Por Guilherme Ayupp, Geissa Evaristo, Diogo Cesar Sampaio. Fotos: Allan Duffes
Ter a honra de ter um samba-enredo cantado na avenida pela Portela é para poucos. Imagine ser o autor de uma obra que vai exaltar Clara Nunes no carnaval? A glória caberá aos poetas Jorge do Batuke, Valtinho Botafogo, Rogério Lobo, Beto Aquino, Claudinho Oliveira, José Carlos, Zé Miranda, D’Dousa e Araguaci. O samba foi escolhido de maneira aclamatória na grande final de samba realizada na madrugada deste sábado no sagrado terreiro de bambas, o Portelão, em Madureira. A Portela apresenta em 2019 o enredo ‘Na Madureira moderníssima, hei sempre de ouvir cantar uma sabiá’ sob o desenvolvimento de Rosa Magalhães. A Majestade do Samba será a terceira escola a desfilar na segunda-feira de carnaval pelo Grupo Especial.
Portelense intenso e apaixonado, Jorge do Batuke é um dos compositores mais frequentes nos eventos e concursos da ala de compositores da Portela. O taxista, que já chegou em algumas finais, realiza o sonho de ter um samba de sua autoria na escola que ama. A parceria faz história ao desbancar o time capitaneado por Samir Trindade, que não chegou à final, e tentava um tetracampeonato na escola. O time é todo formado por portelenses que frequentam a agremiação há muitos anos e pela primeira vez triunfam na maior campeã do carnaval.
“Eu não tenho palavras para esse momento. A ficha ainda não caiu. Imagina você está aqui, desde os três anos de idade, frequentando a escola; e hoje você é um dos compositores campeões, de um dos maiores enredos da história da escola. Realmente, a ficha não caiu. A parceria, que é nota mil, trabalhou com muita honestidade, pé no chão, respeitando os adversários. E assim, o que está acontecendo é um sonho. Hoje a minha história passa a ser documentada. Ela a passa a valer, a partir de 2019, por eu ser um dos autores do samba campeão, com a minha escola levando como hino oficial. Eu estou muito feliz. A gente está tentando a vários anos, e eu nunca imaginei que a gente venceria o da Clara Nunes. Isso aí, eu não tenho palavras”, disse Jorge do Batuke.
O compositor Valtinho Botafogo apontou o diferencial do samba campeão.
“Foram 11 anos esperando esse título. Quatro vezes finalista. Esse ano sentimos que a comunidade abraçou. Era o samba que a escola queria, o samba que a crítica inteira comentou. Conseguimos nos inspirar em Clara Nunes e fazer essa obra maravilhosa que a escola vai desfilar na Avenida. Ser campeão com o enredo mais esperado da Portela me deixa sem palavras. O samba foi feito todo na primeira pessoa como se fosse a Clara Nunes contando a história. Esse foi nosso diferencial”, disse o compositor Valtinho Botafogo.
O palco foi comandado por Zé Paulo, da Viradouro, e Grazzi Brasil, do Tuiuti. A cantora emocionou cantando toda a primeira samba em tom de lamento. A apresentação foi incontestável e arrebatadora desde os primeiros acordes. Antes mesmo da subida da bateria toda a quadra cantava a plenos pulmões a obra, a favorita para levar a vitória desde as primeiras semanas de eliminatória. Com a Tabajara do Samba acompanhando o que se viu foi uma avassaladora passagem, com importantes segmentos da Portela não se fazendo de rogados e defendendo seu samba preferido. A sensação foi de que o portelense estava deixando um claro recado: desejava que fosse o samba da parceria que representasse o enredo sobre Clara Nunes. Zé Paulo conduziu com extrema categoria toda a apresentação.
Presidente revela importância de fortalecimento interno da Portela
Luis Carlos Magalhães foi o presidente que atendeu o anseio de todo portelense, que era levar Clara Nunes para a avenida como um enredo na Majestade do Samba. O dirigente, líder dos portelenses desde a morte de Marcos Falcon em setembro de 2016, ressalta que uma multidão de pessoas têm demonstrado interesse em desfilar.
“Um enredo que é das entranhas e do coração da escola. Acho que isso traz vantagens, mas também problemas. Gente do mundo inteiro quer desfilar, não é só gente aqui da Portela. E com o carnaval sendo reduzido vamos ter de conviver com essa situação. Mas as vantagens são muito maiores. Tivemos uma disputa muito boa, todos os compositores são da escola. Isso me alegra bastante. A intenção ao montar o regulamento foi que qualquer um pudesse ganhar, não apenas os sambas poderosos. Acho que nós acertamos”, destacou.
O enredo da Portela terá de ser concebido sem patrocínio. O presidente declara que não havia como não ousar para 2019, devido aos 95 anos da Portela.
“Não tinha como ser diferente. A Portela faz 95 anos e esse enredo já estava rondando a rua Clara Nunes desde que ela se foi em 1983. Temos recursos próprios, que sustentam cerca de 25% de nosso projeto. Mas buscamos parceiros o tempo todo. A dificuldade maior do carnaval é você não saber se vai receber ou quando”, contou.
Sobre a situação política da Portela, o presidente acha cedo para emitir qualquer opinião antes do desfile. Mas não descartou uma candidatura se o grupo portela Verdade tiver o interesse no seu nome.
“Não estou fugindo, mas é o carnaval que determina tudo. Aqui temos um grupo, o Portela Verdade. Esse grupo é que sabe o que é melhor para a escola. Mas eles vão ter que pedir à minha mulher para eu ser candidato”, disse o presidente às gargalhadas.
O presidente falou ao CARNAVALESCO sobre as mudanças implementadas na disputa para este ano e comemorou os resultados obtidos.
“Vamos manter as modificações e avançar. Achei legal pois as sugestões vieram da própria ala de compositores. Deu muito certo e equilibrou bastante a disputa. Eu acho que é preciso democratizar esse processo, permitindo que parcerias menos poderosas consigam vencer também, por que não?”.
Portela quer a liderança do ranking da Liesa
Para Fábio Pavão, diretor de carnaval da Portela, além do título em 2019, o desejo da escola é assumir a liderança do ranking da Liesa.
“O maior desafio da Portela é continuar como uma escola competitiva no sentido de estar sempre disputando o carnaval. Não fomos bicampeões como pretendíamos, mas queremos ganhar o ano que vem e assumir a liderança do ranking da Liesa. Não pode faltar num enredo sobre Clara Nunes a energia da Clara, claridade, religiosidade, brasilidade e sobretudo a química característica da essência da Clara. Viremos com 28 alas e apenas cinco comerciais. Serão 500 vendidas e 2600 de comunidade. Os ensaios de comunidade serão as quartas, de rua iniciaremos em janeiro, e em breve receberemos as co-irmãs no Portela convida aqui na quadra. O samba de 2019 transmite a energia que o portelense tem, emociona, claro, conta o enredo, mas tem o principal bate na veia”.
Rosa prepara grande homenagem para Clara Nunes
Responsável pelo desfile da Portela, a carnavalesca Rosa Magalhães está confiante no sucesso do desfile, mas avisa que o resultado depende de todos os integrantes da escola.
“O enredo da Portela foi a escola inteira que escolheu. A responsabilidade não é só minha não. É de todo mundo aqui. Dos compositores, da bateria, da porta-bandeira… Um trabalho coletivo, que eu espero que dê tudo certo. Porque o assunto que estamos trazendo é muito ligado a Portela”, explica.
A artista revela que contou com muitos amigos para desenvolver o enredo da Portela.
“Eu tive a ajuda de várias pessoas para desenvolver esse enredo. Inclusive de um amigo meu que é especialista em Candomblé. Eu não quero fazer bobagem com a Clara, com os orixás, os santos. O enredo traz uma parte da Clara Nunes cantora, da Clara Nunes portelense, são muitas facetas dela que estarão presentes”, conta Rosa.
Portela recebe Nenê de Vila Matilde e anuncia campeão de manhã
A noite de escolha de samba na Portela foi carregada de emoção, como sempre ocorre no Portelão. O diferencial deste ano foi a onipresente figura de Clara Nunes através de diversas pessoas, famosas e anônimas, que representaram a cantora e enredo portelense. Para abrir a noite o coreógrafo Carlinhos de Jesus leu um texto sobre Clara, enquanto atabaques lembravam a religiosidade da cantora. Em seguida sambas que marcaram a trajetória da artista emocionaram o público nas vozes dos cantores da escola. O relógio se aproximava das 02h do sábado quando a bateria Tabajara do Samba iniciou seu esquenta para o delírio absoluto do público. Durante a noitada de samba diversas personalidades, dirigentes e sambistas ligados à outras escolas prestigiaram a final. A rainha de bateria Bianca Monteiro roubou a cena com um figurino que se assemelha à forma com que Clara se apresentava.
Enredo no carnaval de São Paulo no ano que vem, a Portela recebeu o casal da Nenê de Vila Matilde, Arthur e Bia, e a escola cantou para os presentes seu hino para o Carnaval 2019. A agremiação paulistana vai homenagear a azul e branca de Oswaldo Cruz e Madureira no Anhembi. O samba campeão foi anunciado por volta das 06h deste sábado em um Portelão em estado de êxtase.
Bateria aprova escolha do campeão
Em entrevista ao site CARNAVALESCO, mestre Nilo Sérgio falou sobre a bateria para o ano que vem.
“Fizemos um bom carnaval em 2018, mas foi complicado trabalhar com o samba porque era meio nordestino e muito carregado. Foi difícil encontrar um andamento adequado. Quando colocamos pra cima o samba trepava e pra baixo o samba caia demais. Não subimos de segunda, passamos reto e demos um destaque para chocalho, tamborim e agogô. Para 2019 temos um bom samba, já encontramos o caminho dele e já temos um andamento certo, 143 BPM (batidas por minuto). Criamos algumas coisas em mente, após a escolha do samba ensaiaremos as nossas e paradinhas. O samba da Portela sempre precisa ter boa melodia, boa letra e acima de tudo emocionar. Temos tudo isso aqui”.
Para o intérprete Gilsinho, o Carnaval de 2019 ficará marcado em sua vida por cantar Clara Nunes na Avenida.
“A sensação de cantar um samba em homenagem a Clara Nunes é a melhor possível. Ela foi um ícone da nossa escola, uma grande cantora e representa muito para todo portelense a história dela dentro da Portela. A escola está muito emocionada com essa homenagem a ela. E ela, lá no céu, deve estar muito feliz com o que está acontecendo aqui”.
Fantasia do casal promete emocionar o portelense
Marlon e Lucinha Nobre, casal de mestre-sala e porta-bandeira da Portela, explicam que não fazem nenhuma exigência sobre o figurino do desfile.
“O carnaval de 2018 foi uma primeira experiência minha com o Marlon (mestre-sala), no Grupo Especial. Uma responsabilidade muito grande. O resultado foi muito satisfatório. Eu não fiz nenhuma exigência quanto ao figurino. Eu trabalho com Rosa Magalhães, para mim é um sonho, e aquilo que ela me pede, que ela me propõe, eu fico emocionada”, afirma Lucinha.
“A gente vai vir cada vez mais forte, mais aguerrido. Nós somos amados pela escola, nós amamos a escola. A reciprocidade só nos traz mais convicção. O figurino vai ser algo emocionante. É o estilo portelense. Aquela fantasia que acerta em cheio o coração de todas as pessoas que são apaixonadas pela Majestade”, revela Marlon.
Como foram as apresentações dos outros finalistas
Parceria de Thiago na Fé – O palco da parceria foi comandado pelo experiente Vitor Cunha, que conduziu muito bem a obra. Melodiosa, a composição enfrentou uma árdua missão. Conquistar os portelenses depois que o samba de Jorge do Batuque arrebatou a quadra. Mesmo assim a parceria conseguiu cumprir uma boa apresentação, com uma torcida que cantou bastante. Mas o grande destaque da parceria da final foi o intérprete Vitor Cunha. Talvez, a grande conquista da parceria tenha sido alcançar a final em uma disputa que envolveu caciques da ala da Portela. Sem os exorbitantes recursos das grandes parcerias, mesmo assim os irmãos gêmeos estiveram em uma final na escola de coração.
Parceria Samba dos Crias – Também formada por jovens portelenses, daí o nome de crias, a parceria apostou em Emerson Dias na condução da apresentação. O samba tinha características melódicas de maior impulsão, o que em um primeiro momento favoreceu uma passagem consistente. A neta de Monarco, Juliana Diniz, cantou o alusivo e também defendeu a obra no palco. Sem dúvida, o grande destaque do samba era seu refrão, o que fez em alguns momentos o samba se impulsionar. Entretanto a apresentação perdeu rendimento em outros trechos, principalmente, devido ao estendido tempo de apresentação e não se mostrou competitiva para desbancar a grande favorita.