar. O carnavalesco Paulo Menezes contou sobre a adaptação ao site CARNAVALESCO.
“Na realidade quando cheguei no Rosas, cheguei em um dia e no dia seguinte começou a pandemia. Então foi um carnaval pensado por causa da pandemia, mas ao mesmo tempo não tinha um conhecimento, não tinha aquela coisa pessoal. Era tudo muito virtual. Então você criar para uma escola, sem conhecê-la presencialmente, para mim não é fácil. Não gosto de fazer um projeto e entregar, gosto de vivenciar esse projeto. Então quando tem essa distância para mim, Paulo, não é bacana. Gosto de estar presente”.
Na nossa visita ao barracão da Rosas em 2022, Paulo Menezes dizia sobre a adaptação ainda estar acontecendo, explicou e disse como está atualmente: “Ano passado quando falava que ainda estou me adaptando era muito por causa disso, foi um período muito difícil. Primeiro não sabíamos se teria carnaval, não sabia quando seria e o pior, não sabia se estaria vivo no carnaval. Foi muito difícil para todas as escolas, e principalmente para os artistas, pois criar com essa pressão na cabeça não é tão simples. Criação precisa de liberdade, de espaço, então é muito difícil para você criar com essa pressão de não saber o que vai a frente”.
Assim como a conexão com a escola: “Agora estamos em casa, conheço a escola totalmente, é claro que o conhecimento é eterno. Tem que estar sempre conhecendo, mas posso dizer que estou em casa”.
Escolha do enredo
Através de um samba vice-campeão na disputa da Rosas em 2005, que o carnaval de 2023 surgiu. Um dos compositores daquele samba foi Arlindo Cruz, sempre cantado na quadra da agremiação azul, rosa e branco. Um dia eis que o carnavalesco parou, escutou e conectou com um enredo que já vinha sendo arquitetado, deu liga.
“Já tinha vontade de fazer um enredo com essa temática há um bom tempo. Tinha umas ideias guardadas, mas quando por acaso escutei o samba na quadra, que é o samba que participou da disputa em 2005 para o Carnaval de 2006. E não foi vencedor. Em uma festa ouvi esse samba cantado na quadra e ele me chamou atenção. Pois tinha muitas coincidências daquilo que eu queria falar no meu enredo. Quando passou o carnaval, a gente sentou e discutiu várias opções. Essa era uma delas, e a gente acabou optando por ela”.
Vale ressaltar que ‘Kindala’, no idioma bantu, significa ‘agora’. No logo oficial do enredo, ainda tem um recado: “Que o amanhã não seja só um ontem com um novo nome”.
Cuidado com a temática
Com muito estudo, Paulo Menezes foi através de diversas personalidades negras do carnaval, do samba, e também fora dele. Tem quem será representada em vida, outras serão homenageadas, e também personalidades que representarão nessas homenagens, caso de Karol Conka, Manoel Soares, Fofão, Fernanda Ross, Adriana Lessa, entre outros artistas e atletas que estarão no Anhembi.
“Não queria que fosse um enredo com olhar de um carnavalesco branco sobre um tema preto. Então o primeiro ponto da pesquisa foi conversar com as pessoas, independente de que camada social ou intelectual que elas pertenciam. O mais importante foi conversar com elas e para sabermos quais eram as prioridades, necessidades, o que seria importante ser tocado. Pois elas foram a fonte maior de pesquisa, daí partimos para pesquisa em livros e principalmente em redes sociais, jornal, televisão. Porque tudo que a gente está falando aconteceu na época que começou a escravidão, e continua hoje em dia. Então é um tema muito atual, não é um fato histórico. É uma história que se perpetua até hoje. Infelizmente ainda é assim”.
Proposta do enredo
Paulo Menezes quer tocar o próprio componente da roseira e trazer um sentimento que talvez seja um pouco peculiar para sua própria escola, mas que simboliza bastante sua ideia em ‘Kindala’.
“São realizadas diferentes, histórias diferentes, hoje a proposta é que quem esteja desfilando sinta vergonha. Que uns sintam vergonha pelos outros. E outros sintam vergonha, pois estou participando ativamente disso que está acontecendo. Ou então não participo, me calo, não faço nada. São maneiras de vergonha diferente, e o que a gente espera é isso. É colocar na cabeça das pessoas um pouco daquilo que estamos falando para que elas se sintam engajadas nesta luta que esse povo tanto briga, tanto luta e corre atrás da sua igualdade”.
Alegorias e fantasias da Roseira
“Tudo é grande. São Paulo gosta de tudo grande. Continuo com meu estilo, fantasias rebuscadas, detalhadas, mas a escola está muito colorida. Mas ao mesmo tempo ela está muito azul e rosa. O azul e rosa estarão presentes na escola inteira. Claro que entram outras cores, entre verde, laranja, tons terrosos, mas o azul e o rosa sempre estarão presentes. Quando Rosas estiver na avenida, as pessoas irão perceber que é uma escola azul e rosa”.
Pesquisa e descobertas
“O mais diferente de tudo é claro, contamos a luta do povo negro, e a herança que deixa para a nossa cultura. Mas a gente começa com África, antes dela ser invadida pelos brancos e antes dos negros serem escravizados. O mais importante do nosso enredo é a parte final dele que é a luta de hoje. Pois a luta de hoje não é uma luta que tenha virado enredo ainda. A escravidão, navio negreiro, sempre passou na avenida, mas o enredo que conte a luta de hoje, como esse povo se organiza para lutar por direito, respeito, igualdade. Não vemos toda hora como enredo de escola de samba, essa é a parte mais importante do enredo. Retratarmos essa luta como ela se movimenta hoje”.
Em três momentos diferentes, Paulo Menezes relatou sobre os quatro setores tradicionais nas escolas: “Para mim são mais setores”. Um dos motivos é: “Tripé tem muitos”. Por fim, o carnavalesco não gosta muito de revelar o jogo, disse: “Spoiler deixamos para a avenida”, sem dar muitos detalhes sobre os setores, mas contou quatro momentos:
Conheça o desfile da escola
Setor 1: Contando brevemente um pouco de cada momento, afinal Paulo Menezes gosta de trabalhar com tripés e mais setores, inicialmente disse: “Mostramos a África antes da chegada do branco”.
Setor 2: Para um segundo momento do desfile, a etapa contada será: “O branco chegando e escravizando”.
Setor 3: “Chegada no Brasil e distribuição do povo preto no Brasil, e a sua luta. Começa a luta pela busca da liberdade e resistência. Mostramos também a influência da cultura africana na cultura brasileira”.
Setor 4: “Por fim como essa luta se perpetua nos dias de hoje. Como mudou o pensamento do povo preto, e como hoje, as armas utilizadas para conquistar seus direitos”.
“Algumas (personalidades) vem representando personagens e outros vem sendo homenageados justamente pela sua história, legado, história de vida e de luta, esses vêm na última alegoria”.
Sobre os homenageados, a roseira tem anunciados personalidades negras em seu Instagram, Paulo falou alguns deles: “Milton Gonçalves, Ruth de Souza”, e do “carnaval de São Paulo serão vivos, tem muita gente bacana, até do carnaval, estamos resgatando”.
Recado do carnavalesco para a escola
“Pode esperar um carnaval lindo, está lindo. Uma escola feliz com o enredo e o que esperamos é que esse enredo plante uma semente na cabeça de cada um. Que as pessoas pensem, repensem as suas atitudes, suas maneiras de olhar o próximo, e o que pode fazer, cada um de nós, para mudar tudo isso que vivemos. Sabemos que é uma luta árdua, que não vai acabar tão cedo. Mas cada um é um grão de areia, cada um lutando, se unindo, sendo um aliado nesta luta, as coisas melhoram muito”.
Ficha técnica
Alegorias – 04
Componentes – 1.600
Alas – 19
Diretor de Barracão – Alexandre Vicente
Supervisor de fantasias e atelier – Binho e Edson
A Mocidade Alegre trará para o Sambódromo do Anhembi em 2023 o enredo “Yasuke”. Ao longo do desfile da escola, o público conhecerá a saga do negro que foi levado por jesuítas ao Japão e se tornou um dos maiores samurais de sua época. Em conversa com o Site CARNAVALESCO, Jorge Silveira, que assina o Carnaval da Morada do Samba, contou o que virá pela frente.
Origem do enredo
“O Yasuke apareceu para mim como uma possibilidade há mais ou menos dois anos, apresentado pelo Ricardo, que era meu assistente na época. Ele me apresentou o personagem, que eu não conhecia. Imediatamente, quando ele me mostrou, eu falei que achava ser um tema com um potencial enorme para Carnaval. Comecei a me debruçar sobre o assunto, buscar referências, bibliografia. Achei muito conteúdo na internet, muito material. Existem vários vídeos que falam sobre a história dele. Embora ele seja desconhecido no Ocidente, no Oriente ele é cultuado como um herói, então existe muito material farto sobre ele. A partir daí, comecei a aprofundar a pesquisa e criar uma linha narrativa que pudesse contar a saga do Yasuke. É assim que ele aparece para mim, como a sugestão de um amigo.”
Saga de Yasuke, segundo a Morada do Samba
Existem muitas informações a respeito da possível origem de Yasuke, sua vida no Japão e até mesmo o que aconteceu com o samurai. De acordo com o carnavalesco, a ideia é criar uma linha narrativa carnavalizada e de fácil leitura para o público nas arquibancadas.
“A versão que a Mocidade levará para a Avenida é a versão da Mocidade. Contaremos a trajetória histórica do personagem, desde quando ele chega ao Japão até ele desaparecer. Daremos um desfecho para essa história trazendo para o universo contemporâneo e adaptando para a nossa linguagem do Carnaval. Embora existam muitas formas de contar a história dele, o nosso foco, o que nos interessa, é a saga do herói, a construção do herói. O processo de construção da narrativa da história dele é tipicamente a construção de um mito, de um herói, que surge da adversidade e vai gradativamente construindo sua linha de crescimento até se transformar em uma referência para aquela sociedade. Usaremos essa mesma linha de trajetória. Contaremos de quando ele chega escravizado até o Oriente. É o primeiro negro que se tem história, naquela época, a pisar em solo japonês. É preciso contextualizar que o Japão, há 500 anos atrás, era um território fechado politicamente, que não se comunicava com os países vizinhos, que tinham uma série de restrições. Ele era um indivíduo diferente dos demais, então chamou muita atenção por isso. A partir desse contraste social, começo a desenhar a história até o desenlace, trazendo ele para o contemporâneo, para os dias atuais.”
Reação do Japão feudal ao ver um negro pela primeira vez
A história da humanidade tem uma grave mancha que é a escravidão dos negros africanos em prol da ganância de grandes impérios. Em contrapartida, a sociedade japonesa, por entre os fatores o fato de ser uma ilha, se desenvolveu de forma isolada do restante do mundo. Ao se depararem pela primeira vez com um homem forte e de pele negra, a reação foi totalmente diferente.
“Antes mesmo de eu trabalhar com o Yasuke, eu já sou naturalmente um admirador da cultura japonesa. Sempre fui um consumidor da cultura japonesa. Eu sempre percebi que eles tem um traço de humanidade, de generosidade, que é diferente do Ocidente. Em um primeiro momento, o personagem causou um contraste, mas logo depois ele foi compreendido, aceito e absorvido por suas qualidades e virtudes. Quando o negro foi trazido para o nosso território, o olhar era totalmente outro, totalmente adverso. No Oriente foi diferente, com ele foi diferente. Eles conseguiram enxergar nele as virtudes de um grande homem, o conhecimento de um grande homem. Tanto que ele foi catapultado à condição de ser apto a ser treinado para ser um samurai. O conceito de samurai é muito mais amplo do que os filmes e a cultura pop vendem para a gente. Um samurai nessa época é um homem de honra, de virtude, de dignidade. É um homem que é letrado, que entende de poesia, de artes. É um homem que tem uma vasta visão cultural. Não é só um homem de armas. Isso faz parte do ofício dele, mas ele sobretudo é uma pessoa que se destaca naquela sociedade. A cultura japonesa visualizou nesse homem, que até o momento não se chamava Yasuke. Esse encontro cultural é o que me chamou mais atenção. A maneira como essa bagagem que ele traz, como a ancestralidade dele africana é observada como um tesouro pela cultura japonesa ao ponto deles se juntarem, se mesclarem e criarem um novo indivíduo, único naquela sociedade”.
Um enredo com a essência da Mocidade Alegre
Conhecida por excelentes carnavais de temas ligados à África, em um primeiro momento pode soar estranho a Mocidade Alegre trazer uma temática ligada ao mundo Oriental. A jornada de Yasuke, porém, remete às suas origens ancestrais e inicialmente similar a de tantos outros negros escravizados que vieram ao Brasil. Na essência, é tão característico da Morada do Samba quanto outros consagrados na Avenida.
“Acho que é importante dizer que é um enredo de representatividade. É um enredo que traz a Mocidade, embora eu tenha até ouvido muitas pessoas dizendo que foge um pouco do tradicional, mas o enredo tem fundamentos que tem tudo a ver com a essência das coisas que a Mocidade gosta de trabalhar, que é ancestralidade, respeito à comunidade, um tema que se relacione com um conteúdo que as pessoas se identifiquem, e a comunidade criou uma relação de identidade muito forte com o personagem. Eu vejo isso no desenvolvimento do trabalho, vejo isso na quadra. Temos usado muito a expressão “Somos todos Yasuke”. Toda a nossa galera da diretoria que estará na pista durante o desfile, não estarão discriminados como harmonia, direção disso ou daquilo, na blusa estará escrito “Somos todos Yasuke”. Isso criou para nós um sentido de unidade. Ao invés de o único momento que o Yasuke aparece é no samba, encarnado em determinado momento em alegorias, como personagem ele o coletivo. Nós todos carregamos a história dele em um coletivo em conjunto. É uma escola que se fortifica pelo somatório da sua comunidade. Ela se identificou com o personagem e está carregando ele nos braços. Para mim, é o melhor que pode acontecer, o melhor dos mundos. É quando a comunidade acredita na ideia, se identifica e canta como se não tivesse amanhã”.
Conheça o desfile da Mocidade Alegre
A Mocidade Alegre fará um Carnaval na forma da saga de um herói. Conheceremos Yasuke desde suas origens africanas até ele se tornar o samurai que ficou conhecido como “o guerreiro com a força de dez homens”. O desfile de encerrará mostrando a maneira como os jovens negros da nossa sociedade atual precisam das mesmas virtudes de Yasuke para superar as adversidades da vida, renascendo a cada dia nos sonhos e lutas de cada um deles.
Setor 1 – A origem ancestral de Yasuke
“Abrimos o Carnaval mostrando a origem do Yasuke. Existem muitas possíveis origens para o personagem, e a mais provável tratada pelos historiadores, é que ele tenha vindo de Moçambique. E sendo um negro originário de Moçambique, a cultura religiosa é a cultura Banto, ao contrário da cultura Jeje-Nagô, que é a da maioria dos africanos que vieram ao Brasil escravizados. É uma outra linguagem cultural e espiritual. Existem outras divindades cultuadas por essas religiões. Eles tratam essas divindades como “Inquices”, e a nossa abertura faz referência a dois inquices da cultura Banto, que é Nzazi e Nzuzu, que são os guardiões dos mares e o guardião da força e da justiça. Simbolicamente no nosso enredo, eu escolhi essas duas divindades primeiro porque uma significaria a divindade que traz o personagem pelos mares até o Japão, que essa divindade guia o personagem pelos oceanos, e o outro inspira ele de força e coragem, qeu são as ferramentas necessárias para ele se tornar um samurai. Nossa abertura é a convocação dessas duas divindades que vão trazer o Yasuke e entregar até às divindades do Oriente, para que elas cuidem dele a partir desse momento”.
Setor 2 – O Japão conhece Yasuke
“A gente mostra o encontro cultural. Já é o personagem caminhando pelas terras japonesas e conhecendo esse mundo novo e diferente, e esse mundo novo o conhecendo. Temos nesse momento uma passagem muito importante que é o momento em que ele chega até o local, e pela diferença da cor, o Daimiô, que é o líder político local, ordena que ele seja lavado, que ele seja banhado, porque acreditava-se que estavam tentando pregar uma peça nele, que ele havia sido pintado. Diante disso ele é banhado, e obviamente a cor não sai, como o samba diz, revela a beleza dele, e aí o Daimiô, muito envergonhado, passa a querer conhecer e entender esse homem”.
Setor 3 – O guerreiro com a força de dez homens
“Mostramos a maneira como ele se torna Yasuke. Como ele se torna um samurai próximo ao Daimiô. Ganha a armadura, se torna guardião da espada do líder do local. Se torna o mais importante samurai da sua geração.”
Setor 4 – A luz de Yasuke renasce em cada jovem negro
“É o desfecho da história. Acredita-se que ele tenha desaparecido. Tem muitas versões. Não se sabe se ele voltou a morar com os jesuítas no final da vida, se ele morreu efetivamente em batalha, se ele virou um eremita no Japão e desapareceu. Para nós isso não é importante. Para nós é importante dizer que a alma dele renasce todas as vezes que um jovem da nossa cidade, da nossa periferia, precisa se erguer todo dia de manhã, se vestindo da armadura da coragem de um samurai, para enfrentar os desafios do preconceito, das diferentes sociais, para poder vencer essa batalha da vida. O Yasuke nasce e renasce toda vez que é necessário travar esses desafios. A maneira como o contexto cultural da nossa sociedade se organizou faz com que isso seja necessário, que os nossos jovens precisem ter essa força. É isso que a gente termina, com uma mensagem de esperança, de que o Yasuke é um exemplo a ser seguido por essa garotada, pela sua bravura, pela sua dignidade, pela sua honradez”.
Ficha técnica
Enredo: “Yasuke”
Alas: 19
Alegorias: 4
Componentes: 1600
Posição de desfile: Quinta a desfilar no sábado, dia 18 de fevereiro de 2023, pelo Grupo Especial
“O meu lugar é caminho de Ogum e Iansã, lá tem samba até de manhã”. Talvez, nenhuma música fale tanto sobre a forma com que Arlindo Cruz se relacionava com a vida, como a canção “O meu lugar” lançada pelo próprio compositor em 2007. Por isso, o carnavalesco Alex Souza, que em 2023 terá a responsabilidade de contar a vida do sambista, se apropriou do sucesso, produziu um enredo bastante relacionado com a canção e adaptou um pouco o nome para chegar ao enredo “Lugares de Arlindo”. De volta ao Grupo Especial, a Serrinha, nove vezes campeã do grupo de elite do carnaval carioca, vive um momento de reconstrução e espera permanecer e dar sequência a esse trabalho de recuperação da agremiação esperando o retorno aos tempos de Glória da Coroa Imperial. Nada melhor para inflamar ainda mais o orgulho do imperiano na Sapucaí do que falar de um grande baluarte da escola como é Arlindo Cruz. A ideia do enredo foi do presidente Sandro Avelar.
O carnavalesco Alex de Souza revela que tem aprendido e se impressionado muito com a vida e carreira deste grande artista que o Império Serrano vai homenagear no próximo carnaval.
“Confesso que eu não conhecia muito a fundo a história do Arlindo, conhecia aquilo que as pessoas estavam acostumadas, ele naturalmente era um homem de mídia até o momento do problema de saúde, mas algumas coisas me chamaram a atenção em relação ao número de obras dele que é enorme, muita coisa que foi gravada, e tem muita coisa que não foi gravada. Existe até uma certa controvérsia em relação a quantidade de músicas que ele compôs. Ele é uma figura queridíssima no meio musical, as pessoas gostam muito dele. Ele tem muito carisma, tem muita alegria e eu acho a obra dele muito agradável em termos de astral. Eu acho que o Arlindo tem uma coisa de obra de astral, e tem uma variedade muito grande também. Há um lado romântico, um lado do samba mais divertido, com umas tiradas, umas coisas mais engraçadas. Tem um lado mais engajado, de preocupação social. Tem um lado de religiosidade, que ele processa a fé no candomblé, mas é ecumênico, porque você encontra catolicismo na música dele, ele faz referência a várias religiões. Ele tem muitas inspirações na obra dele. E nos shows ele também trazia pessoas que eram de outros gêneros musicais para estar no palco com ele”, explica o carnavalesco.
Alex conta que aprovou desde o início a ideia do presidente Sandro Avelar de escolher para o desfile do Império de 2023 apresentar a vida e obra do sambista, acreditando que a emoção vai ser um algo a mais neste carnaval para tentar a permanência no Especial ou até sonhar com algo a mais.
Foto: Divulgação/Império Serrano
“É uma pena tudo isso que aconteceu com ele (Arlindo). Acho que para esse retorno do Império, foi uma ótima ideia do presidente trazer algo que tivesse emoção, tivesse uma relação muito forte com a escola. Eu fiz questão de fazer essa relação entre o Arlindo e o Império Serrano, porque ele se apaixona pelo Império e se põe como imperiano, a partir de 1989, quando ele ganha o primeiro samba-enredo dele. Ele é de uma família portelense. Além de ser da ala de compositores da escola, ele também prestou homenagem à escola nos shows e nos álbuns, gravando sambas-enredo, gravando sucessos de pessoas que fazem parte desta ala de compositores fantástica que a escola tem. E o mais interessante, o destino, ele venceu sambas-enredo em homenagem a ícones do Império e agora ele é um dos homenageados do Império, assim como Dona Ivone foi, Silas de Oliveira, que ele venceu”, descreve Alex de Souza.
Desfile pretende focar nas obras mas sem esquecer da vida do artista
Com mais de 700 obras oficialmente lançadas de acordo com órgãos de direitos autorais, e uma infinidade de canções que nem chegaram a isso, como passear durante pouco mais de uma hora de desfile por todo esse acervo e ainda falar da intensa vida do cantor? O desafio foi dado ao carnavalesco Alex de Souza que explicou qual a linha que vai seguir para este carnaval do Império.
“O meu desfile vai permear mais as obras do Arlindo. Cada fantasia é relacionada a uma música. Eu fiz questão de colocar quais eram seus parceiros, com quem ele compôs. Naturalmente tem um pouco da vida dele, principalmente isso vai ser retratado na comissão de frente, um pouco vem nas primeiras alas porque é inevitável falar do Fundo de Quintal, e falar do fundo de quintal é falar do Cacique de Ramos. Ele também tem as músicas dele daquele período de Fundo de Quintal, por exemplo, ‘Coração da massa’ é uma música que é do tempo do grupo e é uma homenagem ao Bloco Cacique de Ramos. Tudo é muito relacionado”, define o artista.
Foto: Divulgação/Império Serrano
Uma das grandes sacadas do enredo fica clara a partir do nome “Lugares de Arlindo”. A expressão faz referência à canção “O meu lugar”, grande sucesso do músico. Nela há muito do que é a essência de Arlindo Cruz. Por isso, foi escolhida por Alex para guiar o desfile do Império. Mas haverá referências também que não estão presentes na música.
“O norte de tudo é a música ‘O meu lugar’, porque é uma canção que ela em si já descreve muito do subúrbio, da Zona Norte, de Madureira e Adjacências, fala de religiosidade, fala de grandes figuras do Império, não deixa de falar da Portela. Aquela música, por si só, já é o enredo de fato. Só que eu não repeti o título, até porque tem outras coisas que são acrescentadas, por isso que eu coloquei ‘Os lugares de Arlindo’, porque a gente vai além da música. A música não fala do Cacique e o bloco é um dos lugares de Arlindo, o Fundo de Quintal é um dos lugares de Arlindo. O pagode da Tamarineira é um dos lugares de Arlindo. Tem outras músicas que vão além. A música ‘Banho de fé’ eu descobri depois de já ter criado todo um setor e uma alegoria que tinha tudo que essa música fala. Tem a coisa do compositor de samba-enredo, não só do Império, como de outras escolas. Essa coisa de ele ser do samba, do pagode e também da escola de samba, e ele tem como grande parceira dele a vida inteira, uma porta-bandeira, que também assinou músicas com ele, mãe dos filhos dele. É bem agradável, interessante e gostoso esse enredo”, confessa o carnavalesco.
Trabalho no Império retoma lembranças de infância para Alex de Souza
O Império Serrano será a quinta escola em que Alex de Souza assina um trabalho no Grupo Especial. Com quase 30 anos de carreira como carnavalesco, e mais alguns anos em outras funções, o artista se diz muito feliz de poder produzir o enredo de uma figura tão importante para os sambistas. Alex também lembra que já tem uma relação com a Serrinha de infância, principalmente por uma samba que ficou em seu coração no passado.
“Acho muito bacana a figura dele, a obra do Arlindo, e o tanto que estas pessoas gostam dele. Eu sempre tive em mente, meio de brincadeira, não muito imaginando assim que fosse fazer essas escolas que eram consideradas as quatro grandes do carnaval no passado. Então eu trabalhei no Salgueiro e estou no Império, ainda tem as outras duas. Mas, o Império é uma escola que eu tenho sambas-enredo inesquecíveis e que marcaram a minha vida, a minha infância. Eu com nove anos de idade quis acordar cedo para assistir o Império por causa do samba-enredo. Eu torci pelo Império, pelo menos uma vez, em 1993, quando ela estava no acesso, que era um samba do Arlindo, ‘Império Serrano – um ato de amor’ , que é um samba que eu amo, eu cheguei a ir na Estrada do Portela, no ensaio de rua, lembro do Marçal, que era mestre de bateria da Portela, mas estava no Império, e eu queria desfilar no Império naquele ano por causa do samba. O samba me chamava a atenção. Como foram as obras do carnaval de 1976, 1977 dos imigrantes, que eu adoro. Eu acho que o Império tem além da sua história, tem uma relação de sambas-enredo fantásticos. E estou eu aqui, são coisas da vida. Me sinto honrado e gostei da escolha do enredo pelo presidente”, relembra o profissional.
Foto: Lucas Santos/Site CARNAVALESCO
Além das lembranças de infância e juventude, no passado, o carnavalesco também já prestou serviços a Verde e Branca de Madureira fazendo desenhos para outros carnavalescos como Ernesto Nascimento, Sílvio Cunha, Actir Gonçalves, por volta dos anos 2000. Agora como carnavalesco, Alex, liderando o processo estético e criativo da escola, terá o desafio tornar legível toda a numerosa obra de Arlindo Cruz.
“Confesso que não foi uma coisa fácil de início, porque é complicado, seja pelo lado biográfico vasto, seja pela obra, você tem que pensar que você vai pegar letras de música e um pouco da vida desta pessoa e transformar em visual, fantasia, alegorias. Você tem que produzir uma linguagem visual para uma coisa que está toda nas palavras. Foi preciso criar de forma lúdica imagens retiradas das letras, dos títulos das músicas e um pouco da história dele, para ver o que vai render de imagem. Mas, acho que vai dar certo”, aposta o carnavalesco.
Imponência característica do Império será preservada
Nos últimos quatro carnavais, Alex esteve no Salgueiro, antes fez Vila Isabel,União da Ilha, Mocidade, Rocinha, só para citar o Grupo Especial. A chegada em uma nova escola sempre requer uma fase de adaptação, tanto na questão comportamental como, em relação aos carnavalescos, a questão da estética. É claro que existem diversos casos de parceria. Muitas vezes o profissional chega para realizar uma grande mudança, impor um estilo. Outras vezes é mais uma questão de resgate ou apenas de manutenção do jeito que a agremiação já possui para diversas questões. No caso de Alex, o artista aponta que, obviamente, vai trazer algo do seu estilo, mas pretendendo resgatar uma opulência e luxo que é característica da Serrinha.
“Eu gosto de tentar dependendo do enredo. O enredo às vezes pede uma outra coisa. Mas, tem o lado da escola, tem a personalidade da escola, o jeito de ser, uma característica da escola. Eu enxergo o Império como uma escola que tem um glamour, que tem uma imponência. É a coroa Imperial. Sem ser uma coisa antiquada, dentro das medidas algo luxuoso, algo que seja por esse lado. Porque eu acho que não cabe, na minha visão, uma coisa muito despojada. Eu acho que cada escola tem o seu jeito. Eu não acho legal descaracterizar completamente o que se espera de uma determinada escola. Eu já trabalhei com escola em verde e branco no passado, mas há muito tempo que eu não sei o que é isso. O verde eu achava que tinha uma certa dificuldade. Quando eu comecei o trabalho, eu pensei como o verde é uma cor derivada, você tem muitas tonalidades, eu brinquei com o que eu pude, todos os tons e sobretons de verde. Isso deu uma paleta de cores muito interessante, naturalmente por força do enredo você adiciona outras cores. Tem um pouco de tudo, mas eu acredito que vai ter um conjunto com mil tons de verde”, define o artista.
Um dos símbolos do Império Serrano é a coroa, que sempre gera expectativa se vai aparecer no desfile e como será representada no enredo. Alex Souza não quis revelar muito, mas deixou a impressão de que o símbolo estará presente e será um dos pontos altos do desfile.
“Quanto a coroa, é diferente quando você tem um animal que está representado todo o ano em uma escola. Você tem uma forma da coroa Imperial e você tem ela dentro de um contexto. Eu tenho uma coisa que acho melhor não falar, mas tem muito a ver com esse passado da escola e com suas conquistas. Eu estou unindo elementos que são fortes da história da escola, já para abrir o desfile e espero que cause uma grande impressão logo no início”.
Enredo identitário é trunfo para permanência no Especial
Outra grande questão que o Império Serrano terá que resolver é o fato de abrir o desfile. Essa colocação de apresentação tem sido um problema, neste século, de 21 desfiles, poucas agremiações que vieram do Acesso conseguiram permanecer no Grupo Especial, e mesmo assim, algumas foram em anos em que não houve rebaixamento. Alex revelou ao CARNAVALESCO o grande trunfo que acredita, a Serrinha ter, para vencer este desafio.
“Tem muitas outras escolas que abriram o carnaval que não tem a tradição que o Império tem. São escolas, de repente, muito mais novas, que não tem uma comunidade tão presente, ou uma escola que teve bons êxitos no grupo de Acesso, mas já tem esse pessoal espalhado por aí, de tudo quanto é lugar. No caso do Império, a escola tem aquela coisa de quem viveu a vida inteira ali. Eu sempre ouvi que o Império é uma escola formada por famílias. São várias famílias que fizeram a escola, e até hoje seus descendentes estão presentes. É uma escola que deveria estar na elite como sempre esteve. Logo no primeiro ano entre as grandes, em 1948, ela ganhou, foi fundada em 1947 e seguiu um tetra campeonato. Super escola de samba”, entende Alex.
O carnavalesco complementa falando sobre uma possível presença do cantor Arlindo Cruz que hoje encontra-se em uma situação de saúde que aspira cuidados, após o acidente vascular cerebral que o acometeu em 2017.
“A presença do Arlindo, se for possível, eu creio que trará uma grande comoção, sem dúvida. Acho que o grande trunfo da escola é a vontade do imperiano de botar para fora tudo que puder de empolgação, de alegria, de cantar o samba, dar a vida. Esse carnaval ou nada. Cada ano é um ano, a escola continua, os carnavais virão, mas é uma grande oportunidade de permanecer, tem que trazer essa força, essa garra. É uma escola que tem muitos apaixonados e uma boa parte é formada por gerações mais antigas, pessoas que viram as glórias da escola. Outra, são os mais jovens, que são de fato da comunidade. Acho que nesse sentido é bem raiz. Quem gosta, quem desfila no Império é porque gosta mesmo”, finaliza Alex de Souza.
Conheça o desfile do Império Serrano 2023
Para o próximo carnaval, o Império Serrano vai levar para a Sapucaí 5 carros, mais um tripé. Ao todo são 29 alas, e 3000 componentes. O carnavalesco Alex de Souza explicou mais sobre o que estará sendo representado em cada setor. “A abertura é imperiana mesmo”.
Primeiro Setor: “É uma primeira parte que tem o primeiro samba que foi gravado, a entrada no Fundo de Quintal, o Cacique de Ramos, para fazer essa ligação”.
Segundo Setor: “Neste segundo momento, a gente vai mostrando o subúrbio, um subúrbio boêmio”.
Terceiro Setor: “Depois a gente vai ter uma parte mais religiosa, essa coisa do candomblé, da umbanda”.
Quarto Setor: “Representamos uma parte do pagode romântico e uma menção às músicas românticas”.
Quinto Setor: “Neste momento falamos da parte do Arlindo como compositor de escola de samba. Neste setor também tem o grande amor da vida dele, que é a porta-bandeira Babi Cruz”.
Sexto Setor: “Neste vem a grande homenagem que ele sempre prestou ao Império Serrano e encerra com o ‘show tem que continuar’, e é o próprio Império homenageando o Arlindo”.