A Fábrica do Samba recebeu, em outubro, a gravação oficial do samba-enredo da X-9 Paulistana para o Carnaval 2026. Com forte presença de comunidade, coral robusto e um clima de grande responsabilidade, os segmentos da escola destacaram a busca por equilíbrio entre técnica, emoção e respeito ao enredo de temática indígena. O trabalho envolveu harmonia, bateria, intérpretes e direção musical, que fizeram ajustes específicos para o tempo de faixa da Liga-SP e para a ambientação do estúdio. O arranjador Bruno Carvalho explicou que a proposta musical partiu das convenções criadas pela bateria, valorizando os instrumentos tradicionais do carnaval paulistano.
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“Nessa gravação, a X-9 Paulistana vai aproveitar os arranjos em cima do que a bateria cria. Para essa gravação, não há nenhum elemento indígena específico ou aquela flauta de bambu. A gente pode até pensar numa adaptação dessa para o desfile, mas tudo foi pensado com os instrumentos que a gente tem no carnaval mesmo, aproveitando as convenções que a bateria fez em cima do tema para a gravação. Já temos a gravação da escola, que teve o Cicinho, um arranjador muito experiente e que participou da gravação de outras coirmãs, como responsável. A gente só readaptou o arranjo para o tempo de faixa que a Liga-SP disponibiliza e acertamos em relação à dinâmica da gravação no estúdio. Ficou um trabalho bem legal, bem encaixado e bem satisfatório pra quem vai curtir a faixa”.

Bruno destacou também que, apesar da ausência de instrumentos específicos, nuances sonoras que remetem ao enredo foram preservadas. “A introdução é bem legal, e durante o samba nós trazemos também alguns elementos indígenas – mesmo sem a presença de instrumentos especiais. A gente faz esse acompanhamento junto com a bateria, sem tirar o chão, porque a gente está dando sustentação para a escola cantar. Isso vai ficar perceptível no trabalho”.
Na harmonia, o diretor Fabiano Maciel (Didi) reforçou o compromisso da X-9 com o retorno ao Grupo de Acesso I.

“A X-9 está se preparando para fazer um grande desfile porque precisamos voltar para o Grupo de Acesso I. Sabemos das dificuldades do nosso grupo, são muitas escolas que estão lutando pelo mesmo acesso, mas eu acredito que a X-9 está preparada e vai fazer um grande desfile”.
Didi descreveu a gravação como um momento leve, mas importante. “Na gravação é uma coisa mais leve. Não de brincadeira, mas uma coisa de juntar os amigos para a gente gravar. O samba é muito bom, o samba ficou maravilhoso, e a gente fez uma grande gravação”.

Ele também revelou seu trecho favorito da obra: “Eu gosto muito do refrão do meio: ‘Anauê! A terra sem mal: Yvy Marã Ei’, mas o samba inteiro foi bem confeccionado”.
Sobre a mobilização da escola, destacou o grande contingente levado à Fábrica do Samba. “Viemos em um total de 114 pessoas entre o coro e a bateria”.
E lembrou as dificuldades logísticas enfrentadas pela equipe. “Eu vou falar por mim: eu sou de Jundiaí, então eu tive que acordar 06h para estar aqui agora. Mas a maioria da escola é daqui de perto. Marcamos aqui na Fábrica do Samba às 09h30 e está todo mundo já aqui. O nosso horário é ingrato, mas é o que sobra para a gente. O pessoal lá de cima vai escolhendo primeiro e o que vai sobrando a gente vai pegando”.
O comando da bateria ficou por conta do mestre Keel Silva, que explicou o andamento adotado na gravação.

“O bpm da gravação a gente geralmente joga um pouco mais para trás: 142 BPM (batidas por minuto), mais ou menos. Para a pista, a gente joga um pouco mais para a frente, para impulsionar um pouco mais a escola. Mas, para a gravação, 142 a gente acha que está bom, porque é um andamento confortável para o coral cantar, para todo mundo entender o samba e para não ficar muito corrido a dicção das palavras. A gente geralmente desce um pouco o andamento no estúdio e, por isso, vai ser 142”.
O mestre detalhou ainda as bossas que serão usadas na avenida. “Na avenida vão ser quatro bossas e, para a gravação vão ser duas. Tem, também, um mini apagão no refrão – que é um pedaço da terceira bossa, que a gente não vai fazer hoje”.
Keel elogiou a qualidade do samba e destacou o impacto dos intérpretes na obra. “É muito diferente quando a gente tem um samba reconhecidamente bom, ainda mais porque a gente ouviu o samba quando ele estava na fase da concorrência. Quando eu ouvi a primeira versão, eu falei que esse samba na voz do Daniel Collete e do Royce do Cavaco vai derrubar o Anhembi pela qualidade técnica de ambos, não tenho o que falar dos dois. É um samba que a comunidade já está aprendendo, é fácil de aprender, é chiclete, e tem uma melodia bonita. Tem tudo para dar certo na avenida e, se Deus quiser, vai dar tudo certo. Na verdade, já deu tudo certo”.
Os intérpretes Daniel Collete e Royce do Cavaco destacaram o equilíbrio necessário entre técnica e emoção na gravação.

Royce explicou a abordagem vocal da dupla. “Para mim, é uma junção: a gente procura ser técnico para mostrar o samba. Como é uma fase pré-carnavalesca, a gravação é importante para passar a mensagem para o público que vai ouvir o samba. Ao mesmo tempo, é preciso puxar a empolgação da galera, a galera precisa sentir, o pessoal da escola precisa sentir o samba, colocar isso no coração, dar voz e ficar confortável para todos. É preciso explorar os tons do samba, as partes fortes do samba, e a gente precisa seguir, também, para dar uma base para todo mundo”.
Daniel reforçou a busca por harmonia entre as vozes. “É preciso ficar tudo equilibrado. O Royce dispensa comentários, e eu sempre aprendi vendo-o cantar na X-9, lá atrás. Aprendemos um com o outro. A gente tem que ter equilíbrio. Não adianta: a escola é dotada de homens e mulheres. Vozes graves e vozes agudas, médias. A gente tem que fazer uma coisa ponderada para não ficar bom para o Royce, bom para o Daniel e não ficar bom para o povo. A gente tenta fazer – e, graças a Deus, a gente conseguiu. Com muita conversa, em comum acordo e numa tonalidade que todo mundo consegue cantar”.
Sobre os cuidados vocais, Daniel destacou sua rotina. “Maçã é muito legal, tem aqueles gargarejos com gengibre, que é cicatrizador. Tem aquele melzinho que a gente toma muito (sempre com cuidado e ficando de olho na taxa de glicose no sangue), e a gente tenta ter uma noite de sono bem dormida, descansar a voz, falar numa tonalidade natural. Uso todas as técnicas vocais que a gente aprende na música e coloco cada uma delas da melhor forma possível, além de hidratar bastante a garganta. Eu também conto com a graça divina para sempre fazer um bom trabalho”.
Royce reforçou a importância dos cuidados após enfrentar cirurgia. “O Daniel sabe disso e absorveu toda essa minha trajetória. No Carnaval que vem, eu vou completar 44 anos de desfile. De três anos para cá, enfrentei lesão nas cordas vocais, fiz a cirurgia dos pólipos e, sob orientação de uma fonoaudióloga e do próprio cirurgião, além de tudo que o Daniel falou (exercícios vocais; dormir bem; maçã, porque ela é feita de fibras e ajuda bastante; e dormir bem), além dos exercícios vocais que eu tenho que fazer para evitar novas lesões, reaprender a respiração e tudo mais. Mesmo com as cordas vocais zeradas novamente, eu tenho que tomar certos cuidados e fazer esse tratamento todo”.
Ao escolherem seus trechos preferidos do samba, os intérpretes mostraram sintonia com a poesia do enredo. Daniel destacou a abertura: “A cabeça do samba é muito bonita: ‘Preciso te ouvir/Nação guarani/Veja o olhar de Guirapoty’. Essa primeira parte é bonita demais. É muita poesia. O samba não tem muitas linhas, mas as que ele possui são bem significantes”.
Royce escolheu outro trecho marcante: “Eu curto o samba inteiro, mas ‘Fogo devorando a clareira/Divina centelha/Precede as águas’. Eu acho muito bonita essa parte”.









