Rumo ao quinto ano de parceria, Taciana Couto e Daniel Werneck, primeiro casal de mestre-sala e porta-bandeira da Grande Rio, mostram entusiasmo para lutar pelo bicampeonato da agremiação. Embora já repletos de elogios de desfiles anteriores, o recebimento da nota máxima de todos os jurados foi essencial para a primeira vitória da tricolor de Caxias, em 2022. Em entrevista ao site CARNAVALESCO, antes de um ensaio na quadra, os dois falaram sobre a construção de seu passado profissional, o respeito que sentem um pelo outro e as expectativas para 2023.

Fotos: Luisa Alves/Site CARNAVALESCO

Qual foi o segredo para vocês atingirem esse grau de excelência em tão pouco tempo?

Taciana: “Acredito que muita dedicação, trabalho duro, balé, uma preparação física específica e a nossa rotina de ensaios, tanto particulares quanto com a comunidade. Tudo isso é um somatório pra gente chegar numa apresentação bonita. Também tem muito estudo em torno da fantasia, do enredo e da coreografia”.

Daniel: “Tem dias que brincamos de dividir em rounds. Primeiro round: musculação. Depois o treino funcional com o Bruno Germano, o ensaio com a Beth… Essa cobrança que temos com nós mesmos, de nunca cair numa zona de conforto e trazer algo diferente que as pessoas gostem”.

Daniel, quando anunciaram que Taciana viria de terceira para primeira porta-bandeira, qual foi sua reação inicial?

Daniel: “Fiquei feliz por um lado e triste por outro. Triste porque já estava há três anos com a mesma parceira, tínhamos uma sintonia, mas quando soube que a Taci seria minha porta-bandeira fiquei feliz por ser nova. Acho que o mundo do samba precisa dessas apostas e constante inovação. Mais ainda por ser alguém da casa. Eu vim de fora, mas fui muito abraçado aqui dentro. Hoje digo que se dependesse de mim encerraria a minha carreira na Grande Rio. Acho que isso é gratificante e, quando surgiu a responsabilidade, pensei ‘cara, vamos lá!’. É um novo desafio porque no passado apostaram em mim e preciso confiar nas outras apostas da escola também. Graças a Deus foi um sucesso. No primeiro ano estávamos nos conhecendo, no segundo já tínhamos confiança e conseguimos alcançar o objetivo de trazer a nota máxima pra escola. Tempos depois repetimos a nota, o que é difícil de fazer”.

Taciana, quando soube que seria a primeira porta-bandeira da escola, o que sentiu?

Taciana: “Foi um susto porque era uma situação inesperada. Eu estava dormindo quando tudo aconteceu. Pela madrugada, começaram a comentar que a terceira bailarina assumiria o primeiro pavilhão da escola e, durante o dia, todo mundo me perguntou o que estava acontecendo e eu nem sabia responder. Só soube no fim do dia, quando o presidente pediu que fosse ao barracão pra comunicar isso. Foi uma grande surpresa e demorou meses pra ficha cair, mas a escola me deu todo o suporto necessário e tive o Daniel, que é excelente, ao meu lado. Eu pude e ainda posso contar com a experiência dele. Se evoluí muito nesses anos foi também graças a ele, graças a Beth, graças ao Bruno, graças a Paula do Theatro Municipal”.

Qual é ou foi a importância do trabalho da Beth Bejani com vocês na lapidação da dança e no patamar que o casal já chegou?

Daniel: “Quando temos uma coreógrafa, no caso a Beth, é importante porque precisamos desse olhar de fora. Muitas vezes a gente faz um movimento e acha que está bonito, mas não está tão amplo. Acho que o trabalho da Beth chega nessa questão de limpeza corporal e de dizer ‘olha, esse braço pode ficar mais esticado’, ‘falta finalização aqui’… Ela traz essa cobrança pra gente. Ela diz ‘poxa, Dani, Taci, é melhor ir por esse caminho’, mas nunca impôs nada. Nunca chegou com a coreografia pronta só pra aprendermos. Pelo contrário, ela pede pra levarmos ideias”.

Quais são suas referências como mestre-sala e porta-bandeira, e por quê?

Daniel: “Minha referência foi o Ronaldinho, um dos grandes mestres-salas. Eu tive a oportunidade de ter sido o terceiro e o segundo mestre-sala dele. Foi uma pessoa que lapidou muito a minha dança. Na verdade, digo que tive duas referências. Quando comecei, o meu professor Jorge Edson, que já faleceu, e aí quando vi o Ronaldinho dançando, na época com a Marcella (Alves), fiquei encantado. Pensei que era a dança e a técnica que eu gostaria de levar pra vida. Acho que o que me encantou nele foi justamente a leveza e a elegância que ele trazia pra dança, a forma de manusear o leque e o lenço. Normalmente você encontra um mestre-sala dançando com um leque, um lenço ou um bastão, mas não o Ronaldinho. Ele dançava com o leque e com o lenço. Trouxe isso pra mim e sempre vou enaltecer a figura dele”.

Taciana: “Caramba, que pergunta difícil! Acho que sempre há algo pra se ressaltar em cada uma. Apesar de termos funções básicas a seguir, a nossa dança é de particularidades. Todas têm o seu encanto e beleza. Sou muito fã da Cris Caldas, pela técnica e postura exemplar, e da Marcella Alves do Salgueiro”.

Para vocês, qual é o desfile mais inesquecível, 2020 ou 2022? Por qual motivo?

Daniel: “Os dois, porque, assim… 2020 foi um desfile que entramos com uma energia surreal, quase não nos reconhecíamos. Realmente vestimos um personagem, até por conta do enredo, e isso é algo que sempre cobro da Taci. Tinha momentos em 2020 que o samba falava de Oxóssi e fazíamos movimentos pra Oxóssi, embora viéssemos representando Exu, fazíamos movimentos de Pombajira, de Iansã… também tinha o momento só do Daniel e da Taciana. Foi um desfile muito marcante. Nunca nesses nove anos que farei na escola vi um tão emocionante. Então, quando chega 2022, nossa! A gente vê a galera gritando quando a comissão de frente entra na Avenida, se apresenta e o Exu está no topo borrifando. Aquele foi um sentimento único. Acho que é um momento que entra para história da escola e nos marca muito, ainda mais por termos entrado sabendo que estávamos brigando pelo título e que ele foi incontestável. Todos bateram palmas pra Grande Rio”.

Acreditam que o julgamento do quesito nos próximos anos voltará a ser mais focado na dança ou a coreografia chegou para ficar e ganhar mais protagonismo?

Daniel: “É muito importante a gente enaltecer isso quando entramos no argumento da dança e da coreografia: a dança do mestre-sala e da porta-bandeira não muda. É o cortejo, o riscado… Afinal, o que é a coreografia pra gente? A organização de movimentos que faremos durante o desfile. No primeiro momento vou cortejar, no segundo vou fazer o riscado, no terceiro vou apresentar a bandeira, no quarto vou riscar mais um pouco e no último agradecer. Esse é o papel da coreografia. Hoje as pessoas surgem pensando que a dança do mestre-sala e da porta-bandeira está muito coreografada, mas não é isso. Estamos organizando o que fazer. Lógico que existem os detalhes diferentes porque, por exemplo, você tem um samba que fala sobre frevo e vai querer colocar um movimento de frevo ali. São pequenos detalhes que não modificam a dança”.

Falando em coreografia, vocês têm uma especial na hora do “quitandinha”. Ela vai para Avenida também?

Daniel: “Vamos aproveitar algumas coisas. Acho que esse ano a ideia do carnaval da Grande Rio é um carnaval muito mais leve e mais alegre. Eu e Taci entendemos como uma dança brincante e descontraída, bem de Erê mesmo. Aquilo de criança implicar, brincar, beijar… então a gente vai ter esse movimento. Faremos um pouco do que mostramos na quadra, mas também vamos levar umas surpresinhas”.

Vocês trabalham com dois artistas que atualmente estão no topo do carnaval. Como é a conversa com os carnavalescos Gabriel Haddad e Leonardo Bora na elaboração das suas fantasias?

Taciana: “É bem bacana porque vai além de uma relação profissional e surge uma amizade fora do barracão. Temos uma ótima relação com eles, então conseguimos conversar sobre tudo. Desde que chegaram na escola nos perguntaram o que gostávamos de vestir, quais cores… sempre estão dispostos a nos ouvir. Tanto que em 2020 tivemos três desenhos até chegarmos no quarto e último, baseado num conjunto de opiniões deles, nossas e da Beth. A gente não interfere no trabalho deles, mas temos a liberdade de expor o que nos deixa favoráveis, mais soltos na Avenida, e que combine mais com o enredo. Esse ano a gente não precisou mexer em nada. A proposta já nos emocionou de primeira e estamos muito felizes com o que vamos levar pro desfile”.

Para o Daniel, qual é a principal virtude da Taciana na dança?

Daniel: “Nunca ouvi essa pergunta antes! Pra mim, a virtude dela é saber ouvir. É muito difícil lidar com o ser humano porque existem egos e, graças a Deus, entre a gente não tem nada disso. Ela sabe ouvir, temos sempre conversas, debatemos e discordamos. Acho que a maior virtude dela é essa capacidade de ser compreensiva na dupla”.

Para a Taciana, qual é a principal virtude do Daniel na dança?

Taciana: “Sempre estar disposto a me ensinar. Acho que desde o instante em que ele me acolheu. Imagino que não tenha sido fácil vir de uma parceria em caminho de consagração e pegar a responsabilidade de uma menina mais nova e com pouca experiencia porque você praticamente tem que recomeçar todo um trabalho. Mesmo assim, já no início ele me abraçou com muito carinho e até hoje tem a paciência de me ensinar, está sempre trazendo alegria para os nossos dias. Às vezes eu estou triste e ele me alegra, e cobra que o momento da nossa dança seja também de descontração. O Daniel é isso. Ele é alegre, divertido e traz isso pra minha vida, muito além da dança”.

O que não pode faltar em um mestre-sala perfeito, Daniel?

Daniel: “O entendimento da função. Ele compreender que o papel do mestre-sala é ser o guardião e defensor do pavilhão e da porta-bandeira. Acho que o mestre-sala deve estar o tempo todo pra ela, pra dama… ser realmente um protetor e pensar ‘essa flor é minha, não posso perder e deixar que peguem’”.

O que não pode faltar em uma porta-bandeira perfeita, Taciana?

Taciana: “Acredito que a elegância de uma defensora de um pavilhão, o respeito pelo sagrado e a alegria de estar ali representando uma comunidade”.