Por Antonio Junior. Fotos: Allan Duffes e Magaiver Fernandes
Fechando o carnaval 2019, a Mocidade Independente de Padre Miguel certamente colocou uma pulguinha atrás da orelha de quem está na disputa pelo título. Ainda que tenha apresentado um conjunto alegórico com algumas falhas de acabamento, a Verde e Branca da Zona Oeste fez um desfile que mostrou a força de seus quesitos “de chão”, com o samba rendendo muito bem e mostrando competência em outros quesitos, como: comissão de frente, mestre-sala e porta-bandeira e bateria da agremiação.
Comissão de Frente
Coreografada por Saulo Finelon e Jorge Teixeira, a comissão de frente encenou uma viagem de reencontro com o passado da própria história. Mais uma vez, o trabalho da dupla foi bastante satisfatório, arrancando muitos aplausos dos espectadores. O único momento de desencontro na apresentação do módulo 2, se deu quando o componente que representava o macaco demorou para sair da estrutura do elemento alegórico e acabou encerrando a apresentação distante fisicamente dos outros componentes que representavam a evolução da espécie humana.
Mestre-sala e Porta-bandeira
O casal da Estrela Guia de Padre Miguel fez apresentações tecnicamente perfeitas em todos os módulos de julgamento. A fantasia mesclou as cores lilás e preto, o que contrastou muito bem com a luz do dia que acompanhou o desfile da agremiação. O casal mesclou o bailado tradicional com uma coreografia com passos ousados e arrancou muitos aplausos pela Avenida, especialmente no módulo dois.
Harmonia
O canto muito forte e contínuo marcou o desfile da Verde e Branca de Padre Miguel. Mesmo com um primeiro setor mais “pesado”, os componentes da Mocidade entoaram de forma muito satisfatória o hino da escola. O trabalho da harmonia fez com que o samba rendesse bastante, embalados pelas bossas da Não Existe Mais Quente e do carro de som da agremiação.
Samba-enredo
Rendimento extremamente satisfatório da obra da Mocidade Independente. Bem interpretado por Wander Pires, a obra confirmou as expectativas do pré-carnaval e embalou o desfile da Verde e Branca da Zona Oeste. As bossas da bateria também colaboraram para esse desempenho.
Evolução
A Mocidade fez um desfile regular no quesito. O andamento foi bastante envolvente, mas a agremiação acabou ficando duas passadas de samba parada na Avenida aguardando a entrada da última alegoria, que demorou mais que o esperado. De resto, rendimento bem regular do quesito.
Fantasias
Diferente das alegorias, as fantasias mostraram acabamento mais qualificado e tiveram uma leitura mais fácil. Destaque para o último setor da escola que traduziu com fidelidade os carnavais inesquecíveis da agremiação. O terceiro setor da agremiação também se destacou positivamente, pela qualidade das indumentárias dos componentes.
Alegorias
Quesito que deixou a desejar no desfile da Mocidade. Todas as alegorias da agremiação apresentaram algum tipo de problema de acabamento. A concepção do último carro também deixou a desejar, mas vale destacar a segunda alegoria da agremiação, repetindo os tons da fantasia do primeiro casal de mestre-sala e porta-bandeira e dando um efeito visual bastante interessante.
Bateria
Um desempenho bastante satisfatório do quesito, que deu um molho bem especial ao desfile da Verde e Branca da Zona Oeste. A bossa na segunda parte do samba, em ritmo mais pagodeado, levantou o público presente nas arquibancadas e contribuiu positivamente para o desempenho do samba-enredo da agremiação na Avenida.

Quinta escola a desfilar, nesta segunda-feira, o Paraíso do Tuiuti investiu em tema crítico, ácido e de exaltação ao nordeste brasileiro, com o enredo “O Salvador da Pátria” do carnavalesco Jack Vasconcelos.
No topo do carro, uma imagem lembrava a Capela de São Pedro dos Pescadores, localizada na Avenida Beira-Mar, em Fortaleza. Completavam a cenografia da alegoria objetos que remetiam a seres do mar, botos e pescadores. O carro ainda contava com atrações como os Casais Romeiros; os Pescadores e devotos de São Pedro; e o Poema a São Pedro.
A União da Ilha do Governador deixou a Marquês de Sapucaí nos braços do povo depois de um desfile absolutamente arrebatador. Com a melhor apresentação desde a última vez que voltou às Campeãs, em 2014, a escola arrepiou o Sambódromo com a comissão de frente, que trazia o Padre Cícero voando. O trabalho de plástico de Severo Luzardo foi o melhor de sua carreira no Grupo Especial. Com tantas virtudes a escola, antes apontada como candidata ao rebaixamento, agora pode sonhar com uma vaga no Sábado das Campeãs. A Ilha concluiu seu desfile em 73 minutos e apresentou o enredo ‘A peleja poética de Rachel e Alencar no avarandado do céu’.
A União da Ilha do Governador abriu seu desfile transformando a Marquês de Sapucaí em um rio cearense onde vai desaguava o verdadeiro “milagre da fé”. Romeiros, pescadores e sertanejos – personagens retratados tanto por José de Alencar como por Rachel de Queiroz em sua vasta obra literária – fizeram um cortejo na avenida em procissão.
Todos clamavam por uma salvação dos céus. Ao ver a tristeza de sua gente sofrida e guerreira, o milagreiro Padim Ciço chegava à Marquês de Sapucaí, concedendo sua bênção e promovendo verdadeiros milagres. A água voltou a banhar o solo rachado do sertão. Surgiram flores, borboletas e pássaros que coloriram com matiz a aridez do sertão. O milagre fez renovar a fé. A arrebatadora apresentação viveu seu ápice quando integrante vivendo o padre levanta voo na avenida. Sem dúvida a comissão mais aplaudida da avenida.
A fantasia do casal remetia a uma das histórias mais emblemáticas de Jericoacoara, paraíso litorâneo cearense e uma das paisagens desenhadas nas “telas de reminiscências” de José de Alencar descritas no livro “O nosso cancioneiro”. A vestimenta do casal reproduziu a lenda da Princesa Encantada de Jericoacoara. Dandara Ventapane vestiu o figurino que aproximava sua imagem à iconografia da donzela metade mulher, metade serpente. Phelipe Lemos, um príncipe medieval que remetia à própria história de Jericoacoara.A apresentação da dupla foi arrebatadora, carregada de garra e um entrosamento que os coloca entre os melhores casais do Grupo Especial. Phelipe deslizou pela pista, acompanhando uma Dandara estonteante, sempre com o sorriso no rosto. Uma atuação de almanaque.
Desempenho muito bom da União da Ilha no quesito. Mesmo com fantasias grandes e volumosas a escola cantou forte o samba, do início ao fim. No trecho final do desfile o cansaço não abateu ninguém e o canto se mantinha forte como no início do desfile.
O bom rendimento do samba deve-se a mais uma segura condução de Ito Melodia, o maior intérprete da história da União da Ilha. O samba derreteu as críticas sofridas servindo com perfeição no impulsionamento do desfile.
Mas o quesito não enfrentou outros problemas graves. As alas passaram soltas. A movimentação de entrada no recuo foi perfeita, com os passistas passando por dentro da bateria. A escola conseguiu finalizar seu desfile dois minutos abaixo do tempo máximo permitido.
A Ilha iniciou a contagem do enredo em um setor com lendas e mistérios do Ceará, com as apresentações de casal e comissão de frente. Além de arrebatadoras, as apresentações tiveram uma leitura para o público compreender. No segundo setor, Severo Luzardo trouxe os aspectos da culinária cearense, com alas muito bem claras. A terceira parte do desfile trazia as festas populares do estado. No quarto setor as belezas naturais do estado e na finalização do desfile a moda cearense e a mensagem de que as novas tecnologias podem caminhar ao lado da modernidade. Setores muito bem defendidos e um enredo de fácil assimilação.
Fantasias
Alegorias
Outros destaques
O Paraíso do Tuiuti veio para o carnaval de 2019 com a missão de superar o vice de 2018. Graças ao seu último desfile, onde impactou a todos os presentes com sua beleza plástica somada a crítica social, os holofotes desse ano se voltaram para a escola de São Cristóvão, que abordou novamente um enredo politizado. “O Salvador da Pátria” trazia a história do bode Ioiô com alusão a um certo político brasileiro “nordestino, barbudo, baixinho, de origem pobre, amado pelos humildes e por intelectuais”, como bem diz a sinopse. E ainda fazia uma crítica ao atual governante do país dizendo que o povo “iria conhecer um mito de verdade”. O bode, que viveu em Fortaleza no século passado, se tornou uma figura histórica da cultura cearense. A história conta que o protagonista e fio condutor do enredo foi eleito vereador em 1922 como forma de protesto a política local. O bode que hoje está empalhado num museu, virou um tema muito bem contado e conquistou os presentes na Marquês de Sapucaí.
Um bom desfile foi feito pela escola, mas sem a chance de credenciá-la ao título. Ainda não será esse ano que a comunidade de São Cristóvão levará o troféu. Erros pontuais em evolução e alegoria gerados pela dificuldade do carro em entrar na avenida podem fazer a escola perder décimos que farão falta. Além disso, o enredo deixou uma sensação de que a qualquer momento as cutucadas indiretas a políticos seriam mais agressivas colocando realmente o “dedo na ferida”. Porém, isso não aconteceu.
O estreante Felipe Moreira elaborou uma coreografia com passos de balé e movimentos leves. Na apresentação os políticos e coronéis vendiam a cidade num palanque de praça e em seguida sofriam represália dos moradores do lugarejo. Em meio a discussão dos políticos x população surgia um dos dançarinos vestido de bode com rodinhas nos braços e nas pernas. Ao aparecer, ele espantava os políticos larápios que iam correndo para o centro da praça. Ao subirem no tripé percebiam a fama do Ioiô e caíam um por um até o bode surgir no meio deles com a faixa presidencial. Os políticos então retornavam e retiravam a faixa empurrando o vencedor para a população que o aclamava. Durante a passagem nos módulos a comissão foi ovacionada pelos presentes e aplaudida pelos jurados nas cabines.
Trajados com fantasias nas cores do sol escaldante nordestino, elaboradas com faisões amarelos e laranjas, Marlon Flores e Danielle Nascimento executaram o bailado de forma perfeita. A porta-bandeira usou e abusou das caras e bocas e o rapaz riscou o chão com seus passos. Sob as bençãos do cisne da passarela, Vilma Nascimento, mãe de Danielle, o casal não passou por problemas nas apresentações que ainda contou o samba na ponta da língua. No trecho “O Tuiuti me representa” ambos batiam no peito como forma de declaração de amor a escola e ao momento que estão vivendo como defensores do pavilhão azul e amarelo.
A escola lançou a moda no Grupo Especial de encomendar samba e seguiu a fórmula para esse ano. Essa escolha fez com que tivessem mais tempo de ensaio e consequentemente um chão mais potente. O canto forte dos componentes deve muito a qualidade do samba-enredo e a vontade do integrante de afirmar novamente que 2018 não foi por acaso. As alas cantaram com muita gana e conquistaram o público. Nas paradinhas feitas pela bateria durante refrão principal a Sapucaí vinha abaixo cantando muito forte. Apenas no quarto módulo quatro de julgamento foi onde se percebeu uma leve queda no canto da comunidade.
Celsinho Mody e Grazzi Brasil se firmaram mais uma vez como os dois grandes acertos provenientes do carnaval paulista. O rendimento positivo da obra se deu muito pela magnífica execução dos cantores que cantam juntos pelo segundo ano consecutivo. O timbre suave dela foi somado a voz mais firme dele e resultou em um excelente desempenho. Atrelado aos cantores principais, soma-se o time de canto e cordas que os acompanhavam. E ainda a bateria Supersom de mestre Ricardinho que ousou nas bossas sem perder o entrosamento com a equipe musical.
Tudo ocorria de maneira perfeita no desfile do Tuiuti até que a última alegoria a ser posicionada na avenida não conseguia ser alinhada de maneira perfeita. Pouco antes do primeiro módulo de julgamento um buraco de grandes proporções se formou, podendo prejudicar a escola na avaliação do quesito. Houve correria entre os empurradores de carro até conseguir alinhar o carro com perfeição. A partir daí, o desfile voltou a desenvolver sem erros no chão da escola. Apesar dos problemas a escola concluiu seu desfile com tempo de 1h14.
O enredo começou sendo contado seca nordestina. Um sertão em nas cores avermelhadas e laranjadas deram o tom no primeiro setor da escola que impactou pelo belo conjunto visual. Foi muito mais do que a história do bode e sim uma cutucada leve na atual conjuntura política brasileira. Se esperava um pouco mais a partir do que foi lido na sinopse no que se refere a apontar o dedo nas feridas abertas provenientes da corrupção, por exemplo.
As críticas mais pesadas vieram apenas em algumas alas pontuais como a 29ª que trazia um embate entre o bode da resistência, com seu punho serrado, e a coxinha ultraconservadora com armas em punho. O último carro da escola foi o grito contra o autoritarismo. Ativistas das minorias estavam presentes e entre eles havia a frase “Quem mandou matar Marielle Franco”.
Um Paraíso bem vestido passou pela avenida. O bom gosto do carnavalesco deu a escola fantasias de fácil leitura e um verdadeiro tapete visual quando visto de cima. No segundo setor a ala “Vendedores do mercado” chamava atenção pelo volume impactante. A vigésima segunda, “Mamulengo Coronel” também impactava. Em geral as fantasias eram bem acabadas e seus artefatos não caíam pela avenida.
Um enorme e impactante abre-alas mostrou aos presentes que um volumoso conjunto de alegorias estava por vir. O sertão cearense foi palco para os bichos criados em formas de xilogravuras. Destaque para o uso das cores durante as cinco alegorias. Devido a dificuldade de fazer o último carro entrar na avenida, o mesmo passou pela Sapucaí sem a parte lateral. Problemas de acabamento em alguns detalhes foram visto nessa alegoria que ainda assim foi um ponto alto devido aos seus destaques que estavam em cima. Nos fundos do carro a frase “Ninguém solta a mão de ninguém” arrancou aplausos por todos os setores.
Outros destaques