Por Alberto João e Matheus Mattos

Uma onda de protestos nos Estados Unidos caminha para o oitavo dia. Tudo começou com a divulgação de um vídeo, no dia 25 de maio, onde George Floyd é imobilizado por um policial branco e asfixiado com os joelhos do agressor em seu pescoço. A vítima foi levada inconsciente, mas declarado morto ao chegar ao hospital. No dia seguinte, o vídeo viralizou e milhares de pessoas foram às ruas protestar. A frase “I Can’t Breathe”, que significa ‘Eu não consigo respirar’, foi as últimas palavras de George e virou grito marcante para as vozes protestantes. De acordo com as informações da imprensa norte-americana do último domingo, quatro pessoas foram mortas e mais de 1.700 presas.

No Brasil, existem inúmeros casos de assassinatos ao povo negro. Como por exemplo, o episódio do garoto João Pedro, de 14 anos, morto dentro de casa com um tiro de fuzil nas costas. No último domingo, manifestantes se reuniram em frente ao palácio do Guanabara, sede do Governo do Rio de Janeiro, para protestar pelos diversos casos ocorridos no país. O site CARNAVALESCO ouviu personalidades negras do carnaval sobre os protestos à favor da igualdade.

Simone Sampaio, madrinha da Dragões da Real

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“Senti a mesma coisa que sinto ao ver qualquer assassinato dos nossos brasileiros desta forma. Só sinto que o questionamento venha após o assassinato do George, após repercussão da grande potência que é os Estados Unidos. A sensação é de impunidade, a mesma quando morre Marielle Franco, João Pedro, Ágatha, Kauê, Jenifer e tantas outras vidas. Não é mais dolorosa do que eu como mãe, vendo a forma como nosso João Pedro sendo brutalmente assassinado dentro da própria casa pela força do Estado que deveria protegê-lo. Isso acontece todos os dias há muito, e parece que a cor negra neste momento fica invisível aos olhos de todos que deveriam se rebelar contra a discriminação e o genocídio negro. O movimento negro nos Estados Unidos deve ser referência, por ser tão consolidado, unido e forte. Podemos aprender diversas coisas. O racismo é racismo em qualquer território. Aqui no Brasil somos o maior país negro fora da África e muitas pessoas ainda insistem em dizer que o racismo não existe, enquanto vidas negras continuam morrendo por serem negras em ambos os países. No Brasil, negros são setorizados. Deixa de ser uma questão de competência, e passa a ser uma questão de falta de oportunidade: é raro ver profissionais negros em grandes cargos de chefia, nas universidades, nas telecomunicações, entre outros locais. Isso, sendo 54% da população brasileira. Quando conquistamos algo, a batalha é extremamente árdua. A luta continua. Temos a ágil e eficaz arma da comunicação. Através de um celular hoje podemos filmar e enviar a informação pro mundo inteiro instantaneamente. Neste sentido, a globalização é uma grande aliada. Acredito que infelizmente tendo o líder que temos nos EUA e o que temos no Brasil, a tendência é que os confrontos não cessem mais rápido. Mas por outro lado, ficamos na torcida da conscientização da população num todo. Não há mais espaço para opressão e precisamos todos entendermos que mudar isso é responsabilidade de todos”.

Lucinha Nobre, porta-bandeira da Portela

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“Esses dias eu li uma frase, acho que do Will Smith que dizia: “o racismo não está aumentando, ele está sendo filmado” e refleti muito sobre a união dos pretos nos Estados Unidos, no sentido de lutarem contra. Aqui no Brasil, infelizmente, existe primeiro uma negação da raça. Muitos pretos nem se reconhecem como tal, se declaram morenos, pardos… só aí já estamos em clara desvantagem. Paralelo a isso, tudo para nós é mais difícil, temos que nos esforçar três vezes mais para qualquer reconhecimento. É cansativo. Doloroso. Triste. Eu estou anestesiada. Tentando me reerguer através da fé. Da educação e do estudo. A gente tem que estar bem informado e bem preparado para não abaixar a cabeça. E ainda assim corremos riscos. Tenho um filho de 21 anos e costumo ligar pra ele de madrugada, quando ele sai, só para monitorar se ele está seguro, se ele tá protegido. É exaustivo. Lá nos Estados Unidos, a luta antirracismo é de todos. Aqui no Brasil a gente sofre o racismo e ainda tem que ouvir branco dizer pra gente que não foi racismo, ou seja, querem decidir por nós. Quem sabe se está sofrendo racismo é o preto e não cabe ao branco decidir isso”.

Patrick Carvalho, coreógrafo do Salgueiro e Império Serrano

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“É um misto de indignação. Por mais que a gente tenha esse espaço de fala. O racismo feio, ridículo, escroto, ele não cessa. Uma hora ou outra vem alguém e aplica uma covardia dessa. Aquela imagem tira nossos olhares de uma grande pandemia que afeta o mundo. Vem o inimigo covarde de raça, presencialmente, vai lá e mata a pessoa. Nem o vídeo espanta o inimigo. O cara fala que está sem ar e a outra pessoa não para. É muita covardia. Venho do alto do morro, que é difícil descer e subir, tem que pedir permissão, quando eles querem apagam a luz, é uma senzala. A gente vive dentro de uma senzala mundial. É muito triste e doloroso. Isso precisa acabar”.

Rute Alves, porta-bandeira da Viradouro

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“Até quando um vírus que mata milhares de pessoas no mundo inteiro não será a nossa única preocupação? Até quando qualquer desculpas e “achismos” servirão para mascarar o preconceito que assola o mundo? É inacreditável, como sempre foi, que em pleno século XXl seres humanos são assassinados fria e brutalmente por sua cor de pele. Quantos Georges, João Pedros, Rodrigos… Serão confundidos? Que estatística cruel é essa? É de doer a alma ver um irmão suplicar para respirar. Mesmo que ele fosse o possível falsificador, não é essa a justiça que tem que ser feita. Uma família não pode perder seu menino de 14 anos, ou qualquer outra idade, porque tem uma residência em comunidade que a polícia pensa que só bandido poderia ter, e invadir atirando e, não satisfeitos, sumirem com o corpo. Onde estão os direitos humanos desses humanos? Punição! Enquanto não houver severa e verdadeira punição a quem cometer atos tão cruéis, desumanos e covardes, continuaremos caminhando por uma estrada onde o futuro dos negros, ao sinal de uma menor dúvida, será o tronco levando chibatadas até morte. Que em Minneapolis, São Gonçalo, no morro da Providencia, ou qualquer lugar desse mundo, essas mortes não tenham sido em vão, que além de todo sofrimento causado, sirva para alguma mudança. Estou sendo utópica? Até acredito que sim, mas só acreditando que se é possível que podemos lutar por mudanças”.

Gilsinho, intérprete da Portela

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“Achei aquele episódio o mais sujo teor de racismo. Isso, infelizmente, ainda existe no mundo. Desumanidade odiosa. Algumas pessoas sem a menor noção de amor e igualdade ainda insistem em alimentar o preconceito racial. O fato acontecido é muito lamentável. Rezemos para que um dia isso acabe, pois não é coisa de Deus”.

Lyllian Bragança, destaque de chão do Vai-Vai

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“Sinto dor, quando vejo um dos nossos sendo subjulgado, ameaçado e morto. Nos ameaçam todos os dias. Nos EUA e no Brasil, não há diferença de como a elite hegemônica que domina o mundo nos veem. O Estado armado, com estrutura para dizimar um povo. Penso que temos que olhar para a história da escravidão de cada país. Foram milhares de negros que desembarcaram no Brasil, mesmo após 1822, data da independência do Brasil. Ou seja, precisamos falar sobre essa elite que nos permeia e que perpetua o poder, mesmo após o fim da escravidão, e suas consequências. Vistas na desigualdade criada no Brasil,nas periferias. O mito da democracia racial, que no carnaval é de grande valia para essa sociedade, como já dizia Lélia Gonzáles: ‘mulata, doméstica e mãe preta’ no carnaval ela se torna rainha. O racismo nas duas nações é estrutural, está incrustado no seu alicerce, portanto difícil de aplacar. Não podemos mais serenar essas questões que perpetuam a morte do nosso povo. Seja onde for. Lá, nossos irmãos estão cansados. E nós aqui, como estamos? Cansados. Chega de ver nossas crianças sendo mortas”.

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