Por Matheus Mattos
Vice-campeã do carnaval de 2017 e uma das favoritas para 2019, a Dragões da Real
recebeu a reportagem do CARNAVALESCO no barracão para contar mais detalhes
sobre o enredo: “A Invenção do Tempo. Uma Odisseia em 65 Minutos”. O experiente
carnavalesco Mauro Quintaes afirma que o tema trabalhado proporciona uma estética
nova para agremiação.
“A proposta da Dragões para esse carnaval era mudar um pouco a cara, não pejorativamente falando, mas a escola sempre teve uma pegada mais infantil, com
desenhos mais leves, talvez, a palavra certa seria densa. A estética da Dragões não
era muito densa. Eu trago para escola uma leitura mais realista, o fã da Dragões vai
entender que mudou um pouco. A gente até brinca que a escola faz 18 anos e é como
se ela tivesse adquirindo a sua maturidade. Eu espero que a gente possa agradar e
ser premiado”.
Contratado recentemente, Mauro revela que já tinha pensado e desenvolvido um
enredo, mas durante a reunião com os dirigentes se sentiu atraído por um dos temas
propostos, o mesmo que foi escolhido.
“Quando eu cheguei na Dragões tivemos uma reunião onde cada um trouxe o seu
enredo. Eu tinha um em mente muito bom, os diretores da escola também tiveram
ótimas ideias e o Chico, nosso Diretor de Marketing, trouxe um enredo sobre o tempo.
O tema foi muito bem aceito, achei legal também, criamos um texto, montamos um
corpo e trabalhamos em cima disso”.
O carnavalesco confessa também que o processo de pesquisa foi bem extenso e que
se sentiu surpreendido da forma como o ser humano é dependente da hora.
“A gente está tão envolvido com o tempo que não percebemos o quanto ele pode ser
prejudicial. Essa coisa de ter um horário pra acordar, uma hora pra almoçar, isso se
repete o dia todo e às vezes estende isso pro final de semana, onde deveria ser um
espaço pra lazer. Evidente que nem todo mundo é assim, eu por exemplo acordo tarde, chego tarde aqui no barracão, vou embora mais tarde ainda. Eu nunca deixo faltar nada em termos de produtividade mas horário não é o meu forte. Eu vejo que tem pessoas que é sufocada pelo tempo, se vê obrigado a almoçar tal hora, acordar tal hora, e isso me deixou um pouco angustiado”.
O desfile será dividido em cinco setores, onde cada parte traz diferentes características artísticas. Dentre elas, Mauro acredita que o terceiro setor será o ponto alto da Dragões da Real.
“Eu gosto muito porque é o setor mais popular, que nisso aí o meu amigo Paulo Barros é mestre. Ele entende que o telespectador precisa ter uma leitura imediata da coisa,
ele tem que bater o olho e dizer ‘olha ali o fulano, olha o Batman, olha o super-homem’, como o desfile é muito dinâmico você não tem tempo pra pensar, ele vai passando e você tem que entender. Por isso eu acho que o carro três representa esse tipo de leitura, você vai ter personagens, vai ter momentos onde qualquer um vai poder identificar, sendo ele bem informado ou não”.
Dragões da Real está com barracão praticamente finalizado
Diante de um cenário de dificuldades financeiras, prazos curtíssimos e difícil procura
de bons profissionais, a escola de samba tricolor surpreende pela organização. O
carnavalesco Mauro Quintaes adianta o cronograma do barracão e ateliês de
fantasias.
“Nós estamos em Janeiro né, das cinco alegorias eu tenho três já embaladas. Estou terminando a forração do abre-alas e estou construindo o carro dois. O nosso tripé da comissão de frente também está pronto, tem detalhes que só vou fazer lá na frente. Em questão das fantasias, 70% já estão fechadas, tenho uma equipe que cuida exclusivamente disso, que é o Ronny Potolski e o Danilo Dantas, eles tem essa responsabilidade de visitar ateliê, vê as necessidades de material, etc. Então estamos muito tranquilos em relação a isso. Posso afirmar que mais de 75% do carnaval já está pronto”.
Diante de todos os assuntos revelados, cria-se uma expectativa muito forte na
agremiação. Sobre isso, Mauro diz:
“A expectativa sempre atrapalha. Quando você gera uma grande expectativa e ela está um décimo abaixo do esperado, você já decepciona. Eu não me preocupo com isso, a direção da escola também não se preocupa com isso. O presidente Tomate deixa claro que classificação não é o mais importante, importante é você construir um bom trabalho, gerar tranquilidade, gerar economia pra escola e dar o retorno que o público e o componente estão esperando”.
Carnavalesco acredita que julgamento do carnaval de São Paulo é peculiar
Mauro defende que o jurado precisa ter “bom senso” antes de avaliar o quesito e que
pequenos defeitos não podem atrapalhar negativamente a estrutura ou influenciar o
critério sobre o restante do desfile.
“Eu acho que o resultado positivo no carnaval de São Paulo depende de uma série de
fatores, o julgamento daqui precisa ser estudado porque é muito peculiar, alguns
pontos avaliados que nem são tão importantes artisticamente falando. Falta um bom
senso do jurado em olhar um espelhinho caído numa alegoria imensa e avaliar que aquilo não irá atrapalhar em nada. Eu tiro como exemplo o tempo que fiquei na Peruche onde eu entrei com vários problemas nas alegorias, mas a forma estava muito bonita, o julgador colocou na súmula ‘apesar de pequenos problemas a plástica merece 10’. Acho quando se tem uma plástica forte ela supera esse rigor no julgamento. Fora isso acredito que São Paulo está numa projeção muito boa, porém afirmo que não existe nenhuma comparação com o carnaval de São Paulo e com o do Rio, são coisas totalmente diferentes, duas festas com espaços diferentes de apresentação, com estética diferente”.
Conheça o desfile da Dragões da Real
1° SETOR
“A gente abre com um convite ao espectador a entrar na mecânica do tempo, o nosso abre-alas é a mecânica de um relógio. É como se tivéssemos trazendo o folião pra dentro dessa máquina com a presença da figura do Deus Cronos. Em cada setor do desfile da Dragões eu to trabalhando com uma estética diferenciada. Trabalho com steampunk na abertura”.
2° SETOR
“No segundo setor eu falo das invenções que foram feitas para que se pudesse contar
o tempo, então eu trago as máquinas, as ampulhetas, relógio, tudo aquilo que foi criado para que o homem pudesse controlar o tempo”.
3° SETOR
“No carro três eu falo do grande anseio da comunidade em querer manipular o tempo, passado, presente e futuro, a máquina do tempo pra ser mais objetivo. Aqui eu trago uma leitura mais POP, trago uma máquina do tempo mais popular e trago esse
elemento em cada continente do mundo, como se o componente estivesse viajando pelo mundo. Uma coisa que foi muito difícil porque o carro alegórico tem 20 metros, mas a gente conseguiu com sucesso. Então esse vai ser o setor de leitura imediata, temos a figura do Einstein, guerreiros medievais, Indonésia, e sempre com a parte teatral, que é uma figura da Dragões há muito tempo.
4° SETOR
“Depois eu falo do homem sendo escravizado pelo tempo, que é entre aspas uma parte mais dramática, ‘somos escravos da hora’ o samba pontua muito bem, e aí eu trago o carro baseado na estética do filme Metrópolis, onde o Fritz Lang foi um visionário e aí eu achei por bem trazer essa estética dos personagens, esse setor tem mais a cara dos anos 20.
5° SETOR
“Eu fecho com tempo mais importante pra nós que trabalhamos com carnaval, que são os nossos 65 minutos. Tudo aquilo que é visto antes, tudo que se passa anteriormente vai se resumir no mais importante tempo que a gente ta levando. Então a síntese de todo esse trabalho de um ano ta ali nesse pequeno espaço de tempo pra ser
mostrada, e dali sim tira-se a conclusão de que se ela vai ser coroada com sucesso ou não. Então eu tenho nesse enredo que o tempo mais importante pra nós que fazemos carnaval são os nossos 65 minutos”.
Ficha técnica
2.700 Componentes
21 alas
5 alegorias
1 tripé de Comissão de Frente
230 Ritmistas
65 baianas
História do carnavalesco Mauro Quintaes
“Eu entrei no carnaval pelas mãos do Max Lopes, que era amigo pessoal do meu
pai. Na época eu era funcionário do metrô do Rio de Janeiro, saia todo dia às 17h. Eu
já era projetista nível 1, passava no barracão da Vila Isabel todo dia e como os
funcionários da época não tinham um nível universitário, eu acabei me destacando
porque já cursava arquitetura.
Foi assim que eu entrei na equipe do Max e fiquei nove anos trabalhando com ele. Houve alguns desentendimentos dentro da Viradouro, escola na qual estávamos trabalhando, e o Max acabou saindo e eu fiquei pra trabalhar junto ao Joãosinho 30, ano em que chegamos a um 3° lugar. Em seguida resolvi trilhar uma carreira só, e pude assinar o meu primeiro carnaval no Grupo Especial com a Caprichosos do Pilares e no mesmo ano estava realizando um trabalho paralelo em uma escola do Grupo 3, que na época ninguém conhecia que era a Porto da Pedra.
Na época as escolas do Especial podiam convidar agremiações dos níveis abaixo para compor o Grupo de Acesso, fizemos um belo carnaval e subimos. Em menos de um ano saímos do grupo três e chegamos no Grupo Especial com a Porto da Pedra. Após isso fiquei quatro anos no Salgueiro, voltei pra Viradouro, passei também pela Mocidade Independente de Padre Miguel, Rocinha, São Clemente, Mangueira, Império Serrano e Unidos da Tijuca no Rio de Janeiro.
Passei também por algumas escolas de São Paulo, como a Tom Maior e Peruche. Após o desfile do Martinho da Vila na Peruche, eu recebi bastantes convites de escolas do Grupo Especial de São Paulo e acabei fazendo a opção pela Dragões da Real, que é uma escola diferenciada em termos de estrutura, organização e retidão no pagamento, desde o faxineiro até o carnavalesco. Optei por só ficar em São Paulo porque acredito que é um mercado bom a ser explorado”.