O Salgueiro busca reencontrar o caminho das vitórias com um enredo que é a cara da escola, afinal, não existe nada mais Salgueiro do que contar a história do povo negro entrelaçada com a do Rio de Janeiro, com o enredo “Resistência”, a escola da Tijuca irá retratar na avenida locais do Rio de Janeiro marcados como pontos importantes de resistência cultural preta. a agremiação se volta para sua riquíssima história e busca emocionar o público mais uma vez em busca do título que não vem desde 2009.
Indo para o seu o seu quarto ano a frente da academia, já tendo assinado “Senhoras do ventre do mundo”, “Xangô” e “O Rei negro do picadeiro”, Alex de Souza recebeu a equipe do site CARNAVALESCO no barracão para contar alguns detalhes do próximo desfile.
Lançado em meio às manifestações antirracistas em todo o mundo, por justiça social e igualdade, o enredo do Salgueiro para 2022 teve a concepção de Eduardo Pinto e Marcelo Pires, da Diretoria Cultural da escola, juntamente da professora e doutora Helena Theodoro
“Estávamos em meados do ano de 2020, já tinha acontecido toda aquela situação que tocou o mundo inteiro, de manifestações pelo planeta pela morte de George Floyd, aquilo eclodiu e aí já tinha uma sequência de escolas de samba prestando uma homenagem a essa questão, o departamento cultural achou por bem, pela tradição da escola, que a gente não poderia estar de fora dessa corrente, o departamento cultural optou por esse caminho e chamou a Doutora Helena Theodoro para dar o suporte e orientação, foi um trabalho feito por várias pessoas ”, conta Alex.
Poucas são as escolas que tem como marca uma linha de enredos de temática africana, pensar no Salgueiro é lembrar de enredos que traziam ao público personagens desconhecidos da nossa história, sambas-enredos com louvações aos orixás e que dão ao negro o protagonismo que ele de fato merece. Para esse ano, a escola buscou dentro de si a inspiração para valorização da cultura negra.
“O enredo se propôs a não ser tão abrangente, já que só de falar de territórios e formas de resistência no Rio de Janeiro, já bastava para um carnaval inteiro. Então se juntou duas coisas que são muito fortes no Salgueiro, a questão da negritude e o Rio de Janeiro como tema, então juntou duas tradições da escola, uma escola muito carioca e que sempre valorizou a história do negro. Uniu as duas coisas”, comenta Alex.
Durante a pesquisa do enredo, Alex encontrou pontos interessantes e até então desconhecidos para ele e também para o restante da sociedade, é uma oportunidade de falar do Omolokô, uma religião sincrética praticada no Brasil tendo como base elementos africanistas, espíritas e ameríndios, mas que é poucas vezes foi retratada no carnaval.
“Aquela Região do Alto Leblon, que hoje é super valorizada já foi um Quilombo, outra coisa extremamente interessante é falar sobre o Omolokô, no carnaval sempre se fala do Candomblé, as pessoas não tem muito conhecimento sobre as casas de Omolokô, assim como falar da Umbanda, que surge aqui e precisa ser valorizada. Vamos falar também sobre a festa da Penha, que era uma tradição muito importante, era uma festa que teve muito valor pra música popular brasileira e hoje é meio esquecida”, pontua Alex.
O enredo do Salgueiro é uma síntese da resistência carioca em todo o Estado do Rio de Janeiro, a proposta não é fixar apenas no Centro, mas também olhar o entorno e entender que a luta se faz presente em todo o território, o subúrbio terá uma representação enorme, um setor inteiro da escola vai homenagear os grandes bailes oriundos de Madureira, principalmente no Viaduto Negrão de Lima. Para Alex, o enredo será um grande passeio turístico, histórico e cultural sobre a resistência negra no Rio.
“Não é só a cidade do Rio de Janeiro, tem o entorno, tem territórios que a gente identifica em São Gonçalo, na Baixada Fluminense, que são satélites, é uma coisa muito rica porque pega o Rio todo, o Subúrbio, Niterói. São vários locais, mas a gente começa homenageando o Salgueiro e termina com uma menção ao Salgueiro como local de resistência, como o morro tendo sido um Quilombo”, destaca Alex.
Quando perguntado sobre o maior trunfo da escola para o desfile, Alex acredita que o conjunto fará a diferença, juntamente da garra do componente salgueirense, para ele, a força do enredo fará com que os integrantes sintam a energia.
“A gente deposita toda nossa confiança e esperança na garra do Salgueirense, superando todas as dificuldades que todas as escolas tiveram, e que nós também tivemos, vamos com toda força, cantando a plenos pulmões, a bateria tá fantástica, acredito muito na comissão de frente, ela vai mostrar um grande trabalho, então o conjunto é o nosso maior trunfo, o tema é pertinente a “A gente deposita toda nossa confiança e esperança na garra do Salgueirense, superando todas as dificuldades que todas as escolas tiveram, e que nós também tivemos, vamos com toda força, cantando a plenos pulmões, a bateria tá fantástica, acredito muito na comissão de frente, ela vai mostrar um grande trabalho, então o conjunto é o nosso maior trunfo, o tema é pertinente a escola e ao momento, vai ser um desfile alegre, com muita energia e com muita força”, destaca o carnavalesco.
“Escola de Samba é sempre um reflexo do momento da sociedade”
O carnaval deste ano terá um número enorme de enredos com temáticas africanas, reflexo do que estava acontecendo ao redor do mundo no período de escolha das escolas, nos últimos anos a pegada mais crítica ganhou força novamente, Beija-Flor e Mangueira foram campeãs com enredos extremamente críticos em 2018 e 2019, Alex acredita que o carnaval tem esse dever de retratar o que a sociedade está passando, mas para ele funciona melhor quando a mensagem é passada de forma mais leve.
“Temática negra em escola de samba existe desde sempre e o Salgueiro evidenciou ainda mais isso a partir dos anos 60 com o Pamplona e sua turma trazendo heróis negros que não eram conhecidos, era a história marginal do Brasil, as pessoas não conheciam Xica Da Silva, Zumbi dos Palmares, Chico Rei, até que o Salgueiro foi mostrando, acho que a crítica sempre teve e agora está se refletindo mais, a escola de samba tem esse dever de refletir o momento da sociedade, tivemos momentos de carnavais mais críticos por conta da situação política e com humor, acho inclusive mais bacana quando é mais bem humorado, o recado passa melhor”, comenta Alex.
Proposta Visual do Desfile:
No último carnaval, a Academia do Samba encantou o público presente no Sambódromo, tamanho o bom gosto de Alex em alegorias e fantasias, extremamente bem acabadas e de fácil concepção, a escola gabaritou em fantasia e não foi descontada em alegoria, Alex inclusive ganhou o Estrela do Carnaval na categoria “melhor conjunto de fantasias”, para esse ano, Alex pretende repetir o sucesso, mas diz que em nada o carnaval passado se assemelha ao desse ano, são propostas diferentes.
“Espero que seja no mesmo nível, mas são carnavais diferentes, a plástica é totalmente diferente, o assunto é outro, o trabalho de aderaçaria é mais forte do que nos últimos anos, então eu espero que esse conjunto funcione muito bem, pelas formas, pelas cores, pelo didatismo, espero que as pessoas consigam entender, principalmente, eu espero que as pessoas se identifiquem”, conta Alex.
O Salgueirense está acostumado com desfiles suntuosos e luxuosos, a grandeza faz parte da história da escola, principalmente após a longa passagem do casal Lage pela agremiação, essa grandiosidade será vista no desfile deste ano, ao chegar no barracão é impossível não se impactar com o tamanho dos carros, a riqueza de detalhes é enorme, Alex conta que a maioria dos carros terá 16 metros de altura, o cuidado nas fantasias também é muito perceptível, o volume está presente em todas as alas, assim como o acabamento primoroso.
“O abre-alas vai ser o de maior identificação, mas acredito que para os mais antigos, aqueles de raiz, seria a traseira do último carro, que é onde a gente fecha essa história Salgueirense”, aposta Alex.
Entenda o Desfile:
O Salgueiro será a terceira escola a desfilar na Sapucaí na primeira noite de desfiles, dia 22 de abril. A escola irá desfilar com 3.500 componentes, distribuídos em 32 alas, cinco alegorias e dois tripés.
Setor 1: “A abertura presta homenagem aos proprios enredos negros do Slagueiro e a estética que o Salgueiro desenvolveu com o Pamplona e sua turma, que a gente identificava de cara como o Salgueiro. É uma África estilizada, uma África clean, para o grande cenógrafo que foi o Pamblona”.
Setor 2: “Atrás do abre-alas nós temos um setor que mostra um período anterior à abolição e pós abolição, época de República Velha e a gente evidencia muito essa região da Pequena África, encerra com o tripé da a Pedra do Sal. Na sequência entra a religiosidade, desde um catolicismo negro, passando pelo Candomble, pelo Omolokô, pela Umbanda a gente vem trazendo essas várias vertentes de matriz africana até encerrar num tripé e numa alegoria referente a religiosidade.
Setor 3: “Neste setor a gente vem com uma parte cultural de cultura de popular com a cultura erudita, começando desde a comida de santo que vira a comida do dia a dia, da culinária dos restaurantes, passa por capoeira, pelo Jongo da Serrinha, pelo Caxambu do Salgueiro, que são primos, passa pelos times de futebol, depois tem a parte dos escritures negros, o teatro negro de Abdias do Nascimento e o balé afro e o balé clássico de Mercedes Batista, e vem o carro como grande palco dessas figuras que trouxeram essa negritude”.
Setor 4: “No quarto setor nós viemos com os ritmos de música e dança, desde lá do início do século com a festa da Penha com os chorões, passando pelas Escolas de Samba, pelos blocos afros, pelo Cacique de Ramos, pelo Charme, pelo funk, até chegar nessa modernidade, mais próxima dos dias de hoje com esses estilos musicais”.
Setor 5: “No último setor a gente vem com os movimentos sociais, nós tivemos várias formas de resistência e no final é o povo na rua reivindicando seus direitos, é uma grande passeata, nós teremos um grande grupo com várias figuras famosas, engajadas, ativistas, artistas, convidados da Doutora Helena para compor esse cenário final. No verso desse carro a gente tem uma lembrança desse morro do Salgueiro, anterior a criação da própria escola, ali é o grande lugar de resistência onde nasceu essa escola que está contando essa história há muito tempo”.