O Tatuapé apresentou para a comunidade na madrugada de sábado para domingo o samba-enredo que cantarão no Sambódromo do Anhembi em 2025. A festa de lançamento também foi marcada pela reinauguração da quadra da escola após uma reforma e pela definição daquele que será o décimo samba cantado pelo intérprete Celsinho Mody defendendo a Azul e Branco da Zona Leste. A obra, escolhida em concurso realizado internamente, é assinada pelos compositores Turko, Zé Paulo Sierra, Silas Augusto, Rafa do Cavaco, Fábio Sousa e Luis Jorge. A Tatuapé será a quinta escola a se apresentar na sexta-feira de carnaval pelo Grupo Especial com o enredo “Justiça – A injustiça num lugar qualquer é uma ameaça à justiça em todo lugar”.
Construção do samba
Falar de justiça é tratar de um assunto que está sempre em destaque no debate público, e a Tatuapé optou por confiar nos versos desenvolvidos por artistas consagrados no carnaval paulistano para transmitir o recado do enredo. Turko, um dos compositores do samba escolhido, falou sobre a estratégia adotada pela parceria para chegar no resultado almejado.
“A gente adotou uma linha que a gente costuma fazer muito. É um samba alegre, para cima e é uma mensagem que o Tatuapé está passando, que é a justiça. A gente vive a injustiça diariamente, nós brasileiros, pretos, a gente sofre muita injustiça no dia a dia, então foi muito fácil, foi tranquilo de fazer o samba. E a gente foi muito feliz por quê? Porque o samba para cima é alegre e tem vários recados que a gente dá na letra do samba, várias deixas como os seus olhos enxergam, mas fingem que não vê. É o lance da injustiça, é o próprio lance do Tatuapé. Olhe e fale o que quiser, mas respeite o meu Tatuapé, é uma escola bicampeã. A gente ficou muito contente, muito satisfeito. Foi um bom resultado quando a gente terminou de fazer o samba, e agora a gente foi agraciado em ser o vencedor no carnaval 2025 representando o Tatuapé mais uma vez. Um grande abraço pra comunidade da Zona Leste, comunidade do Tatuapé, comunidade Azul e Branco. Vambora, Tatu! Que a justiça seja feita. Não calem a nossa voz”, disse o artista.
Dez vezes Celsinho
Um dos momentos mais marcantes da festa de lançamento do samba de 2025 foi o momento em que Celsinho Mody cantou seu décimo samba defendendo o pavilhão da Tatuapé. O intérprete misturou a emoção no discurso com seu tradicional estilo irreverente e forte de cantar para apresentar à comunidade mais uma obra que irão defender na Avenida. O artista aproveitou a oportunidade para fazer agradecimentos especiais a quem contribuiu para sua trajetória na escola.
“Para mim é uma honra muito grande falar com vocês mais um ano pela Acadêmicos de Tatuapé. O décimo ano defendendo, dez sambas cantando nessa escola. Eu estou muito emocionado, muito honrado, feliz, primeiro com o presente que Deus me deu e com a honra que essa diretoria da escola, com a presidência e toda a comunidade me deram de viver dez anos tão felizes, com a aceitação altíssima da comunidade, com respeito da minha parte para a diretoria, da diretoria para a minha parte e cumprindo com o meu trabalho. Aqui é uma empresa, e eu estou prestando um serviço, mas eu presto um serviço com emoção, com amor, com a veia de samba e coloco meu coração aqui, e eu coloquei meu coração com a voz dez vezes. É muito emocionante, muito mesmo, ver uma festa como hoje, tão linda, com as pessoas felizes, esperando o resultado do samba, e eu senti as pessoas emocionadas também. Eu estou muito feliz, e quero agradecer, deixar meu agradecimento para Deus, em especial para Deus. Agradecer aos presidentes do Acadêmicos do Tatuapé, os que já passaram e os que estão por esses dez anos, e dizer que podem contar comigo para esse carnaval de 2025 com toda a minha energia, com algo a mais do que o meu coração, porque está pedindo isso, muito emocionado e vou cantar esse samba como o maior samba da minha vida”, declarou.
Celsinho falou sobre a importância que a escola de samba tem para passar as mensagens as quais se propõe, além de detalhar o processo de preparação do samba para o próximo carnaval desde antes da apresentação até os próximos passos.
“A escola de samba é, como todo mundo fala e não é um clichê, um teatro a céu aberto, e cada um tem a sua parte para executar, e a nossa parte é música. É levar emoção para as pessoas e transportar as decisões da diretoria da melhor forma possível para conquistar o coração das pessoas. Nós estamos com uma ala musical muito forte, com grandes artistas, com grandes cantores, grandes músicos, com um trabalho, posso dizer, impecável. a gente pegou esse samba a partir do momento que a diretoria deu para a gente, ensaiamos cinco opções de arranjos de corda, cinco opções de arranjos de voz, de visões, gravamos com todo o amor do mundo, e o nosso papel é fazer música e levar todo esse projeto que a diretoria escolheu para o coração das pessoas. E pode ter certeza de que nós estamos muito unidos. Acabou a apresentação do enredo, nós estávamos em reunião até agora discutindo e falando coisas positivas para melhorar cada vez mais esse projeto. Podem esperar da ala musical do Acadêmicos de Tatuapé o maior espetáculo que a gente já fez na questão técnica e na questão da emoção também. O Acadêmicos do Tatuapé é uma escola muito sólida, de uma diretoria que está junta há muitos anos, que sabem o que fazem, sabem como escolhem os sambas. Rodos os anos o samba da Tatuapé é muito cantado pela comunidade. A gente faz uma matemática, um estudo musical, que possibilita que a escola cante muito. Aqui é um trabalho feito com união, com muito esmero. A gente ensaia e passa frase por frase, desde a ala musical até o mais novo e o mais experiente componente. Vocês podem esperar um trabalho muito digno, com muito afinco e com muita musicalidade para o próximo carnaval”, explicou.
Assertividade dos compositores
O carnavalesco Wagner Santos se sentiu satisfeito com a safra de sambas que a Tatuapé recebeu. O artista acredita que os compositores entenderam a proposta do enredo, e antecipou o que o público poderá esperar do desfile da Tatuapé em 2025.
“Eu gostei muito do samba. Nós tivemos vários sambas que estavam concorrendo nessa final, e foi muito difícil porque eu acredito que todos os compositores conseguiram absorver muito bem a sinopse, a ideia, a proposta, e todos fizeram muito bem o trabalho, foi um difícil resultado. Eu escolhi para chegar a dois, e para a gente foi muito difícil porque a qualidade dos sambas estava muito boa, mas eu estou contente com o samba. Nós não tivemos ainda o tempo para preparar a comunidade para cantar o samba, mas com certeza será um grande samba. Com a proposta que vamos apresentar na avenida, com o visual, o trabalho que está sendo feito para esse samba, com certeza faremos um grande desfile, uma grande noite, e as pessoas, com certeza, vão se sentir presentes no desfile da Tatuapé. Nós vamos abranger diversas críticas que envolvem a vida social das pessoas, o dia a dia dos brasileiros. Situações que hoje são muito presentes e que exigem atenção e falta justiça. Será um grande enredo, com certeza. Eu acredito que, com certeza, as pessoas vão se sentir muito presentes, as pessoas que se sentem injustiçadas no nosso país”, declarou.
Wagner exaltou o fato de o samba escolhido ter passado por ajustes mínimos antes dos compositores apresentarem a versão final da letra, o que na opinião do carnavalesco contribuirá positivamente para o andamento da construção do desfile da Tatuapé.
“Os compositores foram muito fiéis na colocação das palavras, na montagem da letra, está muito legal com tudo o que a gente vai apresentar na Avenida. Claro, as pessoas vão entender isso conforme o desfile vai acontecendo, mas o samba está perfeito, está atento. Tanto é que foi um samba que não teve alteração nenhuma. Foi alguma palavrinha, alguns detalhes, muito pouco, talvez, por interpretação, a necessidade de uma interpretação, mas foi perfeito. Foi muito perfeito, foi muito feliz, e todos absorveram a mesma ideia, foi tudo muito bacana. Estou muito feliz, cansado, porque é uma semana muito exaustiva de um momento em que a gente estará retratando no hino o que vai nos conduzir todo esse momento na Avenida, e eu acredito que as pessoas vão gostar muito do trabalho da Tatuapé. Nós vamos trazer muitas novidades em termos de visual e de proposta teatral. Nós vamos trazer um verdadeiro teatro, uma interpretação, mas também há magia da alegria porque, apesar de muitas tragédias, muitas situações negativas, vamos retratar a alegria e a esperança de um povo brasileiro que sempre tem esperança de dias melhores. O mundo sem justiça não é nada, mas o mundo com justiça pode resolver muitos problemas e pode, com certeza, solucionar problemas”, concluiu.
Desafio de transmitir a mensagem do enredo
A Tatuapé se caracterizou por definir a escolha de seus sambas internamente, seja com concurso fechado ou encomenda. Edu Sambista, um dos presidentes e diretor de harmonia da Tatuapé, explicou como foi o processo de escolha do samba para 2025.
“Como de costume da nossa escola, nós não temos eliminatórias na quadra. Quem escolhe é um processo interno de escolha do samba onde na primeira fase a diretoria da escola seleciona alguns sambas. Entre esses sambas escolhidos pela diretoria da escola, entra na segunda fase em que todos os departamentos da escola se reúnem e fazem a votação. Nós marcamos um dia em que cada responsável vai dar o voto do sambista e o respectivo departamento. Ali a gente já tem a decisão do samba escolhido, mas a gente só anuncia o dia marcado para a festa de apresentação do Samba”, explicou.
O enredo para o carnaval de 2025 marca uma mudança na característica dos enredos que a Tatuapé trouxe nos últimos anos. Ao propor um tema cultural que gera reflexão, fará com que a escola encare um desafio especial para o próximo ano.
“Realmente esse vai ser um grande desafio para a gente. Nós, quando finalizou o carnaval de 2024, a gente estava decidindo que a gente queria uma proposta diferente para enredo. Aí surgiu o tema de justiça, primeiramente entre os diretores. Nós começamos a debater e aí nós fomos tomando noção, emoção, da amplitude do enredo, de como era um enredo complexo e aí um olhou para a cara do outro e falou: ‘vamos aceitar esse desafio, vambora’, foi dessa maneira. A gente sabe que vai ser um grande desafio, mas graças a Deus conseguimos depois de muito trabalho construir uma sinopse com a cara que nós queríamos, como nós planejamos, e em cima disso, quando nós selecionamos o samba, foi justamente para a gente transformar aquela sinopse para o público no dia do desfile em 2025”, disse Edu.
Justiça para a Tatuapé e para o Brasil
O primeiro casal de mestre-sala e porta-bandeira da Tatuapé, formado por Diego do Nascimento e Jussara de Sousa, exaltou a importância do enredo e a forma que as características do samba refletirão no seu desempenho na Avenida.
“Para nós, a comunidade sempre abraça. A gente tem uma comunidade que é muito unida, uma comunidade que entende o projeto, sabe da dificuldade que a escola tem de colocar o desfile na pista e que faz de tudo para a gente desenvolver o melhor desfile, e em 2025 não vai ser diferente. A gente tem aí um samba que é a cara da nossa comunidade. De certa forma, a gente vem aí sendo injustiçado, sempre perdendo décimos, carro que quebra e a gente bate lá e não consegue pegar essa taça para a Tatuapé. Mas acredito que tudo tem a hora certa e, com certeza, com esse enredo da justiça, nós vamos trazer o tricampeonato para a nossa escola”, declarou Jussara.
“Para mim é um samba que vai ficar na cabeça de muita gente porque hoje o mundo clama por justiça. Todo mundo está clamando por justiça, e o nosso samba fala detalhadamente de todas as injustiças que nós vivemos. Tem uma parte do nosso samba que fala ‘qual será a receita da paz’, porque até hoje ninguém descobriu, até hoje todo mundo está clamando por justiça. É um samba que tem muito a ver não só com o povo brasileiro, mas com o mundo, então eu creio que vai ficar na cabeça de muita gente. É um samba forte, vai vir para quebrar na Avenida, vai ficar aquele famoso samba-chiclete, que fica na ponta da língua de todo mundo e vamos lá, vamos pôr a justiça na Avenida. Como a nossa diretoria, os nossos presidentes sempre falam, com esse samba a gente vai para a Avenida para fazer o melhor desfile das nossas vidas”, afirmou Diego.
O processo de preparação do casal para o próximo desfile já está em andamento. Jussara acredita que a essência da dança se manterá, com incrementos possíveis em estudo.
“Nós já estamos trabalhando. Nós já estamos fazendo as nossas pesquisas porque é um enredo que envolve muita coisa. A gente está buscando na parte de coreografia os pontos mais fortes do samba para gente estar podendo fazer a coreografia para o jurado, pista, e tudo mais. Acredito que não vamos precisar mexer no nosso estilo de dança, porque seria a nossa identidade, essa é a nossa identidade como vocês vêm assistindo nos últimos anos. A nossa identidade é uma dança mais para frente, é uma dança mais explosiva, então não tem porque agora, nesse enredo, a gente fazer alguma alteração no estilo de dança. Obviamente a gente vai ter que fazer alguma caracterização que a gente gosta, referente a fantasia e tudo mais, mas a gente ainda está elaborando”, explicou a porta-bandeira.
“Jussara já falou tudo, mas é isso. Não tem por que mudar. Na verdade, a gente só tem a acrescentar, então a gente já vem com o que a gente já tem, nós vamos acrescentar algo mais, porque todo ano a gente acrescenta mais e mais. A gente vai tendo a nossa bagagem aí de anos juntos e está dando certo, então vamos na mesma linhagem”, concluiu o mestre-sala.
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