Por Marielli Patrocínio, Marcos Marinho e Luiz Gustavo

A Beija-Flor de Nilópolis anunciou, na madrugada desta sexta-feira, por volta de 2h45, o resultado oficial do seu concurso de samba-enredo para o Carnaval 2026. A direção da escola optou por unir duas obras: os sambas das parcerias de Júlio Assis e Sidney de Pilares, que agora se tornam um só hino para embalar a comunidade na Marquês de Sapucaí. Assim, a obra é assinada por Sidney de Pilares, Marquinhos Beija-Flor, Chacal do Sax, Cláudio Gladiador, Marcelo Lepiane, João Conga, Diego Oliveira, Diogo Rosa, Manolo, Julio Alves e Léo do Piso. O enredo de 2026, “Bembé”, presta homenagem à celebração centenária de matriz afro-brasileira realizada em Santo Amaro (BA), símbolo de resistência, fé e cultura. Atual campeã do Grupo Especial, a Beija-Flor vai em busca de mais uma conquista com a força de sua comunidade e o peso de seu “rolo compressor” no desfile de domingo, na Sapucaí. * OUÇA AQUI O SAMBA APÓS A JUNÇÃO

Segundo a presidência da escola, a fusão das duas composições busca valorizar a força poética e melódica de cada obra, resultando em um samba ainda mais completo e representativo para o desfile.

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“Fizemos um estudo minucioso, avaliando o melhor de cada uma das duas obras, entendendo a necessidade do projeto e também ouvindo a voz da nossa comunidade. A junção é um gesto de respeito ao talento dos compositores e um presente à Beija-Flor, que vai cantar na avenida com a força multiplicada dessa união”, destacou o presidente Almir Reis.

‘Esse samba vai virar macumba e deixa girar’

Um dos nomes de uma das parcerias vencedoras, Diego Oliveira não escondeu a emoção com a escolha.

“Primeiramente, antes de tudo, eu quero agradecer os meus apoiadores, da minha comunidade que estava junto nessa disputa tão acirrada. Mas a gente está numa disputa no qual a nossa diretoria e nossa presidência escolhem o que é o melhor pra escola. O importante é a gente abraçar a escola e, se Deus quiser, arrumar o bicampeonato. Essa é minha quarta vitória na Beija-Flor. Pra mim, o samba é um conjunto. Isso aqui vai virar macumba e deixa girar, deixa girar que o bi vem aí”.

Após nove anos sem vencer na Beija-Flor, Sidney de Pilares comemorou com entusiasmo o resultado da junção de sambas para o Carnaval 2026. “Depois de nove anos eu me sinto assim, sabe, muito radiante com essa vitória porque os dois sambas realmente foram os melhores e tanto é que juntou, eles estavam aí. Ficou um sambaço. Vamos para avenida com um puta samba. A comunidade ficou satisfeita, nós compositores também ficamos satisfeitos. Porque da outra parte são grandes compositores também. Vamos trazer o bicampeonato com certeza”.

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Sidney destacou ainda o trecho de sua preferência na obra: “Eu gosto muito do trecho da segunda parte: ‘Yemanjá, Alodê no mar (no mar), é D’oxum toda beleza no ibá’”.

O compositor também recordou sua trajetória de vitórias na escola: “É minha quinta vitória aqui. E duas junções. Em 2005, conquistamos o tricampeonato para a escola, tlevamos todos os prêmios. E agora, vamos ver no que vai dar”.

O compositor João Conga contou como se deu o processo criativo e a escolha das partes que formaram o hino oficial. “Quem fez a fusão sabe o que faz e realmente ficou bonito. Juntou uma parte com a outra, o que tinha que ser. Inclusive, eu estava em casa e falei: ‘se unir o samba assim com a parte tal do outro samba…’ liguei para o Sidney e perguntei se ele achava que poderia ter junção. Justamente a parte que eu achava, ficou do outro samba, e ficou legal”.

‘Não pensamos no bi, mas em fazer um grande desfile’

Marquinho Marino, diretor de carnaval, fez um balanço da temporada de 2025 e tratou de colocar os pés no chão para 2026.

“Foi um título especial, um desfile marcante, e a escola está muito feliz e unida. A escolha do samba hoje mostrou isso, porque tínhamos duas grandes obras e qualquer uma poderia representar a Beija-Flor. Mas aqui dentro nós não pensamos em bicampeonato, pensamos em fazer um grande trabalho. A consequência pode ser o título, mas a pressão não existe. A gente zera todo ano”.

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O diretor destacou ainda que a escola deverá repetir o número de componentes do último desfile, algo em torno de 3.200. Com a retirada de uma cabine de julgamento, acredita em mais fluidez e ousadia na apresentação. Sobre o calendário, confirmou que os ensaios de rua começam em 6 de dezembro, na Mirandela, e que o “Encontro de Quilombos” já tem presenças confirmadas de Viradouro, Salgueiro e Vila Isabel.

‘O samba é uma nova sinopse’

O carnavalesco João Vitor, que levou a Beija-Flor ao título em 2025, se emocionou ao comentar sua trajetória na escola.

“A sensação é indescritível. Quando cheguei há três anos, me senti pequeno diante do gigante que é a Beija-Flor. Mas essa comunidade me abraçou, e hoje posso dizer que faço parte dessa família. É uma honra enorme”.

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Sobre o processo criativo, explicou a importância da equipe de enredistas: “Todos viajamos para Santo Amaro, cada um em um espaço, vivendo o enredo. No fim do dia, reuníamos tudo. Isso gerou uma safra maravilhosa de sambas. O samba-enredo é uma sinopse musicada. Ele precisa ser claro, direto, para que o povo entenda o enredo”.

O carnavalesco também reforçou sua filosofia de trabalho em silêncio: “Não fazemos festa de protótipos. O segredo é trabalhar quieto. Todas as escolas querem vencer e é décimo a décimo. O silêncio é fundamental”.

‘Esperem mais uma vez um rolo compressor’

O presidente Almir Reis demonstrou confiança no trabalho. “A gente vai entregar uma boa plástica, como no último Carnaval. João Vitor e o barracão têm mostrado competência, e a comunidade pode esperar um grande desfile no estilo Beija-Flor. O rolo compressor vai estar de volta mais uma vez”.

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Sobre o bicampeonato, Almir reforçou a humildade: “Não gosto dessa palavra bi, porque pode dar a ideia de soberba. O nosso lema é sempre pensar no próximo campeonato. Acabou 2025, vamos para 2026”.

‘Enredo é muito rico, vamos trazer o Candomblé para a bateria’

Responsável pela “Soberana”, ao lado de mestre Plínio, mestre Rodney projetou a sonoridade da bateria para 2026.

“Tivemos uma bateria comprometida, que ajudou muito a conquistar o título. Para 2026, tudo que tem dentro do Candomblé pode ter certeza que vamos usar. O atabaque, por exemplo, vai ter um papel importante. Mas bateria é um conjunto, uma orquestra, todos os instrumentos têm valor”.

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Sobre os intérpretes, elogiou a sintonia com o carro de som: “Nino e Jéssica já faziam parte da equipe, estão indo muito bem. Vão marcar o nome na história da Beija-Flor. Aqui o trabalho é coletivo”.

‘São 30 anos de amor e devoção’

A porta-bandeira, Selminha Sorriso, celebrou a noite especial e a busca pelo bicampeonato. “Hoje é uma noite muito especial. A disputa foi acirrada e os dois sambas eram maravilhosos. Qualquer um que vencesse, eu e Claudinho daríamos o nosso melhor. São 30 anos consecutivos defendendo o pavilhão, e em 10 títulos estivemos à frente. É uma emoção única”.

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O mestre-sala Claudinho, que também é compositor, destacou a ligação com o enredo e o carnavalesco: “O João Vitor é mágico, amado pela comunidade. Nossa fantasia está dentro do universo do Bembé e vai emocionar. Além disso, o samba traz nossa ancestralidade, nossa fé. Eu sou ogã desde pequeno e é muito especial poder levar essa energia para a avenida”.

‘Beija-Flor até o fim’

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Mesmo sem ocupar mais o posto de intérprete oficial, Neguinho da Beija-Flor fez questão de ressaltar sua ligação eterna com a escola. “Passei o microfone, mas eu sou da escola. Só não sou mais o cantor, já passei para nova geração, mas um Beija-Flor até o fim. Agora estou com mais tempo de dar atenção a um novo segmento, tenho a música que é o samba de mediano, as viagens, estou com mais tempo para compor. É por isso que passei o microfone, para me dedicar a essa nova fase, dar a minha outra face pra bater. Ainda não sei o local que vou desfilar, mas até empurrando o carro estarei lá”.

‘É um sentimento inexplicável’

Estreando oficialmente como voz principal da Beija-Flor no Carnaval 2026, Jéssica Martin descreveu a emoção de anunciar o samba que defenderá a escola na Sapucaí. “Eu estou sentindo um misto de emoção, coração a mil. E, hoje, tendo a missão de anunciar o samba que vamos levar para a Avenida em 2026, eu vou falar para vocês: é um sentimento inexplicável. De carinho, de amor, de gratidão sempre. Hoje foi uma mistura de tudo, de todos os sentimentos bons que o ser humano possa sentir”.

Ciente da grande responsabilidade de suceder o ícone Neguinho da Beija-Flor, ela ressaltou o peso histórico desse momento.

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“O nível é altíssimo. A gente sabe da responsabilidade que carrega. Suceder o nosso mestre Neguinho após 50 anos de um legado maravilhoso que ele nos deixou, eu sei que isso é uma coisa muito gigante, ainda mais eu sendo uma mulher. Mas a gente está tendo muito apoio. Eu estou tendo muito apoio do Nino, que é o meu parceiraço, está me ensinando bastante, tendo o maior carinho comigo. E a família Beija-Flor também está tendo esse apoio, esse acolhimento, esse carinho. Está sendo maravilhoso, tá sendo incrível esse trabalho”.

Com a alegria de ser um dos intérpretes da Beija-Flor no Carnaval 2026, Nino do Milênio falou sobre a emoção de viver seu sonho e representar a escola.

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“Hoje, além de feliz, me sinto muito realizado. De fato estou realizando um sonho. Tenho uma história muito bonita aqui; cada canto dessa quadra tem uma história. Tenho grandes amigos aqui e estou vivendo o sonho de ser uma voz dessa escola maravilhosa. Não tenho palavras para expressar minha emoção. Só tenho a agradecer a Deus, ao mestre Anísio, ao presidente Almir Reis pela oportunidade e também ao Gabriel”.

‘Foi uma consagração falar de Laíla’

Um dos responsáveis pela comissão de frente da Beija-Flor, Saulo Finelon destacou a emoção de coreografar um enredo em homenagem a Laíla no ano do título.

“Olha, foi super emocionante falar de Laíla, para gente foi uma honra enorme. Acho que foi um momento muito histórico pra escola e nós estarmos participando desse momento. Foi super importante também pra nossa carreira. Aí veio o campeonato, que é o que todo mundo trabalha pra alcançar. Realmente, foi a consagração. Para nós, foi inexplicável”.

O parceiro de Saulo, o coreógrafo Jorge Teixeira, lembrou o peso do campeonato após alguns anos de jejum. “Já tinha uns anos que a escola vinha sem campeonato, então fazer parte dessa equipe que trouxe o título pra Nilópolis foi super importante. Foi muito emocionante. E, se Deus quiser, estamos partindo agora pra 2026 em busca do bi. Esse é o nosso sonho agora”.

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Saulo ressaltou a parceria com o carnavalesco João Vitor: “O João é maravilhoso. Muito parceiro. Foi muito fácil trabalhar com ele. Temos uma ligação forte, porque ele é muito aberto, escuta muito”.

Jorge, por sua vez, destacou a força do samba-enredo como guia da comissão: “O samba é super importante, porque é ele que dá o ritmo, a movimentação, traz a história. Ele ajuda a gente a construir o percurso e o desenvolvimento da comissão”.

Saulo complementou: “Acho que as escolas cresceram muito, hoje é quesito por quesito. Isso é muito importante porque emociona. Esse ano tivemos esse fator emoção muito forte, graças ao samba. E em 2026 também estamos tranquilos, porque os dois sambas finalistas eram maravilhosos”.

Debate sobre a cabine espelhada

Saulo aprovou a ideia de oficializar o novo formato de julgamento: “Olha, eu acho que todo projeto é válido. É importante pensar no público. Esse ano, a gente já tinha uma comissão 360. Então, oficializar isso é válido e que bom que tivemos tempo pra nos preparar. Agora, a gente já projeta visando a cabine espelhada, e acho que vai ser bom”.

Já Jorge apresentou uma visão mais cautelosa: “Eu só acho que ficou no meio termo. Não gosto muito da ideia de ter só uma cabine espelhada. Se fosse pra ser, que fossem as três. Assim fica complicado. Acho que isso vai exigir muito amadurecimento da parte dos jurados, porque em uma cabine vão avaliar dos dois lados, mas na outra só de um. Isso pode dar a impressão de que a comissão dança para um espaço vazio. Não é uma ideia ruim, mas precisa ser muito bem trabalhada, tanto por nós quanto pela cabeça dos julgadores”.

Como passaram os sambas na final

Parceria de Júlio Assis: O samba 01, da parceria de Júlio Assis, Diego Oliveira, Léo do Piso, Diogo Rosa, Manolo e Julio Alves, abriu a final com Tinga, Nêgo, Dodô e Thiago Acácio nos microfones principais. A torcida já entoava os versos do samba antes da apresentação começar, principalmente o trecho “isso aqui vai virar macumba”. A temperatura esquentou para a arrancada da obra, com fortes primeiras passadas. Além dos explosivos versos finais e do refrão de cabeça, o refrão central — “bota dendê, baiana! Ginga o capoeira, abre a porteira que Exú me libertou, o povo preto ergue a sua bandeira, nego fugido não tem senhor” — passou muito bem e segurou o samba lá em cima. O já citado refrão principal — “deixa girar que a rua virou Bembé, deixa girar que a rua virou Bembé, o meu Egbé faz valer o seu lugar, erô erô Beija-Flor, Alafiá” — mais uma vez teve excelente rendimento e levantou a quadra. Na passagem apenas com o canto da torcida, o samba não alcançou tanta explosão; porém, os torcedores seguraram todo o samba no gogó, sem trechos mais fracos. No retorno para os intérpretes no palco, o samba se manteve firme, com os trechos mais fortes sendo cantados pela torcida, em ótima sintonia. Uma apresentação explosiva no início e consistente em todas as passadas, com o samba passando em nível muito bom.

Samba de Sidney de Pilares: O samba 39, da parceria de Sidney de Pilares, Marquinhos Beija-Flor, Chacal do Sax, Cláudio Gladiador, Marcelo Lepiane e João Conga, teve Bruno Ribas, Rafael Tinguinha e Tuninho Júnior nos microfones principais. A apresentação realçou toda a beleza das variações e da linha melódica da obra, como no trecho “Yemanjá, Alodê no mar (no mar), é D’Oxum toda beleza do Ibá, é reza no corpo, é dança na alma, a rosa, a palma no meu baticum”. O trecho “A curimba de baiana faz Nilópolis cantar, Aiê Yê, Odoyá” explodiu e preparou, em grande estilo, para o refrão de cabeça, que seguiu o alto nível da apresentação. Na passada sob o canto dos torcedores, o canto foi consistente, porém o ápice veio a partir da segunda parte até o refrão principal. As duas passadas finais foram fortíssimas e mexeram com componentes que não faziam parte da torcida do samba. Uma apresentação de excelência.