Para celebrar quase um século de existência e produção de uma das mais tradicionais escolas de samba do planeta, a exposição “Artesania ancestral nos 95 anos de Mangueira” foi aberta ao público, nesta terça-feira, no Centro Sebrae de Referência do Artesanato Brasileiro (CRAB), na Praça Tiradentes. A mostra, totalmente gratuita, tem como proposta levar os visitantes em uma viagem pela história da verde e rosa, indo desde os trabalhos manuais realizados em fantasias e adereços nas décadas de 20 e 30 até as montagens de grandes peças de alegorias feitas atualmente para os desfiles no Sambódromo da Marquês de Sapucaí. A curada responsável pelo projeto, Célia Domingues, concedeu uma entrevista para reportagem do site CARNAVALESCO na qual destacou o simbolismo desta iniciativa.

Fotos: Diogo Sampaio/CARNAVALESCO

“Esse é um trabalho que se tornou um processo. Há mais de 25 anos que eu sonho com esse momento, de mostrar as técnicas do Carnaval, o artesão, que isso tudo é uma jornada de um ano inteiro e não só um desfile. Essa parceria com o Sebrae, com o CRAB, foi fundamental para a gente mostrar essa realidade. Nós vamos ficar aqui por dez meses, exibindo toda a estrutura do artesanato do Carnaval, tudo que a Mangueira pode fazer. Mas é importante frisar que isso não é só da Mangueira, isso é do Carnaval. A Mangueira está apresentando essa exposição, mas com referência a todos os profissionais, de todas as escolas de samba do Rio de Janeiro e do Brasil inteiro. É um momento que a gente esperava muito e ele finalmente chegou. Então, eu acho que todo mundo está contemplado de certa forma, todas as agremiações tem que se sentir nesse espaço, afinal a exposição é um divisor de águas. É um tributo ao profissional do Carnaval, ao artista, ao artesão e as técnicas que todo ano promovem o maior espetáculo do mundo, não só na época do Carnaval, mas durante 365 dias”, declarou Célia Domingues.

Logo na entrada, a exposição busca trazer ao público um ambiente que remeta às origens da Estação Primeira de Mangueira. Para isso, um tradicional buteco do morro foi todo recriado no espaço, com diversos elementos que fazem referência para as rodas de samba, para as giras de candomblé e ao Bloco Arengueiros, de onde surgiu a escola de samba. Signos artesanais, que homenageiam aos compositores e fundadores da verde e rosa, também estão presentes no local. Em seguida, o visitante tem a oportunidade de conhecer como a comunidade se tornou um polo de artesãos, através da fábrica de chapéus ao lado da linha férrea, além de fazer um passeio pela arte plumária e pela arte afro-brasileira.

“Nós temos oito salas e cada uma delas mostra o que é um barracão, parte de um na verdade. Nelas, a gente tem retratado as técnicas, os materiais, a reciclagem, a proposta da criatividade dos artesãos, dos artistas, para o Carnaval. Então, são oito salas que nos movem muito e nos comovem demais, porque em cada uma existe um atrativo e uma informação, isso é muito importante. Ao longo desses dez meses em que nós vamos ficar com a exposição aberta ao público, iremos mexer nas salas que vão estar sempre renovadas. Cada vez que uma pessoa vier visitar, de dois em dois meses, vai ver elementos novos, produtos diferentes e umas salas totalmente atualizadas para o Carnaval, de ontem e de hoje”, contou a curadora.

Ao final da mostra, o público ainda pode conferir de perto uma maquete, toda feita à mão, que reproduz com riqueza de detalhes o desfile de uma escola de samba na Marquês de Sapucaí. Toda essa visita é embalada pelos sambas-enredo históricos da Mangueira, além de outras canções gravadas por Cartola e Jamelão, dois dos nomes mais marcantes da trajetória da agremiação.

“Importante dizer que as pessoas visitem a exposição com tempo, até para poder entender todo o processo da construção do Carnaval. No final, nós temos uma loja que tem todos os produtos dos artesãos, que são adereços, que são as baianas, onde eles aprendem a fazer o tamanho natural, depois a gente transforma em suvenir. Então, temos uma coleção de suvenir do Carnaval, no artesanato, para contemplar todos os amantes das escolas de samba e da festa”, pontuou Célia.

Personalidades do Carnaval e da Mangueira exaltam exposição

Antes da abertura para o grande público, a exposição foi inaugurada oficialmente em um evento fechado, apenas para convidados, realizado na última segunda-feira. O carnavalesco e comentarista Milton Cunha foi uma das figuras ilustres do mundo do samba que marcaram presença e fez questão de exaltar a importância do Carnaval e das escolas de samba estarem conseguindo ocupar espaços que até pouco tempo eram destinados quase que exclusivamente para a considerada cultura erudita.

“O bacana é que esse espaço é referência de artesanato. Muita gente fala do espetáculo, mas poucos falam do trabalho com as mãos que esses artistas de barracão tem. Essa exposição lança luz sobre o fazer, sobre o processo, da estampa, de como bate placa, de como prega búzio, de como escama a palha da costa. Então, é importante porque é mais uma fronteira vencida, avançada. Que bom que essas gente careta, de universidade, de instituições nacionais estão olhando o Carnaval, a escola de samba, como um produto a ser estudado, pesquisado, documentado. A exposição está belíssima, oito salas e chegamos lá na categoria artistas do artesanato brasileiro”, comemorou Milton.

Quem também prestigiou o evento de inauguração da exposição foi o ex-presidente mangueirense Elias Riche. Em conversa com a reportagem do site CARNAVALESCO, o baluarte enalteceu o trabalho realizado na mostra e garantiu que a exposição deve ser levada também para outras localidades fora da capital fluminense.

“Essa exposição é de vital importância. É mais uma forma de celebrar os 95 anos da maior escola que existe, que possui uma história muito grande, uma riqueza cultural gigantesca, e que sempre fez o Carnaval com muita garra, muita abnegação. Mas, além de ser importante para Mangueira, essa exposição é algo crucial para o samba de modo geral. É um projeto maravilhoso, do tipo da exposição internacional, para poder levar a bandeira do nosso Carnaval para qualquer lugar do mundo. É um divisor de águas, algo que nunca foi feito. Tanto que a gente quer levar para outros lugares, talvez não nessa dimensão com oito salas. Já estamos conversando, articulando sobre a possibilidade de levar para o interior do estado do Rio e se Deus quiser vamos conseguir ir com ela até o exterior”, assegurou Elias Riche.

Além de apresentar a exposição, o evento da última segunda-feira contou com uma apresentação especial da bateria “Tem Que Respeitar Meu Tamborim” e um show da velha guarda musical da verde e rosa. Uma das integrantes deste grupo, Guesinha é filha de Dona Neuma e neta de Saturnino Gonçalves, primeiro presidente da história da Mangueira. Ela falou com a reportagem do site CARNAVALESCO e se mostrou emocionada com as homenagens destinadas a agremiação.

“Achei a exposição maravilhosa, melhor impossível. Os fundadores da Mangueira nunca pensaram em vê-la chegar em um patamar tão alto. Hoje, nós somos respeitados como os reis do Carnaval, somos tratados como os donos do samba. Portanto, a gente tem obrigação no Carnaval de apresentar um excelente samba, um excelente desfile, tudo excelente, porque é isso que o público espera. Nós temos que respeitar esse público. Por isso, pedimos bastante forças a Deus para que sempre nossos caminhos estejam abertos, porque não tem não tem explicação a gente chegar em um patamar desse. É emocionante. A Mangueira só tem um problema para mim, eu não vejo defeito em nada. Tudo da Mangueira é maravilhoso e ai de quem falar o contrário, fico injuriada. A Mangueira é perfeita, se não existisse tinha que ser criada”, enalteceu Guesinha.

A exposição “Artesania Ancestral nos 95 anos de Mangueira” pode ser visitada de terça-feira a sábado, das 10h às 17h, com entrada franca, mediante apenas a apresentação de um documento com foto. O Centro Sebrae de Referência do Artesanato Brasileiro (CRAB) fica localizado na Praça Tiradentes, nos números 69/71, no Centro da cidade do Rio de Janeiro.

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