A série “Bastidores” pretende mostrar ao leitor como funciona setores quase nunca falados nos desfiles das escolas de samba. Como é feito uma alegoria? Como surgiram as baianas? Como é elaborado um enredo? Essas e outras perguntas são dúvidas para muitas pessoas, sejam foliões ou não. Por isso, vamos apresentar o que fazem todas essas pessoas que trabalham o ano inteiro nos bastidores para que no grande dia do desfile na Marquês de Sapucaí tudo dê certo.

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Aldalea afirma que a força para trabalhar e exercer todas as funções em sua escola de coração. Foto de Wellington Jorge

Antes de começar o primeiro episódio, vamos falar um pouco sobre onde tudo começou. As escolas de samba são uma manifestação cultural da população de massa, e, assim como a maioria das manifestações populares, são nascidas nos morros e favelas do Rio de Janeiro. O que hoje é considerado o maior espetáculo da Terra, atraindo turistas de todos os lugares do mundo, no início não foi bem assim.

O samba foi discriminado por ser uma expressão cultural de negros, pobres e muito ligado ao sincretismo brasileiro. Em meio a tanto preconceito sofrido, surgiu despretensiosamente uma função que seria de suma importância para sempre na história do carnaval, as famosas “Tias do samba”, as matriarcas do samba, aquelas que com todo seu amor e dedicação a escola, sempre estão ali, firmes e fortes, não só no dia do desfile, mas principalmente no dia a dia da escola.

Negras, periféricas, de matrizes africanas e com o famoso coração de mãe que sempre cabe mais um, elas sempre estão lindas e deslumbrantes nos desfiles, porém muito mais do que isso, são elas o pontapé inicial no carnaval como cultura popular.

A origem

A expressão de tias do samba se deu a mulheres mais velhas, que de alguma forma, tinham todo seu lado místico, religioso e cultural bem aflorado. Sempre cuidando de tudo e orientando a todos, essas mulheres foram peças chaves para que as escolas de samba se tornassem o que são hoje, pois foi pelo amor e devoção que as mesmas deram início ao que chamamos hoje de segmentos. Com o decorrer dos anos e com a profissionalização do carnaval e a importância do trabalho dessas tias dentro da escola, se criou então o Departamento Feminino, dando continuidade a essa função.

Mas, afinal, quais são as funcionalidades dessas mulheres dentro das agremiações? No início da história do carnaval, as tias se dividiam e faziam toda parte da demanda de funções para as outras pessoas. Elas eram a porta-vozes da escola com a comunidade. E com a criação do Departamento Feminino, tais funções passaram para esse segmento.

“A importância desse segmento para agremiação é que nós, do Departamento Feminino, que entramos em contato com a comunidade. Realizamos as inscrições dos componentes, se tiver que entrar em contato com alguém ou algo do tipo, quem faz isso é o Departamento Feminino. A interação entre a escola e a comunidade é feita por nós”, diz
Amanda Mattos, de 39 anos, componente do Departamento Feminino da Estácio e filha da Tia Marli, Diretora-Geral do Departamento Feminino da escola.

Quais são as funções?

Seguindo nessa linha, o Departamento Feminino é responsável por várias responsabilidades dentro de uma escola. Seja na organização de alas, no contato direto com os componentes, nos eventos realizados nas quadras e também na hora do desfile.

“No dia do desfile começamos nosso trabalho na concentração, pois cada uma das diretoras do departamento já é responsável por ajudar uma ala da comunidade específica, já chegamos no desfile sabendo qual é a ala que cada uma está responsável. Nosso papel no pré-desfile é auxiliar os componentes dessas alas a colocar as fantasias. Assim que toda ala estiver com suas fantasias, vamos para a segunda etapa que é ajudar os harmonias nas alas, nosso papel durante o desfile é ficar na lateral, ajudando na evolução e no canto”.

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Vendo o trabalho contínuo que o departamento faz com seu segmento, Amanda conta também todo o trabalho social que envolve o segmento.

“Além das atividades do carnaval, a escola promove junto com o Departamento Feminino uma festa junina, para que a entrada da festa seja um quilo de alimento não perecível. Esses alimentos recolhidos são doados à Casa de Saúde Santa Teresa, que dá apoio às crianças com câncer. No final do ano, realizamos uma outra ação, passamos uma lista e quem puder nos ajudar com qualquer quantidade de alimento é bem vindo, contamos também com a ajuda de alguns fornecedores locais. Esses alimentos arrecadados são transformados em cestas básicas e parte dessas cestas são doadas e a outra parte, é feito sorteio dentro das alas da comunidade. É uma brincadeira que acabamos ajudando as pessoas. O sorteio é realizado no último ensaio do ano, quando nosso departamento realiza um jantar para toda comunidade. Quem chega lá sempre é acolhido e tem direito a um prato de refeição. O jantar tem como finalidade a celebração do Natal, é uma confraternização entre a comunidade e a agremiação.”

O amor ao pavilhão move montanhas!

Toda essa dedicação à escola de coração vem de um grande motivo, o amor à agremiação! Dona Aldalea, de 74 anos, afirma que a força para trabalhar e exercer todas as funções em sua escola de coração, a Portela, é fruto de muito amor.

“A Portela é tudo pra mim! Quando eu vejo minha Azul e Branco entrar na Avenida é uma sensação única. Minha vida é a Portela, eu não sei o que seria de mim sem essa escola”, afirma a Rosa Negra da Portela, como é chamada carinhosamente na agremiação Dona Aldalea, Diretora-Geral do Departamento Feminino da Portela.

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Dona Aldalea diz que toda essa dedicação vem do berço, pois toda sua família é do samba. Foto de Wellington Jorge

Mulher negra, com raízes sambistas, mãe de santo e há 38 anos nos comandos do Departamento Feminino da Azul e Branco de Oswaldo Cruz e Madureira, Dona Aldalea diz que toda essa dedicação vem do berço, pois toda sua família é do samba.

“Minha família toda é do samba, de agremiações diferentes, mas o meu amor pela minha águia é maior e eu fui para a Portela. Eu não sei nem descrever esse sentimento. Pela minha Portela eu faço tudo, se tiver que arrumar quadra, ir para evento, fazer feijoada, eu estarei lá para o que der e vier. Pela minha Azul e Branco faço qualquer coisa. É esse amor que me faz estar há tanto tempo dentro da escola. Além, é claro, de ser querida e muito bem dentro da escola”.

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Aos 39 anos de idade e desfilando desde os 8 anos na escola, Amanda fala sobre a importância que a Estácio tem em sua vida.

“Quando eu mais precisei da Estácio, ela estava presente na minha vida! Eu cresci ali e é um prazer fazer parte dessa história! O chá de bebê de todos os meus filhos foi na quadra. Nós formamos uma família, por isso toda essa dedicação no departamento feminino. Não só minha mãe, mas como toda minha família faz parte da escola. Eu fico emocionada até de falar”, afirma Amanda.

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