Enredo: ‘É ONDA QUE VAI… É ONDA QUE VEM… SEREI A BAÍA DE TODOS OS SANTOS A SE MIRAR NO SAMBA DA MINHA TERRA’
Capítulo 1
Do Mar
Sou Kirimurê, o grande mar interior do povo Tupinambá. Nasci de uma ave encantada decaída do céu. Contavam os indígenas antigos que seu coração abriu a terra quando tocou o chão, foi preenchido com o mar do Atlântico e suas alvas asas bordaram de areia meu contorno. Sou a mãe cujos filhos são peixes, de águas mornas e mansas onde as baleias cantam.
Capítulo 2
Da Terra
Sou a boca de mar do primeiro de novembro de Gaspar de Lemos, a Capitania de Francisco Pereira Coutinho e dos franceses que vinham até mim, atrás do meu pau-brasil e humaitás.
Vi a comitiva de Tomé de Souza, que D. João III mandou para fundar a primeira capital, desembarcar na praia do porto da Barra. Construíram fortes, trouxeram a cruz, escravizados e cana-de-açúcar. Fui cobiçada pela Companhia das Índias Ocidentais, invadida pelos holandeses.
Mas a terra que banho é barril dobrado; é de luta.
O som de minhas ondas ecoa nos gritos das revoltas, levantes, e pela independência no dois de julho, pois a luta pela liberdade também tem um perfume de maresia.
Capítulo 3
Dos Santos
Sou de todos os santos e axés. Marés barrocas me fizeram África do lado de cá. Na minha beira floresceram igrejas e candomblés. A magia que sopro pelos ares ao meu redor balança as medidas do Bonfim, levanta a saia das baianas, desfralda os estandartes das procissões, faz dançar as folhas das gameleiras de Nosso Senhor da Vera Cruz que fazem levantar os que já se foram, assanha a brasa da fogueira junina de Xangô que ilumina Santo Antônio na novena, mistura o toque dos sinos com os agogôs, espalha a vibração dos atabaques e do Iorubá falado na missa. Pelas minhas águas que a Gratidão do Povo desfila levando Bom Jesus dos Navegantes em triunfo e devoção.
Meu axé deseja que Deus lhe abençoe.
Capítulo 4
Do Povo
Sou a fartura que faz as redes do povo do mar pesarem em alegria. De mim vem o sustento de pescadores, marisqueiras, catadores de pinaúna, de siri-boia, papa-fumo, chumbinho, salambi, peguari, rala coco. Meu balanço ensinou o Marinheiro Só a nadar nos versos cantados na capoeira dos estivadores e no ritmo das Marujadas e Cheganças.
Meu vento infla as velas dos saveiros que me cruzam a superfície em um vai e vem bailarino, me fazem de rua e palco. Levam o pescado, dendê, farinha, cestos de cana-brava, caxixis de barro, rendas de bilro, frutas, folhas, para a feira de São Joaquim e o Mercado Modelo. De lá, aliás, ainda vejo Maria de São Pedro e Camafeu de Oxóssi refletirem em meu espelho d’água a me admirar. Exalo meu encantamento quando se abre uma garrafa de cachaça de folhas e no cheiro das comidas nos tabuleiros, tachos, alguidares, panelas e nas cabeças das Paparutas a rodar e dançar.
Capítulo 5
Do Reino
Sou o reino de Aioká que guarda tesouros e segredos nas profundezas aquáticas. Naufragados descansam em sua eternidade, casas dos habitantes marinhos que enriquecem a arquitetura viva das profundezas. Tenho ouro negro em meu recôncavo, que traz em sua essência a lembrança de um reino extinto há milhares de anos.
Estou na beleza enigmática que envolve a Ilha do Medo e na misteriosa água da Fonte da Bica que, juram, a água fina faz velha virar menina.
Sou a soberana da Amazônia Azul, a mais bela de toda a costa brasileira.
Minha natureza reina absoluta na exuberância da ilha que os frades nomeiam, onde meu azul envolve o verde da mata atlântica num espetáculo de preservação e respeito.
Sou o encontro de duas rainhas. O mar salgado de Iemanjá recebe as águas doces de Oxum quando os rios Paraguaçu, Subaé e Jaguaripe desaguam em mim.
Capítulo 6
Da Festa
Sou navegante da alegria, da festa. Por isso chame, chame, chame gente que eu benzo o banho de cheiro dos foliões, os blocos de caboclinhos, blocos afros e os Afoxés. Chame gente que é massa sentir os sorrisos felizes por trás das máscaras do carnaval dos mascarados, dos caretas e se alegrar com o arrasta povo do Forró do Jegue. Ó paí, que o embalo da Festa D’Ajuda já anunciou que a capela deu sinal, quem quiser sambar apareça!
Chame gente para tomar um sorvete na Ribeira, se esbaldar no samba de roda da segunda-feira gorda e sambar com a Barquinha de Bom Jesus dos Pobres.
Comemoro e reverencio a vida em cada pôr do sol no farol, com a esperança de que algum dia a paz vencerá a guerra e viver será só festejar.
Texto: Jack Vasconcelos
Ilustração: Antônio Vieira
A jornalista e escritora Luana Genót, fundadora e diretora-executiva do Instituto Identidades do Brasil (ID_BR), que apoia empresas e organizações no desenvolvimento de ações afirmativas para a inclusão de negros e indígenas, esteve no barracão da Unidos do Viradouro, na Cidade do Samba.
Foto: Divulgação/Viradouro
A convite do presidente Marcelinho Calil e de Erika Januza, rainha de bateria da escola, Genót conheceu o projeto do desfile da vermelho e branco para 2023.
O carnavalesco Tarcísio Zanon mostrou os desenhos das alegorias e fantasias que vão ilustrar o enredo “Rosa Maria Egipcíaca”, africana que foi escravizada, prostituta, beata, primeira mulher negra a escrever um livro no país, e que viveu no Rio de Janeiro e em Minas Gerais no século 18.
Os diretores de carnaval Alex Fab e Dudu Falcão também recepcionaram a escritora, que estava acompanhada pela também jornalista Tatyane Amparo e por Tom Mendes, diretor-financeiro do (ID_BR).
Quer passar novamente pela Sapucaí com a “Deusa do Passarela”? Nesta quinta-feira, a Beija-Flor dá início ao recadastramento da comunidade. Os componentes que desfilaram no último Carnaval, em alas ou carros alegóricos, devem comparecer à quadra da escola (Rua Pracinha Wallace Paes Leme, 1025, Nilópolis), entre 19h e 22h, munidos de cópia da identidade, CPF, comprovante de residência, além de duas fotos 3×4.
Foto: Nelson Malfacini/Site CARNAVALESCO
As inscrições, gratuitas, dão direito aos foliões de seguirem desfilando na agremiação. Para garantir a fantasia, é imprescindível a presença nos ensaios de quadra e de rua.
Atual vice-campeã do Carnaval, a Beija-Flor busca seu 15º título com o enredo “Brava Gente! O grito dos excluídos no bicentenário da Independência”. A escola será a 5ª a desfilar na segunda-feira, 20 de fevereiro, pelo Grupo Especial.
Em entrevista ao site CARNAVALESCO, o presidente da Mancha Verde, Paulo Serdan, falou sobre a transmissão dos desfiles do Grupo Especial de 2023. Ele confirmou que a TV Globo continuará como detentora dos direitos, inclusive, com exibição para o Rio de Janeiro, ou seja, sem as escolas da Série Ouro.
Foto: Vinicius Vasconcelos/Site CARNAVALESCO
“A transmissão vai ser com a Globo, porque a gente não evoluiu com as outras emissoras, o que eu acho até que seria legal respirar novos ares. Eu entendo a importância que a Globo teve para o carnaval de São Paulo e ainda tem, mas precisa evoluir muito ainda em termos de transmissão. Está faltando um pouco de carinho ainda com São Paulo. A gente pontou isso na reunião. Espero que eles deem uma atenção melhor a partir desse ano. Mas vamos com a Globo para o país todo e para o Rio de Janeiro. Eu respeito o carnaval do Rio, é monstruoso, culturalmente é impressionante, mas não dá pra gente ser coadjuvante. A gente tem nosso projeto e eles tem o deles e é assim que vai. Eu acho que eles perderam muito em não transmitir o nosso carnaval para o Rio de Janeiro, mas espero que a gente evolua nisso”.
A Liesa disponibilizará na próxima sexta-feira, dia 05 de agosto de 2022, de 9 às 17 horas, através do telefone (21) 3190-2100, a informação de quem foi contemplado com a reserva de camarotes para o Rio Carnaval 2023.
Foto: Divulgação/Riotur
Pessoas físicas e jurídicas que tiverem as reservas de camarotes para o Rio Carnaval 2023 confirmadas naquela data receberão, por e-mail, uma via do contrato que deverá ser assinado e devolvido à Central Liesa de Atendimento até o dia 10/08/2022 (quarta-feira), acompanhado do contrato social atualizado vigente; e, se Pessoa Física, cópia de identidade sob pena de, não o fazendo, a reserva ficar em aberto para uma nova atribuição.
Com o contrato devidamente assinado e entregue, a Central Liesa de Atendimento enviará um boleto bancário referente ao pagamento da primeira parcela (sinal) com vencimento para 16/08/2022.
IMPORTANTE: o não atendimento a qualquer uma das duas condições acima implicará na não confirmação da reserva, ficando a LIESA com o direito de contemplar os interessados cadastrados na fila de espera.
Enredo: “AGANJÚ… A VISÃO DO FOGO, A VOZ DO TROVÃO NO REINO DE OYÓ”
COMPOSITORES: Júnior Fionda, Tem-Tem Jr, Marcelo Adnet, Marcelinho Santos, Orlando Ambrósio, Domingos PS, Dudu Senna, Fábio Turko e Diego Nogueira
BABÁ ALAPALA OBÁ SOU BANGÚ MENINO AGANJU SARAVÁ BABÁ ALAPALA OBÁ LABAREDA QUE NINGUÉM PODE APAGAR
O quinto Alafim de Oyó
Recebe a força dos trovões
O dom de equilibrar o mundo
Olofin te faz guerreiro Sentinela dos vulcões
Agô… neto de oraniã
Filho de acajá
Justiceiro orixá
Quem cospe fogo contra a voz da opressão
Faz queimar intolerância
Apagar a escravidão
Amalá te ofereço
No dende e ajapá
IYÁ basé bota tempero
Na gamela o acaçá
Alujá chamou na terra
Inimigo debandou
QUEM QUER PAZ NÃO FAZ A GUERRA NÃO ATIÇA O MEU XANGÔ
Aos ibejis frutas e cocadas
Guaranás e bananadas
Fundamento e louvação
No mês de junho
Vejo as praças enfeitadas
Os balões e as bandeiras
De São Pedro e São João
São Jerônimo meu pai
Salve são judas Tadeu
Sincretiza a fé do preto
Que um dia se escondeu
Hoje livre no terreiro
Alumia de ajerê
O axé do macumbeiro
No Machado do poder
Ê… kabecilè caô A maldade vira cinza Na fogueira de Xangô
A Mancha Verde realizou na noite de sábado e madrugada de domingo a grande final de samba-enredo para o Carnaval 2023. No processo de escolha, a agremiação proporcionou uma competição diferente do habitual. Houve 18 sambas concorrentes que foram eliminados com o passar do tempo, sem apresentação para o público na quadra, até restar os finalistas. Para o ano que vem, a Mancha levará para o Anhembi o enredo “Oxente – Sou xaxado, sou Nordeste, sou Brasil”, de autoria do carnavalesco André Machado. Com três obras na disputa, sagrou-se campeã a última a se apresentar, sendo da parceria de Edinho Gomes e Gilson Bernini. Os compositores venceram pela primeira na escola alviverde e falaram sobre a emoção desse feito inédito. * OUÇA AQUI O SAMBA CAMPEÃO
“Como eu estava falando para o Gilson, chega a ser inacreditável. Derrubar os atuais campeões é difícil e, conseguir derrubar o que deu o título para a escola, é mais difícil ainda. Então a gente só tem que acreditar que nós fomos felizes na nossa obra. A sinergia nossa é muito grande. O respeito um para com o outro é muito grande. Então acho que isso é muito importante. É a nossa segunda final juntos, mas é a primeira vez que arriscamos vir só nós dois aqui”, contou o compositor, Edinho Gomes.
“É muita emoção, primeiro porque a Mancha Verde faz um tipo de disputa diferente de tudo que eu já vi por aí. Tenho 60 anos de idade e faço samba desde os 17. Eu nunca vi uma disputa onde a festa não nenhuma influência no resultado. Isso deve servir de modelo para todas as escolas, porque isso possibilita até compositores anônimos que não têm condições de gastos para concorrer. Eu estou muito feliz, o Edinho é muito parceiro, nós fizemos em 2018 quando o enredo foi sobre o Fundo de Quintal e ficamos entre os quatro. Resolvemos fazer esse ano e, quando tem uma sintonia, tem hora que muitos compositores até atrapalham. Mas o samba é muito lindo e tenho certeza que a Mancha vai brigar de novo para ser campeã”, completou o autor, Gilson Bernini.
Fotos Lucas Sampaio/Site CARNAVALESCO
Na apresentação, o samba foi defendido pelo intérprete Igor Sorriso. Ainda nos microfones, tiveram as presenças de Toninho Penteado e Adeilton Almeida, que renomados intérpretes do carnaval paulistano. Para festa na apresentação da parceria, houve ‘bexigões’, confetes e serpentina. Não houve grande contingente de torcida, porém deu para observar algumas pessoas ao redor da quadra cantando algumas partes da obra. O refrão principal e do meio são de fácil entendimento e foram facilmente cantados, principalmente, o primeiro. Nitidamente, a parceria optou por uma forte presença de palco, ao invés do famoso ‘arrastão’ para fazer valer a pena sua vitória.
A festa ainda contou com a apresentação dos pilotos para o carnaval 2023. Intercalando com as apresentações dos sambas, a escola foi apresentando as fantasias de setor a setor, que irá para o Anhembi no dia de seu desfile e, ao mesmo tempo, o carnavalesco André Machado, falava brevemente sobre elas.
Presidente celebra escolha do samba
O presidente da agremiação, Paulo Serdan, comentou sobre o samba e também a preparação adiantada rumo ao carnaval 2023. “Foi o ano mais difícil para a gente escolher. Tivemos dois sambas que ficaram alternando muito durante a votação, tanto é que teve que fazer a votação hoje para ratificar. Eu estou bem feliz e até brinquei com o meu diretor que a gente está vindo com um samba de sambista mesmo. Ele dá essa impressão. Sobre a preparação, o restante da minha equipe de Parintins está chegando, equipe de serralheria já estava aqui, estamos com os carros prontos pra subir, amanhã o André já passa o projeto de alegoria e a gente já começa a mexer. Também vamos definir se tem alguma mudança de piloto e, se não tiver, já vamos partir para a produção. O que falta comprar são galões, mas plumas e tecidos estão 80% comprados”, revelou.
Ao site CARNAVALESCO, André Machado comentou como surgiu o enredo para o Carnaval 2023. Quando entrei na Mancha Verde o enredo já existia, que foi através de um documentário que Paulo Serdan assistiu e trouxe essa proposta. Por conta do carnaval que fiz pela Pérola Negra em 2013 falando sobre ‘O Alto da Compadecida’, favoreceu para quando eu estivesse na Mancha Verde. O Xaxado, quando se começa a pesquisar, descobre que não é só um ritmo. É uma cultura toda envolvida. Através dessa dança, que foi através de Luiz Gonzaga que se espalhou pelo Brasil inteiro. Outros grandes artistas da cultura nordestina fizeram com que o Xaxado fosse reconhecido. Através da cultura do mestre Vitalino, da religião do Padre Cícero, que era muito ligado também à cultura do cangaço e era muito respeitado como padre. Luiz Gonzaga, Maria Inês e outros artistas que fizeram com que o Xaxado fosse reconhecido pelo país inteiro. Eu estou muito contente, porque é um tema que eu gosto muito. É um tema leve e que as pessoas gostam. Quando falamos de Nordeste costuma dar sambas bons, e graças a Deus tivemos uma final excelente. O samba campeão era exatamente o que a diretoria queria. Fizemos uma audição esse mês inteiro, ficamos escutando sem parar. O Paulinho (Serdan) com esse jeito de trabalhar é muito bacana, que exige que a gente monte e entenda o enredo. Foi muito feliz essa escolha da Mancha Verde.
Carta na manga para bateria
O diretor de bateria, mestre Guma, falou das inovações e ideias de bossas que a bateria ‘Puro Balanço’ pode ter para o próximo carnaval. “A Mancha sempre tem uma carta na manga. É difícil falar agora porque eram três sambas diferentes, e não sabíamos o que iria acontecer, apesar de estar acontecendo a disputa lá dentro da diretoria. A gente sempre deixa para avaliar ou pensar em alguma coisa quando o samba é campeão. O que eu posso adiantar é que com certeza terá alguma coisa, e a gente vai preparar, se Deus quiser, um grande espetáculo. O Nordeste é muito marcante pela cultura e a diversidade musical e cultural. Temos pela frente muitas possibilidades de criar algumas situações diferentes. Nesse Carnaval campeão eu abri o leque um pouco mais do que de costume da minha trajetória, e não será diferente. O próximo trabalho vamos explorar muito, mas sem perder a essência. Temos a possibilidade de criar muitas coisas, mas não podemos esquecer do samba. O Xaxado, que é o que vamos falar, ele representa o que é o Nordeste, a cultura do tema, e temos que enfatizar, mas sem perder a essência. Temos que ousar um pouquinho, as baterias mudaram muito, mas sempre dentro do contexto”.
Casal já projeta dança de 2023
Marcelo Silva e Adriana Gomes, casal oficial da agremiação, avaliou o enredo e o que se pode trabalhar dentro do samba escolhido. “Para nós, temos a dança de mestre-sala e porta-bandeira tradicional, aquilo que não foge do tradicional. Só que a gente começa a trabalhar o próximo carnaval quando anuncia o samba. Esse samba agora, iremos estudar. Estudamos os três sambas já sabendo que poderia ganhar um dos três. A partir de agora, começaremos o nosso trabalho individual, eu e a Adriana só. É um enredo completamente diferente daquilo que a gente vem propondo. Ele pede até um pouquinho de dança diferente, algo diferenciado até mesmo no cortejo. Eu já estou com algumas coisas na cabeça. Quando anuncia o samba eu fico empolgado, mas já fico imaginando ‘poxa, a gente já pode fazer isso, aquilo’. Acho que tem alguns versos no samba que mostra uma coisa muito legal de cortejo”, disse o mestre-sala.
“Até porque o enredo fala de uma dança. Tem todo o universo que envolve a história, mas é uma dança. A gente tem que dançar o Xaxado, mas como isso será colocado na dança tradicional do casal aí é com o Marcelo quem manda”, completou a porta-bandeira.
Adriana Gomes ainda fez uma análise do carnaval de 2022. “Diante de todo o ocorrido na concentração, a melhor coisa a dizer é que nós temos cumplicidade e responsabilidade de ser o primeiro casal de mestre-sala e porta-bandeira da Mancha Verde, assim como sermos parceiros da escola e a escola ser parceira nossa. Um time, para ganhar, ele tem que jogar junto, e no jogo individual só ganha o individual. A nossa reflexão de tudo isso é que nós estamos em uma escola que acolhe o nosso trabalho e respeita tudo aquilo que a gente faz e vice-versa. A gente entende todo aquele universo do time que uma escola de samba precisa ter para fazer ‘o’ desfile. Se ele vai ser bom, o melhor ou o máximo, quem vai decidir é o jurado, mas até lá é o time quem joga”, finalizou.
Freddy Vianna e a receita que deu certo
Freddy Viana, intérprete da Mancha Verde, mostrou muito carinho ao falar da escola alviverde. “A minha relação com a Mancha foi uma coisa natural. Quando eu cheguei em 2012 eu tinha acabado de sair da Acadêmicos do Tucuruvi, eram 11 anos de escola, e ficava aquela incógnita. Eu não sabia se eu me encaixaria em outra entidade. Eu aceitei o desafio. O Serdan me chamou, eu falei ‘beleza’, e quando eu cheguei na Mancha foi uma energia tão forte que é até hoje assim. Eu entrei na escola em 2012, ganhei o samba, cantei pela primeira vez um samba meu na avenida, e desde então o carinho pela escola foi muito grande, e foi uma coisa recíproca. Até hoje eu entro na escola e sou muito bem recebido por todos os setores, tanto que meu presidente fala “cara, você só sai daqui quando você quiser, porque você é unânime aqui na Mancha Verde. Eu acho que o que leva a isso é o trabalho bem-feito, o respeito e o caráter da gente. E eles são muito carinhosos comigo, acho que deu muito certo esse casamento. E deu certo também a receita que eu trouxe para Mancha, que é uma receita diferenciada de canto. É uma receita mais leve, uma coisa mais audível de letra e melodia. A gente tenta trabalhar muito bem o samba-enredo e é uma receita que deu certo”.
Agora, com o samba-enredo escolhido, a Mancha Verde deu mais um passo rumo ao Carnaval 2023. A escola será a terceira a se apresentar na segunda noite de desfiles.
Após o debate promovido na parte da manhã pelos pesquisadores Vinícius Natal e Mauro Cordeiro, a parte da tarde no Museu da História e Cultura Afro-Brasileira foi marcada pela roda de conversa com a presença de diversos artistas envolvidos na produção visual das escolas de samba, entre eles os carnavalescos André Rodrigues (GRES Beija-Flor de Nilópolis), Antônio Gonzaga (GRES Arranco do Engenho de Dentro), Guilherme Estevão (GRES Estação Primeira de Mangueira), João Vitor Araújo (GRES Paraíso do Tuiuti) e Winnie Nicolau (GRCESM Pimpolhos da Grande Rio).
Fotos: Luan Costa/Site CARNAVALESCO
Durante a conversa, o racismo foi o tema mais pertinente, os artistas ouvidos contaram suas vivências, os percalços que enfrentaram até serem reconhecidos, os medos e os desafios que ainda enfrentam.
Essa foi a primeira roda de conversas voltada para esse intuito, reunir pessoas negras que são importantes dentro de uma escola de samba para debater assuntos importantes e que por muitas vezes são silenciados. O auditório do Muhcab estava cheio e em algumas falas foi possível observar o público emocionado.
“É a primeira vez que cinco artistas pretos conversam com pessoas pretas sobre carnaval, que no próximo ano tenhamos mais profissionais aqui. Eu não sou sozinho e não quero ser sozinho, eu quero amigos ao meu lado, quero mais pretos em locais como esse, o importante é que o preto esteja. O carnaval é uma roda que gira, é importante que se renove, tem muita gente da nossa cor querendo uma oportunidade e não consegue”, disse João Vitor Araújo.
“Essa é a mesa mais potente que eu já participei, quem me conhece sabe o quanto raça e classe são assuntos importantes pra mim, estar aqui hoje significa muita coisa e espero que se repita muitas vezes”, pontuou André Rodrigues.
A presença de artistas visuais negros no carnaval ainda é muito escassa, a presença de uma mulher negra é quase mula, a Winnie Nicolau é hoje a única artista no comando de uma escola de samba, pra ela é uma conquista muito grande, mas também uma responsabilidade enorme, afinal, ser quem ela é por si só já atrai uma cobrança excessiva.
“O samba pra mim é uma filosofia de vida, eu ganho dinheiro com isso, eu fiz amigos no samba e hoje eu não imagino a minha vida longe dele. Eu procuro a excelência principalmente por eu ser uma mulher preta, temos sempre que buscar isso, sei que sempre serei muito mais cobrada que outras pessoas, então saber que posso ser espelho para muitas é o que motiva a continuar”, disse a carnavalesca.
Durante o debate foi perguntado aos carnavalescos em que momento de suas vidas eles se reconheceram como artistas, a resposta foi unânime: estão o tempo todo tendo que se auto afirmar. É como se eles precisassem mostrar diariamente que são capazes e merecedores de estarem ocupando um lugar de destaque.
“No meu caso eu não recusei convites pelo racismo, mas o medo de aceitar um convite ele existe, você começa a duvidar de você mesmo, o sistema faz com que você duvide da sua capacidade, você sempre acha que tudo é ruim, não existe a tranquilidade de dormir e pensar que vai dar certo. São comparações que você acaba observando, parece inofensivo, mas não é, existe maldade, o racismo é algo que não vai acabar, mas a gente pode ter dias bons como aqui, encontros como esse”, disse João Vitor Araújo.
“Meu medo é justamente por ser uma mulher preta, eu tive negações em ser carnavalesca porque eu tinha medo, fiquei com muito receio de criar novos dilemas, tudo seria posto em cheque, mexe com sua autoestima, com a maneira que você se posiciona, mas ao mesmo tempo que tem o medo, fica aquela coisa de que se chamaram, é porque sou boa, mas o racismo faz isso, ele faz a gente se sabotar”, disse Winnie.
“Eu preciso passar dentro do barracão, ou então mostrar na internet de que eu tenho certeza absoluta do que estou fazendo, no nosso caso é três vezes pior porque as pessoas sempre duvidam. O meu papel como carnavalesco é ser um agitador, eu quero promover a comunidade, dentro do ponto de vista racial é importante a gente puxar os nossos, dar espaço para essas vozes, para que a gente continue incomodando”, contou Gui Estevão.