Sob uma chuva persistente, centenas de componentes portelenses lotaram a Rua Carolina Machado, na noite desse domingo, para realizar o segundo ensaio de rua da Majestade do Samba visando o Carnaval de 2024. O treino teve início por volta das 19h40 e durou uma hora exata. O percurso realizado pela escola começou próximo à entrada da estação de trem de Oswaldo Cruz e terminou na esquina da Rua Clara Nunes. Os desfilantes enfrentaram diversos desafios provocados pelo mau tempo, como o acúmulo de água no chão, e outros originários da própria pista, entre os quais a falta de iluminação em alguns trechos da via. Essas adversidades poderiam ser sinônimos de uma apresentação problemática da agremiação, porém o que se viu foi um chão aguerrido, marcado pela superação dos componentes. Nem mesmo o não comparecimento de nomes importantes como o intérprete Gilsinho, o mestre-sala Marlon Lamar e dos integrantes da comissão de frente tiraram o brilho da passagem da azul e branca de Oswaldo Cruz e Madureira, que viu o seu hino oficial para o ano que vem ter um bom rendimento embalado pela excelente performance da bateria “Tabajara do Samba”.

“Gratidão a todos os portelenses que puderam vir nesse domingo, que estiveram conosco na rua, porque teve a questão da chuva, teve a questão do tempo, mas a comunidade se fez presente mesmo assim. Em nenhum momento foi fraco o ímpeto e a força de canto portelense. Então, é disso que a gente está falando. Trata-se de um processo, onde etapa após etapa vamos cada vez mais cantar com força, evoluir com força. Fizemos o ensaio em uma rua que nos oferece uma técnica melhor, realizamos as cabines, balizamos um tempo que a gente entende que é bastante interessante para desfile e isso só acontece porque nós temos uma escola que, em uma situação climática como essa, comparece e representa com orgulho esse pavilhão. Todos nós estamos fazendo um processo de construção cada vez melhor. É sobre a Portela como um todo, sempre”, afirmou o diretor de Carnaval, Junior Schall, em entrevista concedida depois do ensaio de rua para a reportagem do site CARNAVALESCO.

No ano que vem, a Portela será a segunda escola a desfilar no Sambódromo da Marquês de Sapucaí na segunda-feira de Carnaval, dia 12 de fevereiro, pelo Grupo Especial. A agremiação irá em busca do seu vigésimo terceiro título de campeã da folia carioca com o enredo “Um Defeito de Cor”, desenvolvido pelos carnavalescos André Rodrigues e Antônio Gonzaga. Baseado no romance “Um Defeito de Cor”, da escritora Ana Maria Gonçalves, a proposta é trazer uma outra perspectiva da história, refazendo os caminhos imaginados da história da mãe preta, Luisa Mahim.

Samba-enredo

Após uma disputa equilibrada e marcada pelo bom nível dos concorrentes, a Portela escolheu, no início de outubro, a obra assinada por Wanderley Monteiro, Rafael Gigante, Vinicius Ferreira, Jefferson Oliveira, Hélio Porto, Bira e André do Posto 7 como hino oficial da agremiação para o Carnaval de 2024. A partir dessa definição, a composição, que despontou como uma das mais elogiadas da safra do Grupo Especial, passou a ser trabalhada em eventos na quadra, como os ensaios de canto, até ganhar as ruas de Oswaldo Cruz e Madureira neste mês. E mesmo com a ausência do intérprete oficial Gilsinho, o samba-enredo conseguiu ter um excelente rendimento neste segundo treino a céu aberto.

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Fotos: Diogo Sampaio/CARNAVALESCO

O cantor Niu Souza, que comandou excepcionalmente o microfone principal, se saiu bem no desafio e mostrou segurança na condução. Ele soube explorar, junto aos demais integrantes do time de apoio, a riqueza melódica do samba, sem que este ficasse arrastado ou cansativo. Todavia, é importante ressaltar que a bateria “Tabajara do Samba” desempenhou papel crucial para que isso fosse possível. Com um andamento cadenciado e a qualidade já característica, os ritmistas comandados pelo mestre Nilo Sérgio deram um verdadeiro show na Rua Carolina Machado e foram responsáveis por não deixar nenhum dos presentes ficarem parados durante a passagem da Majestade do Samba, sejam eles somente moradores curiosos assistindo no portão de casa ou os próprios segmentos da escola enquanto desfilavam. O feito desencadeou um reflexo positivo no canto da comunidade e na evolução, contribuindo que o bom ânimo se mantivesse principalmente nos momentos em que a chuva castigou com mais força.

Harmonia

A comunidade da Águia Altaneira não se abateu com as adversidades geradas pela chuva e fez bonito no quesito harmonia na noite desse domingo. Com a letra na ponta da língua, os componentes entoaram o samba-enredo com bastante afinco. O trecho de maior rendimento foi justamente o refrão principal, cujo os versos “Saravá Keindhe! Teu nome vive!/Teu povo é livre! Teu filho venceu, mulher!/Em cada um de nós, derrame seu axé!” foram berrados por uma boa parcela das pessoas que estavam no local. Além dele, o refrão do meio, “Salve a Lua de Bennin/Viva o povo de Benguela/Essa luz que brilha em mim/E habita a Portela/Tal a história de Mahin/Liberdade se rebela/Nasci quilombo e cresci favela”, também teve uma boa performance e se destacou pela força do canto. Em contrapartida, outras partes da obra foram pouco entoadas ou em menor volume como “Me embala, oh! Mãe, no colo da saudade/Pra fazer da identidade nosso livro aberto” e “Sagrado feminino ensinamento/Feito águia corta o tempo/Te encontro ao ver o mar/Inspiração a flor da pele preta/Tua voz, tinta e caneta/No azul que reina Yemanjá”, ambas presentes na primeira estrofe. Falando das alas propriamente, um canto mais aguerrido foi observado em desfilantes de todas elas, só variando a quantidade deles dentro daqueles determinados contingentes. A primeira e a terceira ala do treino a céu aberto, assim como as duas últimas, acabaram sendo as que mais chamaram atenção positivamente nesse sentido.

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“O samba é muito potente como um todo. Em toda a obra musical, você tem um trabalho, que é contínuo, para conseguir obter um maior rendimento. Esse trabalho não vai só pela questão do canto, mas pela evolução, espontaneidade, o balanço de uma escola. Nós estamos buscando isso na rua, mas também nos ensaios de quarta-feira de canto. A Portela está ensaiando muito, com um calendário muito bom de treinos, para termos o melhor aproveitamento em cada parte. Interessante é que nós estamos naquele processo, como um todo, em que componentes tomam o samba para si. Ele passa a ser do desfilante, que o explora nesse espaço da melhor maneira possível. E com certeza, nesse momento, até pela característica dos refrões, eles são os pontos de ápice. O nosso trabalho agora é trazer para o máximo de posicionamento bom, efervescência, pulsação, força de canto, todas as partes do samba. É uma obra muito boa, formidável, que narra bem o enredo e que toca o coração e a alma do componente portelense”, ponderou Junior Schall durante conversa com a reportagem do site CARNAVALESCO.

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Evolução

A Majestade do Samba definitivamente não quer cometer os erros do passado e esse segundo ensaio de rua na temporada para o Carnaval de 2024 serve como um exemplo dessa máxima. Debaixo de uma chuva que perdurou todo o período de apresentação, os componentes da azul e branca de Oswaldo Cruz e Madureira demonstraram bastante garra para superar todos os percalços, que incluíram desde bolsões d’água no caminho até mesmo a pouca iluminação do trajeto. Mesmo nos momentos de maior aguaceiro, os desfilantes mantiveram a empolgação, cantando o samba, vibrando, abrindo os braços e pulando. Apesar das ausências da comissão de frente e do primeiro casal de mestre-sala e porta-bandeira, houve a simulação das paradas técnicas nas cabines de jurados. Por conta disso, o ritmo de desfile da escola oscilou trechos de lentidão com outros de maior agilidade. No entanto, isso não acarretou falhas mais graves no quesito como a abertura de buracos ou o embolamento entre alas. Além disso, a bateria também realizou o recuo e conseguiu fazer as manobras de maneira tranquila, sem passar por grandes transtornos.

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Bateria

O grande destaque desse segundo ensaio de rua da Portela na temporada para o Carnaval de 2024. Nem mesmo a chuva persistente foi empecilho para uma performance inspirada dos ritmistas liderados pelo mestre Nilo Sérgio. Ao todo, duas bossas, além de duas nuances, foram executadas no decorrer da passagem pela Carolina Machado, o que animou os desfilantes e os espectadores que se aglomeraram nas calçadas apertadas. A presença de atabaques e a ênfase dada à ala dos agogôs foram alguns dos pontos que se sobressaíram, assim como o andamento adotado pela “Tabajara do Samba”. Ao longo de uma hora de treino ao ar livre, o metrônomo registrou entre 144 e 145 BPM (batidas por minuto), o que permitiu preservar as características originais do hino oficial da agremiação para o ano que vem, assim como da própria bateria da Majestade do Samba.

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“O balanço desse ensaio é positivo, até porque serviu para ver como nos sairíamos em uma situação adversa. Se no dia do desfile estiver chovendo, a gente vai ter que ir de qualquer forma. Além disso, foi bom poder ter uma noção daquilo que desenvolvemos desde o primeiro ensaio, checar se vamos ou não tirar e colocar alguma coisa… Por tudo isso, o treino desse domingo era muito importante para a gente prosseguir o trabalho. Limpamos o que tinha que limpar na semana passada, limpamos na quarta, e hoje praticamos na rua. E essa semana agora já vou botar outra bossa, outro veneno, e assim vai. Portanto, o ensaio de rua foi muito importante sim, independente de chuva ou não. Pode até ter atrapalhado a afinação, mas em matéria de pegada, continuou tendo a mesma. E só aconteceu porque a gente não estava preparado. Pensávamos que ia chover e ia parar rápido, ou então não ia ter ensaio, por isso não botei o plástico nos instrumentos. Mesmo com esse ponto, o resultado foi muito bom, muito positivo”, avaliou o mestre Nilo Sérgio em conversa com a reportagem do site CARNAVALESCO, logo após a conclusão do treino.

Outros destaques

Prestes a fazer seu sétimo desfile no cobiçado posto à frente dos ritmistas da azul e branca da Oswaldo Cruz e Madureira, Bianca Monteiro já se tornou uma figura quase que dissociável da “Tabajara do Samba”. Em uma noite de ensaio de rua na qual a bateria roubou a cena, a beldade não ficou de fora dos holofotes e também se sobressaiu. Mesmo com a pista molhada e os trechos com acúmulo de água, a majestade portelense não economizou no gingado e deu uma verdadeira aula de samba no pé. Com um figurino simples, composto por um short jeans e um biquíni cravejado com pedras azuis, ela esbanjou beleza e simpatia durante sua passagem, fazendo questão de interagir com o público que assistia a apresentação da Portela nas estreitas calçadas da Rua Carolina Machado. Em um dado momento, próximo ao fim do treino, Bianca protagonizou uma cena fofa com a própria irmã, a pequena Laíz Inês, de apenas três anos. A garota mostrou que o amor pela folia vem de família e fez questão de ir para frente dos comandados do mestre Nilo Sérgio sambar junto da irmã mais velha.

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Outro destaque foi a participação da porta-bandeira Squel Jorgea no ensaio de rua desse domingo. Por conta da agenda de compromissos em São Paulo, o mestre-sala Marlon Lamar não pode estar presente e coube ao segundo casal portelense, formado por Emanuel Lima e Thainara Matias, a missão de conduzir o pavilhão na abertura do treino. Dessa forma, Squel optou por desfilar à frente da primeira ala e aproveitou para se jogar no samba. Animada, ela fez questão de interagir com os espectadores e os próprios componentes, mostrando já se sentir completamente em casa na nova agremiação.