Muitas escolas optam por comissões de frente com coreografias mais exíguas, para entregar a nota esperada e pronto – algo que não deve ser criticado, já que resultados balizam projetos. Em 2025, a Independente, entretanto, ousou contrariar tal lógica: com uma comissão bastante extensa e com vários atos, o segmento se destacou no desfile do enredo “Gritos de Resistência”, exibido em 58 minutos. Vale destacar, também, uma atuação bastante segura da bateria Ritmo Forte.
Atento a tudo que acontece no carnaval paulistano (o que obviamente inclui o Grupo de Acesso I), o CARNAVALESCO traz a análise, quesito a quesito, da Independente:
Comissão de Frente
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Destaque nos dois ensaios técnicos da agremiação no Anhembi, enfim o segredo foi revelado. O segmento, intitulado “Independentes ou Morte” e coreografado por Edgar Junior, trouxe uma coreografia bastante extensa. Nela, alguns soldados portugueses e Dom Pedro I entram em contato com nativos e os escravizam – com uma atuação bastante dramática, lembrando outra icônica do carnaval paulistano: a da Tom Maior em 2009. A história muda quando um falso soldado português entra em atrito com os originais, liderando um motim dos nativos contra eles – os brasileiros de nascença, por sinal, começam a incorporar para vencer os adversários. Depois disso, uma nativa grávida dá à luz a um bebê, simbolizando a liberdade e os novos tempos – em momento no qual, por sinal, a arquibancada inteira aplaudia. É importante destacar que os pequenos tripés do segmento tinham rodinhas aparentes.
Mestre-Sala e Porta-Bandeira
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Desde 2020 na agremiação, Jeff Antony e Thais Paraguassu (com um hiato em 2024, para que Thais concebesse um filho) vieram com a fantasia “Brasil Nobre e Colonial” – ele, majoritariamente de vermelho e com detalhes dourados (cores associadas à coroa portuguesa); ela com uma roupa que era vermelha na parte de cima, ganhava um tom laranja na metade da saia e terminava com branco. O entrosamento se fez presente e o casal, como costuma fazer, teve excelente atuação ao longo de toda a passarela – sobretudo nos módulos de julgadores. Ednei Mariano, instrutor da dupla, por sinal, estava radiante após a passagem de ambos pelo segundo módulo.
Enredo
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Para alguns, a história a ser contada pela Independente era algo confuso ou subjetivo demais. Quem prestou atenção no desfile, entretanto, saiu entendo absolutamente tudo sobre a história e, também, sobre a temática: a agremiação, basicamente, falou sobre movimentos de resistência ocorridos no Brasil – iniciados com o próprio país, em 1822, sendo que o famigerado “Grito do Ipiranga” é o início do enredo propriamente dito. A partir daí, de maneira bastante intuitiva, as lutas representadas são cronológicas: a cabanagem é a primeira a ser representada, enquanto lutas contemporâneas (como a do movimento feminista e a de causas ambientais) aparecem mais para o final da exibição – que acaba com o samba também na vanguarda da resistência contra diversas mazelas sociais existentes no Brasil.
Alegorias
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Com dois chassis, o primeiro chamado “A Coroação” e o segundo de nome “O Tráfico e Sua Riqueza” destacam as duas faces dos primeiros anos do Brasil independente – o carro como um todo, por sinal, é intitulado “A coroação e o tráfico negreiro” e tinha o mesmo antagonismo da comissão de frente: escravos e originários do Brasil contra pessoas da coroa portuguesa. A segunda alegoria, “O Último Baile da Monarquia e o nascimento de um novo Brasil” trata o marcante evento como um ato de resistência contra um já combalido império. Por fim, o terceiro, “O samba renasce como Fênix e resiste” apresenta o gênero musical e toda a comunidade ligada a ele como herdeiros de uma resistência ancestral – que também tem momentos ruins, motivo pelo qual a ave mítica aparece no título do carro. Vale destacar, também, o barulho da fênix presente na alegoria. A leitura de todas as alegorias era extremamente simples, com esculturas e cores que remetem a cada um dos eventos representados – no último, por exemplo, rei momo, pierrot, arlequim e colombina se fizeram presentes.
Fantasias
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O bom acabamento de cada uma das fantasias, é claro, conta pontos para o quesito. O que mais chamou atenção, entretanto, foi o fato de que boa parte das indumentárias tinha ao menos um item que permitia a rápida identificação do que a roupa identificava. Revolta dos Cabanos? Bandeira do Pará. Causa Praieira? Bandeira de Pernambuco – que, por sinal, é inspirada na Confederação do Equador. A assimilação simples cria empatia – e torna o desfile muito mais simpático para o público.
Harmonia
Nos últimos anos, a Independente tem se notabilizado por ser uma escola com um canto bem forte – até por isso, as vozes mais abaixo no desfile de 2024 chamaram tanta atenção. Em 2025, entretanto, a agremiação da Vila Guilherme voltou ao bom momento pensando no volume de seus componentes. Mesmo com o potentíssimo sistema de som do Anhembi, era possível identificar timbres diferentes do de Chitão Martins, intérprete da escola e que está cada vez mais ligado à instituição. É necessário, porém, novamente destacar a Ritmo Forte: apostando em bossas mais curtas, os ritmistas comandados por mestre Cassiano Andrade sustentaram como poucas a obra.
Samba-Enredo
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As citações a cada uma das resistências propostas no enredo é explícita e deixa o desfile muito mais simples de ser entendido. Por sinal, a canção tem uma característica que foi utilizada por outras coirmãs em 2025: trazer uma obra sem grande margem para a subjetividade, sendo bastante denotativa. É interessante notar que, mesmo falando sobre um tema que evoca a luta, a primeira estrofe do samba é mais melódica por natureza – enquanto a segunda, mais ritmada, parece mais afeita a todas as disputas que o enredo propõe. A interpretação de Chitão Martins da obra é bastante contundente e combina com o que é apresentado – o cantor, por sinal, parece inteiramente adaptado à agremiação da Vila Guilherme. Com um nome que também está completamente ligado à temática, a Ritmo Forte, comandada por mestre Cassiano Andrade, sustentou muito bem a condução da obra – e, embora não tenha executado tantas bossas, foi cirúrgica quando realizou algum movimento desse tipo.
Evolução
Com alguns passos marcados em determinadas partes do samba (como o refrão principal), a agremiação se movimentou bastante e teve bom andamento no quesito. É necessário, entretanto, novamente destacar a Ala 03, “Cabanagem – A Revolta dos Cabanos”, que parecia ter ainda mais liberdade para brincar o samba – com a anuência do staff, que permitia uma locomoção nem sempre linear.
Outros Destaques
À frente da Ritmo Forte, duas destaques: Acássia Amorim (rainha) e Phoebe Vecchioni (madrinha).