Ao apresentar o enredo “Lonã Ifá Lukumí” para o Carnaval 2026, o Paraíso do Tuiuti confirma sua posição como uma das escolas mais engajadas em narrativas de matriz africana no Grupo Especial. Sob a assinatura do carnavalesco Jack Vasconcelos, a escola de São Cristóvão direciona seu olhar para Cuba, especificamente para a região de Matanzas, onde a tradição iorubá, levada por africanos escravizados, floresceu na forma do culto Lucumí.

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logo enredo tuiuti 2026

A sinopse do enredo, revelada com riqueza histórica e lirismo característico de Jack Vasconcelos, propõe um desfile que ultrapassa os limites da estética para oferecer uma experiência de fé, resistência e ancestralidade. Ao escolher abordar o sistema oracular de Ifá, o Tuiuti mergulha num campo simbólico denso, onde o destino é traçado pelos búzios, pelos signos de Ifá e pela sabedoria ancestral dos babalaôs.

A escola segue o caminho já trilhado em carnavais recentes, como nos enredos “O Salvador da Pátria” (2018) e “Xica Manicongo” (2025), apostando na construção de uma identidade própria, marcada pelo resgate histórico e pela denúncia das injustiças sociais, raciais e culturais. Em 2026, no entanto, o foco se expande além do Brasil, fazendo da diáspora africana seu grande enredo.

A escolha de figuras como Carlota Lucumí, líder de revoltas contra o regime escravocrata cubano, e Remígio Herrera (Adechina), sacerdote fundamental na estruturação do culto Lucumí em território estrangeiro, confere densidade e protagonismo a personagens muitas vezes esquecidos pela historiografia oficial. A abordagem do Tuiuti repara silêncios e reposiciona essas figuras no centro da narrativa.

Outro ponto de destaque é a relação entre o sagrado e o comunitário. A sinopse propõe o desfile como um grande ritual coletivo, onde o samba ocupa o papel do cântico litúrgico e a avenida se transforma em templo. O oráculo de Ifá, interpretado na tradição cubana, passa a ser símbolo não apenas da religiosidade afroatlântica, mas também de um destino coletivo, forjado na luta e na resistência cultural.

Visualmente, o enredo abre caminho para um universo rico em cores, formas e símbolos. A musicalidade pode flertar com os toques dos tambores batá, tão presentes nos ritos cubanos. Alegorias podem representar os cabildos, as casas-templo, os rituais de iniciação, os objetos sagrados como o obí e os idefás. É um terreno fértil para a criatividade cênica e para o impacto sensorial.

O desafio está lançado. Jack Vasconcelos é um artista experiente no campo e terá a missão de entregar um enredo que una forma e conteúdo, reverência e inovação. Com o samba-enredo já encomendado a Cláudio Russo, Gusttavo Clarão e Luiz Antônio Simas, a escola indica que quer seguir com consistência e coerência de discurso. A expectativa é por uma composição que traduza o espírito do enredo com beleza poética e fidelidade cultural.

O Tuiuti caminha, mais uma vez, na contramão da superficialidade. Aposta no enredo como motor de identidade, como espelho de um Brasil plural e de uma herança africana que transcende fronteiras. “Lonã Ifá Lukumí” não é apenas um título. É uma convocação. Uma chamada à memória, à fé e à afirmação de um povo que, mesmo arrancado de sua terra, nunca perdeu o caminho.

Em 2026, o destino da escola parece traçado: a avenida será palco de um ritual. Que os orixás estejam presentes e que o público esteja pronto para escutar o chamado dos atabaques.