Uma escola que acabou de subir para o Grupo de Acesso I e está feliz com os seus resultados no carnaval chama-se Dom Bosco de Itaquera. É mais uma agremiação que irá apostar na temática nordestina visando o próximo desfile. Porém, de acordo com o carnavalesco Danilo Dantas, a escola da Zona Leste abordará o tema de maneira diferente, onde dentro do desfile, haverá críticas em relação ao forte preconceito que sudestinos e sulistas têm em relação ao povo nordestino. A apresentação no Anhembi, além de mostrar a cultura da região, vai mostrar várias reflexões ao público presente no Sambódromo.
A reportagem do site CARNAVALESCO visitou o barracão da escola e conversou com Danilo Dantas, responsável pelo tema para 2024.
O artista conta que tinha esse enredo guardado há muito tempo, e que o principal objetivo dele é desmistificar a figura negativa do nordestino, além de exaltá-lo, como dito acima. “Eu tenho esse enredo há muitos anos, desde a minha primeira passagem no Grupo de Acesso com a Colorado. Me fascina muito e me revolta quando dizem que o nordeste é um atraso para o Brasil. Todo ano de eleição, o pessoal do sul e sudeste sempre usa esse termo. Baseado nisso, eu comecei a pesquisar o porquê surgiu isso e eu descobri o poema que o Bráulio Bessa recitou no programa da Fátima Bernardes e ficou na minha cabeça. Fui pesquisando e é uma música de 1984. Ou seja, desde a década de 80 existe isso. O Brasil vem tendo falas de políticos nas últimas eleições, e eu acho que é preciso mostrar para o brasileiro que se eles querem que o nordeste se afaste do Brasil, olha o tanto de coisa que eles vão perder. Então fizemos isso em um conto através da música ‘nordeste independente’, que é de Bráulio Tavares e Ivanildo Vila Nova e foi eternizada na voz de Elba Ramalho”, explicou.
Muitas coisas que o brasileiro deve aprender
Dantas diz que o que mais fascinou neste enredo, foi conhecer a importância que o Nordeste tem visto que a história nos mostra isso, basta procurar, além do fato de ter figuras brasileiras importantes que pessoas não imaginam ter naturalidade da região. “Saber o quanto tem de nordestino importante na história do Brasil e que as pessoas às vezes nem sabe. José de Alencar, Chico Anísio, Maria Quitéria, Raquel de Queiroz e tantos outros. São tantos fatos e um monte de coisa do nordeste que as pessoas não sabem. A história do Brasil nasceu no Nordeste, as principais revoltas brasileiras aconteceram no Nordeste e o pessoal acaba deixando isso de lado. Essas coisas me fascinaram. Não é só a seca, praia, o forró e o xaxado. É realmente tocar na ferida”, contou.
Nordeste diferente
Justamente completando o tópico anterior, segundo o artista, a Dom Bosco irá fugir do nordeste apresentado costumeiramente no Anhembi. “Não vai ser uma crítica explícita, porque o carnaval é festa. Acho que não é na nossa festa que a gente vai ficar politizando a conversa. A gente vai mostrar a realidade nua e crua das coisas positivas do Nordeste para o brasileiro ter um ponto de reflexão. Na hora que ver na avenida já vai entender e pensar: ‘é um tapa na minha cara’. Principalmente quando o trecho do samba fala ‘imagine minha gente se meu Nordeste não fosse uma nação’. Que me desculpe todas as escolas que abordam esse tema, eu vou muito além de maracatu, festa de reis, festa junina, xaxado, forró e baião. Lógico que tem. Eu vou mostrar a importância da cana de açúcar, algodão, da economia de sustentabilidade, da renda, da palha, do agricultor nordestino. É um enredo que eu quero falar da região inteira e não só da cultura”, disse.
Plástica caprichada
Dentro da pista, Danilo fala que a plástica da escola será um misto, mas principalmente o fácil entendimento. “Eu falo principalmente para o pessoal da escola: Quem me conheceu nos últimos anos sabe que eu gosto de primar pelo acabamento, por tecidos mais luxuosos, mas esse enredo por mais que a gente queira colocar a nossa cara, não tem como fugir da estética. Vão ter alas que se vão olhar por si só que é o que estamos propondo. A ala da palha, da renda, da culinária. A gente procurou usar uma plástica teoricamente mais rústica, mas sempre com brilho. Todos os carros tem estampas próprias e em cada um desses setores vamos dar toques de carnaval, apesar do enredo. A gente vai ter fantasia com muitas plumas, penas e não pode deixar de ter dourado”, comentou.
Comunidade empenhada
De acordo com Dantas, não terá um ponto alto, mas elenca alguns pontos que podem levar a comunidade de Itaquera ao sucesso, sobretudo a comunidade. “Não costumo dizer que tem um ponto alto. O desfile vai ser bem linear. Para quem viu a Dom Bosco nos últimos anos, vai se impressionar com as esculturas. São fantasias bem coloridas. Alegorias bem diversas e diversificadas. Acho que o grande trunfo que a gente tem todos os anos é a nossa comunidade. Eles estão gritando o samba. O importante vai ser eles cantando e dançando o samba”, afirmou.
Sem pressão
Sempre é um desafio abrir desfiles, ainda mais quando se trata de Grupo de Acesso. Porém, o artista diz que o psicológico está atrelado ao Acesso II, visto que são os mesmos jurados que vão julgar o grupo no dia 3. “Nós estamos com o pensamento de que vamos estar encerrando o desfile da semana anterior. Na nossa cabeça a gente não pode pegar esse fardo, até porque os jurados que vão avaliar o nosso grupo, vão julgar o Acesso II também. Já viram 11 escolas e não é novidade nenhuma. Também tem o fato de que vamos nos divertir. É o primeiro ano da escola no Grupo de Acesso e estamos fazendo o nosso papel. Lógico que a gente quer o resultado positivo, mas sem essa obrigatoriamente. A gente tem que sair dessa linha amarela com a certeza de que fizemos o nosso trabalho”, declarou.
Conheça o desfile
Setor 1: “Começa com um grande cordel mambembe, que são o multi cor da arte nordestina abrindo as portas do nordeste para o mundo. Como o nosso enredo é o cordel, a literatura de cordel é o que leva esse nosso personagem a desbravar o país. Nós temos uma ala antes do carro chamada ‘O forte do Nordeste’, que todo país tem a sua fronteira. A gente cria essa fronteira do ‘nós contra eles’. Já que eles falam tanto disso, os nordestinos pegam essa separação que já existe de fato, ela vai ser de direito. O nosso abre-alas vai ser o grito da independência nordestina. Vai ser um nordestino em um jegue gritando independência sem morte, mas com muito amor. A partir daí a gente faz um portal com todas as características do nordeste, mas de uma forma bem leve. Tem seca, carcaça de boi, carranca do São Francisco de uma forma carnavalizada e bem alegre”.
Setor 2: “Nosso segundo setor, teoricamente, é a parte cultural nordestina. Não só da arte, mas da educação, gastronomia. A gente faz uma homenagem ao Paulo Freire, que há muitos anos foi bem criticado pelo ex-presidente. A gente chega até onde todo mundo conhece, que é o forró, xaxado, festas juninas. Vamos fazer uma homenagem ao mestre Vitalino. Não tem como não falar dos grandes heróis nordestinos”
Setor 3: “Vamos finalizar com o ponto de reflexão do nosso enredo, que é onde o nosso personagem teoricamente acorda e ele entende que: por que o brasileiro bate tanto no Nordeste e quando chega junho e julho vai em uma festa junina? Vai rezar Padre Cícero? Quando chega o final de ano ele vai ao nordeste curtir as suas praias. Então a gente faz um grande alto da união que é a celebração das duas nações. O Brasil celebrado por Padre Cícero e o Brasil por Nossa Senhora de Aparecida. A gente até brinca ela está entregando a chave do Brasil para Padre Cícero, porque ninguém precisa se separar”
Ficha técnica
3 alegorias
1 quadripé
16 alas (aproximadamente 1100 componentes)
Diretor de barracão – Dimas
Diretor de alegorias – Pica-Pau