Por Guilherme Ayupp, Eduardo Fonseca e Philipe Rabelo. Fotos: Allan Duffes
A Estação Primeira de Mangueira vai brigar pelo bicampeonato do carnaval carioca com um samba de autoria de Manu da Cuíca e Luiz Carlos Máximo. A escola realizou sua grande decisão da disputa de samba na madrugada deste sábado para domingo no Palácio do Samba. Após uma disputa cheia de novidades no regulamento, como proibição de intérpretes de outras escolas e gastos exorbitantes, três parcerias se credenciaram para a grande final. Em 2020 a verde e rosa, campeã em 2016 e 2019, apresenta o enredo ‘A verdade vos fará livre’. A temática, desenvolvida pelo carnavalesco Leandro Vieira, será uma leitura crítica da biografia de Jesus Cristo. A Mangueira será a terceira a desfilar no domingo de carnaval.
A compositora Manuela Oiticica, a Manu da Cuíca, é bicampeã de samba-enredo na escola. É de sua autoria a obra que foi sensação do último carnaval, angariando a maioria de prêmios e impulsionando a histórica apresentação da verde e rosa na Marquês de Sapucaí. Companheiro de Manu e um dos mais conceituados compositores da retomada do gênero samba-enredo, Luiz Carlos Máximo fez companhia à ela e saboreia sua primeira conquista na velha companheira da Portela, a sua escola de coração.
“Nós somos bicampeões e eu queria ressaltar o caráter democrático e revolucionário da disputa de samba, que colocou os compositores e compositoras em destaque. O grande homenageado da Mangueira é Jesus Cristo, que luta pela partilha e pela fraternidade. Com certeza, ele aprovaria uma disputa como essa, aprovaria uma escola espetacular que trate a favela como um ato de sobrevivência, especialmente com esse governo que mais mata favelados e o samba mostra que estamos vivos”, disse Manu.
O samba apontado como favorito desde o começo da disputa não fez apresentação de favorito, embora tenha sido destacadamente a melhor obra na final. De letra muito inspirada o samba teve dificuldades em cativar a quadra.
“Esse bicampeonato pra gente tem uma importância pelo que significa a Mangueira. A gente que veio de outra escola, a Mangueira é tão grande e e importante quanto Portela, Mocidade e todas as outras. Mas, ela tem um diferencial que esse samba nos dá a oportunidade de falar que é a favela. É a única escola do Grupo Especial que fala da favela. A favela tem uma história de superação. Principalmente pelo momento que estamos. Estão matando gente nas favelas. É o recado que Jesus dá com o retorno dele. Ele fala da favela que é o povo dele. O povo oprimido. Ele chega e diz ‘se liga! Não existe futuro se não tiver partilha. Não terá o Messias!”, disse o compositor Luiz Carlos Máximo.
O carnavalesco Leandro Vieira, devido a um problema pessoal, precisou deixar a quadra antes das apresentações dos finalistas. Ele chegou no início da noite e permaneceu algumas horas no Palácio do Samba, antes de deixar o local.
Elias Riche faz balanço de disputa e elogia Leandro Vieira: ‘O melhor do carnaval’
O presidente Elias Riche atendeu a reportagem do CARNAVALESCO durante a noite de escolha do samba. Eleito em abril para o próximo triênio à frente da verde e rosa, falou sobre o desfio de lutar pelo bicampeonato, que a Mangueira não conquista desde 1987, sem subvenção prevista.
“Eu não sei o que é mais difícil, se é ser campeão ou confirmar o título. Sei que a vitória vem na avenida, não adianta. Pode ter um barracão maravilhoso, dinheiro pra caramba, que é ali naquela pista que a situação acontece. Eu estou acreditando muito no meu carnaval assim como os demais presidentes acreditam no deles. Com ou sem subvenção”, resumiu.
O dirigente não poupou elogios ao carnavalesco Leandro Vieira, que vai desenvolver seu quinto carnaval consecutivo na Mangueira. Para Riche, Leandro é o grande artista da festa, embora haja a necessidade de controle de gastos na gestão da agremiação.
“Você tem de dar liberdade até onde é possível alcançar. Não adianta eu ter 4 para gastar e gastar 6. É nesse sentido que negociamos com ele. O Leandro é uma mente privilegiada, uma pessoa do bem, estamos tremendamente felizes com ele. Na minha visão é o grande carnavalesco da festa hoje”, derrete-se.
Elias fez um balanço positivo da disputa de samba implementada pela escola este ano, com um regulamento rígido no sentido de impedir gastos exorbitantes. Elias considera o modelo o mais democrático.
“Eu acho que foi um modelo novo, muito democrático, valorizamos a prata da casa. Isso é muito sadio para as escolas de samba, para o futuro dos desfiles em si. Nosso balanço é extremamente positivo”.
‘Quem quiser ganhar, tem que ganhar da Mangueira’
Membro da comissão de carnaval mangueirense, Moacyr Barreto falou sobre o peso de fazer um desfile sem previsão de verba.
“É um peso muito grande. Já no ano passado, o que o prefeito tratou não cumpriu. Disse que ia dar R$ 500 mil e somente veio R$ 450 mil. Ainda estão devendo R$ 50 mil e as escolas fizeram um belo espetáculo. As escolas se reinventaram. Temos de acreditar nesta reinvenção apesar do prefeito”, comentou Moacyr, que revelou que a Verde e Rosa terá basicamente o mesmo contingente que 2019.
“Talvez, um pouco menos devido a equação de tempo. Mas, é o contingente da nação mangueirense. Já está fechado o número, mas não iremos divulgar. Ainda não temos previsão de quando vamos começar os ensaios na rua”.
Moacyr Barreto também analisou a posição de desfile da Verde e Rosa, que será a terceira de domingo. “Você não escolhe adversário quando está jogando futebol. Você está ali jogando e tem que ganhar. Temos de fazer o nosso desfile e entregar bem entegue. O que vai acontecer depois veremos. Nosso preparo é fazer um grande desfile. Como sempre digo, quem quiser ganhar, tem que ganhar da Mangueira”.
Evelyn Bastos marca posição com Cristo negro
A apresentação de segmentos da Mangueira foi de tirar o fôlego na quadra. Comandados por Marquinho Art’Samba, os cantores da verde e rosa desfilaram os sambas antológicos da escola, levando o público a uma viagem no tempo, enquanto baianas, passistas, velha-guarda e demais departamentos desfilavam pela quadra.
Mas quem roubou a cena da final foi a rainha de bateria Evelyn Bastos. A beldade se apresentou com um colã branco e na região do abdômen havia um cristo negro, com coro de espinhos decorada com pedras. A rainha foi chamada ao palco no momento que os intérpretes cantavam o samba de 1988, ‘100 anos de liberdade, realidade ou ilusão?’. Maior simbolismo não poderia haver.
Intérprete da Verde e Rosa, Marquinho Art Samba já conquista os corações dos mangueirenses. Ao site CARNAVALESCO, ele fez uma análise do desfile de 2019 e falou da relação com os torcedores.
“Nunca é fácil conquistar o torcedor. Mas, aos poucos vamos conquistando nosso espaço. O ano de 2019 foi muito bom. Sempre pensamos em melhorar e vamos fazer alterações para 2020”.
Bateria representará os soldados romanos
Em entrevista ao site CARNAVALESCO, mestre Wesley falou do desfile de 2019 e revelou que já na pensa na bateria para 2020.
“Foi um ano positivo. Desde o momento que foi escolhido o samba, a gente percebeu que ia dar certo. Vai ter uma surpresa boa demais para o desfile do ano que vem. A gente vai vir de soldados romanos, com 280 componentes e devemos ter um instrumento surpresa que virá no meio da bateria”, garantiu o comandante dos ritmistas mangueirenses.
Casal cheio de fé para 2020
Perfeição. É a melhor palavra para falar do casal de mestre-sala e porta-bandeira da Mangueira, Matheus e Squel. A dupla está no céu do carnaval e rasga elogios ao carnavalesco Leandro Vieira.
“Foi um desfile (2019) que, graças a Deus, nós conseguimos colocar em prática tudo o que a gente planejou e ensaiou por tanto tempo. Tivemos o nosso trabalho reconhecido, mas é uma tranquilidade momentânea. A responsabilidade só aumenta. Daqui pra frente é só aumentar os ensaios”, disse a porta-bandeira.
“Nós somos um casal muito tradicional, a gente não pensa muito em mudar, mas sempre em evoluir para representar cada vez melhor o nosso quesito. em melhor coisa do que falar de Jesus? O Leandro é admirável no trabalho dele e esse não seria diferente. Vamos com fé para a Sapucaí”, completou o mestre-sala.
Análise das apresentações das outras duas parcerias finalistas
Parceria de Rodrigo Pinho: Último samba a se apresentar, a obra de Rodrigo Pinho teve problemas na quadra. Desde o início da apresentação, a composição não contagiou o público e quase ninguém conseguiu cantar e dançar durante os 25 minutos de apresentação.
Parceria de Beto Savana: A obra de Beto Savana foi a segunda a se apresentar. Destaque para o jovem Douglas Diniz que não sentiu a pressão por defender um samba finalista e o fez com muita categoria. O samba viveu bons momentos na quadra, mas caiu de rendimento ao longo da apresentação.