Em 2026, o Império Serrano vai transformar a Sapucaí em página viva da literatura de Conceição Evaristo. Com o título “Ponciá Evaristo: flor do Mulungu”, o enredo desenvolvido pelo carnavalesco Renato Esteves é mais que uma homenagem: é um mergulho coletivo no conceito de escrevivência, criado pela escritora mineira para nomear sua escrita atravessada por raça, gênero e classe, que, agora, atravessa também o carnaval.
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“Foi uma confluência de interesses”, disse Esteves em entrevista ao CARNAVALESCO. “Eu já queria muito falar da Conceição. Dona Conceição é muito especial na minha vida e agora vai ser muito especial para o Império Serrano”, afirmou.
A escolha de homenagear Conceição Evaristo, uma das vozes mais potentes da literatura brasileira contemporânea, nasce, segundo o carnavalesco, de um encontro marcado pela escuta. “No nosso primeiro encontro, ela falou quase seis horas. Ali ela deu o enredo pra gente. Todos os caminhos vieram dessa conversa”, lembrou.
Com delicadeza e reverência, Esteves conduz o desenvolvimento do desfile respeitando um pedido essencial feito pela escritora. “Ela pediu pra gente ler os livros, mas não a biografia. Disse que a biografia dela é de uma mulher preta comum, com todos os sofrimentos que isso carrega — e que a potência dela está nas obras”, revelou.
A escolha evidencia uma das premissas centrais da escrevivência de Conceição Evaristo: é a partir das experiências cotidianas, da oralidade, do corpo e da memória, que se constrói uma escrita que é, ao mesmo tempo, íntima e coletiva. É justamente essa perspectiva que guia o fio narrativo do enredo.
“O Império Serrano é uma escola fundamentada nas mulheres pretas. Já tem a sua própria escrevivência. Então a gente tá se usando desse conceito para desenvolver o desfile e, a partir desse ponto, trazer as vivências da Dona Conceição”, afirmou Esteves.
O desfile será não apenas sobre Conceição, mas com ela, e, também, com o próprio Império, sua história e sua comunidade. Durante o processo de pesquisa, o carnavalesco se viu impactado pela força e atualidade das obras da autora.
“É uma escrita que vai direto ao ponto. São histórias que ou a gente viveu, ou conhece alguém que viveu, ou ouviu alguém contar. Eu me encontrei muito na literatura dela. É literatura, mas também é memória social”, declarou o artista.
Para o Império Serrano, a homenagem vem em forma de afirmação histórica: a cultura negra, as narrativas silenciadas, o corpo feminino e periférico não apenas desfilam, mas escrevem, ou melhor, escrevivem, suas próprias existências no carnaval.
“A gente vai divulgar a cultura, vai divulgar a leitura. É um passo muito importante que o Império está dando, em defesa das bandeiras que ele já levanta desde sempre”, destacou Esteves.
Na avenida, a flor do mulungu — símbolo de resistência e ancestralidade na literatura de Conceição — deve florescer em alas, alegorias e versos. “É uma responsabilidade muito grande falar de Dona Conceição Evaristo. Mas também é um prazer imenso. Eu transformo essa responsabilidade em honra. E eu acho que tinha que ser no Império Serrano”, finalizou.
No desfile de 2026, cada passo será palavra, cada ala será parágrafo, cada batida de tambor será um grito de vida. Uma escrevivência coletiva que atravessa tempos, corpos e saberes — e que fará da Sapucaí um grande livro aberto à luta e à poesia.