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Série Barracões SP: Primeira da Cidade Líder exalta Oxóssi nos 40 anos do renascimento de Pai Tinho no candomblé

Proposta da escola da Zona Leste é, dentro da tradição da religião de matriz africana, celebrar o legado do babalorixá através de uma homenagem ao Orixá que o rege

Quatro décadas do nascimento espiritual de um babalorixá muito querido pelos sambistas paulistanos. No carnaval de 2025, a Primeira da Cidade Líder levará para o Sambódromo do Anhembi o enredo “Àjòdún Odé, em seus 40 anos de axé Pai Tinho celebra Oxóssi”, assinado pelos carnavalescos Ewerton Visotto e Cristiano Oliveira. O grande homenageado do desfile é o Orixá que rege o líder religioso, como forma de respeito à tradição do candomblé.

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A Primeira da Cidade Líder, que vem de carnavais nos quais brigou diretamente pelo acesso através de belos conjuntos visuais e canto animado, precisou renascer das cinzas após um incêndio que destruiu todos os seus carros alegóricos em construção em dezembro de 2024. Apesar disso, a escola impressionou ao ser a primeira a levar suas alegorias para o Sambódromo do Anhembi, sendo essa uma prova contundente do poder de superação da sua comunidade.

Celebrar Pai Tinho é o Ajodun a Oxóssi

O CARNAVALESCO visitou o barracão da Cidade Líder e conversou com o carnavalesco Cristiano Oliveira para conhecer detalhes de como a abordagem do enredo ocorrerá na Avenida. O artista, que é médico de formação, mas sempre foi um apaixonado por carnaval, tem passagens pela Locomotiva de Pirituba e Império Real, dos grupos da UESP. Estreando no Anhembi pela Líder, Cristiano falou sobre a inspiração para o enredo da escola e como o processo de desenvolvimento ocorreu.

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“Quando eu cheguei, os meninos tinham uma ideia, uma proposta de um enredo de temática afro e tinham duas linhas. Tinha essa questão do Pai Tinho, que tem uma importância muito íntima com a escola porque, quando os meninos assumem a diretoria da escola lá na UESP, eles pegam o pavilhão e a primeira pessoa para quem eles levam é para o Pai Tinho. O Pai Tinho tinha uma ligação muito forte já com a escola. Além dessa, também tinha uma ideia de fazer alguma coisa com um Orixá. Tinha uma história de Oxóssi, um Itan de Oxóssi que veio do Imperial, um compositor também, foi passada para eles. Eu falei assim: ‘deixa eu estudar um pouco essas duas temáticas e ver como que conseguimos juntar, se é que dá para juntar’. Quando eu fui pesquisar a história do Pai Tinho, que eu não tinha muito contato, descobri que ele era Pai Tinho D’Odé Oxóssi. Eu disse: ‘nós vamos unir essas histórias’. Quando juntei as duas coisas, o Ewerton foi com os meninos lá no terreiro conversar com o Pai Tinho, que compartilhou várias situações e citações. Ele falou um pouco sobre o Ajodun (celebração em iorubá), explicando que ele mesmo não desejava que fosse um enredo sobre ele. Não faria sentido para ele, um babalorixá, chegar e contar sua história dizendo: “Eu nasci assim”, e tal. Ele tem uma história muito rica, poderia contar mil coisas interessantes, mas não faria sentido espiritualmente falando. Dentro do candomblé, essas festas de bodas de comemoração de sacerdócio, que eles chamam Ajodun, não é o indivíduo que comemora, fala de si e faz uma festa para os seus, como se fosse uma festa de aniversário. É uma festa que você faz em homenagem ao seu Orixá, aquele para quem você se dedicou a sua vida”, explicou.

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Cristiano conta que a proposta é desenvolver uma narrativa onde Pai Tinho conta um Itan sobre a importância de Oxóssi em sua vida. Em iorubá, Itan é o termo utilizado para se referir a histórias sagradas.

“Esse enredo tem esse título porque ele é uma celebração a Oxóssi nos 40 anos de Pai Tinho. É igual a ideia do candomblé, Pai Tinho faz 40 anos, mas o grande homenageado é Oxóssi, e nós fazemos isso da seguinte maneira: O enredo é narrado em primeira pessoa, é o próprio Pai Tinho narrando a história da vida religiosa dele. Não é um enredo biográfico, ele não vai partir do nascimento físico do Pai Tinho, é do nascimento espiritual dele para Oxóssi. Ele vai contar o porquê que Oxóssi é tão importante na vida dele através de um Itan, que antes mesmo de tudo isso acontecer já era um Itan de renascimento, já tinha toda essa temática de renascimento, é um Itan importante, da saída da África para cá. Nessa linha da história, nesse Itan, lá no final, as histórias voltam a se cruzar. O início é o nascimento espiritual dele para Oxóssi e ele vai contar essa história do Oxóssi, de que maneira ele chegou lá da África para o Brasil. É uma homenagem segundo o candomblé. Nesses 40 anos, o Pai Tinho tem uma história linda, mas ele deve tudo isso ao grande Orixá, ao grande Pai, que é o Oxóssi”, afirmou.

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O carnavalesco explica que Oxóssi é um Orixá com maior popularidade no Brasil e, no enredo, isso será usado para narrar seu renascimento no país. Esse renascimento valoriza a celebração dos 40 anos de iniciação de Pai Tinho por também representar um renascer espiritual dentro da tradição do candomblé.

“Sempre quis que o enredo tivesse uma mensagem e esse Itan tem uma mensagem muito forte, a de renascimento. Na África, o culto a Oxóssi não é popularizado como no Brasil e uma das explicações para isso é a maldição da memória, que acomete as pessoas por conta de uma caçada errada que ele faz caçando serpentes. Eu tive liberdade poética para mostrar a promessa de Orumilá, que ele iria renascer no Brasil. Na nossa liberdade poética, ele renasce no Brasil, no próprio Ilê do Pai Tinho e no terreiro da Cidade Líder. A ideia do renascimento é muito forte, especialmente pensando na ligação entre África e Brasil e, mais intimamente, no ritual de iniciação, que é um verdadeiro ‘nascer de novo’, é uma mudança de vida muito grande. Se você conversa com pessoas que passaram por esse ritual, elas dizem que suas vidas mudaram completamente depois da iniciação. É uma experiência muito forte. A ideia de juntar isso e usar essa história para transmitir uma mensagem verdadeira surgiu daí. Lógico que, com o que aconteceu com a escola, o enredo ganhou ainda mais força, tanto que um dos versos mais cantados do nosso samba na quadra é a parte: ‘E renasceu’. Quando você ouve o finalzinho do samba, é algo surreal. É muito bonito ver, as pessoas se identificaram muito com isso”, disse.

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Buscas por referências e participação de Pai Tinho: as curiosidades do desenvolvimento

Até por conta da popularidade de Oxóssi, diferentes escolas já realizaram desfiles relacionados ao Orixá. Procurando fugir do óbvio, a Cidade Líder se aprofundou nos Itans para desenvolver uma narrativa original a nível de carnaval. A participação ativa de Pai Tinho no ciclo da escola, para Cristiano, também foi um ponto de destaque no desenvolvimento do enredo.

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“Tiveram várias coisas, mas uma das coisas que eu mais tentei buscar de referência foi entender esse reino do Ketu. Na nossa história, nós começamos na África, tanto é que nosso Abre-alas vai reproduzir esse reino. É difícil achar referências sobre Ketu enquanto reino porque na época era como se fosse uma cidade-estado, e ao contrário de outras localidades da África, hoje Ketu é praticamente um bairro de outras cidades, não tem muita coisa a respeito disso. Aí você encontra várias referências para justificar como Oxóssi se torna rei de Ketu. Essa variação de nomenclatura, esses detalhes da história dele, esse tipo de coisa me chamou muita atenção. Uma segunda coisa é o quanto o Pai Tinho consegue congregar as pessoas próximas a ele. Nós estivemos lá, pessoas da escola, em momentos diferentes, de festa e de rituais, eu mesmo fui lá algumas vezes. Todo o processo da comissão de frente foi acompanhado de perto por ele, ele sabe exatamente até a roupa que usamos. Uma das roupas da comissão é a mesma que ele usou no Ajodun dele, que ele cedeu para nós na própria festa de 40 anos dele. É bonito ver as pessoas que convivem no Ilê, como ele consegue reunir todo mundo, sempre muito próximo de nós desde o início do enredo. No dia do transporte das alegorias, ele veio aqui. Foi muito bonito ver essa proximidade que ele teve com a escola e a confiança que teve, sabendo que nós íamos conduzir essa história de uma forma que o honrasse, mas sobretudo honrasse o Orixá dele. Em relação à abordagem do enredo, embora já tenhamos tido outros enredos de Oxóssi na Avenida, em São Paulo e no Rio, não queríamos seguir esse caminho. Queríamos uma abordagem diferente, contar uma história de outra forma, que realmente cativasse as pessoas e acho que conseguimos muito isso. Fiquei muito contente de ver o envolvimento da comunidade, independentemente de as pessoas serem ou não da religião. Ver que elas se identificaram com a história foi muito gratificante”, afirmou o artista.

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Cidade Líder na Avenida: do Reino de Ketu ao renascimento no Brasil

O desfile da Primeira da Cidade Líder será dividido em três setores. O primeiro representará o Reino de Ketu, onde na crença do candomblé Oxóssi foi rei. O segundo setor contará o Itan da maldição do esquecimento, onde o Orixá perde suas memórias. O último segmento é o renascimento de Oxóssi no Brasil onde, como diz o samba, reina no terreiro da Líder.

“A comissão de frente é independente e trata-se desse encontro. Eu vou narrar assim: é um encontro de ancestralidades, vocês verão isso na Avenida. Eu diria até que é um encontro de ancestralidades muito além da África. Ela resumirá muito bem o que o enredo contará. Após isso, começamos os três setores. O primeiro setor é pelas bandas de lá. Iniciaremos no reino do Ketu e transportaremos as pessoas para esse reino, com uma linha cromática bem característica de lá, isso ficará muito evidente na Avenida. Começamos com cores mais relacionadas à terra, esse elemento presente no candomblé. No entanto, saímos da terra propriamente dita e avançamos para tons mais vibrantes, que culminarão no final com a escola explodindo em cores. Essa divisão cromática será bem visível. Partimos dessa África, pelas bandas de lá, e depois passamos pelo Itan, que é esse encontro da serpente com Xangô, que lança a maldição sobre ele. Finalmente, terminamos pelas matas de cá, que é o Brasil, representando o renascimento dele aqui. Fazemos essa viagem África-Brasil, tanto em termos de cores quanto de formas, acredito que isso ficará muito claro no desfile”, detalhou Cristiano.

A necessidade de construir novas alegorias após o incêndio não mudou a ideia original do projeto desenvolvido pela Primeira da Cidade Líder, mas obrigou a escola a se adaptar de acordo com os materiais que passaram a ter à disposição. Cristiano afirma que foi um processo desafiador, mas do qual a equipe orgulho.

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“A ideia não teve alteração. O que seria o carro 1, o que seria o carro 2, se manteve. O que mudou foi a proporção das coisas. Os carros da Cidade Líder eram menores, com chassis menores e no incêndio, mais do que perder o material, perdemos os chassis das alegorias. Isso foi o que mais nos deixou perdidos na época. Quando conseguimos as bases, os chassis emprestados de outras agremiações, levamos um susto. Saímos de carros pequenos e fomos para carros muito grandes, especialmente os fabricados, o maior desafio foi esse. Perdemos tudo, as esculturas, tudo, por isso não é um carnaval com muitas esculturas. Tem menos esculturas, mas um trabalho maior de forma, que era o que conseguíamos construir. Teve esse impacto de ter que mudar o tamanho e a proporção das coisas, consequentemente, acabamos mudando algumas linhas de material. Por exemplo, nosso Abre-alas, que pegou fogo, era 100% palha e já estava todo revestido. Sabíamos que não conseguiríamos usar a mesma quantidade de palha, com esse prazo curto, para revestir todo o Abre-alas e manter o mesmo tom e a mesma textura, então usamos outros materiais para construir esse mesmo efeito. Acho que, por sorte, entra muito a organização do Rodolfo e do Rodrigo, os dois juntos se completam muito. Falo para eles que aprendo todos os dias com eles sobre direção e garantia de que conseguiríamos manter a ideia do enredo, mesmo tendo que mudar proporções, materiais e tipos de escultura. Acho que conseguimos manter as ideias. Todo mundo brinca dizendo que vai ficar mais bonito do que estava. Não é isso, era uma outra proposta de material e todo mundo estava muito focado, foi isso que aconteceu. Os últimos dois carros que vão para a Avenida, pela questão do tamanho, foram ainda mais desafiadores. Reunir tudo, preencher os espaços e garantir os acabamentos foi bem difícil, mas, com certeza, estamos muito felizes e orgulhosos com o que vai para a Avenida”, explicou.

Organização é o trunfo da Cidade Líder para 2025

O ciclo do carnaval de 2025 da Primeira da Cidade Líder não se limita ao renascer das cinzas. Com a construção da quadra em estágio avançado, a ponto de poder já ser utilizada para ensaios, a comunidade passou a ter um ótimo lugar para desenvolver um senso de pertencimento, que é fundamental para qualquer escola. O carnavalesco aproveitou para exaltar o trabalho da diretora de harmonia Fabiana Lopes, que chegou no andamento desta temporada, ao destacar a organização da escola como o principal trunfo para a disputa do Grupo de Acesso 2.

“Acho que as pessoas, a comunidade, tiveram um papel fundamental. Houve um trabalho fantástico, que já era um dos objetivos do projeto antes do incêndio: trabalhar as pessoas, o canto, a harmonia e o envolvimento de todos. Com a quadra nova inaugurada, começa a surgir uma identidade. Eu sempre digo que as pessoas precisam de uma casa, uma identidade. Acho que isso faltava e era uma necessidade da Cidade Líder: ter essa sensação de casa. “Aqui é minha quadra, aqui é minha casa, aqui é meu terreiro”. Quando a escola passou a ter a quadra e esse trabalho semanal de ensaios, tudo mudou. No primeiro ensaio da quadra, as pessoas não estavam habituadas, com aquela sensação de estarem se acostumando com a casa nova, poucas pessoas presentes. No último ensaio, ver várias alas juntas e agregadas foi incrível, foi muito emocionante, eu vi pessoas da equipe com lágrimas nos olhos. Depois do ensaio técnico, acredito muito na força da comunidade e das pessoas pelo trabalho que foi feito. Aqui nós temos que mencionar a Fabi, que veio como diretora de harmonia para a escola. Ela tem uma relação muito afetuosa com os meninos, o que ajuda bastante. Ela conseguiu guiar a direção de harmonia e os diferentes setores da escola de forma muito organizada e com um pensamento mais estratégico. Não é nem só profissional, mas também um pensamento competitivo. Não podemos esquecer que o carnaval e a escola de samba são movimentos culturais com força própria, mas também fazem parte de uma competição e essa competição tem seu lado cruel, principalmente quando perdemos, mas é muito gostosa quando ganhamos. A Fabi trouxe um pouco dessa mentalidade de organização: se queremos ganhar e ter um bom resultado, temos que nos organizar, esse tem sido o grande trunfo da escola. A organização da escola, das pessoas e do canto é o que vai dar vida a tudo o que estamos querendo levar para a Avenida, eu acredito muito nisso”, concluiu Cristiano Oliveira.

Mensagem de Pai Tinho para a comunidade da Primeira da Cidade Líder

No dia do transporte das alegorias para o Anhembi, Pai Tinho deixou uma mensagem de motivação para toda a comunidade da Primeira da Cidade Líder. “Aproveitando realmente esse ensejo para transmitir a toda a grande comunidade da Primeira da Cidade Líder, a comunidade itaquerense, que nós estamos aqui no dia de hoje abençoados pela Lua que nos ilumina, levando as nossas alegorias que foram construídas em cima da lágrima e no momento de desespero. O Orixá, dentro da nossa tradição religiosa, nos ensina sempre a renovação. A terra está em renovação, as águas estão em renovação, os ventos se renovam e o Orixá, meu pai Oxóssi e todo o clã da mitologia iorubá nos renovou. A nossa história é uma história de coragem! Comunidade, o carnaval está pronto! Esse recado é para vocês. Nós estamos chegando!”.

Ficha técnica
Enredo: “Àjòdún Odé, em seus 40 anos de axé Pai Tinho celebra Oxóssi”
Alegorias: 2 carros + 1 quadripé + 4 adereços com rodas
Componentes: 850
Alas: 9
Direção de barracão e ateliê: Comissão de carnaval

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