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Barracões: Paraíso do Tuiuti aposta em nova abertura de impacto para repetir sucesso do desfile de 2018

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barracao tuiuti2019 1Apesar de buscar com seu enredo ‘O Salvador da Pátria’ uma temática bem diferente da de 2018, o Paraíso do Tuiuti vai atrás da mesma fórmula de sucesso que deu à escola a sua melhor colocação na sua história. A abertura do desfile da escola é a grande aposta do carnavalesco Jack Vasconcelos, que recebeu a reportagem do CARNAVALESCO no barracão, e admitiu ter preparado uma abertura suntuosa.

“Eu não tenho um xodó em um projeto. Não é discurso pronto não. Todos os filhos demandam atenção. Mas eu gosto de fazer entrada, é um momento que eu presto muita atenção, pois ali o público decide se vai prestar atenção ou se vai para o banheiro. As nossas esculturas são belíssimas, gosto bastante delas. A grande sacada do enredo em termos visuais é a transformação do bode”, adiantou.

Apostando em um enredo com forte temática política, Jack Vasconcelos revela que recebeu a ideia de desenvolver a história do bode iôiô muito antes da polarização ideológica que se acirrou no país, mas admite que a decisão de desenvolver em 2019 a proposta veio na esteira de ofensas que recebeu após o desfile de 2018.

barracao tuiuti2019 3“Esse enredo na verdade chegou até mim pelas mãos do João Gustavo Mello. Ele é cearense e havia me procurado na época que fiz o Boi Mansinho, em 2016. Achei a ideia incrível. Só tive que esperar um pouco pois era muito bicho né (risos). Logo depois do enredo do ano passado, havia percebido certo alvoroço nessa questão da polarização política, já que tivemos um ano eleitoral. Eu e o destaque que desfilou de vampiro em 2018 recebemos algumas mensagens agressivas e violentas. Pensei comigo quando começou essa intolerância do brasileiro, de não entender uma brincadeira carnavalesca. O bode para mim era uma boa resposta de bom humor a tanto ódio. Nosso enredo ano passado era denso e eu queria esse ano algo mais alegre. Um outro espírito”, disse Jack.

barracao tuiuti2019 7Ao contrário do desfile apresentado em 2018, que era denso, triste e carregado na emoção, o Tuiuti em 2019 vai ser jocoso, divertido e leve. Jack Vasconcelos traz uma temática nordestina e garante que isso foi um fator preponderante em um ano onde a crise de materiais deixou muitas escolas em apuros.

“O que me salvou foi o enredo ser nordestino e ter uma pegada colorida. Pude usar materiais variados e brincar com eles. Posso juntá-los, e isso cria um efeito muito bacana. Os fornecedores deixam de comprar determinados materiais devido à forte crise econômica mesmo, não é só no carnaval. Vindo do acesso temos um certo know-how do não ter. Nesse campo eu sofro menos que outros colegas”, adianta.

Conheça o desfile

Setor 1: A seca de 1915. Dizem que o bode iôiô veio para Fortaleza com os retirantes oriundos dessa seca.

barracao tuiuti2019 2Setor 2: A cidade de Fortaleza. A Avenida Dragão do Mar, vendedores da praia, o primeiro ambiente onde o iôiô vai viver e é comprado pela Companhia Dragão de Peles. Vira mascote e vai vier na avenida Beira-Mar.

Setor 3: O bode passeando pelas ruas à noite. Bares, mafuás, poetas e boêmios da época.

Setor 4: A Bella Époque. O aformoseamento da cidade de Fortaleza. Algo parecido com o que tivemos no Rio. Essa higienização da cidade, jogando os mais pobres para áreas periféricas

barracao tuiuti2019 5Setor 5: O jogo de poder dos políticos em cima dos mais pobres. A elite se junta à política. O uso dos mais pobres pela classe política. A eleição do iôiô é uma consequência dessa situação. A insatisfação das pessoas em cima disso.

Setor 6: O iôiô como representante da resistência. Aqueles que precisam ter voz. O grande exemplo do bode no decorrer do enredo é para continuarmos a ser o que somos. Ele frequentava os lugares chiques, mas era um representante da pobreza, que aquela elite não queria nem ver. Ele se tornou um ícone de resistência popular.

Entrevistão com Gilmar, mestre de bateria do Império Serrano: ‘É o ano mais desafiador pra mim’

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Por Thaise Lima

Com um desafio enorme nas mãos, mestre Gilmar da tradicional Sinfônica recebeu a reportagem do CARNAVALESCO para a série ‘Entrevistão’ e está convicto de que mesmo com todas as críticas do público, o Império Serrano vai brilhar a avenida e desconstruir toda essa má impressão de colocar uma música de MPB na Marquês de Sapucaí como um samba-enredo.

Qual é o tamanho do seu desafio em acompanhar o samba de 2019?

Imperio ensaiotecnico 2019 17“Na minha carreira como mestre de bateria é o divisor de águas. Uma coisa é você tocar numa festa de 15 anos, qualquer tipo de animação em festa, em eventos e você fazer 5, 10 passadas, uma outra coisa é você levar esse tipo de samba para a avenida e conseguir sustentar esse samba no andamento em que a grande comunidade e todos que estão ali podem cantar. Isso é muito desafiador, até para a gente achar um ponto de equilíbrio um andamento confortável. Eu posso dizer na minha carreira é o ano mais desafiador pra mim, mas está sendo o ano mais prazeroso. Está sendo um ano diferente de todos esses anos que eu já trabalhei como mestra de bateria”.

Quando soube pela primeira vez que levaria a música do Gonzaguinha para Avenida o que sentiu e pensou?

Imperio ensaiotecnico 2019 15ASSUSTADOR! Lembro que foi numa segunda-feira e me falaram pra dar um pulinho no barracão que iria ter uma reunião. O carnavalesco sentou junto com o diretor e a presidente e falaram assim: ‘Gilmar, estamos com uma ideia inovadora, queremos revolucionar o carnaval, o Império sempre trouxe coisas diferentes para o carnaval e ano a gente quer fazer uma coisa diferente, queremos colocar essa música para o carnaval de 2019’. Eu disse que achei legal, e perguntei se aquele seria o enredo e e eles me falaram ‘Não, Gilmar. Esse vai ser o samba-enredo’. Eu fiquei parado, olhei para o carnavalesco e em primeiro momento só falei as partes negativas, exemplo “como era ter o Império Serrano sem disputa de samba, como vai ser passado isso para os compositores? como vai ser passado para a comunidade? O Império é a escola que tem a ala de compositores que tem mais belos sambas da história do carnaval, como vai ser pegar uma música que não é samba-enredo, é uma MPB e transformar para samba-enredo? Inclusive, tem uma parte da música que a métrica é muito complicada para ser cantada, eles apostaram numa coisa que na arquibancada qualquer criancinha vai saber cantar, mas e a opinião pública? Eu
vim muito assustado pra casa, mas sou movido a desafios. Se der certo, a gente nunca fez isso. Fiquei pensando que poderia ser 8 como também podia ser 80. Depois começou a melhorar, fizemos a gravação, amigos meus que não aceitavam hoje vem no ensaio, apertam minha mão e dizem que eram contra isso. No início, 80% das reações foram negativas, mas hoje se você vê os imperianos que estão aqui comigo dizem que mudam totalmente a opinião sobre o que vocês estão fazendo, as pessoas ficam encantadas, acho que o público tinha medo de como iria ser cantado. Começamos o nosso ensaio em junho, e fomos acertar tudo no final do ano. Trabalhamos muito andamento para acharmos
uma média, hoje posso falar que achamos uma medida boa no tempo de desfile”.

O que fez na bateria para ajudar na condução do samba?

Imperio ensaiotecnico 2019 14Primeiramente foi o andamento. Temos uma famosa virada de três em toda passada de samba e quem entende de bateria sabe, que só o Império faz isso, pra esse ano vimos que não iria encaixar muito bem toda essa passada. Não colocamos para ajudar no bom andamento, achamos que isso poderia atrapalhar e também não ia encaixar com o canto, e as nossas bossas. O Império se você colocar na história, sempre gostei de bossas muito descompassadas, torta, esse ano eu vi que se fizesse isso nesse tipo de música, eu iria me estrepar. Tive que sair do Gilmar, da minha referência, do que eu gosto de fazer. Eu peguei totalmente a melodia da música, porque eu poderia ser taxado de acabar com uma música popular. Os pontos primordiais foram a virada de três, o andamento e as minhas bossas, tive que rever muito as bossas que a gente gosta de trabalhar para esse tipo de música. Vamos usar bossas sim, mas não as que o mestre Gilmar está acostumado a usar”.

Você assumiu o comando pós Átila. Como foi o período?

“Eu nunca achei que o Átila fosse sair do Império. Pra mim, ele seria eterno no Império, por isso nunca almejei me tornar mestre de bateria do Império. Quando eu assumi a bateria em termos de ritmo, não tive problema nenhum, vi que o Átila já me preparava para isso há muito tempo. Eu assumi o lugar de um ícone. Átila não é meu cunhado, ele é meu irmão. Eu não considero que eu alcancei nada que o Átila alcançou, não por reconhecimento e mérito não, é porque ele sempre foi um cara muito dedicado a bateria do Império. Eu só tive medo de mostrar para o mundo do samba que era o mestre Gilmar que estava assumindo a bateria da Sinfônica. Mas em 2010 foi 40 pontos com vários prêmios e reconhecimento. Aos poucos eu fui colocando algumas coisas minhas na bateria”.

É fácil ou difícil comandar uma bateria tão tradicional como é a do Império? 

“Em relação ao carnaval de 2019 foi muito difícil. Com receio de como seria a performance da bateria na avenida. É complicado pensar como vou ser julgado. Se você me perguntar se eu tenho medo, eu digo que tenho medo por se tratar de um clássico e uma escola tradicional que tem suas características”.

Você acha que se fosse uma outra escola de samba que não tem essa tradição toda de bateria, acha que a aceitação seria mais fácil?

“Acho que sim, bem mais fácil, porque é uma escola tradicional. Por exemplo, se fosse a Grande Rio, é uma escola que gosta de fazer enredos irreverentes, aquelas músicas alegres, acho que até cairia bem para eles. Mas, a bateria do Império tocar isso, tradicional do Rio de Janeiro é bem complicado”.

Hoje muitas escolas usam agogôs do Império. O que representa isso para vocês?

Imperio ensaiotecnico 2019 87“É uma questão de alegria saber que o Império Serrano, a minha escola levou para o mundo, não é só aqui no Rio, em São Paulo, a mídia de lá me liga para saber de agogô, dar aula, porque a referência é nossa. As vezes eu vou dar aula para pessoas de outros países por conta do agogô. É uma referência muito bacana, saber que um instrumento que foi criado dentro da escola de samba Império Serrano, mas que outras coirmãs e mestres de baterias acham legal e bom para a bateria deles. Mas essa aceitação já foi muito difícil, antes eu achava que estavam copiando o agogô do Império, hoje em dia não, tudo que é bom se copia. Hoje nós temos o agogô do Império”.

Mudaria algo no julgamento do quesito Bateria? 

Imperio ensaiotecnico 2019 18“Eu mudaria o fato de que o jurado não pode ter um bate papo com quem vai ser
julgado. Por que quem julga não pode ouvir quem está sendo julgado? Por que eu não posso tirar uma dúvida com ele? Por que eu não posso sentar numa plenária e fazer perguntas técnicas para ele? Às vezes muitos argumentos deles não vem bem explicados, os jurados escrevem coisas pra gente e pronto acabou. Eu sou julgado e não posso conversar? Ano que vem ele vai me julgar da mesma forma e eu não posso tirar minhas dúvidas com eles. Acho que as baterias não devem ser julgadas de uma só maneira, eu tenho uma característica, a Mocidade tem outra, a Grande Rio tem a bateria dela, o Salgueiro, Mangueira, Portela . . . muita gente acha que a caixa que toca em cima é tudo igual. Negativo. Acho que tinha que ter um meio termo e conversar, tínhamos que
ouvir e ser ouvidos”.

Ano passado o Império acabou rebaixado e foi salvo. Esse ano a escola sofre como todas. Como mudar essa realidade do Império?

Acho que foi uma grande injustiça colocar o Império como a primeira escola a desfilar. A escola que sobe não tem o mesmo recurso de quem está no Especial há anos. Não tem as mesmas parcerias. O Império Serrano não tem patrono, temos a presidente e a nossa administração. Pegam recursos, patrocínios, mas hoje até para você ter isso é complicado. É uma escola que o recurso é totalmente dela ou de parceiros, acho que tinham que olhar bem a mão como vai ser julgada, não quero clemência, negativo, só quero ser julgado igual uma escola que vai passar na segunda-feira sendo a quarta escola a desfilar”.

O que você pensa que precisa ser feito para o imperiano voltar a acreditar na
escola no topo do ranking e chegar a décima conquista?

ensaio rua império serrano 2019 055“Os imperianos deixarem a política de lado, porque eu sinto falta de muitos amigos
de verdade. Eu nunca participei de nenhuma política de quem vai ser o
presidente. A bateria do Império nunca se meteu, os ritmistas nunca se meteram e
nem tivemos esse negócio de fechar com o mestre tal, pra eleger o futuro presidente. Nunca quis, sempre fui neutro, se chegar um presidente e falar ‘fecha comigo se não você não vai ficar ’ eu vou dizer que tudo bem, se vai entrar e me tirar ok, graças a Deus até hoje nunca aconteceu isso comigo. Acho que a escola tem que se unir, não estou falando que o Império é uma escola desunida, eu digo se unir politicamente, temos pessoas muito inteligentes e influentes dentro da escola, se pegarmos essas influências juntas, ninguém seguraria o Império Serrano. Nunca pensei nisso, mas se hoje eu fosse candidato a presidente do Império, eu iria pegar todos esses amigos que estão longe e iria falar que aqui só precisamos de um presidente, podemos nos juntar e tocar o Império pra frente, eu iria unir mais quem entende de carnaval, fora isso, o Império Serrano tem tudo que uma escola precisa”.

Barracões: Criticando a educação do brasileiro, Grande Rio terá velha-guarda como professores

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Depois da polêmica virada de mesa que garantiu a Grande Rio na elite do carnaval carioca, a escola optou por fazer um enredo em que abordará a crise na educação brasileira, com direito a um mea-culpa onde a tricolor de Caxias assumirá o erro em ter virado a mesa na Liesa. A dupla de carnavalescos, Renato Lage e Márcia Lage falou ao site CARNAVALESCO sobre a proposta e confirma que a virada já virá no carro abre-alas.

barracao grio2019 3“Ela vem no jogo de xadrez. É pua estratégia. Foi um aspecto intencional do enredo, abrir logo com o tabuleiro virando. Ali está o momento da virada de mesa. A Grande Rio não foi a primeira a virar a mesa e esperamos que tenha sido a última. Isso deve servir de lição”, adianta a carnavalesca Márcia Lage.

Embora a escola tenha optado por se inserir na falta de parâmetros educacionais na atual sociedade brasileira, a ideia inicial do enredo nada teve a ver com a virada de mesa. Renato Lage confirma que a proposta veio de uma importante instituição educacional brasileira e eles buscaram uma adaptação.

“Recebemos a proposta do patrocínio. O tema sugerido por encomenda era educação, Nós decidimos não fazer uma coisa careta então decidimos fazer a falta dela. E nesse sentido fizemos um mea-culpa também. É uma necessidade de se ter educação. Não estamos elogiando o que é errado. As alas e carros são causa e consequência”, explica Renato.

‘Carnaval precisa ter leitura’, afirma Renato Lage

Buscando um carnaval de muita interatividade com o público, Renato e Márcia usarão no desfile a linguagem dos emojis, presentes nos aplicativos de trocas de mensagens instantâneas. A intenção é produzir um projeto de fácil leitura e assimilação no público.

“Carnaval tem que ter leitura. O belo pelo belo que não diz nada e não faz as pessoas entenderem é uma inutilidade”, destaca Renato.

Embora tenha um traço de carregada crítica social, o enredo não trará aspectos políticos, como explica a carnavalesca Márcia Lage.

barracao grio2019 2“Não vamos tocar em nada político. Não gostamos. A leitura de nosso enredo é atual, mas não tomamos lado político algum. Infelizmente vivemos fatos que foram noticiados recentemente que se encaixam no cotidiano social abordado pelo enredo. É uma chamada de atenção às necessidades do momento. É um enredo em que a carapuça vai servir”, explicou.

barracao grio2019 1Apesar do patrocínio obtido pela Grande Rio para o desfile, Renato Lage afirma que a escola trabalhou com restrição e a decoração nos carros só começou cerca de 40 dias antes do desfile.

“Esse ano trabalhamos com restrição, apesar do apoio de patrocínio. Esse ano começamos o trabalho de decoração no final de janeiro. Isso pode comprometer seriamente a qualidade e o acabamento das alegorias e fantasias. A crise nos afetou nesse sentido. Não é porquê a escola tem patrono que o dinheiro jorra não. Contamos assim como todas as outras do apoio da subvenção”, adiantou.

Conheça o desfile

Setor 1: “Partimos do jogo da vida, um tabuleiro de xadrez. Ele gira. Nesse momento vamos lembrar a virada de mesa. De um lado o jogo em si e do outro os emojis. Usamos dessa linguagem moderna e atual. Uma hora você está em cima, outra hora está embaixo. Nem sempre de forma limpa ou dentro das regras do jogo.”

Setor 2: “A educação (ou falta de) no trânsito. Existe a causa e consequência.”

Setor 3: “A deseducação com o meio ambiente. A alegoria foi inspirada em trecho do samba: ‘cardumes de garrafas pelo mar’. Diariamente vimos acidentes ambientais, enchentes. Não adianta delegar só aos órgãos públicos.”

Setor 4: “A deseducação na internet. Deu ruim na rede. Ao mesmo tempo que a rede social agrega, ela separa pois às vezes você se isola. Uma opinião mau dada pode causar ataques. É uma seara de muita agressão, algumas vezes de forma violenta. Isso gera uma falta de verdade nas pessoas.”

Setor 5: “Entramos na educação formal. A velha guarda representa os professores. Temos a alegoria da ciência e tecnologia no quinto carro, com uma escultura do Albert Einsten que vai vir girando na avenida.”

Setor 6: “Um corso tradicional com a escola pedindo paz, sem agressividade, violência. O propósito do carnaval é amenizar as mazelas. Fechamos com uma alegoria toda branca que é um pedido de paz, como diz a letra do nosso samba, ‘falam de mim, eu falo de paz'”.

Após matéria do CARNAVALESCO, fã de Clara Nunes ganha convite e vai desfilar na Portela no Carnaval 2019

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Por Diogo Cesar Sampaio

torcedor portela clara 11Há algumas semanas, o site CARNAVALESCO fez uma reportagem com Kennedy Meirelles, fã e pesquisador de Clara Nunes, que possui uma coleção de aproximadamente dois mil itens relacionados a tal mineira, muitos deles exclusivos e inéditos do grande público. Um material que impressiona e demonstra um pouco da relação de amor que Kennedy tem pela cantora.

Na matéria anterior, Kennedy mostrou um pouco da sua coleção, falou sobre Clara e a constante presença da cantora em sua vida, através da obra e do legado deixado. Ele também comentou sobre a importância e o simbolismo da homenagem que a Portela apresentará esse ano a Clara Nunes, além de demonstra sua alegria com tal reverência.

torcedor portela clara 1Com o sucesso da reportagem, a história de Kennedy e sua paixão por Clara Nunes comoveu sambistas, fãs da cantora e portelenses de toda a parte, até mesmo os mais ilustres. Dentre eles, o presidente da azul e branca de Oswaldo Cruz e Madureira, Luis Carlos Magalhães, que ao descobrir que Kennedy não iria desfilar, fez questão de convidá-lo para participar da homenagem.

torcedor portela clara 2“A presença do Kennedy será muito bem-vinda em nosso desfile. Ele é mais do que um fã, é um verdadeiro guardião da memória da Clara. A matéria feita pelo site CARNAVALESCO mostrou isso. É impressionante a coleção dele, com tudo da Clara e mais um pouco”, declarou o presidente Luis Carlos Magalhães.

O convite da Portela deixou Kennedy radiante de alegria. No entanto, o mesmo ainda não sabe nenhum dos detalhes de onde e como vai desfilar. A escola guarda isso a sete chaves, e pretende fazer uma surpresa para o próprio.

torcedor portela clara 3“É um sonho. Foram muitos anos esperando essa homenagem e poder fazer parte disso, é muito gratificante. É uma sensação de êxtase. A Clara está ligada na minha vida desde o início. Ela faz parte de mim, do meu cotidiano.”, disse Kennedy ao falar do convite.

Mas o convite da escola não ficou restrito a participação no desfile oficial. Kennedy também foi convidado a visitar o barracão da Portela, e pode conhecer de perto o que a escola vem preparando para a homenagem a Clara.

“Decidimos convidá-lo para vir ao barracão, além de chamá-lo pra desfilar. Teremos muitos fãs participando do desfile também. Tenho certeza que será um desfile inesquecível”, garante Luis Carlos Magalhães.

torcedor portela clara 4Kennedy foi recebido e guiado no barracão pelo assessor de imprensa da escola, Raphael Azevedo. Logo ao chegar, fez questão de deixar um presente, um disco de Clara Nunes vindo da sua coleção. Em troca, foi presenteado com uma camisa da Portela, além de um DVD e um cd da azul e branca.

O passeio começou com um momento emocionante para Kennedy. Uma das primeiras paradas foi na sala da carnavalesca Rosa Magalhães, onde conheceu todo o projeto do carnaval da Portela, os desenhos, além de ter tido a oportunidade de conversar com Rosa. Um encontro, que na verdade se tratou de um reencontro.

torcedor portela clara 5“Por volta do ano de 2006 ou de 2007, eu estava em Copacabana, e a Rosa estava esperando um táxi. Então, resolvi abordar a Rosa. Eu sempre gostei muito do trabalho dela, sempre foi muito caprichosa com os carros, muito detalhista. E naquela ocasião, eu sugeri a Rosa dela fazer um enredo para a Clara, mesmo na época ela não estando na Portela. Foi uma coisa muito rápida. Foi uma coisa que eu lembrei, mas que ela nem se lembra. E olha a coincidência, hoje ela está na Portela fazendo o enredo e eu vou fazer parte disso (risos)”.

Artista plástico, Kennedy levou de presente para Rosa uma de suas obras. Uma pedra em formato de rubi, na cor azul, com uma estrutura e pétalas em cobre e uma base espelhada. A escolha da cor trata-se de uma homenagem a esse momento dela Portela e ele acredita que algo que possa dar sorte.

Além da parte administrativa, Kennedy também conheceu os protótipos e viu de perto aonde são confeccionadas as fantasias. Com os olhos brilhando, mesclava momentos de muita fala com outros de silêncio total. A cada ambiente, olhava para todos os cantos, tentando absorver o máximo de detalhes que podia, E ainda no ateliê das fantasias, teve a oportunidade de experimentar uma das cabeças de um dos figurinos.

torcedor portela clara 6E quando esteve no primeiro andar do barracão, onde ficam as alegorias, não foi diferente. Ao bater o olho em um dos carros, Kennedy já o identificou e se comoveu na hora. Seu semblante demonstrava a importância daquilo que estava vivendo e presenciando.

“A visita ao barracão… É muito estranho, porque você poder chegar e ver… Eu tive essa experiência em outras escolas. Entrar aqui fez passar um filme na minha cabeça. Cada coisa que fui vendo, as pessoas trabalhando, a confecção, as coisas antes de estarem montadas, me deixou muito emocionado. Quando eu vi a alegoria da capela, em homenagem a terra natal da Clara, mexeu muito comigo. É uma coisa muito legal, além de participar, poder ver de tão perto as coisas. É muito emocionante”.

Kennedy já havia visitado outros barracões, além de ter participado de outros desfiles em homenagem a Clara, no entanto, ele garante ser essa a maior de todas as homenagens. Simplesmente pelo fato de ser Portela e Clara Nunes.

torcedor portela clara 7“Várias escolas já fizeram homenagens. Começou com a Vizinha Faladeira que foi campeã com “Clara Nunes, o canto de um povo”. Todas as homenagens que vieram sempre foram bacanas e emocionantes, porque cada vez a gente está lembrando a Clara. Mas sempre ficou um vazio, porque toda vez que outra escola homenageava a Clara, automaticamente nós fãs, e os portelenses também, pensa logo na Portela. E se questionava do porque da escola nunca fazer essa homenagem. Quando se fala em Clara Nunes, a gente liga logo a Portela. E vice versa. Então, essa homenagem é a maior de todas. A gente esperou 35 anos por esse enredo, tanto fãs da Clara, quanto os portelenses. Ver isso concretizado agora deixa uma sensação de dever cumprido. A Portela devia isso a Clara. A Clara a vida inteira foi Portela, nunca desfilou em outra escola. O amor dela pela Portela era incondicional”.

torcedor portela clara 8E após visitar o barracão, e ver de perto o que a Portela prepara para o seu desfile, Kennedy ficou feliz com que viu. Emocionado com o que está vivendo, e com o convite para desfilar, ele diz que só tem o que agradecer ao site CARNAVALESCO, por toda a projeção e repercussão da matéria:

“Em relação ao site CARNAVALESCO eu tenho que agradecer e parabenizar a todo mundo da equipe. A matéria me surpreendeu. Não só a mim. Praticamente 100% das pessoas elogiaram a matéria, que foi muito bem escrita. E muita gente, não só no Brasil como também no exterior, gente que eu não falava há muitos anos, me acessaram da Alemanha, da França, dos Estados Unidos, da Itália. Teve uma projeção muito legal”.

torcedor portela clara 9

A Portela é a terceira escola a desfilar na segunda-feira de carnaval. A Majestade do Samba traz o enredo “Na Madureira moderníssima, hei sempre de ouvir cantar uma Sabiá”, sobre a cantora Clara Nunes, que é assinado pela carnavalesca Rosa Magalhães.

Ouça agora o debate sobre o primeiro dia de desfiles da Série A em 2019

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    Ouça agora o esquenta para os desfiles desta sexta-feira no Grupo Especial de São Paulo

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    Leonardo Antan: os altos e baixos dos enredos da Série A para 2019

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      Por Leonardo Antan

      antanEm meio a forte crise financeira e identitária que passa o carnaval das escolas de samba, as agremiações da Série A são as que mais sofrem em meios a súbitos cortes de verbas e a falta de estrutura de barracões. Em meio a tantas dificuldades, os
      carnavalescos do grupo precisam de o dobro de criatividade e jogo de cintura para materializar seus temas e fazer um bom desfile.

      Mas se engana quem acha que com tantas intempéries, os enredos do grupo estejam
      fraco ou poucos diversos, pelo contrário, com propostas criativas que vão desde grande homenagens a temas tipicamente brasileiros, compondo um painel multifacetado e pra lá de interessante para quem vai acompanhar o show do grupo de acesso carioca.

      Ainda não entendeu algum enredo? Tá perdido? Vem, que a hora se saber de tudo
      para a Série A de 2019!

      Os vultos e efemérides

      É homenagem que vocês querem? Sempre comuns no grupo, as biografias e grandes
      tributos a personalidades são um verdadeiro trunfo para conquistar o público e fazer
      uma bom desfile. Em 2019, três escolas farão homenagens a nomes importantes da
      cultura brasileira, mais do que isso, chama a atenção o fato destes enredos estarem
      ligados pelo universo das artes dramáticas. Dois deles são sobre autores negros,
      ambos pioneiros em suas áreas, e outro homenageia um dos grandes autores do país.

      Na Santa Cruz, a homenageada é a grande Ruth de Souza, pioneira do protagonismo
      negro no teatro, na TV e no cinema. Nas telonas, também brilhou Antônio Pitanga, um
      dos atores mais importantes da nossa sétima arte que será cantada pela Porto da
      Pedra. O desenvolvimento, nos dois casos, chama a atenção pela clareza, ambos
      farão um passeio pela obra dos homenageados, falando de filmes, novelas e peças
      que ambos fizeram. Aquela receita clássica e sem invencionices, nada mal, pelo
      contrário.

      Quem propõe uma narrativa diferente é o enredo da Unidos de Padre Miguel sobre o
      dramaturgo Dias Gomes, assinado pelo grande enredista João Gustavo Melo, a
      proposta vai além de um simples passeio biográfico e pensa o imaginário poética das
      obras do homenageado, passeando por suas novelas e peças mais emblemáticas,
      aproveitando para fazer críticas ao momento atual do país. O primeiro setor lembrará a
      clássica “O pagador de promessas”, debatendo a intolerância religiosa, depois as
      grandes novelas do autor cruzaram a avenida, separadas nas tramas rurais e urbanas,
      finalizando com seu maior sucesso “Saramandaia”.

      Andar com fé eu vou

      Um levantamento que chama atenção nos temas que cruzarão a Sapucaí na sexta e
      no sábado de carnaval é que a linha preferida dos artistas do grupo foi a de enredos
      que versam sobre religião e fé. Nada menos que cinco enredos do grupo, entre treze,
      falarão da relação do homem com o sagrado.

      Abrindo os desfiles, a Unidos da Ponte retornará a Sapucaí apostando na reedição do
      seu samba clássico de 1984, que fala sobre as diversas oferendas aos orixás do
      candomblé nagô brasileiro. O enredo não poderia ser mais objetivo, fará um passeio
      pelas principais divindades africanas que já estamos muito acostumados a ver na
      Avenida. Curimba boa garantida.

      Outra escola que falará de religiões afro-brasileiras é a Alegria do Zona Sul, só que ao
      invés do popular candomblé nagô-yorubá, muito difundindo nos desfiles, a vermelho e
      branco propõe uma exaltação à Umbanda, religião tipicamente brasileira surgida do
      sincretismo de europeus, africanos e indígenas. Desenvolvido pelo enredista Diego
      Araújo, não faltarão citações aos personagens típicos dos rituais da religião, como a
      Pomba-Gira, o Zé Pilintra, os Caboclos e Pretos Velhos. De proposta simples, o tema
      pode ser materializado com fácil leitura.

      Falou de religiões de matriz africana é impossível não lembrar da intolerância e do
      preconceito, infelizmente, mas esse será justamente o tema da Acadêmicos do
      Sossego. A escola de Niterói terá como figura central do enredo Jesus Malverde, um
      santo não oficial cultuado no México. Sem registros históricos sobre a existência real
      da figura, ele é cultuado por narcotraficantes como uma espécie de Robin Hood. É
      através desse personagem controverso, que o carnavalesco Leandro Valente pretende
      passar uma mensagem contra a intolerância. Resta saber como tudo isso renderá em
      quatro setores, a sinopse não dá muitas pistas a respeito.

      Continuando na América Central, mas trocando o México pelo Panamá, a Estácio de
      Sá traz um enredo que falará da fé católica ao Jesus Nazareno de Portobello, um
      cristo negro símbolo do país. Escrito pelo jornalista Daniel Targueta, o enredo passeia
      pelo mito de descobrimento da imagem, a festa em sua homenagem e termina
      celebrando a união dos povos. Com forte pegada religiosa, o enredo tem os elementos
      necessários para um bom desfile da vermelho e branco.

      Ainda falando de fé, o enredo mais original nesta linha é o de outra escola de Niterói, a
      Acadêmicos do Cubango vai abordar os objetos de fé no enredo “Igbá Cubango: a
      alma das coisas”. Assinados pelos talentosos carnavalescos Gabriel Haddad e
      Leonardo Bora, os quatro setores vão passear na relação entre homem e o sagrado
      através dos ex-votos, passando não só pelos objetos oferecidos em agradecimento
      aos santos mas também em objetos como os amuletos de proteção.

      Por fim, um enredo que também abordará a religião, de alguma maneira, será o da
      Renascer de Jacarepaguá, que vai cantar o “Dia 2 de fevereiro no Rio Vermelho”,
      falando da festa de Iemanjá num dos bairros mais tradicionais de Salvador. É verdade
      que o enredo passeará ainda por outros aspectos culturais da capital baiana, mas o
      mote central será a grande festa sincrética e, com certeza, não faltará uma citação aos
      orixás das religiões de matriz africana. O enredo tem uma linha desenvolvimento
      simples e funcional que tem tudo para dar certo.

      Tem mais variedade ainda…

      Se o enredo da Renascer tem a sua pegada geográfica ao cantar a primeira capital do
      Brasil, o único tema declaradamente CEP do ano vem da Império da Tijuca. A Formiga
      contará a história do Vale do Café, reduto do noroeste fluminense, que conta com
      mais de dez cidades que abrigaram grandes plantações do grão no auge do Segundo
      Império. Especialista na cultura africana, o carnavalesco Jorge Caribé deu como mote
      para o enredo a relação dos negros escravizados que chegaram na região, não
      deixando de passar pela fé e pelas festas da região. A fórmula é batida, mas ainda
      pode render uma agradável apresentação.

      A negritude é tema do enredo da Rocinha, assinado por Junior Pernambucano, o
      enredo “Bananas para o preconceito” entra na onda crítica para falar do preconceito
      racial e exaltar o povo negro. O enredo passa pelo estigma histórico dos africanos e
      exalta figuras como Chico Rei e Abdias Nascimento. A dúvida fica se o tema, apesar
      de fundamental e tristemente atual, ganhará novos ares e contornos inéditos para sair
      da mesmice.

      Saindo do Rio, rumo ao Nordeste brasileiro, a Inocentes de Belford Roxo vai trazer “O
      frasco do bandoleiro” sobre a cultura material dessa região. Lendo a sinopse, fica
      difícil saber qual o fio condutor da narrativa que versará sobre bijuterias, frascos e
      costumes do povo brasileira, mas nas linhas do resumo e no samba-enredo, ganha-se
      destaque a figura de Lampião e o uso de joias pelo cangaço brasileiro. Resta saber se
      o enredo será de mais fácil assimilação na pista.

      Por fim, um dos enredos mais inusitados é o da Unidos de Bangu que vai narrar a
      história da batata, o enredo passará pelo Império Inca onde o alimento era sagrado,
      passeará pela Europa e chegará ao Brasil. De pegada bem clássica, o enredo não tem
      mistérios e resta saber se a história de um alimento tão cotidiano tem uma história
      interessante a contar.

       

      Série o carnaval mudou minha vida: ‘O samba pra mim foi uma escola de vida’, diz Selminha Sorriso

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      Por Lucas Santos

      BeijaFlor ensaiotecnico 2019 37É difícil hoje em dia não associar dentro do universo do carnaval carioca e do carnaval de escolas de samba, em geral, a função de porta-bandeira a Selminha Sorriso. Com 30 anos carregando consigo o pavilhão de escolas de samba, desde sua estreia em 1989 pelo Império Serrano, Selminha se tornou uma referência para todas aquelas que sonham um dia defender o pavilhão de sua agremiação. E foi a partir de um sonho lá atrás, ainda menina, que tudo o que desejou virou realidade. Hoje, já são nove títulos conquistados ao lado da Beija Flor e mais um pela Estácio de Sá, logo em seu primeiro ano na escola.

      “O carnaval realmente mudou a minha vida, me deu outras oportunidades, conheci outros valores. Constituí muitos amigos, conheci países, conheci um universo que não era minha realidade a época que eu comecei. E tudo que eu constituí tem um vínculo com o samba, com a arte da porta bandeira. Eu sou muito grata porque realmente minha vida mudou”.

      Vindo de origem simples, trabalhando como recruta do Corpo de Bombeiros do estado do Rio de Janeiro desde 2002 em paralelo com o sucesso como porta bandeira, Selminha também já viajou inúmeras vezes com a Beija Flor para realizar apresentações em diversos lugares do mundo. Mas se engana quem pensa que a parte financeira do carnaval foi o que mais marcou Selminha durante os quase 30 anos de Sapucaí que serão completados este ano.

      BeijaFlor ensaiotecnico 2019 42“Eu não falo no sentido material apenas. Sou uma pessoa que levo uma vida simples, mas muito grata, muito feliz, porque eu olho pra trás e sei que os dias foram muito mais difíceis em alguns anos lá no passado. Acho que o carnaval realmente faz uma diferença muito grande na vida de quem leva a sério, de quem se dedica. O samba socializa, as escolas de samba ajudam a socializar, a integrar as pessoas em uma sociedade que às vezes é bem diferente da realidade delas porque o carnaval é visto como o maior espetáculo aberto do mundo. Hoje nós do samba somos respeitados, somos convidados para entrar e retornar e sempre deixamos as portas abertas”.

      Por fim, ao se preparar para mais um ano desfilando pela Beija Flor de Nilópolis, Selminha não se esquece das dificuldades enfrentadas pelas escolas de samba em mais um carnaval recheado de cortes de verbas pelo poder público. A porta bandeira lamenta as dificuldades, mas a acredita na capacidade que o sambista tem de dar a volta por cima.

      “Claro, passamos por dificuldades, mas acho que não é uma política que vai destruir algum tão valioso construindo com muito sacrifício, com muito suor, sobre tudo com muito amor. Nós somos muito fortes, somos uma raiz muito forte que não se abala. Espero que o carnaval seja sempre valorizado e seja sempre um ponto de equilíbrio para ajudar suas comunidades, pois o samba é sempre uma escola de vida”.

      Série Barracões: Unidos de Padre Miguel vai mostrar o Brasil através das obras de Dias Gomes

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      Por Diogo Cesar Sampaio

      upm barracoes2019 4Gênio, sádico, comunista, subversivo, anarquista, imoral. Ao longo de toda sua carreira, Dias Gomes chocou a muitos com suas histórias e personagens, ganhando assim, todo o tipo de títulos e adjetivos. Dono de um texto crítico, muita vezes ácido, mas sempre com humor acima de tudo. Pai do realismo fantástico, foi o criador de figuras como João Gibão, Dona Redonda, Dirceu Borboleta e Viúva Porcina, que até os dias de hoje, se fazem presentes no imaginário de qualquer brasileiro. Através de microcosmos como Bole Bole, Asa Branca e Sucupira, Dias retratou o Brasil como nenhum outro escritor o fez. E é esse olhar sobre o país, representado pelas obras do autor, que a Unidos de Padre Miguel pretende levar para Sapucaí, em 2019.

      upm barracoes2019 3“Esse enredo surgiu a partir da necessidade. Já se sabia que 2019 seria um ano de crise, já anunciada por tudo e por todos. Não que falar de Dias Gomes seja menos que qualquer outro tipo de enredo, não é isso. Só que é um enredo que me permitiria, como vem me permitindo, transitar em uma atmosfera artística um pouco mais barata que a dos outros anos, já que é um carnaval onde ninguém tem dinheiro. Nenhuma escola. Escolas riquíssimas estão se rendendo a recursos alternativos. E isso não está sendo diferente com a Unidos de Padre Miguel, que todo mundo diz que é uma escola muito rica. E já era um desejo meu falar de Dias Gomes, eu já tinha essa história guardada. Então, quando surgiu a oportunidade diante dessa crise, eu trouxe a tona essa ideia de levar, não o Dias Gomes propriamente dito, mas o Brasil segundo as histórias do Dias Gomes.”, conta o carnavalesco da escola, João Vitor Araújo.

      upm barracoes2019 2A reportagem do site CARNAVALESCO visitou o barracão da agremiação, e conversou com João Vitor Araújo sobre os preparativos da Unidos de Padre Miguel, para 2019. Durante a entrevista, João Vitor esclareceu um pouco mais a proposta do enredo da UPM, além de dizer que, durante as pesquisas, chamou a sua atenção descobrir a relação entre o carnaval e o homenageado, Dias Gomes.

      upm barracoes2019 5“O que mais chamou minha atenção na pesquisa foi que ele era um apaixonado pelo carnaval. Ele era um escritor muito sério, então eu não imaginava que ele tinha esse carinho, essa paixão, pelo desfile de escola de samba. E ele tinha uma atenção enorme para as sinopses de escola de samba. Tanto que quando ele escreveu a peça sobre Getúlio Vargas, ele se baseou no roteiro, como eram chamadas as sinopses na época, de um desfile de escola de samba, no caso, a Mangueira”.

      Dono de uma extensa lista de obras no currículo, entre peças, novelas e roteiros para cinema, Dias Gomes deixou um legado imensurável. Com tantas histórias de relevância na carreira, e com modelo de desfile compacto como o da Série A, ficou impossível contemplar a todas. Sendo assim, até mesmo títulos famosos de grande importância e destaque como a peça “O Santo Inquérito” (1966), acabaram ficando de fora.

      upm barracoes2019 7“Foram muitas histórias que ele escreveu. Eu li todos os livros do Dias Gomes para poder transforma isso em enredo. E eu tive de deixar muitas histórias de fora devido ao curto tempo que temos para nos apresentar. Temos pouquíssimos setores, quatro apenas. Fiquei muito triste de ter de deixar “O Santo Inquérito” de fora, a história de Branca Dias, mas eu não pude trazê-lo à tona, porque ele faria parte do primeiro setor. E a história do “Pagador de Promessas”, que será o nosso primeiro setor, já é uma tragédia, porque ele morre ao tentar entrar na igreja. E em “O Santo Inquérito” também. Branca Dias acaba morrendo queimada. Enfim, muita tragédia para um setor só, sem condições. Então tive de deixar essa história que é muito bonita, que é muito famosa, inclusive lançou a Regina Duarte no mercado artístico. E eu não tive condições, não tive como incluir. Fiquei muito triste”.

      Carnaval da crise

      upm barracoes2019 6Os bastidores para o carnaval de 2019 não foram fáceis para as escolas de samba do Rio de Janeiro. Agremiações, de todos os grupos, foram afetadas por cortes de verba correspondentes a metade do valor anteriormente combinado. E se não bastasse à diminuição no repasse, as escolas sofreram com o atraso do mesmo. Na Série A, o drama foi intensificado devido às questões envolvendo a falta de estrutura dos barracões, que agravaram ainda mais o cenário de crise já instaurado.

      upm barracoes2019 8“É um prazer poder trabalhar na Unidos de Padre Miguel, mas confesso que é desgastante trabalhar no grupo, na Série A, por conta de todo o descaso. Nós não temos um espaço adequado para poder fazer um carnaval. Sofremos muito com as chuvas de fevereiro. Perdemos praticamente uma alegoria inteira dentro do barracão, que teve de ser refeita por causa disso. Isso é tudo fruto de descaso. A gente já não tem uma verba que não é lá essas coisas. Na verdade, isso nem pode ser chamado de verba, tinha de ser chamado de ajuda de custo para o almoço. É um absurdo você conceber um carnaval com 250 mil reais. E exigem tanta qualidade, exigem um padrão altíssimo das escolas da Série A, dizem que tem que ser o novo Grupo Especial… Mas com esse canário, só se for lá na China. Aqui sem condições. Com esse valor que a gente recebe, já é um milagre colocar um carnaval na rua. Isso acaba desgastando. A escola é maravilhosa, as escolas são maravilhosas. Mas a forma como essas escolas são tratadas é inadmissível”.

      Mediante a toda esta crise, se fez necessário recorrer a subterfúgios. Não foi diferente com João Vitor Araújo, que teve de se adaptar a atual realidade da escola e do grupo. Com isso, o carnavalesco admite o uso de materiais mais baratos que os utilizados por ele no anterior, em sua estreia na agremiação. No entanto, apesar das substituições na confecção, ele garante manter o mesmo nível plástico e visual, apresentado pela UPM, ao longo dos últimos anos.

      upm barracoes2019 9“Desde o início, eu sabia que essa crise pegaria a gente com força total. Foi difícil começar, foi difícil de fazer, e está sendo difícil de terminar também. A gente está puxando daqui, esticando de lá, dando nosso jeito. Claro, sem esculachar o trabalho. Não tem nada mal feito e nem feito às pressas. É até engraçado dizer isso, já que nós começamos o barracão a praticamente dois meses do carnaval apenas. De fato, é um carnaval mais barato, mas a escola vai desfilar com a mesma imponência de sempre. A diferença é que optamos por recursos um pouco mais em conta do que os que utilizamos nos anos anteriores. Foi um carnaval que nós pechinchamos tudo. Até o tecido que custa cinco reais, que aparentemente é barato, a gente deu preferência para o que custa dois reais. Foi assim que a gente trabalhou para poder ajustar tudo isso no nosso orçamento”.

      Sobre os materiais alternativos e inusitados utilizados na produção do carnaval desse ano, João Vitor destacou o uso de buchas para banho. Elas foram usadas na confecção das fantasias de uma ala, após serem submetidas a um tratamento, para simular pelugem de lobisomem.

      upm barracoes2019 10“Eu tenho uma ala de lobisomens que eu fiz a pelúcia do lobisomem de bucha de banho. Eu nunca tinha feito isso, eu vi em um filme. Saiu muito mais em conta, deu um pouco de trabalho, mas o orçamento ficou lá embaixo. No final, o resultado ficou maravilhoso, nem parece que é. Mas é só a pelúcia do lobisomem da ala, não o do carro alegórico. Ficaria inviável, em poucos dias, conceber uma pelagem gigantesca, feita com bucha. Dá muito trabalho, porque você precisa tratar, precisar deixar de molho, passar cola, até finalmente poder pintar”.

      João Vitor ainda contou que não tem uma preferência dentre o seu trabalho para 2019. Devido ao ritmo acelerado no processo de confecção e a falta de antecedência no barracão, o artista confidenciou não ter tido tempo para ter uma visão completa e geral do projeto, o que o impossibilitaria de ter um favorito.

      “É um carnaval muito apertado. Nós só abrimos o barracão em dezembro. É um carnaval que eu conheço o desfile no papel, ali na prática da construção, mas eu ainda não o visualizei. Então, eu gosto de tudo. Ainda não tive a oportunidade de montar um carro inteiro, e de dizer aquele ali que eu gosto mais. Gosto de todos por hora. Eu só vou ter o meu xodó de fato quando eu conseguir ver eles todos montados”.

      Entenda o desfile

      A vermelha e branca da Vila Vintém levará para Marquês de Sapucaí um total de 4 alegorias, 23 alas e 1900 componentes. Com o enredo “Qualquer semelhança não terá sido mera coincidência”, sobre a obra do escritor baiano Dias Gomes, a Unidos de Padre Miguel será a quinta escola a desfilar na sexta-feira de carnaval.

      Setor 1: O Pagador de Promessas

      “Eu começo com a intolerância religiosa, retratada em “O Pagador de Promessas”. Quando eu reli essa história eu vi que não tinha nada mais atual que essa obra dele. Coincide perfeitamente com que a gente vem dizendo e vivendo atualmente”.

      Setor 2: Roque Santeiro e O Bem Amado

      upm barracoes2019 11“O segundo setor eu falo de política e de religião. O povo brasileiro, infelizmente, é um povo que sente a necessidade de se apegar a algum tipo de crença. Às vezes, as pessoas pegam um mito e o santificam. Dizem que é um mito, e acabam o santificando, quando na verdade aquilo não é nem um santo, é um charlatão. Isso faz parte do dia a dia do brasileiro. Ele fala muito bem disso em “Roque Santeiro” (TV Globo – 1985), que todo mundo cultuava aquela imagem do Roque, o santo, quando na verdade o cara nem tinha morrido. Então, eu falo dessa necessidade que o brasileiro tem de se apegar a uma pessoa, a um líder. Além de falar dos dribles que os políticos dão nas pessoas. A vida no interior. Mostramos a Sucupira governada por Odorico Paraguaçu. E o que a gente vive hoje? Em um país, em uma cidade, em um estado governado por Odoricos Paraguaçus. Estamos cheios de Odoricos por aí”.

      Setor 3: Bandeira 2, O Espigão e Sinal de Alerta

      “E o terceiro setor, que já é um setor um pouquinho mais engraçado, eu falo de jogo do bicho, retratado na novela “Bandeira 2” (TV Globo – 1971/1972). Falamos também da vida nas grandes cidades, da especulação imobiliária, de meio ambiente versus ecologia, retratado em novelas como “O Espigão” (TV Globo – 1974) e “Sinal de Alerta” (TV Globo – 1978/1979)”.

      Setor 4: Saramandaia

      “No último setor, que é o realismo fantástico, é o momento lúdico do nosso enredo. Mas também não tão lúdico assim não, porque quando se fala em realismo fantástico, lembra-se de “Saramandaia” (TV Globo – 1976). Que tinha a Dona Redonda que comia até explodir, tinha o cara que botava formigas pelas ventas que era o Zico Rosado, o professor Aristóbulo que quando dava meia-noite se transformava em lobisomem, e isso não é tão fantástico quando se fala de Brasil. A gente vive em um país onde todo mundo parou para acreditar em uma mulher que estava grávida de quíntuplos, a tal da grávida de Taubaté. Isso sim é um realismo fantástico de certa forma que acontece no nosso dia a dia”.

      Acompanhe agora a saída das alegorias das escolas que desfilam nesta sexta pela Série A

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