A Sociedade Rosas de Ouro optou por fazer um projeto diferente e ousado para o carnaval 2023. Não é sempre que sambas-enredo derrotados em finais de eliminatórias são resgatados para fazer parte do desfile de uma escola. Porém é o que vai acontecer na Roseira para o próximo ano. Com o enredo “Kindala”, cujo o contexto é o combate ao racismo e a luta do negro desde a escravidão até os dias de hoje, a agremiação optou por recuperar a obra que participou da acirrada final de 2006. Naquela oportunidade, o tema da Rosas de Ouro era “Diáspora Africana. Um Crime Contra a Raça Humana”. Foi um grande desfile que deu à escola a quinta colocação e o desfile das campeãs.
Os compositores da obra que irá ser cantada no desfile de 2023 são: Arlindo Cruz, Fabiano Sorriso, Pedrinho Sem Braço, Paulinho Sampagode e Osmar Costa. * OUÇA AQUI O SAMBA-ENREDO OFICIAL PARA O CARNAVAL 2023

Segundo a presidente Angelina Basílio, o namoro já era antigo e uma hora esse resgate iria acontecer. “Eu acho que esse samba não perdeu em 2006, porque nada é por acaso. A gente reviveu ele. Eu me lembro que foi uma disputa acirrada e não podia juntar os sambas naquela época porque as melodias eram totalmente diferentes, mas teve muitas modificações, inclusive o andamento está um pouco diferente e é o que a gente está vivendo. É uma letra muito forte. Essas questões raciais a gente fala todo dia e em 2006 não era assim. Em 2022 todos os dias tem uma história torta e uma patifaria em relação ao racismo. A comunidade abraçou e o nosso enredo se chama ‘Kindala’. É agora que devemos tomar providência”, contou.

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Fotos: Magaiver Fernandes/Site CARNAVALESCO

O diretor de carnaval da agremiação, Evandro Souza, confirmou a história e disse que pegar o samba eliminado de 2006, era um sonho antigo da comunidade da Brasilândia. “Esse samba desde que ele perdeu, a gente tinha vontade de ver na avenida. Isso foi um sonho de muitos anos de muitas pessoas e ele veio. Estava virando lenda já. A gente idealizou muito isso e do nada depois do carnaval, com um tempo mais curto de preparação, a gente pensou por que não arriscar agora. Vencer algumas etapas que a gente teria que passar, como eliminatórias. Batemos o martelo e decidimos levar esse samba para a avenida e demos uma pequena atualizada em alguns contextos e algumas palavras e agora é ver como ele vai render na avenida 17 anos depois”, declarou.

O carnavalesco Paulo Menezes foi uma das cabeças pensantes para tirar essa ideia do papel, pois misturou o enredo que ele propôs à escola junto ao samba-enredo que foi falado para ele. De acordo com o artista, ao ouvir a obra, ele procurou a diretoria para falar da similaridade que tem com o enredo. “Uma vez eu estava aqui na quadra, esse samba tocou e eu já tinha essa ideia de enredo há um bom tempo. Eu senti que o samba se aproximava muito daquilo que eu estava me propondo a fazer. Então eu procurei me informar sobre o samba e me informaram que era um samba que havia participado da final, mas que não tinha sido campeão. Aí passando o carnaval, eu procuro a escola com o enredo e a ideia de trazer esse samba. A escola topou e estamos aí”, afirmou.

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O intérprete Royce do Cavaco, que será responsável por cantar a obra no Anhembi em 2023, falou que para a obra dar certo, é preciso a comunidade abraçá-lo. “É um samba com um estilo mais autêntico. Não adianta bateria e puxadores. As alas têm que formar e a comunidade cantar com afinco e com garra. Eu acredito nesse samba, tem força e é preciso de um grande trabalho até o carnaval”, comentou.

O cantor ainda falou do trabalho junto ao mestre Rafa dentro da obra. “Em alguns ensaios técnicos na avenida a bateria vai dar uma cadenciada. Esse samba não pede correria, é mais autêntico. Ao estilo anos 80 e 90. Ele vai aplicar um estilo mais cadenciado e eu acho que nem pode correr, porque senão vai perder beleza melódica”, completou.

O diretor de bateria da escola, mestre Rafa, afirmou que vai fazer de tudo para o samba crescer e tornar um dos melhores do carnaval paulistano. “O samba não é nem céu e nem terra. Como é mais antigo e com uma pegada mais para trás, nós colocamos ele um pouco mais pra frente e com a velha ousadia que a ‘Bateria com Identidade’ traz. Bossas e breques mais do que nunca. A cada ano que passa a gente vai colocando mais coisas e esse ano não vai ser diferente. Creio que a gente já deu uma identidade pro samba crescer. Eu acredito que com o trabalho da ala musical e bateria, vamos fazer esse samba crescer muito e modéstia à parte, com todo respeito às coirmãs, vai ser um dos melhores do carnaval de São Paulo”, disse.

mestre rafa rosas

A ‘Bateria com Identidade’ é uma das mais completas do carnaval paulistano. Faz tudo o que se pede para atingir a nota máxima, como abusar da criatividade. Mesmo com uma obra antiga, mestre Rafa prometeu ainda aprimorar essa ‘ousadia’ que a batucada tem. “São quatro bossas e dois arranjos. A gente nunca veio com quatro bossas. A gente tem uma convenção diferente no meio do samba. O povo do carnaval vai poder conferir. A gente deu uma transformada no samba. Eu não sei se é pro bem ou pro mal. A gente só vai saber quando abrir as notas, mas tenho certeza que pelo menos para as pessoas ouvirem é legal, porque o público gosta disso. A ‘Bateria com Identidade’ criou essa característica com o público e a cada dia que passa é mais esperado por conta da ousadia. Com certeza a gente vai dar um show lá. Para você ter ideia a bossa é o samba todo. Vai da cabeça até o fim. Já temos mais de 200 compassos de bossas”, contou.