Atual campeã do carnaval carioca, a Unidos do Viradouro aposta em um carnaval ainda maior na busca pelo bicampeonato, para isso, a escola terá que quebrar uma escrita que já dura 14 anos, a última vez que uma escola foi bicampeã do Grupo Especial foi a Beija-Flor, quando ganhou em 2007 e 2008. A responsabilidade, afinal, é grande. A Viradouro em 2020 executou um belíssimo desfile, o que lhe garantiu o campeonato e um sentimento de orgulho para a imensa comunidade e admiradores. Para este ano, a escola vai destacar o sentimento dos cariocas na folia de 1919, que marcou o fim da pandemia da Gripe Espanhola, com o enredo “Não há tristeza que possa suportar tanta alegria”, a Vermelha e Branca de Niterói pretende tocar o coração de todos os apaixonados por carnaval.

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Foto: Site CARNAVALESCO

Indo para o segundo ano no comando artístico da Viradouro, os carnavalescos Tarcísio Zanon e Marcus Ferreira receberam a reportagem do CARNAVALESCO no barracão para questionamentos e falaram sobre como o enredo surgiu.

“Tínhamos acabado de ganhar o campeonato e a pandemia já estava estourando, a gente já começou a pensar no próximo carnaval e queríamos trazer algum tema que tivesse relevância para o momento, estava todo mundo numa incerteza muito grande, o medo era forte, aí encontramos na Folha de São Paulo uma reportagem falando sobre o carnaval de 1919, que era considerado o maior carnaval de todos os tempos, a gente já sabia dessa história, mas não nos ligamos que era um carnaval pós pandêmico e pós primeira guerra mundial, então nesse momento essa história nos deu uma esperança, se lá atrás as pessoas conseguiram virar a página e realizar um grande carnaval, o próximo também será”, conta Tarcísio.

Dentro da pesquisa do enredo, os carnavalescos encontraram vários personagens que foram importantes para entendermos como chegamos no carnaval de hoje e que mesmo assim são desconhecidos do grande público, a escola pretende contar essas histórias e destacar esses personagens, ao longo do desfile as pessoas vão desvendar o quanto o carnaval de 1919 foi essencial para a virada de página para o povo carioca e brasileiro.

“Temos por exemplo a figura do Jamanta, ele era um condutor ferroviário que durante a pandemia de 18 conduziu os corpos e mesmo assim conseguiu sobreviver, mesmo na época não existindo nenhum remédio, nenhuma vacina, nada que pudesse curar a gripe, mesmo assim ele sobreviveu, durante a pandemia ele carregava os corpos no bonde, durante o carnaval ele pintou esse bonde e conduziu os foliões para o Bloco dos Carões na a praça da República. Outra figura importante é o Caveirinha, ele recebeu esse apelido porque ele tinha contraído a gripe espanhola e um dos sintomas foi ter emagrecido muito, depois disso ele realiza o primeiro desfile do Bola Preta, em 18 ele funda e em 19 desfila, é um bloco que existe até hoje e cresce ano após ano”, conta Tarcísio.

A emoção estará presente durante o desfile da Viradouro, o momento que a sociedade viveu e ainda vive reforça o sentimento de que a esperança de dias melhores passa pelo retorno do carnaval, os carnavalescos pretendem fazer um paralelo sentimental entre Gripe Espanhola e Covid.

“Diversas vezes durante a nossa pesquisa nós nos deparamos com os sentimentos que vivemos hoje em dia, de retomada da vida, do comércio se abrindo, do carnaval sendo essa chave modeladora de que a população pudesse olhar a vida com a normalidade dos melhores dias, então eu acho que o carnaval possui o espírito de que a alegria vai fazer a voltar parte da nossa rotina, a pandemia nos deixou inseguros, toda a humanidade começou a pensar em como seria o retorno, esses sentimentos foram vividos lá atrás. Nós temos acompanhado os ensaios técnicos e o carnaval tem sido essa volta, enfim a normalidade”, pontua Marcus.

Um dos momentos mais aguardados do desfile é a representação da linha de frente dos médicos que lutaram contra a pandemia da Gripe Espanhola e a dos médicos que lutaram contra a pandemia de Covid, em um dos carros os carnavalescos prometem que fazer essa ligação e homenagear os profissionais que tanto fizeram pela população durante esses períodos epidêmicos.

“A gente achou historicamente no carnaval de 1919 que a linha de frente foi homenageada num baile de clube, eram bailes a fantasia, então a gente achou uma foto histórica da linha de frente da Cruz Vermelha, não só médicos, mas enfermeiros e todos que trabalharam em prol da população, eles foram homenageados no Liberty Club, lá eles foram fantasiados de palhaços listrados, queremos fazer a reprodução dessa cena e reverenciar a linha de frente num momento bem bacana”, diz Marcus.

De estreantes à protagonistas da festa:

Estreantes em 2020, a dupla enfrentou a desconfiança por parte da comunidade e também por quem acompanha o carnaval, mesmo com títulos no Grupo de Acesso, muitos torceram o nariz quando a Viradouro anunciou que eles seriam os substitutos de Paulo Barros, que havia levado a escola a um honroso vice campeonato. Passado o desfile, já não restavam dúvidas quanto ao talento dos dois e quando a vermelha e branca de Niterói se sagrou campeã, toda a desconfiança virou agradecimento.

“A maior mudança foi que o título sempre dá uma confiança a mais, era praticamente nossa estreia no Grupo Especial, estreando na escola também, dar mais confiança pro nosso trabalho ser mais aceito, pra gente entender o julgamento e o que os jurados acharam do nosso trabalho, então eu acho que o título coroa todas as incertezas que a gente tinha quanto profissional, quanto jovens que somos. Apesar de termos tido uma boa experiência no acesso com trabalhos que foram amadurecendo e títulos que vieram, na Viradouro veio a certeza que enquanto artistas estamos trilhando o caminho certo”, pontua Marcus Ferreira.

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Foto: Site CARNAVALESCO

Antes de formarem a dupla de carnavalescos da Viradouro e serem campeões, Marcus Ferreira e Tarcísio Zanon até 2019 eram oponentes. O primeiro foi campeão na antiga Série A em 2017 pelo Império Serrano e o outro conseguiu o acesso para o Grupo Especial por duas vezes com a Estácio de Sá. O carnaval foi o grande responsável por unir o casal, eles falam sobre como é dividir uma vida a dois e conciliar com o lado profissional.

“Não é fácil, qualquer relacionamento passa por dificuldades, ainda mais quando você passa praticamente 24 horas do dia ao lado da pessoa que você escolheu pra ser seu companheiro, mas por um lado nós temos o positivo, fazer a parceria com a pessoa que você tem total intimidade facilita no diálogo para chegar em um resultado, não existe entre nós nenhum tipo de vaidade pra chegar numa ideia final, se vai prevalecer a ideia de um, ou se vai prevalecer a ideia de outro, quase sempre com a nossa afinidade e amadurecimento profissional a gente já chega num resultado muito fácil, os pensamentos são muito parecidos, a vantagem é essa, a intimidade de poder dialogar de igual pra igual”, comenta Tarcísio.

Proposta visual do Desfile:

No campeonato de 2020 a Viradouro se destacou com uma plástica impecável, as fantasias fugiram do óbvio e os carros se diferenciavam um dos outros, cada setor tinha seu próprio conceito e estética, projetando o próximo desfile, os carnavalescos contam que a abertura da escola é muito forte, se no último carnaval o abre-alas foi o maior da história da escola, o deste ano já vai superar essa marca.

“A gente mantém a leveza dos figurinos, mas a proposta desse carnaval é totalmente diferente do último, vamos manter alguns atributos que eu e o Tarcísio trouxemos da nossa trajetória, cada setor tem sua plasticidade, uma temática diferente e um uso de colorimetria diferente. A gente manteve as cores quentes que são características da Viradouro, a gente acredita que cada ano é um ano e a pesquisa é fundamental pra isso, conseguimos tanto nas alegorias e fantasias fazer um apanhado de fotos da época para poder usar de inspiração” conta Marcus.

O abre-alas da escola promete retratar o momento em que o Rio de Janeiro está saindo das trevas e entrando na luz, é quando o período da Belle Époque toma conta do Estado, pensando nos efeitos de luz e movimento a ideia é que o carro cause bastante impacto.

“O nível dos carros é bem igualitário, nós não temos uma alegoria que esteja acima das outras, a gente tentou dar uma unidade para todas elas, é claro que a gente acaba se debruçando um pouco mais sobre a abertura da escola, o abre-alas é o cartão de visitas, tem que ter o impacto, então esse ano a Viradouro vem com o maior abre-alas da história dela, maior até que o do último ano, estamos usando um material não comum no carnaval para a forração, que é um tecido furta cor de bolsa, nós conseguimos juntos com a iluminação um resultado bem diferenciado, qualquer cor que jogue em cima desse cima, ele capta e expande, então a iluminação é completamente diferente”, pontua Tarcísio.

O presidente da Viradouro, Marcelinho Calil, costuma dizer nas redes sociais que esse é o maior e mais belo conjunto de fantasias da história da escola, para 2020 ele já havia dito isso e na avenida se confirmou, o público ficou encantado e os juraram distribuíram notas 10, para esse ano, a pesquisa e a criatividade foram fundamentais na construção das fantasias.

“A gente se debruçou em uma pesquisa sobre o carnaval de 19 e sobre os artistas que deram linguagem para essa época, então toda essa linguagem rebuscada de moda estará presente, nós criamos muitos materiais no barracão, o período pandêmico fez a gente ativar a criatividade, já que a ausência de material foi enorme, então tudo isso trouxe um ar muito artesanal para as nossas fantasias e que trouxe esse resultado positivo que o nosso presidente costuma falar, nós sentimos isso já na festa de protótipos, foi uma festa bem fechada, mas a gente conseguiu ver a comunidade bastante emocionada com o que foi apresentado”, pontua Tarcísio.

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Foto: Site CARNAVALESCO

Entenda o Desfile:

A Unidos do Viradouro será a quinta escola a desfilar na Sapucaí pelo Grupo Especial na sexta-feira, 22 de abril. A escola contará 3.600 componentes, distribuídos em 6 setores, serão seis alegorias, dois tripés e um elemento cênico da comissão de frente.

Setor 1: “O primeiro setor aborda a retirada do luto da cidade, a população acredita que realmente vai ter o carnaval, então a gente prenuncia a chegada do carnaval de 1919 com um baile pré carnavalesco no clube dos Democráticos, que é a grande sociedade que dá título ao enredo”.

Setor 2: “O segundo setor é o momento que as grandes sociedades e os blocos de sujo tomam a rua com a irreverência contra a espanhola, a gente faz referência ao Chá da Meia Noite, às perucas que foram muito alugadas durante o carnaval, já que as mulheres que tiveram a gripe perderam os cabelos, o Bloco da Viúvas Espanholas, que foram as mulheres que perderam seus maridos por conta da gripe, vamos abordar mesmo essa irreverência para mostrar que apesar de tudo, o carnaval venceu”.

Setor 3: “O terceiro setor é o carnaval da Avenida Central, que é o carnaval mais elitista da cidade, vamos fazer menção a grandes entidades que desfilaram lá, como o primeiro desfile do Cordão do Bola Preta, o bloco do Eu Sozinho, a Batalha das Flores no coreto J. Carlos, esse setor é um setor mais do carnaval da elite mesmo”.

Setor 4: “ No quarto setor a gente traz uma homenagem a linha de frente, nós pegamos especificamente um baile, que aconteceu no Liberty Club, nesse baile os heróis da Cruz Vermelha que vieram ajudar durante a pandemia foram homenageados, então a gente revive esse baile, estaremos homenageando todos os profissionais que se dedicaram durante a pandemia”.

Setor 5: “O nosso quinto setor representa a negritude, a Pequena África, que era um carnaval que era excluído, mas que foi de suma importância, porque foi exatamente nesse ano que o samba se tornou o maior ritmo do carnaval, e o surgimento dos oito batutas, esse desfile que acontecia ali na Praça Onze. Os blocos que desfilavam ali já levantavam a questão da igualdade racial e respeito ao samba, então é um setor bem forte e a gente faz uma referência às tias baianas, como Tia Bibiana e Tia Ciata. Vamos trazer neste setor a cura espiritual para o samba”.

Setor 6: “Nosso último setor é solar, é a nossa quarta-feira de cinzas, é quando os Niteroienses de 19 vieram pro Rio de Janeiro e por coincidência o local mais quente do carnaval de Niterói era no Barreto, existia nessa época o carnaval de Barca, então as pessoas viam de Niterói nas Barcas, elas eram decoradas e ali já era uma grande festa, um grande carnaval, e nesta quarta-feira de cinzas eles vieram se encontrar com os cariocas e viver esse último dia de carnaval, nós faremos esse encontro entre as duas cidades e esses reencontros que a pandemia nos separou, queremos promover no final do desfile o abraçaço, o beijaço, como diz o samba, é o momento de dizer carnaval te amo e na vida és tudo pra mim”.

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