Enredo: ‘SALVE TODAS AS MARIAS – LAROYÊ, POMBAGIRA!’

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JUSTIFICATIVA
Ela é mulher assim como todas as outras.
Ela é mulher, sinônimo de coragem, mistério, sedução, liberdade, poder, respeito e determinação. Ela não tem medo, nem do acaso, nem das circunstâncias. Ela enfrenta, encara de frente, se reergue, se apruma e no ponto se refaz em feitiço, oculto encantamento.
Ela é a mulher que se perpetuou através dos séculos. Sendo parte de um sagrado ancestral espiritual e, continuamente, feminino.
Ela é parte do mistério de muitas mulheres. Bruxas, feiticeiras, prostitutas… mulheres de outros tempos que sofreram, foram humilhadas, diminuídas, objetificadas, excluídas, acusadas, silenciadas, queimadas e ceifadas. Mas que na história permaneceram e são, inquestionavelmente, empoderadas, destemidas e livres.
Ela tem mistérios que se desdobram pelo Brasil, atuando em diversas praças, terreiros, encruzas e caminhos. Tornando-se popular em sua ousadia e coragem que inspira tantas outras mulheres.
Ela se faz encantada, admirada e pelos seus é presenteada. Ela é festa e alegria em gargalhadas, danças e sedução. Mas tem a intolerância como seu maior algoz. E sua presença na luta contra o ódio faz-se necessária, tanto pela desmitificação, história e honraria, quanto por sua coragem, liberdade e transgressão.
Salve todas as mulheres que são livres e tem o seu valor.
Salve todas as Marias! Salve Todas as Pombagiras! Laroyê!
SINOPSE:
“…Ela é a dama da noite,
Moça bonita que veio me ver
Vestindo preto com rosa vermelha,
Traz sua força para me valer…
Você é uma moça linda,
Oi, moça linda eu quero lhe ver”
Na gira desse conto ela é dona absoluta. Seu nome tem origem nos cultos Bantus e Angola, sendo Pambu Njila ou Bombojira, uma espécie de cruzamento da força vital das ruas, estradas e encruzilhadas. Seu poder feminino, para o bem ou para o mal, talvez tenha raízes nas feiticeiras Yamins, mas não são elas!
Elas são apenas parte desse sagrado feminino, em que o mistério é sua verdade e o invisível a sua morada na essência de toda mulher. Muitos caminhos remontam sua existência, o tempo guarda consigo personagens de um espírito livre e cheios de mistérios, carregados de força e valentia que coexistem em harmonia com a beleza e o prazer. És aquela que sabe quem é e é quem quiser ser.
“Arreda homem que aí vem mulher
Ela é Pombagira
Venha ver quem ela é.”
Foi por vezes a mística, a dona dos encantos que povoa o imaginário popular. A bruxa ibérica, sendo aquela de Évora ou de qualquer outro lugar, de certo um mito abastecido dos segredos que o oculto a revelou. Por vezes foi a curandeira e a vidente, tantas outras, a feiticeira, e em todas, amaldiçoada pelo julgo de uma sociedade opressora que fez da fogueira seu flagelo favorito, acreditando que ali, apagaria seu espírito. Mas esse não se finda, ele renasce e se blinda tal qual uma armadura a santificá-la.
Sua natureza faz abrigo em quem bem quer, é feita de um misto de brasa e correnteza, uma força que faz vibrar a vida através das suas gargalhadas, gestos e quadris. Está gravada em sua alma os mistérios, a magia e a liberdade cigana, por vezes, mundana que em canto e dança seduz e hipnotiza fazendo perder os sentidos, não temendo o perigo nem tão pouco, a solidão.
Sendo sua alma um mistério, seu corpo não tolera julgamentos. Na boca de quem não presta és a vagabunda, a solta na vida que sem medida sacia os desejos e prazeres dos homens. Messalina e prostituta em quem a luxúria fez morada, por sorte pudera ser amante cortesã ou por sobrevivência uma rameira infeliz. A mulher sem nome, uma fiel concubina sem um lar, a meretriz sem valor que fez do seu corpo e suas vontades sustento e liberdade em tempos onde nada lhe dava o direito de ser o que se é.
Tantas coisas dizem sobre ti, por muitas alcunhas querem te apontar, sob a sombra da ignorância tentam te diminuir ou te findar, seja como a rosa vermelha que veio lá do inferno, a esposa de Exu, aquela que tem sete maridos, a mulher de “Lucifér” ou ainda o próprio diabo, entre outras definições.
“…Você é a flor perfeita
Que vem dentro desta seita
Para aqueles que tem fé…”
Contam que ela já se fazia presente nas macumbas cariocas, no cruzamento das religiões que conviviam no Brasil. Fortalecida na fé, ganhou espaço e notoriedade, espalhando o poder da sua assistência em meio aos seus, seja nas ruas, esquinas, encruzas, cruzeiros, à noite adentro nas calungas e em toda parte, onde bem queria estar.
Nos tambores da Umbanda, encontrou doce abrigo, nas sete linhas que te formam e manifestam sua crença. Mas seu poder pertence a esquerda, junto a tua legião, onde sua presença e magia foram firmadas, com Exu ao seu lado ganhando força e prestígio.
“Lá vem ela oh…
Caminhando pela rua
Com Tiriri, Marabô e Tranca-rua”
Os sete reinos da Quimbanda se desdobram descortinando novos mundos a cruzar caminhos. Na tronqueira exaltada, Exus e Pombagiras se apresentam numa outra linha de manifestação, na qual o oculto guarda segredos, ritos e devoção.
No Batuque está presente, atendendo seus consulentes, representando o poder que vem de longe. Batuqueiros, quimbandeiros que abrem encruzas e caminhos com Exu Bará ao seu lado.
E na Jurema sagrada, enraíza e encontra seu espaço nos domínios do Catimbó, por ali ninguém anda só, salve as pretas velhas feiticeiras.
Essas catimbozeiras são firmadas na gira sustentando seu poder, tendo as almas como amigas que trabalham no caminho. És potência a se respeitar com Exu e Pombagira na demanda que lhes chamarem. Salve todas as Almas!
Ela é Dama da Noite
Ela enfeita o luar
Ela é Rainha faceira
A encruza é seu lugar
Nos pontos teu povo te canta
Ofertam presentes, se põem a dançar
Moça bonita é Pombagira
Que chegou pra ficar.
Quando lançada à sorte em outro tempo, não imaginaram o quanto seria amada e que sua história seria sinônimo de empoderamento, força e transgressão. Seus filhos te visitam ofertando seus presentes preferidos, como as frutas e as bebidas que mais gosta de saborear. Levam cigarros, charutos e cigarrilhas, rosas e velas vermelhas e as mais doces fragrâncias para te incensar. Querem ouvir sua gargalhada e seus conselhos, ao sentirem sua presença, querem te ver dançar.
Salve todas elas! Em suas falanges e corruptelas que esta noite abriram os caminhos, adentrando este espaço e se apresentando nesta gira, seja como Navalha, Menina, Molambo ou Caveira, Figueira, Cacuricaia, Catacumba ou Mirongueira, das Almas, da Praia, da Lira ou da Noite, dos Ventos, do Cemitério, do Porto ou do Ouro, das 7 saias e todas dos 7, a Bela da Noite, Ciganas, Rosas, Rainhas… Salve todas as Marias! Laroyê, Mojubá!
Mas, para muitos, ainda é o exemplo da mulher que não deve ser imitada, aquela que não se deve seguir, a que foi feita pra apanhar, sem virtudes e imoral.
Aquela maldita aos olhos de cada novo inquisidor e assim, naturalmente, ganha espaço o ódio em forma de intolerância, violência e perseguição. Nem sempre maldita, mas sempre uma mulher, empoderada e livre que seguirá perpetuando sua essência primordial.
Ela é aquela que conhece as dores e delícias de ser resistência, sem medo do julgamento. Ela é do povo, ela é da rua e das encruzas da vida. Ela existe e “dá o nome”. Ela, do início ao fim, é Pombagira! Ela é A Mulher!
– Vem Pombagiras! Receba este enredo que a Em Cima da Hora preparou para você, em sua maior prova de devoção. Desejando que o mundo possa melhor te conhecer, “pombagirando” e emanando sua força, uma doce consagração. Conquistando, em seu nome, esse título que tanto sonhamos, uma vitória que não é somente nossa, mas de toda sua legião.
Salve todas as Marias – Laroyê, Pombagiras!
Argumento: Anderclébio Macêdo e Rodrigo Almeida
Texto e pesquisa: Anderclébio Macêdo
AGRADECIMENTOS ESPECIAIS
A Em Cima da Hora agradece a Pai Jorge Gina de Ogum, Pedro Migão e Simas, bem como ao povo de rua, às pombagiras, ao povo da encruza, às mulheres guerreiras, brasileiras, às bruxas perseguidas, às que amaram, sofreram, resistiram e se transformaram, às feiticeiras africanas e a todas as mulheres presentes nos rituais afro-indígenas brasileiros.