A noite desta quarta-feira será histórica na Liga Independente das Escolas de Samba do Rio de Janeiro (Liesa), no Centro do Rio de Janeiro. Os representantes das escolas do Grupo Especial, além de fundadores da Liga e grandes beneméritos vão escolher a diretoria para o próximo triênio. A eleição marca o fim do comando de Jorge Castanheira. O site CARNAVALESCO fará a cobertura pelo Twitter (https://twitter.com/scarnavalesco) a partir das 17h30.

A Liesa foi fundada em 1985 para modernizar o desfile das escolas de samba. Apesar de Castor de Andrade (in memorian), Luiz Pacheco Drumond (in memorian), Anísio Abrahão David, Capitão Guimarães, dentre outros terem perpetuado a influência nos bastidores da Liga, nenhum deles presidiu a instituição por um tempo maior que Jorge Luiz Castanheira.

Ele assumiu o seu primeiro mandato no ano de 1995 e permaneceu até 1997, quando deu lugar a Djalma Arruda. No triênio seguinte fez parte da chapa de Capitão Guimarães como vice e permaneceu neste posto até 2007. Querido por Guimarães, ele foi se perpetuando na presidência a partir de 2007, sempre com o apoio das escolas. Foram 18 anos ocupando o posto de presidente da Liesa.

Perfil de Jorge Castanheira: Conciliador e centralizador

Jorge Castanheira conferiu à Liesa algo que nenhum presidente anterior a ele havia conseguido: credibilidade perante a opinião pública. Os presidentes e patronos perderam muito apoio popular e da mídia após a prisão da cúpula em 1993. Para negociar contratos, atender a imprensa e definir os rumos do carnaval era preciso de uma figura competente e séria. O escolhido foi Jorge Castanheira. Ele transitava com desenvoltura no mundo empresarial e político, além de construir uma sólida relação com o Grupo Globo, o maior parceiro comercial da história do carnaval.

Mas, ao mesmo tempo em que conferia credibilidade de dentro para fora da Liesa, os presidentes se queixavam de sua personalidade centralizadora. Castanheira fazia questão de definir desde a definição do regulamento às mais simples tarefas administrativas dentro da Liesa.

castanheira liesa

A partir de sua gestão os resultados do carnaval se tornaram mais respeitados, embora sempre houvesse as tradicionais reclamações após as apurações. Mas sob sua batuta os títulos da Mocidade (1996) e Viradouro (1997) se deram sem maiores discussões quanto à credibilidade do resultado. Castanheira também começou a costurar uma sólida relação com a Globo. Em 1997 foi a penúltima vez que a TV Manchete transmitiu o carnaval e no ano seguinte, já sem Castanheira, a emissora carioca abriu falência depois do carnaval.

Boa relação com Maia e Paes

Jorge Castanheira foi reconduzido à presidência da Liesa em 2007. Respaldado pelos dirigentes foi reeleito três vezes, completando quatro mandatos seguidos. Nos primeiros anos desta segunda gestão, Castanheira fortaleceu os laços da Liesa com o poder público municipal. A Cidade do Samba já estava de pé e o dirigente demonstrou grande entrosamento com os prefeitos Cesar Maia e Eduardo Paes. Além disso, mantinha uma mútua relação de confiança com a Globo e se beneficiou do bom momento econômico do país conseguindo apoio financeiro de grandes empresas, como a Petrobras e também do Governo do Estado.

A relação entretanto começou a sofrer os primeiros desgastes na segunda metade da década de 2010. O carnaval não ficou imune à crise política e institucional que se abateu sobre o Brasil. A gestão de Marcelo Crivella com sua perseguição implacável ao carnaval afetou todas escolas de samba. Castanheira viu o apoio do poder público às escolas praticamente minguar.

Um grande racha na cúpula da entidade começou a dar seus primeiros sinais depois do desfile de 2014. A Beija-Flor de Nilópolis amargou um 7º lugar, pior colocação da escola desde 1992. A reação nos bastidores foi imediata: mudança radical no corpo de julgadores, uma clara demonstração da força de Anísio nos corredores da Liga.

Em 2016 nova polêmica que aumentaria as rachaduras internas. Um julgador de bateria não compareceu para os desfiles, alegando problemas pessoas. Após o resultado do carnaval, veio à tona que o julgador tinha a intenção de prejudicar algumas agremiações. Laíla (na época na Beija-Flor) e Fernando Horta (presidente da Unidos da Tijuca) trocaram farpas publicamente e a história foi parar nos tribunais.

Plenárias fervem, mesas viram e novos líderes políticos surgem

Em 2017, caótico para o carnaval, cheio de acidentes na pista (um deles que custou a vida da jornalista Liza Carioca), Castanheira não queria e defendeu a manutenção do resultado, mas não teve força para impedir que as escolas decidissem que não haveria rebaixamento naquele ano. Como se não bastasse tudo isso, a Liesa se viu em uma sinuca de bico causada por ela própria. Após a Portela romper o jejum de títulos de 33 anos, com a Mocidade alcançando o vice-campeonato (sua melhor colocação desde 1996), uma bomba viria à tona: um julgador de enredo deu um 9,9 para a Mocidade, alegando ausência de uma destaque que constava no roteiro de desfile. O provável 10 que a escola receberia consagraria ela campeã e não a Portela. A Estrela Guia conseguiu provar que havia entregue uma errata dentro do prazo estipulado em regulamento e entrou com recurso para também ser consagrada campeã. Embora o parecer jurídico da Liga impedisse a divisão de títulos, a “plenária soberana” decidiu dar à Mocidade sua sexta conquista. Castanheira sairia enfraquecido da disputa.

No ano seguinte, novamente uma escola com influência política dentro da Liesa usou seu poder para mudar o que estava estipulado em regulamento. Como não houve rebaixamento em 2017, para que voltassem a 12 escolas em 2019, duas cairiam em 2018. Graças a erros cometidos pela Grande Rio, a escola estourou o tempo máximo estipulado em regulamento e desfilou sem uma alegoria. Na apuração foi rebaixada junto com o Império Serrano. Mas os presidentes conseguiram virar a mesa, mantendo a própria tricolor caxiense e o Império Serrano na elite.

O estopim viria no ano seguinte. Desta vez foi a Imperatriz, de Luizinho Drumond, que seria rebaixada após um desastroso desfile. Com a “jurisprudência” de 2017 e 2018, uma nova plenária salvou novamente o Império Serrano e a Imperatriz e em 2020 seriam 15 escolas a desfilar. Mas dessa vez, usando o Ministério Público como aliado, Jorge Castanheira conseguiu reverter a decisão em nova plenária. Embora tenha sido uma vitória política sua, ele já sofria intensa pressão para se afastar da presidência.

A condução dos trabalhos de Castanheira dentro da Liesa já sofria muitas críticas e desde 2017 uma importante voz opositora começou a ganhar destaque dentro da entidade: Gabriel David, filho de Anísio. Inteligente, bem articulado e cheio de argumentos, Gabriel deu inúmeras declarações contra a gestão de Castanheira, principalmente, no que tange ao marketing da Liga, inexistente segundo o emergente dirigente da Beija-Flor. A gestão de Castanheira na pandemia, aumentou a insatisfação dos dirigentes. Por opção dele e com o aval do Conselho Superior da Liesa, Castanheira decidiu não disputar mais uma eleição. Após quase 25 anos dentro da entidade, Jorge Castanheira finalmente deixa a cena para o seu sucessor, Jorge Perlingeiro, que comanda há quase 30 anos a apuração dos desfiles das escolas de sambas.

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