Desde 1972, um evento reúne todos os sambistas da cidade de São Paulo. Organizado pela Mocidade Alegre para comemorar o aniversário da escola, o 24 Horas de Samba entrou no Calendário Oficial de Eventos da Cidade de São Paulo, por meio da Lei 18.924, de 10 de setembro de 2025. Solange Cruz, presidente da Morada do Samba, foi entrevistada pelo CARNAVALESCO durante o 24 Horas de Samba, na Arena Morada do Samba, e fez um balanço do evento, realizado entre os dias 27 e 28 de setembro, o fim de semana seguinte depois do aniversário da agremiação do Limão, no dia 24 do mesmo mês.
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Sambista Imortal
A cada ano, um baluarte ganha o prêmio de Sambista Imortal outorgado pela Mocidade Alegre em pleno 24 Horas de Samba, com direito a um documento emoldurado e discursos especiais. Outra ‘regra’ da honraria é que o homenageado não pode ter ligação com a Morada do Samba. Na edição deste ano, entretanto, uma brecha foi utilizada para premiar Sidnei França, carnavalesco que assina, desde 2025, os desfiles da Estação Primeira de Mangueira.
Praticamente nascido na agremiação, Solange explica o motivo pelo qual ele foi o escolhido em 2025: “É um filho que ganhou o mundo! Saiu daqui de casa, foi criado aqui, no nosso terreiro, no nosso chão. O Sidnei, com toda a família, fez parte da Mocidade Alegre desde lá de trás. Realmente, o Sidnei cresceu na Mocidade Alegre. A mãe dele era da ala Em Cima da Hora e eles participaram de várias ações, de várias coisas dentro da escola. E essas oportunidades ele foi tendo aqui”, recordou, citando o tradicionalíssimo que desfilou por 54 anos na Morada do Samba e foi reconhecida na final do samba-enredo da Mocidade Alegre de 2025.
Por conta da ‘regra’ citada no primeiro parágrafo deste intertítulo, houve uma reflexão – e, depois aclamação: “O Sidnei tem muita história, e só conta história quem tem pra contar. O Sambista Imortal a gente só dá pra quem não é da Mocidade Alegre – e ele, hoje, não é da Mocidade Alegre. Nós pensamos bem e vimos que tem muito a ver. Ele ganhou o mundo! Ele passou pela Vila Maria, pelo Águia, passou pela Gaviões e hoje ele está lá estourando na Mangueira. Eu falo às vezes com a presidenta Guanayra e ela também adotou o Sidnei. Isso é muito importante e muito bacana. É um menino que, além de expandir horizontes, não nega suas raízes. Isso é muito importante. Todo sambista tem que entender que camiseta a gente troca, coração nunca”, suspirou Solange.
Ancestralidade da Morada do Samba
Enquanto falava de Sidnei França, Solange Cruz foi relembrando outros nomes históricos da Mocidade Alegre. Uma delas foi Elaine Cristina Cruz Bichara, irmã da atual presidente e mandatária da agremiação entre 1998 e 2003: “Não é fácil trabalhar comigo, acho que ele trabalhou melhor com a minha irmã do que comigo porque eu sou brava. Ele falou para mim outro dia algo que é fato: ele disse que, na época, talvez ele não entendesse o quanto a gente precisa ter um pouco de Solange em determinadas situações – mas que, hoje, ele entende. Bater na mesa e falar ‘é isso e pronto’ é muito bacana de se ouvir – porque, às vezes, a pessoa nunca vê o lado positivo numa coisa negativa. Mas a gente sempre precisa estar enxergando que, atrás de algo negativo, tem algo positivo”, refletiu.
Outra figura emblemática da escola e de todo o Carnaval de São Paulo relembrada foi Juarez da Cruz, um dos fundadores da agremiação e primeiro presidente da escola, entre 1967 e 1992: “O Sidnei é uma marca muito forte aqui dentro da Mocidade Alegre. Uma pessoa querida, simpática, idolatrada. Trabalhou muito, começou trabalhando com a minha irmã. A gente chamava ele aqui de ‘Juarezinho’, em referência ao meu tio. Meu tio, um dia antes de falecer, conversou comigo e falou para que eu não deixasse deixa o Sidnei mudar a sequência de como estávamos fazendo os enredos. Nessa época, a gente estava fazendo muitos enredos que eram abstratos e estava dando muito certo”, relembrou.
Reconhecimento do poder público
Entrar para o Calendário Oficial de Eventos da Cidade de São Paulo, como se sabe, não é para qualquer festividade. Solange, é claro, comemora o feito: “Ser a primeira edição do 24 Horas de Samba torna essa ainda mais especial! Eu tenho 21 anos de gestão e esse sonho já era dos meus antepassados, lá de trás, da ancestralidade da Morada do Samba. É uma festa tão tradicional, e ter o reconhecimento da cidade de São Paulo é um grande avanço, é maravilhoso – ainda mais para a gente, que se coloca como cultura e nos vemos, agora, inseridos como tal. Fico feliz da Mocidade ter sido a pioneira, e eu acho que, com esse reconhecimento, só se abre portas para todos os sambistas e para outras coisas que vão acontecer”, destacou, já conclamando as coirmãs a buscarem tal reconhecimento para os próprios acontecimentos.
A presidente não deixou de agradecer a duas figuras do poder público que, no entendimento dela, foram fundamentais para que tal honraria fosse alcançada: “Tenho muito a agradecer à vereadora Sandra Santana, que batalhou junto com a gente para conseguir esse feito; e, também, ao prefeito Ricardo Nunes. Tudo funcionou. Quando as pessoas chegam aqui, participam, entram e veem tudo, como é o nosso metiê, elas começam a entender aquilo que a gente sempre tentou passar”, comentou.
Ainda falando do poder público, Solange destacou que a união entre as escolas de samba enquanto agentes de uma comunidade e os representantes eleitos pelo povo é o caminho a ser seguido: “Não é apenas nos 65 minutos de pista: é a vivência do ano todo. Isso vem acontecendo com essa parte política. Eles têm vivenciado mais as escolas de samba, têm participado mais, têm vindo em várias ações. As escolas de samba também estão participando. O prefeito veio aqui na frente e a gente plantou árvore? É do bairro, é da comunidade, temos que estar juntos e vamos estar juntos. Esse entrosamento, essa conexão, fez com que o samba começasse a, também, ter uma outra visão junto ao poder público. Isso muito importante para nós”, pontuou.
Escolha para o evento
A reportagem perguntou para a presidente como eram selecionadas as escolas para cada edição do 24 Horas de Samba. Sem pestanejar, ela foi sucinta: “A gente vai fazendo uma espécie de rodízio: vamos convidando as escolas que ainda não vieram – e assim a gente vai. Têm escolas que demoraram mais para vir, têm escolas que já vieram mais vezes, têm escolas que têm sambas que caem na graça do público, grandes sambas, grandes obras, que, quando são cantadas aqui, o povão cai dentro… isso é importante: fazer a festa ficar ativa o tempo todo, assim como foi na primeira noite”, comentou.
Solange relembrou, também, que o 24 Horas de Samba não é feito apenas por escolas de samba paulistanas: “A gente mudou a roda de pavilhões para a segunda noite, justamente pra homenagear o Sambista Imortal. No último sábado foi a final de samba-enredo da Mangueira e, hoje, a galera vai estar toda aí. As escolhas são feitas assim. Também não deixar de dizer que, para mim, meu xodó da noite foi o Grupo Miscigenação, que completou 30 anos. O Sombrinha, meu filho, trata isso com muito carinho, com muita dedicação, com todos os ensaios e com a parte musical e tudo mais. Toda essa nova equipe traz toda essa galera da antiga que estava aí ontem. Isso é tudo para nós, é isso que nos move. Hoje também trouxemos um pouco da Moradinha do Samba na parte da manhã – que foi sensacional”, destacou – e, aqui, é importante relembrar que a outra escola carioca que se apresentou na primeira noite do evento também teve uma data importante: a final de samba-enredo da Portela menos de vinte e quatro horas antes de se apresentar na Arena Morada do Samba.
Exaltação às coirmãs
Como não poderia deixar de ser, Solange exaltou as agremiações que se apresentaram na festividade, começando as da primeira noite: “Tivemos um super show da Tom Maior, da Nenê de Vila Matilde, do Rosas… ainda brinquei com o presidente Mantêga, disse que não estava acreditando que a escola dele ainda estava no Grupo de Acesso I, essas brincadeiras sadias de sambistas”, riu.
As da segunda noite também foram elogiadíssimas – com direito a detalhes: “E hoje não foi diferente! Barroca Zona Sul, uma escola que transcendeu, vive crescendo cada vez mais. Fazem sambas maravilhosos ultimamente, o Cebolinha tem acertado em cheio ali. E eu sinto muitas saudades do Borjão. Ele me via e falava ‘Ô, bonita!’. Ele era sensacional. Tatuapé, que é uma escola muito querida e eu tenho uma amizade muito forte com o Edu Sambista, todo mundo sabe disso. A gente é amigo de família mesmo, de casa em casa. Hoje, o Erivelto está na Liga-SP. A gente tem, também, uma coletividade muito grande com a Tatuapé. Gaviões, que crescente! Eu brinquei com eles que estou preocupada, eles ficaram na minha frente em 2025, pensei que eles iriam pegar a bolinha 03 da segunda noite, mas deixaram para mim. Com essa nova diretoria, essa gestão vem fazendo um trabalho sensacional. E é uma escola que despontou, fez um desfile incrível. A gente tem que reconhecer os méritos das pessoas”, finalizou.









