Por Diogo Sampaio

Guardião da memória, que traz na oralidade os saberes de um povo. Sua figura, tão ligada às tradições africanas, é testemunha de todo acontecimento. Através de histórias, transmite as vivências dos antepassados para as gerações futuras. O Griô é quem nos levará, ao longo do desfile da Unidos de Bangu em 2020, a olhar para o passado, como fonte de ensinamentos, para entender o presente e jogar luz sobre o futuro. O enredo “Memórias de um Griô: a diáspora africana numa idade nada moderna e muito menos contemporânea” irá narrar à história do continente africano, desde seu primeiro habitante até a chegada do europeu, que colonizou as terras e escravizou os nativos, criando males que perduram até os dias de hoje, como a desigualdade e o preconceito.

“O que seria ‘Memórias de um Griô’? É a memória que ele passa, que ele tem guardado de tudo que já foi passado para ele pelos seus antepassados, e de tudo que ele já viveu também. Então assim, ele pega e conta a sua história, que é a história de um povo como um todo. E o mais bonito disso é que se trata de um enredo que traz uma lição para a gente levar pro dia a dia: a gente nunca sabe de tudo. A gente sempre está aprendendo alguma coisa. É um enredo que vai fazer refletir um pouco sobre a própria vida”, defendeu o carnavalesco Bruno Rocha.

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Bruno desenvolve o carnaval da Unidos de Bangu desde o final do passado. O artista chegou à agremiação tendo a missão de dar prosseguimento ao trabalho iniciado pela dupla de carnavalescos Rodrigo Marques e Guilherme Diniz, que regressava para vermelha e branca da Zona Oeste após dois anos.

“Recebi o convite dia 05 de outubro. Logo de imediato, na primeira reunião com toda direção e com a presidência, pedi todo o material que já tinha pronto, para que pudesse começar a desenvolver o trabalho. Estudei qual era a realidade da escola e até aonde poderia ir, depois me coloquei no lugar dos meninos que eram carnavalescos, o Guilherme e o Rodrigo, para que pudesse seguir uma linha. Tive que tentar pensar o que eles estavam pensando, para poder não me perder e saber como tocar o projeto”, relatou para a reportagem do site CARNAVALESCO.

Da Intendente para Sapucaí

Além de marcar sua estreia na escola, o desfile de 2020 da Bangu será o primeiro trabalho de Bruno Rocha na Marquês de Sapucaí. O jovem carnavalesco, que iniciou sua trajetória nos barracões como aderecista no Cubango, traz em seu currículo uma vasta experiência na Intendente Magalhães. Algo que, segundo ele, o ajudou a superar as dificuldades encontradas para construir o carnaval deste ano.

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“A gente que está na Intendente Magalhães sonha em chegar na Série A, mas quando chega e se depara com a realidade só pensa assim: ‘Nossa, não é um sonho, é quase um pesadelo’. Quando você se vê em meio de tantas dificuldades, acaba perdido e sem saber direito o quê fazer, mas mesmo assim é obrigado a tocar o barco. E é nessa hora, que entra o lado bom da história. Foram oito anos de Intendente Magalhães. Lá, a situação é bem menos favorável do que estar em uma Série A. A estrutura é bem mais inferior, o trabalho é muito mais difícil… Aqui a gente tem trabalho dobrado, ao quadrado, ao cubo, mas na Intendente Magalhães é muito mais complicado, porque você não tem um barracão. É praticamente um único galpão onde você tem que dividir o mesmo espaço com mais cinquenta, sessenta escolas. Não tem uma estrutura boa de poder chegar na loja e falar assim: ‘eu quero esse tecido, aquele tecido, esse galão, esse aviamento…’. Você começa a recorrer as escolas da Marquês de Sapucaí, tanto algumas da série A e outras do Grupo Especial, para poder ver se arrecada algum tipo de fantasia, que dali você tira um galão, tira um tecido, uma ferragem, e já começa a diminuir um pouco os custos. Então, eu pego essa experiência, essa vivência e começo a colocar aqui, hoje, na Bangu, na Série A”, afirmou.

Soluções para vencer a falta de verba

Bruno contou ainda que, devido à ausência do repasse de verba da Prefeitura do Rio, uma das soluções encontradas para conseguir pôr o carnaval da Unidos de Bangu na rua foi a utilização de muitos materiais reciclados do dia a dia para confeccionar fantasias e alegorias. Todavia, o artista destacou também que não abriu mão do uso de materiais mais tradicionais da festa e da temática do desfile.

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“Por ser um enredo afro, não tem como você não usar certos tipos de materiais como a palha, a esteira, as argolinhas de madeira… Não tem como você fugir desses, mas você consegue adaptar outros tipos de materiais que tem um custo inferior e que possam acrescentar no trabalho. Então, vamos ter decorações com rolinhos de jornal, que eu acredito que isso ainda não foi visto na Sapucaí; com pregador de roupa, garfinho de madeira, espátulas de sorvete, marmitex… São alguns tipos de materiais que a gente vai adaptando e que vai dar um grande efeito na Avenida”, explanou.

E mesmo diante das dificuldades financeiras, Bruno Rocha assegurou que a mais antiga da Zona Oeste irá manter o padrão de grandiosidade de esculturas e volumetria dos carros apresentados no último carnaval. Ele ressaltou ainda a continuidade no uso de artifícios como as movimentações.

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“Os carros da Bangu vão vir bem grandes, com direito a bonecos de Parintins e muito movimento. Vai ser uma escola que eu acredito que vai impactar bastante na Avenida. Foi até um pedido da própria agremiação, para que não se perdesse um trabalho que já vem sendo feito nesse período que ela se encontra na Sapucaí, de ter carros com movimentos, bonecos de Parintins, esculturas grandes… Então eu continuo seguindo essa linha”, contou.

‘Uma Bangu mais clean’, promete carnavalesco

Porém, apesar do tamanho permanecer, a proposta estética do desfile como um todo será outra em comparação aos carnavais passados da escola. Para o site CARNAVALESCO, Bruno disse que evitou o excesso de informações em alegorias e fantasias, além de ter optado por fugir um pouco da plástica típica da temática africana.

“Sou um carnavalesco que tem uma estética de um carnaval mais limpo, que você olhe e já consiga identificar. Venho nesse trabalho com uma pegada mais cenográfica. No último carro, por exemplo, vão vir plantas naturais, flores naturais, por que como eu vou representar um Candomblé? Então, tenho que trazer todos os elementos que remetam ao Candomblé: plantas, flores, comidas. Outro exemplo: o carro dois é um navio negreiro em que vão vir pessoas acorrentadas, fazendo encenação. Resumindo, podem esperar um carnaval mais limpo e uma Bangu diferente do que passou esses últimos anos na Avenida. Uma Bangu mais clean, porém não pobre, mas sim rica e bem objetiva no que ela quer passar para o público”, garantiu o artista.

Pressão por resultados

Desde o campeonato da Série B em 2017, a Unidos de Bangu vive uma fase de ascensão. A vermelha e branca da Zona Oeste conseguiu se firmar na Série A e no último carnaval alcançou sua melhor colocação desde então: um oitavo lugar. Ao ser questionado pela reportagem do site CARNAVALESCO acerca de alguma cobrança interna da escola por resultados, Bruno afirmou não existir.

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“Eu não sinto pressão da escola, não sinto pressão da comunidade, não sinto pressão da diretoria. Eu sinto a minha própria pressão. Por ser a minha estreia, tenho o dever e a obrigação de fazer um trabalho que vá chamar atenção, porque não é só um benefício para Bruno Rocha, o carnavalesco, mas sim um benefício para agremiação, que pode sim ascender mais um degrau ou até mesmo, quem sabe, brigar pelo título”, declarou.

Entenda o desfile

Terceira agremiação a desfilar no sábado de carnaval, a Unidos de Bangu levará para Marquês de Sapucaí cerca de 1700 componentes, além de 18 alas, três alegorias (sendo o abre-alas acoplado), um tripé e um pé de passagem. O enredo “Memórias de um Griô: a diáspora africana numa idade nada moderna e muito menos contemporânea” será desenvolvido pela vermelha e branca através de três setores, como explana o carnavalesco Bruno Rocha:

Setor 1: “O primeiro setor traz toda a riqueza natural, que é justamente a fauna, a flora, as tribos africanas… Como o regulamento exigiu que agora fosse só três alegorias e um tripé, tivemos que reduzir um pouco e adaptar duas estéticas em uma. Então, o abre alas vem trazendo uma savana e vem trazendo uma tribo também. Podem esperar uma entrada bem quente, com uma pegada bem forte e cores bem acentuadas”.

Setor 2: “O segundo setor é a parte dos comércios. Nesse trecho destacamos o grande comércio de tecido, de especiarias, de metais, entre outros”.

Setor 3: “A gente fecha com o setor glórias e honras, que traz a libertação através da religião, a conquista de poder aqui no Brasil cultuar a sua crença. Então, trazemos o Candomblé e encerramos com a fé, que é fundamental”.

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