O Paraíso do Tuiuti encerrou a primeira noite de ensaios técnicos do Grupo Especial no último domingo mostrando que o trabalho realizado às segundas-feiras em São Cristóvão com os treinos na rua tem dado resultado. O samba confirmou na Sapucaí os elogios que recebeu desde a escolha, esteve na boca dos componentes que cantaram durante todo o ensaio com muita intensidade e empolgação. Outros destaques ficaram para a bateria de mestre Marcão, a comissão de frente dos coreógrafos Lucas Maciel e Karina Dias, e a evolução tranquila e espontânea da agremiação. O treino oficial teve a duração de uma hora e 10 minutos. Em 2023, o Paraíso do Tuiuti abre a segunda noite dos desfiles do grupo de elite do carnaval carioca com o enredo “Mocangueiro da Cara Preta” que está sendo desenvolvido pelos carnavalescos Rosa Magalhães e João Vitor Araújo e pretende explorar na Sapucaí a história e a riqueza cultura da Ilha de Marajó no Pará. * VEJA AQUI FOTOS DO ENSAIO TÉCNICO
“Na verdade, agora eu tenho que agradecer a toda comunidade do Paraíso do Tuiuti. Foi uma entrada muito firme nessa avenida. Estávamos mais uma vez precisando. Porque aqui é o passo para o nosso desfile principal. Agora não é melhorar, é só lapidar. O que virá de específico serão todas as surpresas que estamos preparando. Gostei de ouvir toda Sapucaí cantando o nosso samba”, disse André Gonçalves, diretor de carnaval.
Samba-Enredo
Uma das principais contratações da escola e principal mudança para o carnaval 2023, Wander Pires, que já vem tendo esse contato espetacular com o público nos ensaios de rua, pela primeira vez, pisou na Sapucaí como intérprete do Paraíso do Tuiuti. E não foi nada menos do que já se esperava do cantor: grande construção de terças e segundas vozes em cima da melodia do samba, condução com muita segurança e precisão do samba. Isso tudo auxiliado por um carro de som bastante entrosado e ensaiado. A obra do Paraíso do Tuiuti escolhida para o desfile de 2023 tem uma melodia muito característica, alguns pontos altos como o refrão principal “Cadê o Boi”, e o bis antes do refrão principal com o “É lá, É lá” que remonta a músicas típicas da região homenageada, além do refrão do meio que possuiu um swing da Ilha de Marajó. O andamento escolhido pela bateria de mestre Marcão também favoreceu a obra e a evolução da escola, não tornando arrastado um samba que tem muita ênfase em sua linha melódica com aspectos das músicas regionais e entradas para a dança do carimbó.
Evolução
A evolução do Paraíso do Tuiuti se deu de forma bastante espontânea sem filas rígidas com os componentes realmente brincando carnaval e curtindo o samba. Não se observou buracos e o ritmo adotado pela escola foi bastante agradável para quem assistia, sem nenhum momento de correria, em um ritmo com fluência até o final do desfile, sem ser arrastado com muito samba e com alguns passos de carimbó em algumas partes do desfile. Destaque para algumas alas coreografadas no início que realizavam pequenas coreografias baseadas na letra do samba, mas com liberdade para evoluir de forma mais espontânea em outros momentos.
No trecho do samba “Cadê o boi” do refrão principal, muitos componentes faziam com a mão acima da testa como que procurando o animal, mostrando sincronismo e que tem uma comunidade que está curtindo muito o carnaval que vem pela frente. Mais para o final do desfile, a ala “carimbó” trazia mulheres com saias coloridas evoluindo no ritmo da dança paraense.
Comissão de Frente
Os bailarinos liderados pelos coreógrafos Lucas Maciel e Karina Dias apresentaram uma coreografia bastante intensa e precisa. Mais do que isso, uma coreografia que privilegiou a exibição de passos de danças típicas do estado do Pará. Vestidos com uma fantasia que remete a grupos de pescadores, atividade tradicional na Ilha de Marajó, e com as meninas com saias floridas, os bailarinos da comissão realizavam movimentos bastante sincronizados e passos de danças típicas divididos em grupos de componentes que bailavam de forma independente, e grupos que dançavam com um par. Quatro meninas se destacavam no meio da roda produzida pelo movimento da equipe, apresentando o carimbó. Destaque para a movimentação das saias das bailarinas e para o numeroso elenco trazido pelos coreógrafos, além da força e constância com que cantavam o samba da escola mesmo em meio aos passos de dança.
Mestre-sala e Porta-bandeira
Pelo segundo ano consecutivo dançando juntos na escola de São Cristóvão, Raphael Rodrigues e Dandara Ventapane são adeptos de um estilo bastante intenso. Mas é importante destacar também como há entrosamento entre o casal, sincronia de movimentos, aproximação, toque e neste ensaio, até uma pitada de sedução nos olhares e na delicadeza dos movimentos. Parece que a dupla vai apostar em uma pegada mais voltada para a sedução e para a proximidade de casal, além de alguns passos que remetem a cultura do local e ao próprio carimbó. A indumentária escolhida pelo casal também se destacava em um bege que remete um pouco ao barro presente nas moringas, mas com alguns detalhes voltados para o dourado como na parte de cima do vestido de Dandara. Já a roupa de Raphael, trazia uma extensão na parte de trás como cauda que gerava um bonito efeito quando o mestre-sala girava e fazia movimentos de maior intensidade. A saia do vestido de Dandara era dupla e também causava um efeito interessante.
“O ensaio foi pura energia, foi revigorante. A gente faz um ciclo de trabalho, e quando chegamos aqui para o ensaio técnico é para brindar o público, e para começar essa reta final que é o desfile. A gente está em um processo. A nossa coreografia não fechou. Minha coreógrafa que diz:’Dandara você está sempre querendo alguma coisa a mais’. Eu tenho vários pontos: o principal foi a nossa sincronia para resolver o que a gente precisava junto ali na avenida. Acho que na verdade o nosso grande trunfo é isso. Acho que ele (ensaio técnico) dá esse termômetro para a gente fazer os ajustes finais para o desfile”, afirmou a porta-bandeira.
“Estou emocionado, o quanto esse ensaio foi importante para mim. Porque a cada dia é uma superação, a cada dia eu agradeço a papai do céu, agradeço aos meus orixás por poder passar nessa avenida mais uma vez, mais um ano, principalmente junto com a Dandara. É um balanço de muito trabalho, de muita dedicação. O ensaio nada mais é que a preparação para o dia. Agora a gente vai analisar tudo. Nós vamos conversar, eu, Dandara, nossa coreógrafa Karina Dias. Toda equipe. A gente vai sentar, conversar, ver os prós e os contras. Vai ver o que bom, o que não foi, o que pode melhorar. Agora é hora de estudar e continuar trabalhando. O ensaio técnico é treinar no campo de jogo”, completou o mestre-sala.
Harmonia
Outro ponto alto foi o canto. Desde novembro realizando ensaios de rua em São Cristóvão próximo a quadra, a escola colhe mais uma vez os frutos de uma comunidade bastante aplicada. Desde as primeiras alas, os componentes mantiveram um canto muito intenso e constante, e muitas vezes contagiante. O próprio público também cantou, de forma que seria injusto colocar destaque para apenas algumas alas. E isto vale para segmentos que defendem quesito como a comissão de frente que o tempo todo não parava de gritar o samba. Era notável ver velha guarda, baianas, passistas e até a própria bateria cantando com vontade e alegria. Em alguns momentos, o próprio carro de som deixava a condução do refrão principal “Cadê o Boi” para os componentes que não fugiam à responsabilidade. O único ponto a se prestar a atenção foi já na parte final do desfile, talvez por cansaço, a diminuição na intensidade do canto nas últimas alas. Mas, nada que pudesse interferir em uma possível nota máxima no quesito caso fosse para valer.
“Foi ótimo o ensaio. Tivemos um bom resultado. O povo cantou, participou. Cantou junto comigo, com a escola. E a tendência é melhorar. São poucas coisas para se ajustar para gente vir para Avenida e fazer um grande Carnaval. [Eu gostei mais da] empolgação, da euforia dos componentes, o povo participando. São poucos detalhes [a melhorar]. A bateria é um dos pontos maravilhosos do nosso ensaio. Eu não gosto de pontuar assim porque é muita pouca coisa para se melhorar. Claro que, até o desfile, vai melhorar, a tendência é melhorar mais, até porque vamos ensaiar mais. E ensaiando a gente acerta. [Minha parte preferida do samba é] ‘Há mão que modela a vida no barro Marajoara’, por conta da linha melódica. Cantor gosta de melodia. Todo samba é lindo, mas essa melodia foi a que mais me fascinou, entrou em mim. A bateria está um espetáculo! Nós (intérprete e cantores de apoio) com a bateria estamos simplesmente maravilhosos”, disse Wander Pires.
Outros destaques
A rainha Mayara Lima, eleita recentemente como personalidade do ano de 2022 pelo site CARNAVALESCO, mais uma vez provou porque tem tantos seguidores nas redes e gera tanto engajamento. É muito pelo o que ela faz também no “ao vivo”. Vestida com uma fantasia indígena, Mayara reinou à frente da SuperSom esbanjando simpatia com o público, interagindo com ritmistas e com a ala de passistas que a antecedia.
“O andamento acho que foi tudo perfeito, na nossa concepção do que tocamos e da rapaziada ficou tudo como esperávamos. Vamos ver se algum diretor tem alguma coisa pra falar e então vamos acertando, ensaio técnico é para isso. Eu pego a informação que vem de dentro, do meio para trás é onde tenho a informação do andamento, o que está acontecendo lá no meio. Porque aqui eu só tenho o agudo, então quem está lá, tem o grave e o médio grave, eu olho pra eles dizem que está tudo certo. Se tudo deu certo pra eles, para mim deu certo também. Vamos com cinco paradinhas e 250 ritmistas. Sem muita surpresa, só a do meio que é um carimbó mesmo, estamos fazendo uma ali e é isso, acho que o menos é mais”, comentou mestre Marcão.
A bateria comandada por mestre Marcão, um dos destaques no carnaval passado, trouxe uma bossa no ritmo do carimbó que preenchia todo o refrão do meio do samba. O segundo casal chamou bastante a atenção do público com a singular maquiagem do mestre-sala Leonardo Thomé de boi da cara preta.
No esquenta, Wander Pires cantou os sambas de 2018 “Meu Deus, Meu Deus” e do último carnaval “Ka Ríba Ti Yê”. Antes do desfile, o presidente Renato Thor dedicou a apresentação do Tuiuti a duas baluartes da escola falecidas recentemente, Dona Zilá e Tia Sandra, presidente da ala das baianas. Os carnavalescos Rosa Magalhães e João Vitor vieram no final do desfile.
Colaboraram Allan Duffes, Augusto Werneck, Cristiano Martins e Matheus Vinícius