Tida como uma das favoritas para o Grupo de Acesso II em 2023, a Unidos do Peruche fez questão de deixar claro que o status não veio à toa. Com um desfile que impressionou pelo bom gosto estético e pela grande exibição do casal de mestre-sala e porta-bandeira, a Filial do Samba deixou apenas uma dúvida na prática: a função do tripé que veio logo após a comissão de frente. Há, porém, uma certeza: a apresentação do enredo “A Essência Que Me Seduz”, que durou 47 minutos (logo, três minutos abaixo do limite máximo regulamentar) brigará pelo título do agrupamento no ano.
Comissão de frente
Com uma fantasia inteira branca e prateada (dando a impressão de que eram seres celestiais), com forte maquiagem também no rosto, os componentes executaram uma coreografia que apostou no bailado puro, sem recurso algum extra e sob a batuta do coreógrafo Matheus Cardoso. O grande trunfo dos bailarinos foi a sincronia, já que cada movimento era executado com ritmo perfeito em cada passagem – o que incluiu também a apresentação na frente de cada uma das torres de jurados.
Um detalhe curioso veio logo após os integrantes do setor. Havia um tripé com figuras remetendo a santos (o que combina com os seres celestiais que vinham à frente), mas ele não interagiu com os componentes em momento algum – e vice-versa. Por sinal, o tripé era empurrado por pessoas que estavam fantasiadas como os seres celestiais.
Mestre-sala e Porta-bandeira
Dos casais mais eficientes e graciosos de todo o carnaval paulistano, Kawê Lacorde e Nathalia Bete tiveram mais uma noite de gala. Extremamente sorridentes e expressivos, ambos tiveram muita sincronia em cada movimento e envergaram com muita altivez o tradicionalíssimo pavilhão perucheano.
Kawê e Nathalia mesclaram de maneira bastante satisfatória as interações com o samba e entre eles mesmos, o bailado e os giros. Cada desfraldamento do pavilhão foi executado de maneira precisa, sem contratempos e com largos sorrisos de dois componentes que sabem como poucos a nobre arte que exercem.
Harmonia
O início da escola foi plenamente satisfatório no quesito. As primeiras alas perucheanas cantaram com força o samba-enredo, surpreendendo até mesmo quem estava nas arquibancadas – que, moralmente coagidas, passaram a reagir ao canto.
A partir do segundo setor, é bem verdade, para exprimir o máximo canto de cada componente, foram necessárias algumas chamadas de atenção de staffs posicionados no corredor. Após cada uma delas, entretanto, os foliões voltaram a cantar forte a canção.
O alinhamento de cada ala era foco de atenção dos staffs, mas não foram necessários grandes chamadas de atenção em tal aspecto.
No fim das contas, o que fica é uma imagem rara e que se repetiu diversas vezes ao longo do desfile: pessoas com a camisa da escola cantando o samba e de olhos franzidos para ficar atento a qualquer deslize – que raramente ocorriam.
Enredo
A história do perfume foi o mote para o enredo “A Essência Que Me Seduz”, idealizado pelo carnavalesco Mauro Xuxa. Mais que trazer o desenvolvimento histórico de tão conhecido fluido, o desfile permitiu associações imediatas para quem estava atento ao samba-enredo – que buscou explicar, de forma melódica, o que era visto.
O primeiro setor trazia uma linha cronológica do perfume, com referências a nações e eventos históricos – como as Cruzadas, os franceses e a chegada dos portugueses ao Brasil. Depois, veio a interação das essências com o carnaval e, por fim, a importância das florestas brasileiras para o desenvolvimento de novos aromas.
É bem verdade que o primeiro setor busca alcançar um período histórico muito maior que os dois seguintes (que, por vezes, até mesmo se confundia), mas tal situação é permitida pelo próprio enredo desenvolvido – logo, não é considerado como falha.
Evolução
Bastante regular ao longo de todo o desfile, o componente perucheano aproveitou o samba-enredo que caiu no gosto da escola e se movimentou bastante. Brincando e com bastante leveza, cada componente aproveitou para interagir com companheiros de ala e com as arquibancadas.
Vale destacar, também, o andamento sem sobressalto algum ao longo de todo o desfile. Sem acelerar ou frear o passo, a Filial do Samba passou de maneira linear pelo Anhembi – o ideal para todos os envolvidos.
O recuo da bateria, momento sempre de tensão em cada desfile, foi executado sem deixar buraco algum na passarela. A bateria esperou metade do espaço destinado a ela aparecer e curvou-se à direita, logo atrás de uma das mais tradicionais Velha Guardas da cidade de São Paulo. Com uma recheadíssima corte de bateria, coube às destaques ir à frente da passarela e sambar bastante até que a ala anterior assumisse o posto – e, também, impedindo o aparecimento de buracos. Foram cerca de oitenta segundos de agremiação aguardando o final da movimentação para voltar a evoluir.
Samba-Enredo
Como dito anteriormente, a canção caiu no gosto da comunidade perucheana – o que, é claro, facilitou a execução da obra na avenida. Além dos componentes, vale destacar, também, a ótima condução da música na avenida por Alex Soares, que empolgou desde os alusivos cantados na Concentração. Sem muitos cacos, ele também foi ajudado pela grande noite da Rolo Compressor, sob o comando de Acerola de Angola – os ritmistas, entretanto, apostaram mais em bossas e em um andamento pouco mais acelerado para empolgar os desfilantes.
Fantasias
De acordo com cada setor (explicado no quesito “Enredo”), a cromia da escola evoluiu de maneira condizente com o que era pedido: no primeiro, cores com tom mais pastel, para dar a aparência de envelhecimento; no segundo, cores bem mais vibrantes (com destaque para uma ala em um forte tom de azul, com componentes cantando muito forte o samba); por fim, no terceiro, o verde interagia com cores em tons de lavanda e rosa – para remeter a algumas das flores utilizadas em essências. Neste último setor, destaque para a ala das baianas, majoritariamente de branco e com detalhes verdes e lilás – fazendo uma mescla perfeita com o que viria pela frente.
Mais do que isso, chamou atenção o extremo bom gosto das fantasias desenvolvidas pela escola. Enquanto coirmãs buscaram colocar algum adereço e/ou costeiro por cima de tecidos brutos, a Peruche, claramente, investiu para dar ao folião a certeza de que vestia uma fantasia completa, produzida e pensada para ele. Com acabamento impecável e peças de extremo bom gosto, cada roupa parecia, também, leve – deixando o folião bastante à vontade para cantar e se movimentar.
Alegorias
O abre-alas da escola chamou atenção não apenas pela beleza que trouxe, majoritariamente nas cores azul e amarela e com esculturas magistralmente bem desenvolvidas e acabadas. O carro, bastante imponente e alto, trouxe um gigantismo e bom gosto para o desfile que se confirmou conforme ele se desenrolava – e que ficou ainda mais bonito com a fumaça que saía do mesmo.
A segunda alegoria, pouco menor, manteve o ótimo nível estético e fechou o desfile dentro do seguimento do enredo, unindo a história da escola com as essências proporcionadas pela Floresta Amazônica.
Outros destaques
Das escolas mais tradicionais do carnaval paulistano, a Unidos do Peruche tem diversos sambas de quadra reconhecidos no carnaval de São Paulo. A execução de alguns deles fez com que a escola entrasse na avenida já com três minutos no cronômetro.