A palavra que pode resumir o ensaio tecnico da Estacao Primeira de Mangueira foi maturidade. Melhorando a cada treino de rua, a Verde e Rosa levou para Sapucai uma comunidade com o samba na ponta da língua. Fez um ensaio organizado, com evolução correta e bem espontânea, usando bastante a pegada rítmica do enredo. Na parte musical, apesar dos vários problemas no sistema de som, a união entre carro de som, bateria e comunidade passou por cima das adversidades e conduziu para uma forte interação com o público desde o começo, abençoado pela chuvinha fresca no final.
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Na comissão de frente, mais uma vez, a escola trouxe surpresas e soube usar bem a luz cênica abrilhantando o publico com uma apresentação pautada na tônica do enredo que mexeu com a torcida verde e rosa presente em grande número. Craques, o casal “Furacão” fez jus ao nome e riscou o chão da Avenida cheio de ancestralidade e apresentando passos que caracterizam a sua dança.
Em 2025, a Mangueira vai fechar a primeira noite de desfiles do Grupo Especial com o enredo “À Flor da Terra – No Rio da Negritude entre Dores e Paixões”, desenvolvido pelo carnavalesco Sidnei França.
Dudu Azevedo, diretor de carnaval, ressaltou a força do canto da comunidade. “Eu vim na parte da escola da bateria para trás, e foi muito inflamado com as falhas do som. Em algum momento parou e parecia que foi para mostrar o quanto o nosso povo mangueirense canta e não só canta, mas como desfila. Parecia que a arquibancada estava inflamada. A gente fez uma parada da bateria e deixamos o povo cantando. Acho que foi uma troca muito boa. Percebemos que o povo cantou muito o samba, a Mangueira cantou o samba”.
Comissão de frente
A dupla de coreógrafos Lucas Maciel e Karina Dias trouxe uma apresentação diferente do que foi apresentado no minidesfile, interagindo demais com o público, tendo um ápice muito aclamado pelas milhares de pessoas que acompanhavam o ensaio tecnico na Sapucaí, principalmente, a incessante maioria de mangueirenses. A dupla, também, mais uma vez, fez um excelente uso do recurso da iluminação cênica, ainda que não em todos os módulos, valorizando mais o efeito de cascata na ponta da lança de um dos guerreiros.
A apresentação em termos de conteúdo resumiu muito bem o enredo, fazendo do uso da transformação, troca de figurino, ainda que de um integrante, primeiro apresentando a ancestralidade dos guerreiros bantos, até o climax, com o pivô se tornando um menino do Morro, de cabelo pintado, bermuda, sem camisa, chinelão, mandando altos “passinhos”.
Muito respeito dos coreógrafos de trazer uma grande apresentação como essa para o publico do ensaio técnico, em que muita gente não conseguirá ir ao desfile oficial. Gera ainda mais expectativa para descobrir o que eles vão trazer no grande dia. Sarrafo alto da dupla Lucas-karina.
Mestre-sala e Porta-bandeira
Matheus Olivério e Cintya Santos fizeram jus ao apelido de “casal Furacão “. Procuraram valorizar suas características que casaram totalmente ao enredo. Exibiram uma coreografia diferente do que vinha sendo apresentado na “Visconde de Niterói “, mais viril, mais centrada na ancestralidade, que abordam o enredo que também deu origem ao bailado do mestre-sala e da porta-bandeira. Ela foi espetacular em seus movimentos da “bandeirada” forte, mas charmosa no final, emocionada, com seus rodopios e o corpo ligeiramente inclinado em que as voltas são energéticas, precisas, com a bandeira bem desfraldada, um espetáculo.
Matheus com seus estilo bem característico do Morro de Mangueira, também forte, mas em alguns momentos bem “malandreado”, com uma forte influência dos passos do maior da posição para os mangueirenses, mestre Delegado. Foi muito positivo ver a dupla apresentando uma coreografia mais livre, dentro do bailado característico do casal de mestre-sala e porta-bandeira, sem tanta preocupação em pontuar o samba, mas fazendo bom uso dele a serviço da dança dos dois, e, o melhor , dentro das características que valorizam o que o casal tem de melhor.
A porta-bandeira avaliou o treino e revelou que a coreografia apresentada no ensaio técnico é mais próxima do que a dupla vai levar para a Avenida.
Freddy Ferreira analisa a bateria da Mangueira no ensaio técnico na Sapucaí
“Eu diria para vocês que entregamos o trabalho. É esse que vai estar presente no dia oficial. Estamos felizes que a escola entregou o que ela queria. Algo brasileiro. Poder fazer as pessoas conhecerem o banto, de onde vieram, a nossa ancestralidade. E na dança também. Nos ensaios de rua, foi a coreografia de quadra. Hoje, a gente apresentou a coreografia oficial. A ancestralidade está na dança e a gente vem trazendo a raiz da dança, a gente não vai inovar muito. Somos casal raiz, que não perde a originalidade”, sentencia Cintya.
Ja Matheus Olivério deixa no ar que algo ainda pode aparecer de diferente no dia. “Somos um casal furacão, improvisação o tempo todo. Mas, é a dança tradicional, é sentir o dia. E a gente hoje foi na emoção. Estamos trabalhando há nove meses, sempre arrebentando, sempre uma emoção, sentindo a energia da escola. Ontem, a gente fez um ensaio na chuva maravilhoso e pensamos: ‘vamos desse jeito que está gostoso’. Está lindo, encaixado e esse é o casal Furacão. Agora já é reta”, acredita o mestre-sala.
Harmonia
A escola, como está sendo visto nos ensaios de rua, cantou de forma bastante efetiva, forte, potente, correta, buscando mostrar que o samba estava na ponta da língua e foi abraçado pela comunidade. No final, mesmo com desgaste e calor, as alas seguiram cantando. No carro de som, a Mangueira venceu os problemas com o som disponibilizado para o ensaio que a presenteou falhas, inclusive, no esquenta da escola, quando a Sapucai pegava fogo.
Entretanto, as falhas do equipamento só evidenciaram uma escola cantante. Só em um momento houve um leve desencontro que aconteceu pela falha do equipamento, o que não acontecerá no dia, pois o som principal da Sapucaí estará ligado. No mais, ótimo trabalho da ala musical da Mangueira, impulsionada por um trabalho de excelência da bateria.
“Foi excelente! O pessoal do mundo samba assistiu. Com certeza, a comunidade da Mangueira está em um nível altíssimo para cantar bastante na avenida e ajudar a escola a chegar ao tão sonhado título. É só ensaiar mais um pouco e colocar tudo em prática do que a gente vem fazendo”, comentou o intérprete Dowglas Diniz.
“O samba atingiu o lugar que a gente queria. Ainda mais na hora que faltou som, que a comunidade começou a cantar copiosamente. Isso aí provou que o samba é um dos grandes do carnaval de 2025”, garantiu o cantor Marquinho Art Samba.
Samba-enredo
O samba tem como compositores Lequinho, Júnior Fionda, Gabriel Machado, Júlio Alves, Guilherme Sá e Paulinho Bandolim, parceria que assinou as últimas três obras da Verde e Rosa. A música possui algumas características parecidas com os últimos sambas como um pré-refrão lá embaixo da segunda do samba forte como “É de arerê, força de matamba/ É dela o trono onde reina o samba”, que prepara para a explosão em “Sou a voz do gueto…”. Também como nos últimos carnavais há um destaque para a segunda do samba na forma de ser mais melódica, como mais nuances de melodia.
Neste caso, em tom menor, diferente da cabeça, quando o assunto se torna mais sério ao falar da valorização dos próprios personagens da comunidade e as dificuldades enfrentadas pelos “herdeiros” dos povos bantos. Melodia de maior profundidade. A primeira do samba procura ser de maior ataque e dar andamento e ritmo a obra. Como citado em outras crônicas o único “senão” é no refrão de baixo na palavra “dona” de “dona das multidões” que para não fugir da acentuação tônica correta, acaba com a pronúncia um pouco forçada em termos de música. Mas nada que tenha impedido o grande crescimento do samba. Mostrou que pode passar muito bem na Sapucaí.
Evolução
A Mangueira passou muito tranquila pela Sapucaí, mas bastante quente. Com muita dança, com fluidez, sem correria, brincando carnaval, mas com técnica e organização, sem apresentar buracos, grandes espaçamentos ou alas emboladas. Fez de forma correta os movimentos mais cirúrgicos, como as saídas da bateria dos recuos e a entrada no segundo, além de apresentações de comissão e casal que nao influenciaram no ritmo da escola.
A presença de algumas coreografias foi observada tanto naquelas que pontuavam o samba, exemplo a referência que se fazia no “descolorir o cabelo’, como em alas que tinham uma tematica que claramente exigia coreografia. Por exemplo, uma ala após o segundo carro tinha ervas na mão e faziam coreografia mais no refrão do meio que trabalha essa temática. Importante pontuar que essas coreografias não influenciaram no bom andamento. No final, houve tempo até para a Mangueira curtir o deu final do ensaio.
Outros destaques
Antes do início da apresentação, no esquenta, o carro de som apresentou uma performance especial da musicalidade negra, com batidas mais tradicionais e depois seguido para o funk representado por “eu só quero é ser feliz” e “é som de preto, de favelado…”. A rainha Evelyn Bastos veio como “Njinga a Mbande”, a rainha Ginga do reino de Matamba, com uma roupa que lembrava uma guerreira, com detalhes muito bonitos em dourado e pintura corporal.
E, por falar em pintura, uma ala do início, atrás do primeiro carro, apresentava uma bonita maquiagem com símbolos de ancestralidade no rosto. Os passistas vieram cheios de estilo arrasando no samba e no “passinho”.
Outro destaque ficou para o segundo casal de mestre-sala e porta-bandeira, Débora de Almeida e Renan Oliveira, que também apresentava um gingado muito legal, com alguns passinhos dentro da parte da bossa funk do samba. E , por falar em bateria, a “Tem Que Respeitar Meu Tamborim” fez grandes performances no juri, não só no áudio como também no visual, com jogo de luzes, se utilizando também da luz cênica, além de fogos.
No comando da bateria, ao lado de Rodrigo Explosão, Taranta Neto avaliou o treino da Mangueira e a performance do ritmo mangueirense.
“A minha análise é que fizemos um bom ensaio. Acho que, por ser o primeiro, estava todo mundo muito ansioso, muito nervoso, até por tudo que viemos passando ao longo do ano. Estamos enfrentando essa questão de muita gente achar que o nosso samba não funciona, que tem sido criticado no pré-carnaval. Mas hoje conseguimos mostrar que nosso samba é forte, aguerrido e, se Deus quiser, vai nos levar rumo ao título. Sobre possíveis correções ou ajustes, nós apresentamos todas as convenções que queremos levar para a avenida. Ainda temos mais ensaios, incluindo o segundo ensaio técnico, há detalhes para acertar. Mas hoje já demos uma amostra do que vamos apresentar na avenida. Espero que, assim como hoje, no dia 2 de março possamos sair daqui ovacionados, ganhar os 40 pontos e ajudar a nossa Mangueira a ser campeã do carnaval”, citou o mestre
Colaboraram Allan Duffes, Luan Costa, Marielli Patrocínio, Juliana Henrik, Gabriell Radicetti, Matheus Vinícius, Matheus Morais e Rhyan de Meira