Mestre-sala, passista, ritmista, agora presidente. Pode-se dizer que Sandro Avelar já fez de tudo ou quase tudo no carnaval. Neto de Zacarias da Silva Avelar, presidente do Império Serrano nas décadas de 1950 e 1960, Sandro segue a dinastia da família e desde 2020 é o mandatário da Serrinha. Bastante incisivo com aquilo que pretende, crítico ferrenho do último desfile da escola, que considera um dos piores, senão o pior, o dirigente também se considera um articulador, um militante sambista que procura lutar sempre por aquilo que entende ser o melhor para o carnaval.
Em entrevista ao site CARNAVALESCO, Sandro Avelar conta as dificuldades que encontrou quando assumiu o Império Serrano, explica os bastidores da contratação e sua relação atual com o carnavalesco Leandro Vieira, aponta os desafios da Serrinha para um carnaval que busca incessantemente o título, além de esclarecer sua atuação na Liga-RJ e seu relacionamento com a Liesa.
Você sabia quando assumiu o Império Serrano que o desafio de gestão seria enorme. Foi além do que esperava?
Sandro Avelar: “Eu não entrei enganado, né? Eu entrei convicto de que o Império Serrano vive um momento difícil financeiramente, em relação a estrutura da escola mesmo, de sua comunidade. Falei diversas vezes que o Império tinha feito na minha visão o pior desfile da história em 2020. E, entrei motivado realmente para tentar modificar bastante a escola, tanto que 90% dos segmentos foram contratados, não mantive a base que nós tínhamos porque eu realmente buscava mudança. Eu quis buscar uma nova cara para o Império Serrano, mas mantendo as tradições da casa”.
Você sempre fala nas dívidas da escola. O que já foi pago e como fazer o desfile e pagar essa dívida?
Sandro Avelar: “Estou pagando aos poucos, não tem como resolver 74 anos do Império Serrano em um, ainda mais durante a pandemia, com a quadra fechada. Mas, busquei acordo em diversos processos, os processos que tinham os maiores custos eu busquei acordo, eu pago mensalmente, alguns dos credores do Império Serrano, outros eu estou tentando buscar também. Mas, eu espero que o Império Serrano possa em médio, longo prazo colocar suas dívidas em dia, e ter realmente crédito e saldo para cada vez mais buscar um carnaval melhor. Eu tento buscar o justo meio termo em relação ao pagamento, mas eu busco sempre quitar uma parte da dívida, mas o restante eu destino ao carnaval que é o produto final”.
A escola faz uma grande feijoada, tem shows, como incentivar ainda mais essa geração de receita? O que você pensa em criar?
Sandro Avelar: “Eu acredito que o marketing da escola de samba em geral precisa ser trabalhado. No caso do Império Serrano, era uma escola que estava desacreditada, uma escola que veio perdendo sua comunidade. Na minha visão não há marketing melhor do que a vitória. O que que eu penso nesse primeiro momento, dar o título ao Império Serrano. Porque é a forma que eu tenho para tentar motivar a comunidade, e também aumentar a contrapartida para o patrocinador. Nesse período eu criei um time de futebol porque obviamente o Império Serrano disputando com escola do Grupo Especial, a captação de recursos não ia ter o mesmo potencial. Fui para o lado do esporte, do lado social, fui para a questão do assistencialismo junto à comunidade, para tentar em contrapartida também, tentar aumentar o atrativo para o Império Serrano. Nós vamos manter o clube de futebol, que começa o campeonato carioca em maio, nós continuamos doando cesta básica, e tentar direcionar os recursos para a escola de samba, reverter todos esses benefícios em prol do carnaval”.
Muita gente fala que o Sandro Avelar é o dono do Acesso. O que você responde?
Sandro Avelar: “Eu sou um grande articulador, nunca foi segredo para ninguém que eu sempre articulei bastante o Grupo de Acesso, eu fui da Intendente Magalhães por mais de 10 anos, fui presidente do Império da Praça Seca lá em 2009. Eu era o presidente mais jovem da história do carnaval, se você olhar aí neste perfil, ainda continuo sendo um dos presidentes mais jovens, e bastante militante. Sou militante, gosto do carnaval, sou sambista, já fui ritmista, mestre-sala, fui intérprete, sou um dos fundadores dos Filhos da Águia, poucas pessoas sabem disso, fui do Império do Futuro, desfilei com meu avô em carro alegórico. Só não fui baiana, mas se uma escola estiver precisando também, e não tiver ninguém para ajudar, eu vou ajudar. Sou um militante, hoje também ocupo o cargo de vice-presidente da Federação Nacional do Samba que agrega as ligas de diversos estados. Não tenho essa relação de militância só no Rio de Janeiro, participo do carnaval de Vitória, do carnaval de São Paulo. Sou um sambista de fato”.
Neste contexto, dizem que a figura do Sandro Avelar não seria bem recebida na Liesa. Você acredita nisso?
Sandro Avelar: “Eu acredito que o carnaval não tem essa vertente. O Império Serrano é uma escola fundadora, de uma bandeira pesada, eu mantenho uma boa relação com todos da Liesa, inclusive eu participei da posse do Jorge Perlingeiro, e também assumi uma posição no Conselho Deliberativo, o Império Serrano como fundador tinha vaga, e a gente mantém uma relação de respeito, tanto que eu fui um dos articuladores para termos a volta dos ensaios técnicos da Série A. Busquei unificar de fato o discurso das duas ligas, tive uma pessoa que me ajudou bastante que é o responsável de fato em tentar agregar e ajudar as duas ligas que é o Almir Reis, presidente da Beija-Flor. O Almir é esse elo entre as duas ligas. E eu tenho ajudado bastante também, e há uma conversa muito amistosa e muito tranquila”.
Gosta de ser chamado de general pelos amigos?
Sandro Avelar: “Eles dizem que eu sou um pouco ditador. Na verdade, eu sou muito incisivo no que eu quero e na forma como eu me coloco. General é para mostrar que eu sou um cara firme. Mas, eu tenho outros apelidos também, general é um que pegou no carnaval, mas me agrada bastante, eu gosto do apelido de general”.
Existe favoritismo para o Império Serrano, como foi com a Imperatriz? E como administrar isso?
Sandro Avelar: “Eu acho que o Império é uma das favoritas sim, eu acho que o Império tem uma grande bandeira, é uma das grandes bandeiras do grupo, e acho que tem mais umas duas escolas com potencial igual ou até maior. Financeiramente, o Império Serrano não é a maior escola, tem escolas que têm poder aquisitivo maior, mas o Império demonstra um chão muito forte, e trazendo essa questão de reparação histórica, o Império Serrano merece uma vaga no Especial”.
Como você analisa essa disputa de 2022 na Série Ouro pela única vaga para o Especial?
Sandro Avelar: “O que é combinado não sai caro, né? Nós temos plena convicção disso. Os regulamentos foram aprovados em assembleia com bastante antecedência, não adianta chorar por algo que não aconteceu. Eu acredito que devemos pensar no futuro em ter um acesso e um descenso maior. Mas, no atual cenário, todos sabiam que esse seria o cenário atual. Na verdade, os grupos se protegem, né? É óbvio que a Liesa vai tentar limitar, fazendo um acesso e um descenso de uma escola, e a Série Ouro também. É algo totalmente aceitável e dentro da lei”.
Como você administra a relação com o imperiano que adora cobrar e exigir excelência em tudo da escola?
Sandro Avelar: “Eu acho digno, mas também eu tento mostrar a realidade. O Império é uma escola que estava praticamente indo para a Intendente Magalhães. Fez um carnaval horrível. O Império Serrano tem muita dívida e precisa realmente se reencontrar. Eu estou realmente tentando buscar o melhor para a minha escola, a escola do meu coração e acredito que tenho feito o melhor que eu podia até o momento”.
Você apostou no mestre Vitinho, levou pancada e hoje ele está colhendo os frutos. O que falar do trabalho dele? E o que falar de quem ainda faz comentários sem fundamento técnico?
Sandro Avelar: “O Vitinho é um irmão para mim. Nós somos criados juntos e eu tinha relação com o pai dele, o meu pai já com o avô. Vale ressaltar que o avô do Vitinho era mestre de bateria quando o meu avô era presidente do Império Serrano. Nós temos esse elo histórico. Ele tem um potencial muito grande, já provou isso na Unidos da Ponte e era o segundo diretor lá na Portela. Acho que o Império Serrano precisava renovar a bateria, o mestre anterior tinha um grande valor, mas não tinha o formato que eu realmente desejava para a escola. Realmente, eu torço para o Vitinho dar esse novo gás para a escola, e também mantive toda a base da Serrinha. Todos os diretores do Império Serrano são crias do Império Serrano e muito com vínculo familiar. Filho de ex-mestres, filho de ex-diretores, trouxe esse elo para manter a tradição, resgatando a história da escola. Eu sou palpiteiro em relação a bateria, mas eu consultei diversos mestres, inclusive, mestre Silvio que foi do Império Serrano, Wanderley que também foi mestre do Império, todos eles deram aval e concordaram com a contratação do mestre Vitinho. E foi uma aposta dentro de casa, não trouxemos mestre de outro local. Nós apostamos realmente na prata da casa”.
Você chegou ao topo como presidente do Império Serrano, mas é sambista e veio de mestre-sala. Conta essa sua história de sambista
Sandro Avelar: ”Na verdade, o Império Serrano é quase que uma herança. O meu avô foi fundador, foi presidente do Império Serrano, deu título ao Império Serrano do Grupo Especial, meu pai foi vice-presidente, comandou em um período diversos setores do Império Serrano, mas eu sempre vivi dentro do Império Serrano. Império do Futuro, fui passista, fui ritmista, desfilei na ala das crianças, fui buscar realmente um conhecimento maior fora do Império Serrano. Fui para os Filhos da Águia, fui para a Portela, fui mestre-sala da Beija-Flor, Unidos da Tijuca, mas o bom filho sempre retorna. Volto para o Império Serrano hoje motivado, mais experiente, tentando colocar a escola no seu eixo”.
Como é trabalhar com o Leandro Vieira?
Sandro Avelar: “Uma grata surpresa. Eu acho o Leandro Vieira um cara competente, nós tínhamos um medo porque tem um rótulo, a grife Leandro Vieira assustava, mas o Leandro virou meu amigo pessoal independente de trabalhar junto ou não. Espero que ele possa continuar com o Império, mas independente disso, Leandro foi um achado, eu acho ele maravilhoso, e foi ótimo para a escola, ele entende a identidade da escola, e ele tem agradado a todos. Em relação ao carnaval que ele projetou, ele não tem dificuldade alguma financeira, tudo que ele pediu nós compramos, obviamente a gente tem que pechinchar porque o Império Serrano precisa pechinchar, mas é um carnaval que eu acredito que seja o que ele realmente está esperando”.
Aliás, falam que o barracão do Império Serrano está atrasado. Isso procede? Como está o andamento lá?
Sandro Avelar: “O Império Serrano não está atrasado porque o Império Serrano começou do zero. Todos os carros começamos da planta. Não é algo que nós mantivemos estrutura. Eu fui em quase todos os barracões da Série A e posso garantir que 90% dos barracões são reaproveitamento das anteriores. E o Império Serrano começou da planta. Esculturas novas, obviamente que a gente aproveitou o que era possível, mas o barracão do Império é grandioso e eu posso garantir que se não for o melhor, é um dos melhores barracões desse pré-carnaval”.
Falando de carnaval no geral, você incentiva a Indentende. O que espera dos desfiles de 2022 lá?
Sandro Avelar: “Eu acho que a Intendente Magalhães está precisando ser mais valorizada. Acredito que será um grande desfile, as escolas sofreram com a pandemia igual as do Grupo Especial, mas a Intendente Magalhães tem uma carência maior. Acredito que vai ser um carnaval grandioso, um carnaval competitivo, e acredito que possa ser o maior carnaval da história da Intendente Magalhães, visto que o Eduardo Paes tem colaborado bastante, dado um reforço maior, não só financeiramente, mas também com a questão da estrutura para as escolas de samba da Intendente Magalhães”.
Hoje, o que você sonha para os desfiles da Série Ouro? E o que acha que é utopia e o que pode virar realidade nesses sonhos?
Sandro Avelar: “Eu acho que os desfiles da Série Ouro precisam melhorar a questão estrutural. As escolas de samba têm carência na estrutura de barracão, recursos muito menores se comparado ao Especial, se você parar para analisar a diferença é quase com a gente recebendo uns 20% do que recebe uma escola do Especial, só que aqui nós temos quatro setores e no Especial são seis setores. Então, proporcionalmente existe essa defasagem grande. Mas, na minha visão, é um carnaval popular. Eu acho que a Série Ouro não pode perder esse caráter popular, tanto que os ingressos têm esse caráter popular, é o carnaval do povo. Cada local com sua cultura, e a Série Ouro busca sempre está coisa mais popular e é o que nós estamos mantendo”.
Sobre regulamento e obrigatoriedades nos desfiles, o que você aperfeiçoaria, tanto no Acesso, quanto no Especial?
Sandro Avelar: “Tudo depende muito da questão financeira. A Série Ouro não tem como avançar muito, visto que o valor é irrisório comparado com o Grupo Especial. É um regulamento enxuto, mas um regulamento que coloca todas as escolas de samba em pé de igualdade. Eu acho que isso é melhor para o espetáculo. Ninguém pode reclamar de algo que foi democraticamente constituído em assembleia geral. O regulamento é um pouco mais enxuto, mas ele vai mostrar que as escolas de samba estão preparadas. A grande diferença do regulamento de 2022 é a questão do tripé da comissão de frente e eu posso garantir que vai ser na minha visão o diferencial de todas as escolas de samba. Todas as escolas de samba estão fazendo tripés grandiosos e com bastante efeito. O que não aconteceu nas anteriores”.
Você é muito amigo da Morango, porta-bandeira. Acredita que nos próximos anos vamos ver como porta-bandeira de uma escola do Especial? Como superar essa barreira?
Sandro Avelar: “Eu particularmente respeito a opinião de quem é contrário, mas é bom deixar claro que cada instituição com sua independência. Não tenho conhecimento sobre o regulamento do Especial em relação a isso, mas se a Série Ouro aprovar eu sou totalmente favorável. Se a Intendente Magalhães também aprovar, sou totalmente favorável. Cada um que coloque as regras do seu jogo. Eu sou favorável, acredito que nós temos que dar a oportunidade de não só para porta-bandeira homem ou trans, o que for, nós temos também que tirar alguns rótulos do carnaval. O carnaval precisa ser mais popular e ele não pode ter nenhum tipo de separação ou elitismo, quem quiser ser porta-bandeira, quem quiser ser baiana, quem quiser ser ritmista, tem que ser a festa do povo, para o povo”.