A União da Ilha do Governador ocupou a Estrada do Galeão, na noite da última quarta-feira, e deu início a temporada dos ensaios de rua visando o desfile do ano que vem. A agremiação, que irá em busca de alcançar o título da Série Ouro e garantir o retorno para primeira divisão da folia carioca, apostará em 2024 na mistura das temáticas africana e infantil, através do enredo “Doum e Amora: crianças para transformar o mundo”, inspirado na obra do cantor e escritor Emicida e que terá desenvolvimento do carnavalesco Cahê Rodrigues. Essa proposta se fez presente no treino, com as referências ao universo das crianças e a negritude presentes não só na parte musical como também em coreografias. Ao longo do percurso, a escola mostrou toda a força do seu chão, que provou estar com a letra do samba-enredo na ponta da língua, entoando ele com vontade do início ao fim. Aliás, o bom desempenho da obra teve como alicerces o espetáculo promovido pelo carro de som insulano, comandado pelo intérprete Nêgo, e pela “Baterilha” do mestre Marcelo Santos.

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Fotos: Diogo Sampaio/CARNAVALESCO

“A gente não cria muita expectativa para o primeiro dia, mas confesso que o resultado me surpreendeu. Foi um ensaio realmente técnico, onde o carro de som e a bateria se encaixaram direitinho, o Nêgo foi um monstro cantando… Quando eu vim pra cá, no ano passado, sempre me falaram que a Ilha, o povo insulano, ama os ensaios de rua. Toda vez que venho para rua com a escola, tenho cada vez mais certeza que essa afirmação é verdadeira. Então, nós estamos trazendo ensaio de rua mais cedo, temos mais oito datas para gente trabalhar e estou confiante que faremos o melhor possível visando um grande desfile no sábado de Carnaval”, analisou o diretor de carnaval Dudu Falcão, em entrevista concedida para a reportagem do site CARNAVALESCO.

Ao todo, esse primeiro ensaio de rua da União da Ilha na temporada para o Carnaval de 2024 teve uma duração de pouco mais de uma hora. A largada para o treino ocorreu às 22h, sendo que o trajeto percorrido foi o mesmo dos anos anteriores, indo da esquina da Estrada do Galeão com a Rua Ericeira até a chegada em frente a quadra da agremiação. Apesar das ameaças de chuva, com direito a raios e trovoadas antes e durante a apresentação, os componentes compareceram em grande quantidade, assim como os torcedores da escola que se aglomeraram nas calçadas para assistir a passagem. Ainda na conversa com a reportagem do site CARNAVALESCO, o diretor de carnaval Dudu Falcão avaliou esse desempenho da tricolor insulana na noite dessa quarta-feira e garantiu que as duas primeiras semanas servirão mais para sentir a comunidade.

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“Hoje foi improvisado. Nós exploramos um pouquinho mais algumas alas, brincamos com o casal, com a bateria, e por isso nós fizemos em 64 minutos. É o tempo de maturação do samba aqui, mas daqui a dois ensaios começamos a trabalhar realmente com o tempo correto, sem improviso. Então, hoje foi para, como eu falo, soltar a musculatura. Nossa ideia é estabelecer um tempo limite de 60 minutos, trabalhando sempre com o casal e comissão de frente no horário original do desfile. Depois disso, a gente vai brincar um pouquinho, sabendo que não vai está menor, porque não tem carro, não tem sempre corpo completo, mas uma hora é o tempo ideal para que possamos usufruir o máximo possível da bateria, do carro de som e da comunidade fora da quadra”, declarou Dudu Falcão.

Com um calendário antecipado, a União da Ilha foi uma das primeiras agremiações da Série Ouro a definir o seu hino oficial para o Carnaval de 2024. A obra composta por André de Souza, John Bahiense, Ricardo Castanheira, Leandro Pereira, Leandro Augusto, Júlio Assis, Flávio Stutzel e Vagner Alegria derrotou outras oito concorrentes e se sagrou, ainda no mês de agosto, vencedora do concurso promovido pela tricolor insulina. Desde então, o samba-enredo passou a ser trabalhado pelos segmentos musicais da escola em ensaios de quadra e eventos diversos. Agora, a composição será testada semanalmente nos treinos ao ar livre. Em conversa com a reportagem do site CARNAVALESCO, o intérprete oficial Nêgo defendeu a importância dessa etapa na rua e destacou ser a oportunidade de se ter uma noção maior do rendimento do samba em uma realidade próxima a da Marquês de Sapucaí.

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“Os ensaios de rua são muito diferentes daqueles que realizamos na quadra, principalmente por conta da acústica. Na quadra, o som bate no teto e volta. Já na rua é como se fosse um desfile, é ao ar livre. Portanto, a nossa noção acaba sendo mais precisa. E, apesar de ser ainda o primeiro treino aqui na Estrada do Galeão, posso garantir que estou totalmente habituado ao samba. Foram três meses de ensaios desde a escolha. Claro que teve algumas modificações, mas fizemos um grande trabalho durante esse período e tenho certeza que não vai ser diferente agora na rua. Pretendo fazer um excelente desfile com a União da Ilha do Governador, assim como tive a felicidade de fazer com o Porto da Pedra e com o Império Serrano. Quero ajudar a colocar a Ilha em um lugar que nunca deveria ter saído, que é o Grupo Especial”, afirmou Nêgo.

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Se depender do que foi visto nesse primeiro ensaio na Estrada do Galeão, a União da Ilha não terá preocupações na parte musical em seu desfile oficial no ano que vem. O samba-enredo teve um ótimo rendimento ao decorrer de mais de uma hora de apresentação, o que se refletiu em um canto bastante aguerrido da maior parte da comunidade insulana. Além da condução segura do intérprete Nêgo e do time de cantores do carro de som, a “Baterilha” foi outro ponto crucial para a boa performance do hino. Os ritmistas comandados pelo mestre Marcelo Santos deram um verdadeiro show, com um andamento um pouco mais acelerado, que se encaixou perfeitamente a obra, além de bossas e convenções com referências à negritude. Essas menções não ficaram restritas ao ritmo e também ocorreram através de uma coreografia realizada pela bateria, que erguia o punho direito cerrado para o alto durante uma passada do refrão principal. O movimento era acompanhado pelo restante dos componentes da escola, dando um belo efeito no conjunto. Para a reportagem do site CARNAVALESCO, Marcelo Santos comentou este começo de temporada de treinos à céu aberto e antecipou um pouco do que o público poderá encontrar no sábado de carnaval.

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“A comunidade da União da Ilha gosta muito de ensaios de rua. A gente deu o nosso pontapé inicial em grande estilo e pintamos a Estrada do Galeão de azul, vermelho e branco. A bateria compareceu em peso e, com isso, conseguimos realmente ter uma boa noção sobre como está o andamento, como estão as nossas bolsas ao ar livre. Afinal, é só na rua que a gente consegue sentir um pouco mais do que é o clima na Sapucaí. E o que apresentamos hoje é somente o resultado de tudo o que a gente vem fazendo nesses quatro meses de ensaios com os ritmistas. Para a Avenida, a nossa largada vai partir no 146 BPM (batidas por minuto), uma vez que o samba permite isso, e vamos vir com 4 bossas ao todo. Eu sempre gosto de reeditar uma bossa do passado e esse ano não será diferente. O saudoso Mestre Paulão será homenageado e vamos reeditar uma virada de 3 dele da década de 90, de 96, um instrumento de 98 e vamos usar atabaques. Temos também mais 3 bossas com a levada afro e vai ter uma bossa que é uma ode visual. Assim como o pessoal da Estrada do Galeão viu uma palinha hoje, a galera da Sapucaí vai poder conferir a bateria fazendo uma coreografia que cabe muito dentro do enredo, que vai ser muito importante”, relatou o comandante da “Baterilha”, que revelou ainda que levará 250 ritmistas para o Sambódromo.

O primeiro casal de mestre-sala e porta-bandeira da União da Ilha, Thiaguinho Mendonça e Amanda Poblete, irá fazer em 2024 o seu segundo desfile consecutivo como defensores do pavilhão principal. Na estreia, a dupla obteve apenas uma nota máxima, além de três 9,9. Para não perder novamente esses décimos e alcançar os tão sonhados 40 pontos, os dois estão seguindo uma rotina intensa de ensaios, que agora contará com mais um compromisso semanal. Em entrevista concedida para a reportagem do site CARNAVALESCO, Thiaguinho e Amanda falaram sobre os treinos na Estrada do Galeão e ressaltaram o impacto deles na preparação para o Carnaval do ano que vem.

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“É importante, pois a gente começa a sentir mais o clima da escola como um todo, né? A energia da bateria, a alegria do desfilante… E, tecnicamente falando, nós começamos a entender mais o andamento, principalmente com a conexão da comissão de frente. Então, acho que a gente tem tudo para poder fazer aí uma boa temporada de ensaios, porque o time se conecta muito fácil. Algumas coisas que podem acontecer de interação são muito fáceis de serem feitas. Portanto, tenho certeza que estamos indo para uma temporada de bons ensaios”, ponderou o mestre-sala.

“É sentir a energia da escola, entender como está o andamento, principalmente, para que a gente possa adaptar a coreografia realmente no tempo certo. Tem uma diferença grande do samba na gravação para o ao vivo. No ensaio de rua, a gente consegue conectar isso direitinho. Também tem essa coisa do entrosamento, a questão da saída da comissão para a nossa entrada nos módulos de julgamento, a nossa saída mesmo para o restante da escola vir, são coisas fundamentais que só temos uma noção muito maior de como vai funcionar nos treinos ao ar livre. Além disso, é bom para entender como está a bateria, o Nêgo, então tudo isso é um conjunto para que a gente possa executar da melhor forma possível o trabalho”, pontuou a porta-bandeira, logo em seguida.

Neste primeiro ensaio de rua, a dupla apostou em uma dança veloz, marcada pela intensidade, que mesclou o bailado tradicional com passos coreografados. Repleta de giros, a apresentação dos dois contou com bastante troca entre eles, fruto dos anos de parceria. Nem mesmo o vento forte comprometeu a performance do casal, que conseguiu driblar as dificuldades de maneira eficiente. No bate-papo com a reportagem, Thiaguinho e Amanda afirmaram terem o costume de usar parte da coreografia oficial nos treinos de rua, até como forma de testar os movimentos e ver como eles funcionam dentro de uma realidade simulada de desfile.

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“A gente gosta de testar até para poder entender que movimento está funcionando ou não ao longo da pista. É diferente de quando você ensaia parado, além de não ter o fator da entrada e saída. Então, a gente gosta sim de, pelo menos, utilizar os elementos importantes da nossa coreografia nos ensaios de rua. Aliás, na maioria das vezes a gente executa a mesma coreografia para poder adaptar bem, ver o que está dando certo e o que não está, até para dar tempo de mudar alguma coisa, se necessário, ou acrescentar alguma coisa também”, relatou Amanda Poblete.

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“Temos que aproveitar o ensaio de rua para poder entender o tempo de desfile, o tempo de bateria, porque é diferente a gente treinar dentro de um estúdio com CD e treinar no áudio ao vivo. Então, é claro que a gente tem que aproveitar o máximo possível. Tem alguns detalhes da coreografia que a gente vai poupar ou fazer com menos volume para que fique esse mistério ainda, mas a gente vai tentar ao máximo botar em prática o oficial”, complementou Thiaguinho.

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Em 2024, a União da Ilha do Governador levará para o Sambódromo da Marquês de Sapucaí o enredo “Doum e Amora: crianças para transformar o mundo!”, assinado pelo carnavalesco Cahê Rodrigues. O tema é inspirado livremente no livro “Amoras”, do rapper e escritor Emicida, e em contos infantis do universo da literatura brasileira negra. A proposta é debater questões antirracistas e a intolerância religiosa, através do olhar infantil. A tricolor insulana será a quarta escola a cruzar a Avenida no sábado de Carnaval, dia 10 de fevereiro, segunda noite da Série Ouro, quando irá em busca do campeonato e do sonhado retorno para elite da folia carioca.