O economista José Rubens Damas Garlipp escreveu o artigo “A Virulência de um Capitalismo Comórbido”, em maio de 2020, e o que chama atenção no excelente texto de Garlipp são os dados que o economista apresenta sobre o enfraquecimento da economia mundial, nesses tempos de Covid-19. Muito mais do que isso, Garlipp é um crítico visceral do capitalismo que cambaleia, segundo ele, sem a mínima perspectiva de dias melhores.

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Os números superlativos mostrados pelo economista dão conta de uma contração na economia, diminuição drástica na produção e nas palavras dele, (…) “uma ruptura das cadeias globais de valor para uma contração, historicamente sem precedentes” (Garlipp, 2020). Com efeito, atingirá as economias periféricas e provocará elevação substancial do desemprego, pobreza e miséria, assevera Garlipp.

Os economistas do mundo inteiro ou pelo menos 90 deles, dos 189 países membros do Fundo Monetário Internacional (FMI), não conseguem achar outra saída, senão, suplicar financiamento de emergência para responderem à economia. O aniquilamento da riqueza mundial é iminente e a pobreza e miséria, baterão à porta de qualquer um do povo e em qualquer lugar. Como estamos no planeta Terra, há sempre o outro lado e merece também ser apresentado. Garlipp nos acode mais uma vez em indicar o Relatório da Oxfam, que aponta uma desigualdade global nunca observada antes. Com efeito, os bilionários no mundo dobraram na última década. Os 2.153 bilionários do mundo têm mais (…) riqueza do que 4,6 bilhões de pessoas, ou cerca de 60% da população mundial (Garlipp 2020).

No Brasil, o desemprego, ou melhor, os sem trabalho, extrapolaram os números e as medições econômicas. O Banco Mundial aponta que, no Brasil, entre 2014 e 2018, a população que sobrevive em condição de miséria cresceu 67%. Não se pode negar o pífio atendimento dos governos no combate ao vírus e na falta de políticas de austeridade, com relação à economia. Infelizmente, as universidades do mundo inteiro não lecionaram cursos de economia em tempo de guerra. De fato, o mundo está sob ataque, estamos em guerra e, por ora, o cardápio de opções para atenuar o desastre econômico do planeta não foi entregue à população do mundo.

Deixando o pessimismo de lado, observamos alguns países resolvendo com mais celeridade que outros, o problema do vírus e de suas economias. A Alemanha, a Inglaterra e até a França incrementaram políticas severas no combate ao vírus e ajustam concomitantemente suas economias. Com efeito, esses países, mesmo que atacados pelo vírus e combalidos no momento, estabilizarão no futuro, pela robustez de suas economias trabalhadas com rigor no passado do pós guerra mundial. Essa não é uma visão apenas econômica, mas sim uma constatação histórica.

Ao se voltar para a História, assistimos que todas as mudanças sociais do planeta tiveram o trabalho como alavancador dos sistemas, assim aconteceram revoluções, ditaduras nasceram sob a égide do trabalho. O trabalho forçou a criação de partidos políticos, discursos inflamados e forma de comunicação de governantes. Haja vista, o bordão “trabalhadores do meu Brasil”. Enfim, não é preciso ser um proeminente economista como Celso Furtado ou  José R. D. Garlipp, para entender o quanto o trabalho pode significar a solução para muitos problemas no conjunto de medidas de austeridade, das quais os países precisarão adotar, como meta principal, sem dúvida, depois do combate sistemático do novo Coronavírus.

Considerando que o Brasil esteja resolvendo, mesmo que paulatinamente, a vacinação da sua população, a criatividade deve voltar a reinar nas mentes da sociedade, principalmente nas cabeças brilhantes da população do Mundo do Samba, com a finalidade de buscar alternativas de ajudar o país a voltar a crescer, em especial o Rio de Janeiro, estado que originou o maior espetáculo do planeta com suas Escolas de Samba.

Com efeito, o próprio governo do estado, já deu demonstrações de apoio incondicional ao Carnaval ao buscar possibilidades de romper com a inércia econômica, causada pela pandemia, ao solicitar o Fundo Estadual de Cultura, ajuda financeira para manter o Carnaval e principalmente as Escolas de Samba, totalmente combalidas, sem a realização do Carnaval. Este apoio, ainda que pequeno, não pode ser entendido como apenas financeiro. As Escolas de Samba reconheceram no dia 17 de fevereiro de 2021, a atenção e zelo por parte do governo estadual, motivado pela Secretaria de Estado de Cultura e Economia Criativa, em investir confiança, em ajudar soerguer o segmento que há muitos anos tem sido parceiro no desenvolvimento econômico do estado do Rio de Janeiro.

O próprio governador Cláudio Castro foi anfitrião das autoridades do legislativo nacional, estadual e representantes das lideranças de Carnaval do estado do Rio de Janeiro. Este relato serve apenas para noticiar uma realidade atual, diferente da escondida no passado, de que o Samba já foi duramente perseguido em outros tempos, até nomeado como “vadiagem” pela polícia da época; na ação do indivíduo batucar Samba nas ruas do Rio de Janeiro.

Na atualidade, o segmento do Samba movimenta bilhões de reais para os estados que trazem políticas públicas semelhantes as do Rio de Janeiro. Segundo o Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (FGV IBRE), há números robustos sobre o que o Rio de Janeiro perde no cancelamento involuntário do Carnaval.

São R$ 5,5 bilhões de reais em 2021, ou para o linguajar do Turismo, “um bilhão de dólares”. Os economistas e pesquisadores do FGV IBRE Cláudio Considera e Juliana Trece destacam 1,4% do PIB fluminense, fazendo referência a outros artigos e cálculos do pesquisador-licenciado do FGV IBRE e atualmente subsecretário municipal de desenvolvimento econômico e inovação do Rio, Marcel Balassiano. O que se pretende com esses números? Destacar a importância do segmento do Carnaval, que move um universo de pessoas muito especiais, artistas absolutamente criativos da indústria criativa cultural do Carnaval, infelizmente dotada de resultados pouco divulgados ou mesmo, menos estudados, dos quais ajudariam a indicar a necessidade de investimentos significativos para o setor.

O Carnaval não é apenas uma festa, leiam por favor, o artigo “Carnaval e seus Artífices – Os trabalhadores dos bastidores”, publicado aqui no site CARNAVALESCO. Para o brasileiro inventor da multicultural e laborativa Escola de Samba, o Carnaval nunca foi apenas a maior festa cultural popular do Brasil. Ou para o antropólogo Roberto DaMatta, o Carnaval é visto como uma viagem antropológica do brasileiro, que prova sua individualidade e seus gestos, instituindo e constituindo o nosso próprio coração (DaMatta, 1978). O carnaval está, portanto, junto daquelas instituições perpétuas que nos permitem sentir (mais do que abstratamente conceber) nossa própria continuidade como grupo (Roberto DaMatta).

O Turismo e es estatísticas que o digam, assim como os superlotados hotéis, albergues, pousadas, restaurantes, casas noturnas, a presença dos transportes alternativos, agências de viagens promovendo passeios, enfim, um sortimento de atividades ainda não superado, por qualquer outro evento nas cidades do país.

Se o étmo da palavra trabalho está diretamente ligado a “tortura”, para o fluminense principalmente, precursor da Escola de Samba, está ligado a um inesgotável ciclo virtuoso de possibilidades laborativas. Os números são assegurados pelos economistas e suas agências de pesquisa, apresentam crescentes demonstrativos de que o caminho já foi traçado.

O Carnaval não beneficia tão somente aos seus realizadores, governos e suas receitas, mas sim a toda população da cidade que o abriga. O Carnaval e sua formação de Blocos, Bandas, Bois Pintadinhos, Bois Malhadinhos, Maculelês, Jongos, Comunidades Quilombolas e as infinitamente belas Escolas de Samba, são o legado da historiografia do Brasil.

Para a divulgação desse universo sofisticado de trabalho, estão as emissoras de TV, Blogs, Sites, jornais impressos e virtuais, como o site CARNAVALESCO. Esses veículos de comunicação não medem esforços de superarem a crise instaurada, com a presença da pandemia e não arredam pé, da quase missão de apresentar ao mundo esses espetáculos de rara beleza, sofisticação, infinita criatividade e muito, muito trabalho.

O otimismo para a realização do Carnaval em 2022 deve estar na mente de cada um de nós que ama e entende o que ele representa para a economia. A pandemia atingiu todos os setores da economia e em todo o mundo, isso já se sabe, no entanto outras atividades renasceram das cinzas da pandemia. O universo do Carnaval na Cidade do Rio de Janeiro sofreu com a presença inútil do ex-prefeito Marcelo Crivella. Ainda não se pode mensurar o que foi pior para o setor, mas é melhor deixar o passado no passado. Os nossos familiares e amigos lamentavelmente padeceram e pereceram sob a vontade do Senhor Deus. No entanto, nada disso pode abalar a necessidade de se olhar para o futuro, ainda que tivemos momentos ruins no passado. Nós ainda estamos vivos!

A História nos acuda, ao revelar os tantos momentos de infelicidade superados pela vontade e força do ser humano. Religiosos ou não, crentes a Deus ou não, pouco importa neste momento. O fato é que vamos superar esta pandemia, e trabalhar muito. Com efeito, nos parece o melhor caminho.

A indústria do Carnaval deve ser mais entendida, pela população, para que não paire dúvidas sobre sua disponibilidade. Está pronta, em cada comunidade, desenvolvida na cabeça inventiva do brasileiro; são empregos, qualificação, capacitação, trabalho e renda, respaldados pelos 90 anos de nascimento da Escola de Samba.

Há no seio da sociedade, algumas pessoas ainda renitentes, quanto a presença do Carnaval, sobretudo as empresas Escolas de Samba. Não se deve influenciar-se pelos ditames e interesses escusos de pessoas como o negacionista ex-prefeito Crivella, que decidiu em meio ao seu mandato, preterir as Escolas de Samba. Não gostar de Samba, não faz de você um mal sujeito – na música, valeu a licença poética. Sem dúvida, há de se respeitar o seu gosto musical e cultural, entretanto, ao se referir a inegável indústria Escola de Samba, as pessoas que não as aceitam, devem raciocinar sobre a posição econômica que possui a estrutura de uma Escola de Samba.

Concluo que a intenção desse humilde artigo é trazer à luz as Escolas de Samba de todo estado do Rio de Janeiro. Não há um número exato, no entanto, mais de 176 agremiações, que merecem total apoio da sociedade, investimento dos governos, atenção das mídias, parcerias com a iniciativa privada e carinho de cada um de nós, que defende e tenta guardar nossa cultura, acima de tudo, a economia criativa do Carnaval, envolvida em todos os momentos. Muito mais do que isso, devem ser entendidas como mais uma fonte de possibilidades para a futura recuperação da economia das cidades do Rio de Janeiro. Há de se proteger essa empresa, é nosso patrimônio, é rentável, autossustentável, atrai receitas para as cidades e nos faz feliz.

Sérgio Almeida Firmino – Assessor Especial de Economia Criativa do Carnaval da SECEC – Secretaria de Estado de Cultura e Economia Criativa de Janeiro. Diretor Conselheiro do Instituto Cultural Cravo Albin. Conselheiro Estadual para a Política de Integração da Pessoa Portadora de Deficiência. Conselheiro do CEIPARM- Comitê Estadual Intersetorial de Políticas de Atenção aos Refugiados e Migrantes. Presidente da FICCCERJ – Federação da Indústria Criativa Cultural do Carnaval do Estado do Rio de Janeiro.
Graduando em História pela Universidade Veiga de Almeida

Referências bibliográficas:
Artigo: “A Virulência de um Capitalismo Comórbido”, José Rubens Damas Garlipp.
Artigo: “Carnaval Também é Desenvolvimento Econômico”, publicado no site Carnavalesco, por Chicão Bulhões – Secretário Municipal de Desenvolvimento Econômico, Inovação e Simplificação do Rio – e o economista Marcel Balassiano – Subsecretário Municipal de Desenvolvimento Econômico e Inovação.
DaMatta, Roberto: “Carnavais, Malandros e Heróis-Para uma Sociologia do Domínio Brasileiro”. Niterói – 1978 – Rocco Digital

Agradecimentos:
Agradeço ao economista Marcel Grillo Balassiano – Subsecretário Municipal de Desenvolvimento Econômico e Inovação do Rio, pelas nossas excelentes conversas, entrevistas e discussões sobre o Carnaval no viés do desenvolvimento econômico.
Agradeço a Secretária Danielle Barros, da SECEC – Secretaria de Estado de Cultura e Economia Criativa, pelo apoio incondicional ao Carnaval do estado do Rio de Janeiro.

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