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Força, Magia e Santa Maldita Euforia, Ala dos Passistas da Portela retrata a chegada da exuberância negra à romaria em desfile que homenageia Milton Nascimento

A ala dos passistas da Portela, sob a supervisão de Nilce Fran, é um exemplo claro de como a dança vai além do entretenimento. Ela carrega consigo um significado profundo, refletindo a força ancestral dos negros, a resiliência dos passistas e a celebração da cultura afro-brasileira. O trabalho de Nilce Fran é, sem dúvida, fundamental para a construção dessa narrativa que se reflete nas coreografias e nos movimentos dos passistas. A conexão com as origens da cultura negra e a homenagem a artistas que representam esse universo tornam a ala um verdadeiro ato de resistência e afirmação cultural.

‘’Esse enredo de Milton Nascimento, ele  funcionou desde que ele foi apresentado. Nós estamos falando aqui do povo preto, do povo de luta, de um homem próspero, que lutou e que conseguiu. A proposta da Portela em 2025 é realmente fortalecer a nossa fé, fortalecer a nossa luta, mostrar essa trajetória e que como diz o samba, quem acredita na vida, não deixa de amar, só o amor constrói e que nós podemos com força, com energia positiva, espiritualidade, nós podemos’’, declara Nilce.

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No contexto da Portela, a ala é mais do que um espetáculo visual, é uma forma de exaltar a ancestralidade negra, resgatar suas origens e, ao mesmo tempo, celebrar a modernidade do samba com movimento que faz referência a uma luta contínua e transformadora.

‘’Os negros eles dançavam para expressar alegria e a dança do samba é isso. A dança do samba é um ato de amor, de expressão, de energia e força. É muito importante. Eu sou passista e coordeno há 25 anos a ala de passista da Portela, mas sempre fui passista, sambista, mulata e a energia do samba fortalece a nossa alma. E o orgulho da cultura negra nessa folia, o carnaval, os desfiles de escola de samba, nesse cenário grandioso no maior espetáculo a céu aberto do Planeta, nós somos o que queremos’’, diz a coordenadora da ala de passistas da Portela.

Nilce Fran, que é responsável pela coordenação da ala, tem se dedicado a transmitir aos passistas a importância dessa conexão com a cultura negra. Para ela, a dança vai muito além da técnica: é um resgate de uma memória histórica e um compromisso com a preservação da herança cultural dos negros no Brasil.

‘’A ala de passista na Portela se conecta com o enredo o ano todo, a gente tem uma coordenadora que faz a gente estudar sobre o enredo, faz a gente cantar o samba porque é muito bom. Nós, não só sambamos, mas também sabemos aquilo que a escola está falando e eu acho que essa conexão da escola com o enredo, do passista com o enredo vai ser muito bom para trazer o nosso título para a Madureira e o Oswaldo Cruz’’ diz João, mais conhecido como João Sorriso, passista da Portela há 6 anos

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‘’O segmento passista é de resistência que até hoje a gente luta por tanta coisa e raça também porque a gente luta bastante, a gente ensaia muitos compromissos com a Portela e eu acho que se junta mesmo, a raça com a resistência e cabe muito com o que nós viemos representar hoje com a nossa fantasia. E quando a emoção de desfilar levando a euforia, o orgulho da cultura negra na Sapucaí. A emoção é muito grande, falar de Milton tem sido muito importante e muito significativo, vai ser um desfile belíssimo, a gente vai chegar trazendo a euforia, trazendo a raça, trazendo a samba no pé e trazer esse título’’, afirma Juliana Antunes, de 32 anos, auxiliar administrativo passista da ala da Portela há 7 anos.

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A ala dos passistas prestou uma homenagem emocionante a dois ícones da cultura negra brasileira: Clementina de Jesus e Grande Otelo. Clementina, com sua voz inconfundível, é uma referência do samba e da música popular brasileira, e sua história é um exemplo de resistência no cenário musical, dominado por homens e brancos. Grande Otelo, foi um dos maiores artistas do cinema nacional, um negro talentoso que quebrou barreiras e se fez presente no imaginário popular, trazendo um protagonismo muitas vezes negado aos negros na história do Brasil.

‘’Nós estamos aqui para isso, para através de Milton Nascimento, esse gênio, esse mago da arte e da cultura. Através dele, nós estamos mostrando ao mundo essa força e como não trazer nomes como Grande Otelo, Clementina, Ivone Lara e tantos outros nomes? Eu que sou dessa geração, cresci e vi as coisas acontecerem e tenho certeza de que quando se trouxe todos esses nomes, foi para dizer que, estamos de mãos dadas, construímos essa história e vamos sempre fazer parte dela de sermos reverenciados’’, relata a coordenadora Nilce.

Os passistas, com seus passos marcantes, não apenas recriaram os ritmos e a energia do samba, mas também trouxeram para o sambódromo o espírito e a luta desses artistas. Clementina e Grande Otelo, através da homenagem na dança, se tornaram símbolos da resistência negra no palco da Portela, sendo lembrados por sua contribuição para o fortalecimento da cultura afro-brasileira.

A passista Mara Oliveira,  que desfila na escola há 6 anos e também é professora de samba, diz que ‘’é mais um grande nome, mais um ano que a gente está levando uma grande história e sempre parece que é o primeiro desfile, é sempre a mesma emoção. Eu costumo dizer que eu estou vivendo meu sonho, ainda nos tempos de hoje, apesar de ter bastante tempo de ala, eu ainda estou vivendo o meu sonho e  parece sempre que é a primeira vez’’.

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O figurino dos passistas é em referência a elementos africanos para simbolizar os corpos negros que começavam a se juntar à procissão. Palhas, búzios, contas e outros materiais fazem parte da fantasia.

A ala dos passistas da Portela, sob a liderança de Nilce Fran, segue firmemente com a missão de transmitir, através da dança, a força e a beleza da cultura negra. Eles são, em sua essência, a personificação da resistência e da celebração da negritude, honrando suas raízes e mantendo viva a chama da ancestralidade.

 

Segundo carro da Grande Rio explora a fertilidade e a potência criadora dos igapós

A Grande Rio foi a terceira escola a se apresentar na última noite de desfiles do Grupo Especial carioca, na Marquês de Sapucaí, na madrugada de terça para quarta. Parte do enredo “Pororocas Parawaras – as Águas dos meus Encantos nas Contas dos Curimbós”, a segunda alegoria, denominada “Quem é de Barro, no Igapó, é Caruana”, representou as áreas alagadas da Floresta Amazônica. O carro reverenciou a pajelança paraense, na qual o manguezal é cultuado como símbolo de vida e fertilidade, ao mesmo tempo que explorou o barro enquanto matéria-prima da cerâmica local.

“Eu sou candomblecista, então para mim essa questão da origem do barro já começa do princípio, porque minha religião acredita que nós fomos também feitos do barro. Várias culturas têm essa questão da vida através do barro, de sermos moldados, de ganharmos o sopro da vida. Para mim, é uma honra. É maravilhoso vir num carro como esse”, compartilhou o cabeleireiro Rafael Henrique Mesquita, de 40 anos, dos quais 24 desfilou na Grande Rio.

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“É um simbolismo que faz sentido, a vida vindo do barro, da água, do igapó. É uma coisa boa resgatar isso aí para o resto do país”, disse o engenheiro Charlie Souza, de 50 anos. O Carnaval de 2025 foi o décimo-quinto de Charlie na Grande Rio.

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“Nos ensaios quando eu estava entrando e eu vi subirem as bandeiras do Pará, é uma emoção que eu não sei te descrever. É algo realmente que ultrapassa a nossa consciência. É algo fantástico. Esse segundo carro também fala da cerâmica marajoara. Eu fui nascida e criada no lugar chamado Icoaraci, que tem a Feira do Paracuri, um dos maiores centros de cerâmica marajoara, artesanato marajoara do Pará. Para mim, tem um gostinho ainda mais especial”, dividiu a cirurgiã plástica Jaqueline Rodrigues, de 36 anos, em seu segundo desfile na Grande Rio.

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Em 2025, a Grande Rio contou a história de três princesas turcas que naufragaram em um rio paraense e viraram entidades cultuadas atualmente no tambor de mina, religião afro-indígena praticada no Norte. O enredo foi patrocinado pelo governo do estado do Pará no maior acordo financeiro da história do Carnaval carioca (15 milhões de reais). O governador Helder Barbalho esteve presente.

“O enredo é ótimo. É um enredo muito rico, com muita história para contar, muita riqueza, encantamento. É um enredo que dá muita liberdade para criar, imaginar. É o mais rico que tem entre as escolas aqui presentes”, afirmou Charlie.

“É um enredo que traz muito desse sincretismo religioso, essa miscigenação que a Amazônia tem. A Amazônia não é só a cultura indígena, ela é o caboclo, ela é a mistura do branco com negro, ela é a mistura do branco com o índio. O enredo traz muito disso. Essa lenda das três turcas que são encantadas por vodum e abraçadas nas águas do Pará é o sincretismo. Quem vem do Pará sabe que o Pará é cultura, Pará é riqueza, Pará é uma mistura, é uma coisa linda. O Pará dá tema de samba-enredo para o resto da vida”, enalteceu Jaqueline.

“É um enredo bem inteligente. A escola soube fazer a manipulação desse enredo, soube trazer a riqueza do enredo de uma forma bem simples e de uma forma forte. A gente está aí para ganhar, para competir realmente. A escola tá linda, tá bem explicativa”, pontuou Rafael.

Com um enredo didático e criativo, com alegorias e fantasias bem acabadas, os foliões projetaram um grande desfile, mirando na vitória.

“Todo ano é a mesma emoção: eu choro, não adianta. É minha escola de coração. É uma sensação diferente. A gente vem para dar o nome mesmo, para fazer acontecer. Por amor mesmo a escola”, declarou-se Rafael.

“A expectativa, em primeiro lugar, é que dê tudo certo; que Nossa Senhora de Nazaré abençoe Caxias, abençoe a Grande Rio; que o desfile seja maravilhoso, que ocorra tudo como tem que ocorrer; e que a Grande Rio possa trazer o campeonato para gente”, encerrou Jaqueline.

A águia da Portela: símbolo de fé, paixão e identidade no Carnaval Carioca

A Águia não é apenas o símbolo da Portela, mas uma entidade que guia, protege e inspira a comunidade portelense. Em 2025, a maior campeã do carnaval carioca homenageou o cantor e compositor Milton Nascimento, em uma procissão que celebrou a travessia da vida e a conexão entre a música e a identidade portelense. A Águia, como sempre, abriu o cortejo, levando consigo a fé, a paixão e os sonhos de milhares de componentes rumo ao “altar do sol”.

A Águia como guia espiritual

Para Carla Guedes, de 50 anos, componente da Portela, a Águia é mais do que um símbolo: é a alma portelense materializada. “A Águia mexe com o coração, com a mente, alimenta o nosso amor pela Portela. Quando a vejo, sinto esperança. Ela tem alma. O som que ela emana parece entrar pela minha boca e chegar direto ao coração”, disse ela, emocionada. Carla descreve a Águia como uma “estrela guia”, que conduz os portelenses em sua jornada rumo ao sol, representado por Milton Nascimento. “Ela nos protege, nos orienta e nos leva ao encontro do sol, que é o Milton”, concluiu.

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A força da tradição

Lucks Matheus, de 26 anos, passista da Portela há 18 anos, vê na Águia a força e a identidade da escola. “A Águia é o nosso símbolo maior. Cada detalhe dela representa a nossa força”, afirmou. Para ele, desfilar ao lado da Águia é carregar os anseios do povo portelense até o altar do sol. “É um sentimento fora do normal. Este ano, homenageamos uma pessoa viva, o que torna tudo ainda mais especial. Você sente a emoção de quem está sendo homenageado, e isso é mágico”, declarou.

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A conexão com a identidade portelense

Iaraci Gomes Bastos, de 60 anos, integrante da ala 3, reforça a ideia de que a Águia é o coração da Portela. “A Águia é tudo. É o símbolo que nos une, que nos faz vibrar”, disse ela. Iaraci destaca a conexão entre o cortejo em homenagem a Milton Nascimento e a identidade da escola. “Milton é a cara da Portela. Ele é maravilhoso, excepcional. Quem não gosta dele? Ele representa a nossa fé, a nossa criatividade”, declarou.

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A emoção de desfilar com a Águia

Roberta Sá, cantora e portelense, define a Águia como um símbolo de liberdade e garra. “O povo portelense é um povo de muita paixão, e a Águia representa isso perfeitamente”, afirmou. Para ela, homenagear Milton Nascimento em um desfile da Portela é unir duas paixões da música brasileira. “Milton é um patrimônio cultural, assim como a Portela. Juntar essas duas forças é algo histórico, que representa a fé e a criatividade do povo brasileiro”, afirmou.

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A jornada rumo ao Sol

O desfile da Portela em 2025 foi uma celebração da vida, da música e da identidade portelense. A Águia, como sempre, lidera o cortejo, guiando os componentes em sua travessia rumo ao sol. Para os portelenses, a Águia não é apenas um símbolo, mas uma presença viva que inspira, protege e conduz.

A emoção foi unânime. “É vontade de chorar, de sorrir, de gritar ‘Milton, a gente tá chegando!'”, disse Carla Guedes. “Madureira está chegando para colocar Milton no trono, para dizer que ele é o sol”, concluiu. E, enquanto a Águia sobrevoou a avenida, o coração de cada portelense bateu mais forte, celebrando a fé, a paixão e a identidade que os une.

Ala de Passistas do Paraíso do Tuiuti adota figurino agênero e celebra a inclusão no Carnaval

No Carnaval de 2025, uma das grandes inovações da escola de samba foi a criação de figurinos agêneros para sua ala de passistas. A ideia foi ousada e desafiou as normas tradicionais, ao apresentar um figurino único e sem distinções entre passistas masculinos e femininos. O conceito por trás dessa escolha não é apenas estético, mas também uma poderosa mensagem de inclusão e igualdade de gênero.

‘’Eu gostei da ideia, entra também dentro do enredo da história, creio que para te  todas as pessoas terem a consciência e mesmo não fazendo parte da bandeira, é importante apoiar e dar força a essa bandeira e as situações que infelizmente as pessoas trans passam, sobre essa parte triste, mas a gente vai estar entrando aqui na avenida com toda força de Xica Manicongo, esse encanto’’, diz o ator e passista da agremiação, Vitor Marcelo, de 21 anos.

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Para os passistas, a experiência de vestir um figurino sem gênero foi uma verdadeira quebra de paradigmas. Diversos membros da ala destacaram como a roupa trouxe não só conforto, mas também uma sensação de empoderamento, já que não havia mais a expectativa de se alinhar a um modelo de beleza ou comportamento preestabelecido.

“Me surpreendeu! É bem colorida trazendo muita diversidade, achei leve e a gente vem mostrando um colorido, mostrando o quanto Xica é colorida’’, declara Marcela, de 16 anos e componente do Paraíso do Tuiuti há 5 anos.

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Já a passista veterana, considera que o figurino agênero representa uma mudança necessária. “Eu achei ela maravilhosa, super confortável. Adorei muito as cores, estão belíssimas. Está muito linda e não tem que distinguir as coisas, está muito bonita, é o que a gente pediu’’, afirma Soraia, de 40 anos, e está de volta como passista da escola há 2 anos.

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O figurino das passistas intitulado de ‘’Caboclada’’, remete à Xica enjuremada, quando conheceu a ancestralidade indígenas e conheceu com os caboclos e caboclas a ciência das folhas sagradas, sendo idealizado para ser agênero. Em tons vibrantes de azul, amarelo, laranja e verde, é revestido de penas nos braços, miçangas no pescoço e a cabeça com flores azuis nas laterais.

O enredo da escola de samba deste ano, que aborda a liberdade de expressão, o respeito às diferenças e a luta contra os preconceitos, se encaixa perfeitamente com a ideia de um figurino agênero. O carnavalesco da escola, Marcos Souza, explica que a escolha do traje reflete o momento atual da sociedade e a necessidade de transformar a festa popular em um espaço mais inclusivo.

A escolha de um figurino agênero, sem dúvida, marca um novo capítulo na história do Carnaval. Em um momento em que questões relacionadas à identidade de gênero ganham cada vez mais relevância, a escola de samba está mostrando que é possível abraçar a diversidade e fazer com que todos se sintam parte da grande festa popular.

‘’Achei uma ideia super legal do carnavalesco. Foi uma criatividade boa dele, a qual o sexo masculino e feminino pudesse estar bem representado e ninguém se sentir menosprezado porque hoje em dia no mundo que a gente vive, a gente LGBT, a gente enfrenta muito o preconceito. Por isso eu achei uma ideia bem bacana. Eu fiquei muito feliz com o enredo porque a gente hoje em dia vive em um mundo em que muitas pessoas, na verdade se sentem discriminadas e enfrentam muitas coisas, então foi uma inovação, porque acredito que nenhuma outra escola pudesse estar fazendo nesse enredo e eu tô feliz por isso’’, finaliza Jonathan Silva, de 27 anos, passista da escola.

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Ala Rainha das Rainhas – representatividade e resistência trans no desfile da Paraíso do Tuiuti

O Paraíso do Tuiuti trouxe para a Sapucaí um desfile que dá voz e visibilidade à comunidade trans, homenageando figuras históricas como Xica Manicongo e Eloína dos Leopardos. A ala batizada de “Rainha das Rainhas” se destacou como um símbolo de resistência, representatividade e inclusão.

Composta por mulheres trans e travestis, participantes do projeto Transcidadania no Samba, iniciativa da Associação Nacional de Travestis e Transexuais (ANTRA) em parceria com o Paraíso do Tuiuti. O grupo homenageia Eloína dos Leopardos, a primeira rainha de bateria da história das escolas de samba, que desfilou à frente dos ritmistas da Beija-Flor de Nilópolis em 1976. Eloína, uma figura icônica, foi uma das primeiras a quebrar barreiras e abrir caminho para a presença de mulheres trans em posições de destaque no Carnaval.

A ala é formada por passistas, bailarinas e artistas que, além de representar a comunidade trans, carregam consigo histórias de luta, superação e orgulho. Para muitas delas, desfilar na Sapucaí é mais do que uma realização pessoal; é um ato político de visibilidade e resistência.

Vozes da Ala: experiências e significados

Mykaella Nazário, de 28 anos, artista e estudante de administração, compartilhou sua emoção ao desfilar pela primeira vez no Carnaval do Rio: “É uma honra representar a comunidade trans em um enredo que fala sobre nossa resistência e história. O Tuiuti está mostrando ao mundo que somos mais do que estereótipos, somos potência e parte fundamental da sociedade”.

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Rebeca Souza, de  34 anos, destacou a importância da homenagem a Chica Manicongo, uma figura histórica da resistência trans no Brasil: “A escola está trazendo à tona uma história que muitos desconhecem. Xica Manicongo viveu no século XVI e é um símbolo de luta. Ver isso no Carnaval é um passo enorme para a visibilidade da nossa comunidade”.

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Larissa Duarte, 36 anos, bailarina, refletiu sobre o impacto do projeto Transcidadania no Samba em sua vida: “Esse projeto mudou tudo para mim. Além de me dar a oportunidade de desfilar, me ajudou financeiramente e profissionalmente. Agora, sou uma Larissa mais confiante e preparada para ocupar outros espaços na sociedade”.

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Já Serena da Silva, de 44 anos, cabeleireira, falou sobre a evolução do reconhecimento da comunidade trans no Carnaval: “Ainda há muito a melhorar, mas vejo avanços. A Tuiuti está dando um exemplo ao abrir espaço para nós. Precisamos que outras escolas sigam esse caminho e nos permitam ocupar todos os lugares, seja na comissão de frente, nas alas ou como musas”.

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O Projeto Transcidadania no Samba: transformando vidas

O projeto Transcidadania no Samba, criado pela ANTRA em parceria com o Paraíso do Tuiuti, teve como objetivo oferecer formação em samba e dança mulheres trans e travestis, além de proporcionar bolsas de estudo e apoio financeiro. Para muitas participantes, o projeto representou uma mudança radical em suas vidas, não apenas no aspecto profissional, mas também na autoestima e no reconhecimento social.

Mykaella, Rebeca, Larissa e Serena são exemplos de como o projeto tem impactado positivamente a vida de suas participantes. Além de aprenderem técnicas de samba e dança, elas ganharam confiança para ocupar espaços que antes pareciam distantes. “O projeto me ajudou tanto profissionalmente quanto financeiramente, agora tenho essa experiência no samba, o que foi uma mudança para mim. Era uma Larissa e agora sou outra”, declarou.

 

Resistência e luta contra a opressão

A luta contra a opressão ressoa profundamente com as histórias das integrantes da Ala 28. Ao homenagear Chica Manicongo e Eloína dos Leopardos, a escola não apenas celebra o passado, mas também reforça a importância de continuar lutando por direitos e visibilidade no presente.

“O Carnaval é um espaço de alegria, mas também de denúncia e conscientização”, disse Rebeca. “Ao trazer a história das mulheres trans para a avenida, estamos mostrando que nossa luta é antiga e que merecemos respeito e igualdade”, concluiu.

O futuro da representatividade trans no carnaval

Apesar dos avanços, as integrantes da Ala  concordam que ainda há muito a ser feito para garantir a inclusão e o respeito à comunidade trans no carnaval e na sociedade como um todo. “Precisamos que mais escolas abram espaços para nós, não apenas como passistas, mas em todos os cargos e alas”, afirma Serena.

Para Larissa, as escola precisam abrir mais espaços para que as pessoas trans ocupem espaços no mundo do samba. “E se as mulheres trans e travestis ocuparem os espaços que elas quiserem? E se ela quiserem estar na ala das Baianas, na Comissão de Frente, num carro como destaque, como musa, como passista? As escolas precisam abrir mais espaços para nós”, declarou.

O Paraíso do Tuiuti, com sua Ala “Rainha das Rainhas”, está dando um passo importante nessa direção. Ao celebrar a história e a resistência trans, a escola não apenas faz história, mas também inspira outras agremiações a seguir o mesmo caminho.

A Ala “Rainha das Rainhas” do Paraíso do Tuiuti é mais do que um grupo de passistas; é um símbolo de resistência, orgulho e representatividade. Ao desfilar na Sapucaí, Mykaella, Rebeca, Larissa, Serena e tantas outras mulheres trans estão mostrando ao mundo que suas vidas importam, que suas histórias merecem ser contadas e que o Carnaval pode ser um espaço de transformação e inclusão. Como diz Mykaella: “Nós somos muito mais do que aquilo que pensam de nós. Somos parte da sociedade e estamos aqui para transicionar o mundo”.

O legado de Eloína dos Leopardos e Chica Manicongo vive na Sapucaí, e a Ala Rainha das Rainhas é a prova de que a luta por visibilidade e respeito continua, com samba no pé e muita resistência.

A Magia da Pororoca: baianas da Grande Rio celebram o encontro das águas

Compondo o segundo setor “Barreira do Mar, Raízes da Encantaria”, a Grande Rio trouxe as suas baianas com a fantasia “Jóias d’Água”, simbolizando aquelas que guardam a sabedoria ancestral do Samba e os fundamentos maiores dessa festa mítica. Segundo o professor, Cláudio Didimano, entrevistado no início da pesquisa do enredo, em março de 2024, na cidade de Belém, as entidades turcas que chegaram às praias do Grão-Pará, seguiram pela floresta amazônica adentro e se ajuremaram, em busca da cura.

Unindo as mães-baianas, guardiãs da sabedoria ancestral do samba, à simbologia da cura ajuremada, a Tricolor de Caxias apresentou uma fantasia em tons de verde-água, que se misturam ao azul-turquesa do início do enredo, representando as “águas claras”. Os adornos remetem ao enredo e à tradição das baianas, com romãs prateadas penduradas: os frutos, que simbolizam o imaginário turco, também são balangandãs na tradição da ourivesaria negra brasileira (as chamadas “joias de crioula”).

O carnavalesco Gabriel Haddad explicou que a fantasia das baianas, nada mais é do que a simbologia da pororoca.

“As baianas são as joias da água, elas vêm atrás do abre-alas, elas fazem essa transição entre Turquia, as águas salgadas e as águas doces”, disse o carnavalesco.

As baianas ficaram encantadas com a fantasia, toda cheia de brilhos e simbolizando a cura da jurema sagrada.

“Desfilar como baiana pela primeira vez é uma emoção indescritível! Estou muito feliz por representar a Grande Rio em uma fantasia tão deslumbrante, que nos transforma em verdadeiras ‘Joias d’Água’. Nossa saia, com seus tons e movimentos, parece dançar como as águas encantadas, refletindo a beleza e a ancestralidade dessa história mágica”, disse Maristela Oliveira, caxiense, motorista de ônibus de 57 anos.

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Desfilando pela Grande Rio desde a escola mirim, a estudante Beatriz do Carmo, está pela primeira vez na ala de baianas ao lado de sua avó.

“É a minha primeira vez desfilando como baiana, e a sensação é mágica! Vestir essa fantasia tão rica em detalhes me faz sentir parte desse encanto que atravessou mares e chegou até aqui. Quando giramos, parece que as águas dançam junto conosco, refletindo a história das Princesas Turcas. É uma honra representar essa tradição e viver esse momento inesquecível na Avenida”, declarou a estudante de 22 anos.

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“Este é meu primeiro ano desfilando como baiana, mas já faço parte da comunidade há três anos e sempre tive um carinho enorme pela escola. Estar aqui hoje, vestindo essa fantasia deslumbrante, é um momento muito especial para mim. A fantasia ‘Joia d’Água’ representa as três princesas turcas encantadas, que atravessaram o ‘Espelho do Encante’ e se tornaram parte das águas brasileiras. Assim como elas, nós, baianas, giramos a história, representando o mar que encontra o rio, como na Pororoca. A mistura do azul-turquesa e do verde das nossas saias reflete essa fusão mágica entre culturas e elementos da natureza. Cada detalhe da fantasia, das romãs prateadas aos bordados, carrega um significado poderoso. É emocionante sentir que estamos dando vida a essa lenda com nossa dança, trazendo a força e a beleza das águas para a avenida. Me sinto parte dessa magia, dessa joia encantada que é o mar”, disse a professora Vanessa Costa, de 44 anos.

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Na harmonia entre história, e encantaria, as baianas da Grande Rio transformaram a avenida em um verdadeiro oceano de memórias e devoção. Como guardiãs das águas e da tradição, fizeram de cada giro um elo entre passado e presente, unindo culturas e celebrando a beleza da ancestralidade.

Segundo carro da Mocidade traz a grandiosidade da galáxia para a Sapucaí

A Mocidade apresentou na noite de terça-feira o enredo “Voltando para o Futuro – Não Há Limite para Sonhar”, em um desfile futurista e reflexivo. A segunda alegoria da escola levou para a avenida o tema da exploração espacial.

“Esse carro simboliza o espaço, a lua, a primeira vez que o homem pousou na lua e tudo mais. Está muito especial. A gente vai fazer uma performance com o circo. Vai ter acrobacia, vai ter uma magia que vocês vão conferir na Sapucaí. Tem um ponto de gravidade zero, simulando a gravidade do espaço real. É um carro diferente, é uma inovação da escola trazer o circo, uma prática milenar e super tradicional, dentro desse tema de tecnologia. Esse carro promete”, disse o artista circense Jodson Brito, de 30 anos, em sua primeira vez na Mocidade.

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“Eu gostei muito da iluminação. É porque agora tá apagado, não dá para ver, mas a iluminação é linda e os detalhes, são bem acabados em todos os detalhes. Você vê a camurça e não consegue ver a conexão entre uma e outra. As crateras estão bem pintadas, as fantasias estão muito bem feitas e tem várias surpresas nele. É um carro muito bem feito e que é visualmente impactante, que mesmo quem não conhece o enredo, quando olhar vai reconhecer, vai saber o que é. É de fácil identificação. É muito interessante”, comentou a médica Ketlen Cheab, 29 anos. Sou médica. É a terceira vez que Ketlen desfila pela Mocidade.

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“Aqui é o céu, os planetas. É muito interessante porque o trabalho do Renato é muito limpo. O carro é aberto, você visualiza todo ele. É um trabalho primoroso”, elogiou Elisângela, de 54 anos, componente da Mocidade há pouco menos de 30 anos.

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O enredo da verde e branco de Padre Miguel resgatou o estilo do carnavalesco Renato Lage, que se destacou nos anos 90 com desfiles high-techs e recursos luminosos. Renato volta à escola após 23 anos afastado.

“O enredo retrata a evolução e o que se o que vem a partir dela, o bem e o mal. Se não a tecnologia for bem usada, ela pode destruir também. Esse enredo é mais em função da volta do Renato: reviver os tempos em que ele esteve na Mocidade, agora retornando e mostrando que, com a evolução do tempo, muita coisa foi destruída”, explicou Elisângela.

“O enredo nos convida a parar, olhar para si mesmo e pensar que nós estamos todos conectados, porque vem dessa ideia de que todos nós surgimos do Big Bang, da primeira estrela. Todos nós temos a mesma composição de matéria. Isso faz a gente ter uma um senso de união, que é muito presente, inclusive, na comunidade. Foi muito legal essa sacada de interligar uma coisa com a outra. Ele traz a ideia de que o universo é gigante, mas que não é infinito, no sentido de que as nossas atitudes aqui na Terra, tudo que a gente faz, influenciam”, afirmou Ketlen.

Questionada para onde iria caso tivesse a oportunidade de visitar o espaço, a médica se mostrou pensativa.

“Ai, difícil, muito difícil… Se eu pudesse escolher um lugar no espaço para ir, é engraçado, eu iria para Saturno, porque tem uns aneis lindos, tem as nebulosas. É muito bonito e é um dos maiores planetas que a gente tem no nosso sistema solar”, respondeu.

Já Jodson e Elisângela optaram por uma viagem mais curta, com menor fuso-horário.

“Eu gostaria muito de conhecer a lua. porque é o corpo celeste que a gente mais tem acesso, tem contato. Por estar próxima à Terra, por ter grandes mistérios, por ser ainda pouco explorada, a gente tem essa curiosidade”, pontuou o artista circense.

“Eu tenho muita conexão com a lua. As fases da lua me atraem, me dizem muita coisa. Eu sou muito esotérica, gosto muito de lidar com esses conhecimentos. Ela me energiza. Eu gosto da lua”, finalizou Elisângela.

A Nobreza Submersa: A Lenda das Princesas no Abre-Alas da Grande Rio

A Grande Rio abriu o seu desfile submerso nas águas marítimas, em uma embarcação conduzida por três sereias.  O navio traz a narrativa alegórica de uma história que tem início em “meia viagem”, pois ela foi engolida pelas águas do mar. Trata-se de uma narrativa muito conhecida nos terreiros da Mina paraense, segundo a qual um navio de guerra turco, que levava para longe das batalhas religiosas as filhas do Sultão, as Princesas Mariana, Herondina e Jarina, desapareceu em uma tempestade. Mas elas não morreram no naufrágio, mas sim atravessaram um redemoinho mágico e se encantaram, aportando, depois, em território brasileiro.

O Abre-Alas da Grande Rio transporta o público para o mundo místico do “Espelho do Encante”, onde as fronteiras entre o real e o imaginário se confundem. O enredo, inspirado em uma história popular dos terreiros de Mina paraense, narra o desaparecimento de um navio turco, carregando as filhas do Sultão, em uma tempestade. Ao contrário do que se imagina, as Princesas não sucumbem às águas, mas são encantadas por um redemoinho mágico e chegam ao Brasil, onde se tornam parte da cultura local. A alegoria, dividida em dois chassis, materializa essa jornada etérea através de uma estrutura flutuante, repleta de espelhos e detalhes encantadores.

O carnavalesco Gabriel Haddad, falou ao CARNAVALESCO como foi a concepção de um afogamento e fundo do mar projetados em uma alegoria.

“É uma alegoria que a gente vai imaginar a Turquia se afundando, a Turquia se encantando junto com as três princesas turcas. Então é um carro com bastante água, tem balões nas alturas para parecer que tudo se afundou junto com as princesas turcas e está tudo atravessando o portal da cantaria”, explicou o carnavalesco.

As componentes que representavam a “Realeza Submersa”, simbolizando a imersão das princesas nas águas encantadas.

“Somos a representação da nobreza marinha, eu não conhecia essa história, aprendi com a escola.Esse carro é deslumbrante, uma verdadeira viagem ao fundo do mar. As três sereias à frente da embarcação criam uma atmosfera mágica, evocando a lenda das ‘Três Maresias’ com muito encanto. As lanternas que se mesclam com águas-vivas tornam tudo mais mais impressionante. Eu já esperava algo grandioso, mas esse carro superou todas as minhas expectativas”, disse a economista, Ana Paula Souza, de 45 anos, que desfila na Grade Rio desde 2012.

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No primeiro chassi, o navio turco aparece como uma entidade luminosa, conduzida por três sereias que remetem à trindade turca e à cultura amazônica. A embarcação, que mais parece uma nave mágica, flutua serenamente, entrelaçada por criaturas marinhas de formas diversas, que evocam bestiários medievais e iluminuras. O segundo chassi segue o tema da magia e do encantamento, com elementos que simulam um palácio submerso, reforçado pelas cúpulas de mosaicos e os hipocampos que dançam nas águas. O trabalho minucioso de adereçaria, coordenado por Zé Paulo Conceição, transforma cada caquinho colado em uma obra de arte, criando uma verdadeira quimera luminosa que fascina a todos na Avenida.

A analista de sistemas,  Vanessa Moraes, está pela primeira vez no abre-alas e viu a energia paraense na alegoria.

“Eu acho que o carro está com uma energia muito grande do Pará, a gente vai abrir o desfile com a navegação das princesas turcas para poder contar toda a história da Pororoca.É onde começa a viagem das três princesas que conduziram esse navio. É como se estivéssemos dentro de um palácio submerso um conto de fadas aquático. A riqueza nos detalhes, com o trabalho manual de colagem de cada caquinho, mostra o quanto foi feito com dedicação. Fiquei sem palavras ao ver a fantasia, me surpreendeu de uma maneira linda!”, disse Vanessa, de 42 anos.

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“Esse carro está impressionante, não só pelo capricho no trabalho manual, mas também pelos movimentos que remetem ao fundo do mar. A alegoria transmite perfeitamente a mistura entre o mágico e o real, e me sinto honrada por representar a nobreza turca que se encantou e se perdeu nas profundezas das águas. Cada detalhe foi pensado para nos transportar para esse universo do encantamento e a beleza se misturam de forma única”, contou a professora Lia Silva, de 33 anos, que desfila há 5 anos pela escola.

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A alegoria misturou elementos culturais da Turquia e da Amazônia, representando a travessia das princesas em uma embarcação mágica. O carro apresentou criaturas marinhas e palácios submersos, criando um enredo visual que celebra o folclore e a mitologia. A narrativa é transportada de forma encantadora, desafiando o tempo e o espaço.

Carnaval da Tuiuti homenageia mulheres trans e travestis históricas em desfile emocionante

O Carnaval do Rio de Janeiro, conhecido mundialmente por sua grandiosidade e diversidade, foi palco de um momento histórico este ano. O Paraíso do Tuiuti trouxe para a avenida uma homenagem que celebrou a resistência e a luta de 28 mulheres trans e travestis que marcaram a história do Brasil e do mundo. O desfile, além de uma festa, foi uma aula de respeito, diversidade e visibilidade para a comunidade LGBTQIA+.

Em uma homenagem que une ancestralidade africana e luta contemporânea, a ala “NGangas Ancestravas” celebrou a ancestralidade da primeira travesti não originária do Brasil. Em um tributo à resistência, a fantasia homenageou 28 mulheres trans e travestis que fizeram de suas vidas uma bandeira de guerra. Figuras como Brenda Lee, Dandara Ketley e Gisberta Salce foram homenageadas pela suas lutas por igualdade e respeito no figurino que mesclou as cores da bandeira do movimento trans com os NGangas Africanos.

Wissone Landim, 20 anos, francês morando no Brasil, expressou seu orgulho em participar da homenagem. “É uma novidade e quero que essa novidade seja uma mensagem positiva para a sociedade. A mensagem da ala é de tolerância, algo que estamos precisando muito neste mundo que está de cabeça para baixo”, afirmou.

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Wissone destacou a importância de trazer à tona histórias que muitas vezes são ignoradas. “Muitas dessas mulheres tiveram seus feitos apagados por não corresponderem ao padrão da sociedade. Precisamos mudar essa visão”, declarou.

Ralph Duccini, 32 anos, componente da ala, compartilhou sua emoção ao representar uma fantasia que homenageia essas mulheres. “Como pessoa transmasculina, me sinto honrado em representar essa parte da nossa história. É importante lembrar aquelas que vieram antes de nós e que foram assassinadas, mas que deixaram um legado de luta e resistência”, disse Ralph. Ele destacou a importância de figuras como Brenda Lee e Dandara, estampadas na fantasia da ala, que inspiram pela coragem e pela luta por direitos básicos.

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Sayoan Príncipe, de 33 anos, ressaltou a importância da homenagem para sua existência como homem trans. “Essa homenagem significa minha existência. As mulheres trans sempre estiveram à frente na luta, e sem elas, não estaríamos onde estamos hoje. Esse desfile é um fato histórico”, afirmou. Sayoan destacou a importância de personalidades como Dani Balbi e Giovana Baby, que lutam pelos direitos da comunidade trans.

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Aloísio Costa, de 31 anos, que desfilou pela primeira vez na Sapucaí, falou sobre a importância de dar voz a essas histórias. “Essas pessoas existem, têm nome, força e rosto. Passar pela avenida com esse tema é algo histórico, é dar voz a quem sempre foi silenciado”, disse ele. Aloísio acredita que a sociedade precisa ser mais empática e entender que as pessoas trans são seres humanos como qualquer outro, com necessidades e direitos.

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Para Daniel Hassen, de 26 anos, o desfile do Tuiutí pede respeito à comunidade trans. “O Carnaval é uma festa conhecida mundialmente, e trazer esse tema para a avenida é uma forma de mostrar para o mundo que precisamos de mais respeito e compreensão”, afirmou Daniel. Ele ressaltou que a luta por direitos e visibilidade deve continuar além do Carnaval.

O desfile da Tuiuti foi mais do que uma celebração; foi um ato político e educativo. Ao homenagear mulheres trans e travestis que foram apagadas pela história, a escola de samba trouxe à tona a importância de reconhecer e valorizar a diversidade. Em um mundo onde a intolerância ainda é uma realidade, o Carnaval da Tuiuti mostrou que a luta por respeito e igualdade deve ser constante e coletiva.

A mensagem do desfile ecoou além da avenida: é preciso olhar para o passado para construir um futuro mais justo e inclusivo. As histórias dessas 28 mulheres, agora celebradas, servem de inspiração para continuar lutando por um mundo onde todas as pessoas, independentemente de sua identidade de gênero, possam viver com dignidade e respeito.

O Traviarcado Brilha na Avenida: Paraíso do Tuiuti Exalta Acolhimento e Inclusão em Carro Alegórico Histórico que homenageia em vida mulheres trans e travestis da sociedade brasileira

O Paraíso do Tuiuti promete um dos momentos mais marcantes do Carnaval deste ano com a sua quinta alegoria que celebra o acolhimento, a inclusão e a força do Traviarcado, um termo que simboliza o empoderamento das pessoas trans e travestis na sociedade brasileira. No centro dessa grandiosa alegoria, estarão 29 personalidades trans e travestis de diferentes gerações e áreas de atuação, representando a resistência, a arte, a política, a cultura e o ativismo LGBTQIAPN+.

O carro, que trará uma cenografia imponente inspirada em templos de acolhimento e resistência, será adornado com elementos simbólicos como asas douradas, espelhos gigantes e um grande abraço esculpido, representando a proteção e o amparo da comunidade LGBTQIAPN+. A alegoria reflete a importância da inclusão e da valorização de corpos historicamente marginalizados no Brasil.

‘’Estar aqui hoje é sem dúvidas o melhor momento de uma reparação histórica brasileira. O Brasil é um país que mais assassina a população de travestis e transexuais, mas ao mesmo tempo é o que mais consome a pornografia trans, esse enredo se faz muito necessário, fazer esse momento de visibilidade desse corpo transvestigênero, nesse espaço, que é a maior festa do mundo e que vai estar aí colocando em volta a população de travestis que vive na esquina, que vive na rua e que não tem escolaridade, que não tem empregabilidade e que não tem o nome garantido. Estaremos todas travestis, a maioria assim vários estados, são 28 traviarcas do movimento trans no Brasil que serão homenageadas em vidas. A gente tem o costume de homenageá-las mortas e nesse momento a importância para mim é dizer que eu estou viva para ver uma escola falar sobre a população travesti e transgênero no Brasil’’, declara Mara Cunha, Diretora executiva do grupo conexão G, uma organização que trabalha com a população LGBT de favelas.

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Entre as homenageadas, nomes como Isa Silva, estilista brasileira e Monique Reis, a primeira mulher trans a fundar e presidir uma escola de samba no Brasil, a Imperatriz do Morro de Taubaté, primeira jornalista a fazer a cobertura de um carnaval e a primeira historiadora chefe do Jornal do Brasil.

Para Isa Silva, é muito importante estar nesse lugar de destaque em um desfile que faça sobre Xica Manicongo. ‘’O Brasil é o país que mais mata pessoas trans e quando o Tuiuti traz isso para o carnaval está entrando na televisão das pessoas, onde minha avó assistia, onde todas as pessoas assistem e apresentam para a família brasileira quem somos, as nossas travestis. Isso é muito importante, a gente está entrando pela porta da frente na casa das pessoas’’, relata a estilista.

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Isa diz estar tão honrada com o convite e muito feliz de estar com outras mulheres nessa alegoria, como cantoras, atrizes, advogadas e ativistas.

Já Monique Reis se emociona ao falar sobre o significado do desfile ‘Minha vida é carnaval, amo carnaval, nunca imaginei estar aqui sendo homenageada, já me imaginei de estar aqui musa, mas sendo homenageada é algo que superou todas as expectativas e eu espero que o traviarcado agora mostre sua força e seja igual a repartição pública, toda escola de samba que tiver uma travesti que coloque uma foto do Jaque no quadro porque ele merece. Estar aqui é o resultado de uma vida. Em 1994, eu estava na minha casa com a minha avó, eu vi a Imperatriz Leopoldinense com os leques do Fábio de Melo e eu decidi amar o carnaval, fundei a escola chamada Imperatriz do Morro, que é a filha da Imperatriz Leopoldinense e já fiz muita coisa, dediquei minha vida por isso. Viva  Jaque, viva a Tuiuti, viva o traviarcado e eu sou travesti’’, declara a jornalista.

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As fantasias foram desenhadas para refletir a diversidade e a grandiosidade dessas personalidades. Cada uma delas usará figurinos inspirados em divindades e realeza que tem a ver com a origem de Xica Manicongo. ‘’Esse último carro foge um pouco do restante da história da escola para partir mais para a atualidade de realeza e vem as mulheres,  mulheres trans, travestis que são importantes para comunidade no Brasil. Ele tira um pouco dessa característica de carnavalesco e coloca mais como realeza com essa despegada mais colorida e com a pegada e representação de cada mulher trans que está vestindo ele’’, relata Samira Fiori, aderecista da escola.

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A alegoria retrata uma Xica Manicongo estilizada com uma estética ‘’queer’’ em tons de rosa assentada na frente do movimento traviarcal, onde todas estão super coloridas como se fossem um arco-íris.

O Paraíso do Tuiuti, que já tem tradição em enredos politizados e sociais, escreve mais um capítulo importante no Carnaval carioca. O carro do acolhimento e da inclusão não será apenas uma alegoria desfilando na Sapucaí, mas um símbolo de luta, orgulho e pertencimento.