Em 2025, pela primeira vez na história, o Raízes do Samba desfilará em um grupo ligado à Liga-SP. Abrindo o desfile do Grupo de Acesso II (terceira divisão do carnaval paulistano, a Raízes do Samba debutará no Sambódromo do Anhembi. Mas é claro que a instituição já possui muita história para contar. E, para conhecer o percurso e um pouco mais da agremiação, o CARNAVALESCO ouviu alguns dos segmentos e componentes que estão há mais tempo na escola para saber um pouco mais do que vem por aí.
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Do Extremo Norte para o Anhembi
A história do Raízes do Samba começa bem distante dos grandes centros paulistanos. No bairro de Perus (último bairro da região Noroeste paulistana, já depois de Pirituba e Jaraguá e a cerca de quinze minutos de carro de Caieiras, munício da Grande São Paulo), bastante afastado do agito que caracteriza a maior cidade da América do Sul, surgiu, em 2003, a Valença de Perus. A escola de samba nada mais era que uma espécie de evolução do bloco de carnaval que tinha o mesmo nome e desfilava desde 1997.
Há, entretanto, um triste ano que muda a história da instituição: 2016. Com o enredo “Viagem ao castelo assombrado – Halloween”, a agremiação, que estava no então Grupo 04 da UESP (União das Escolas de Samba Paulistanas), sequer chegou a desfilar por conta de problemas com a chuva. Na temporada seguinte, entretanto, com a temática “Primavera – A Estação da Vida”, veio o título da mesma divisão.
A partir de tal momento, por sinal, é necessário fazer uma diferenciação: de acordo com os ouvidos pela reportagem, a partir de 2017 a escola já era conhecida como Raízes do Samba. Nos registros da Liga-SP, entretanto, tal mudança de nomenclatura aconteceu no ano de 2020. A própria escola tem como data de fundação 20 de novembro de 2015.
O novo nome da instituição também indica uma mudança no local da instituição. Nos últimos anos, a agremiação realizou ensaios no bairro do Cambuci e, desde 2024, também faz eventos na quadra da Mocidade Unida da Mooca – onde foi feita, por exemplo, a Feijoada da Vitória da instituição.
De toda maneira, é importante pontuar que, em 2024, com o enredo “Negras Raízes – O Mundo aplaudiu nossos ancestrais”, idealizado pelo carnavalesco Babu Energia, o Raízes do Samba sagrou-se vice-campeão do Grupo Especial de Bairros da UESP e obteve o direito de desfilar no Anhembi.
Clima familiar explicado
Alguns nomes ligados ao Raízes já são bem conhecidos do grande público paulistano. Contratado para ser o intérprete da agremiação para 2025, Juninho Branco já cantou em Leandro de Itaquera, Pérola Negra e Morro da Casa Verde, por exemplo. Arisvaldo Oliveira Soares, o Babu Energia, carnavalesco da instituição desde 2023, chegou a assinar enredos de Grupo Especial na Acadêmicos do Tatuapé e no Barroca Zona Sul. Mas, mais do que isso, os nomes dos gestores da instituição também são conhecidos na folia da cidade de São Paulo.
Jackeline Rodrigues Motta, presidente da instituição, é filha de Robson de Oliveira, presidente da Liga-SP em dois períodos – entre janeiro de 1998 e maio de 1999 e entre os janeiro de 2000 a 2005. A própria mandatária, por sinal, destaca que a escola nasce de uma família de bambas: “Nós temos duas características muito fortes. Primeiro é a de ter muita garra. Isso já não pertence só ao Raízes do Samba, as demais escolas também têm – porque para botar um carnaval na rua não é fácil. Mas, acima de tudo, a nossa escola é uma escola muito de família. Por isso o nome Raízes do Samba: minha mãe foi rainha de bateria, meu pai foi presidente da Liga-SP e batuqueiro. Minha avó, a mãe do meu pai, também: foi uma das primeiras baianas das escolas de samba. O nome da escola Raízes do Samba traz essa menção para a família. Além de termos muita garra, também focamos nessa parte de família”, comentou, aproveitando para detalhar quais são as principais características da agremiação dirigida por ela própria.
Robson, hoje diretor de carnaval do Raízes, concorda: “A essência do Raízes é uma essência familiar, é uma essência com o povo novo. É uma escola nova para São Paulo, de fato. Você vai localizar aqui poucos sambistas tradicionais, aqueles sambistas tradicionais que você encontra em todas as quadras, a todo momento. Não que isso não seja bom, é ótimo, porque o nome da escola já enfatiza a raiz do samba. Mas a gente quer construir uma nova escola para o carnaval de São Paulo”, destacou, deixando claro o desejo de modernização da folia na cidade.
Outro caso que ilustra bem a atmosfera que envolve a escola é o de Mestre Will, atual comandante da Bateria do Raízes. Há quatro anos como comandante dos ritmistas, ele já teve companhia em tal posto: Luan, irmão dele – e que, hoje, mesmo morando no interior do estado, segue como um dos diretores. “A primeira coisa que a pessoa que chega no Raízes vai gostar é o clima. Quem está aqui há mais tempo sabe o trabalho que foi para chegar nos grupos da Liga-SP, foi muito difícil. Foi rápido até, mas trabalhamos bastante. Temos o slogan, que fala que treino é treino e jogo é jogo. O clima é bom, é possível ver como tudo funciona. Aqui o clima é bem família, mesmo”, pontuou.
Sandra Batista da Silva, coordenadora da ala das baianas, endossa tal visão: “É uma escola muito família! A gente se valoriza e se apega muito, dos componentes aos diretores. A comunidade estava meio espalhada, agora estamos conseguindo juntar e formar uma comunidade de fato. Todo mundo se conhece aqui, o legal é isso. Vem pessoas do Império e de outras escolas que não conheciam o Raízes, e estamos conseguindo mostrar o que é a escola”, disse ela – que também está na mesma ala na agremiação da Casa Verde.
Slogan e novidades
Boa parte dos entrevistados destacou uma frase que é tida como um mantra na agremiação. Ao ser perguntado sobre o que mais chama atenção dele na instituição, Robson destaca que foi ele quem colocou a expressão no vocabulário do Raízes: “Quem chega por aqui se surpreende com a hospitalidade, a parceria, saber que o material mais caro do carnaval não é a lantejoula, não é a pluma, não é o tecido, não é o sapato, não é alegoria, não é a fantasia: é o ser humano. Se você não priorizar o ser humano… eu até brinco no Raízes e falo que treino é treino, jogo é jogo. A hora que o sambista chegar aqui, ele vai ser bem recebido. Se chegar a vinte e quatro horas do carnaval, aprendeu a cantar o samba, tem balanço, vamos para dentro. Raízes do Samba é isso. A proposta do nome, inclusive, foi construir algo novo para São Paulo. Sabendo que a gente vai traçar um caminho difícil, que a competição carnavalesca é uma muito acirrada, nós deixamos a competição carnavalesca de lado e damos um passo sério na construção de uma nova escola para a cidade de São Paulo”, afirmou.
Falando em modernização, Will também destacou que a bateria terá algo novo para mostrar no Anhembi: “Como características da bateria, tentamos mantê-la mais pesada. Uma levada de caixa com o naipe de catorze, partido alto em cima. Introduzimos o naipe de agogô recentemente, com a diretoria Sofia. Nesse momento, queremos uma batucada pesada, mais grave”, pontuou.
O que é melhor?
Ao ser perguntado sobre o que mais chama atenção no Raízes, componentes especiais deram uma série de respostas distintas. Babu Energia começou: “O que eu mais gosto na escola é a união e a proposta de resgatar um carnaval que há muito tempo estava perdido: o do acolhimento, do entendimento humano. Infelizmente, mesmo não podendo generalizar, acho que as escolas acabaram se engessando por causa do carnaval midiático. Digo isto com propriedade, uma vez que me dispus a fazer carnaval nos bairros – com muito orgulho. E fui muito feliz: campeão por diversas vezes, algumas delas consecutivas. Isso muito me honra: antes de ser mídia, sou um artista que faz questão de expor suas obras de arte. Não se espantem: pode ser na Globo ou na Vila Esperança, lá estará Babu Energia brindando a vida, a arte e o carnaval. A simplicidade, a humildade e a garra dessa escola me convenceram a escrever uma nova história – e aqui estou”, pontuou.
O senso de pertencimento também foi destacado pela presidente Jackeline: “Quem nos ver pela primeira vez vai gostar da nossa alegria, da harmonia, do acolhimento. Todos que chegam até nós são acolhidos e fazemos com que essa pessoa se sinta bem para ela fazer parte da nossa família. Temos muito compromisso, comprometimento e amor pela escola. Gostamos de vestir a camisa”, comentou.
Desde 2016 na agremiação, Sandra destacou o quanto o Raízes se preocupa com o próximo e o quanto gosta de ser ouvida. “Eu consigo fazer as coisas aqui. Eles me escutam, eles atendem todas as minhas necessidades. Como coordenadora da ala das baianas, eu consigo ter uma fantasia leve e confortável, além de dar todo o conforto para elas. Eu, por também ser baiana, sei como fazer com que elas evoluam melhor. Damos respaldo para as baianas e também consigo passar esse respaldo para elas. Tambpem gosto de trabalhar de perto – e, aqui, consigo fazer isso. Consigo fazer fantasia vendo a evolução dos carros alegóricos, por exemplo”, ressaltou.
Por fim, Mestre Will seguiu caminho semelhante: “O que eu mais gosto na escola é o clima. Tem lugares que a gente vai por ser um trabalho ou por ir, sem vínculo algum. Aqui é diferente: me sinto à vontade, trago meus filhos, família e amigos, convido qualquer um… e me sinto muito bem, até melhor que em casa”, finalizou.
Em 2025, o Raízes terá como enredo “De Quem É A Culpa?”, novamente idealizado pro Babu Energia – leia mais aqui.