seminario obcar1

Os desfiles das escolas de samba já há muito tempo alcançaram um patamar que não os limita a apenas uma festa. São manifestações culturais que estão inseridas na história do país, desta forma como qualquer objeto é alvo de estudos desenvolvidos por centros acadêmicos.

Pensando nisso, o Observatório de Carnaval (OBCAR), grupo de estudos filiado ao Museu Nacional da Universidade Federal do Rio de Janeiro, promoveu nesta quinta-feira um seminário para a apresentação de produções acadêmicas voltadas para aspectos da folia. O evento aconteceu no Centro de Artes Calouste Gulbenkian e contou que a participação de quatro pesquisadores que falaram para uma plateia em geral formada por estudantes interessados em produzir pesquisas sobre o carnaval.

Viviane Martins, ex porta-bandeira e atualmente coreógrafa do casal da Cubango, falou sobre sua monografia em Educação Física que contextualizou todos os fatores que interferem no bailado de um casal de mestre-sala e porta-bandeira. Durante a palestra, a pesquisadora relembrou de forma descontraída as dificuldades no início da carreira na Sapucaí, e como se sente mais tranquila hoje com a nova função como coreógrafa ao qual tem se dedicado nos últimos anos.

“Quando era mais nova não queria ser porta-bandeira pois não era do mundo do samba e não aguentava diretor de carnaval ou dirigente sendo grosso comigo, ou a rotina estressante e a responsabilidade. Depois me acostumei. Hoje para mim é muito mais fácil. A minha posição é mais respeitada, o que eu peço pra escola é visto de uma forma mais técnica do que quando é o casal que pede. Também nesse tempo eu aprendi a levar tudo de forma mais leve”.

O pesquisador Leonardo Antan, colunista do CARNAVALESCO, explicou um pouco de seu trabalho que valorizou a história de Luiz Fernando Reis, carnavalesco de uma estética e temática mais marginal em relação a hegemônica que se formou até os dias atuais. Segundo Leonardo, Luiz era mais adepto da crítica política e deveria ser mais valorizado e lembrado por suas contribuições ao carnaval principalmente no tom crítico que algumas escolas têm aderido nos últimos anos. Antan ao ser perguntado sobre quem hoje poderia ser comparado com Luiz Fernando Reis, teve dificuldade para encontrar algum profissional com os traços do crítico carnavalesco.

“Muito difícil apontar um carnavalesco conceitual como Luiz Fernando. Adoro o Leandro Vieira mas sua estética está mais ligada ao hegemônico, ainda que a significação seja dada de.forma diferente. Talvez mais ou menos o Jack Vasconcellos, nas fantasias, suas soluções. O problema é que hoje quem faz muito diferente e perde, não faz mais”.

Durante os 40 minutos de conversa, Leonardo apontou a formação do carnaval que conhecemos hoje a partir dos trabalhos de Arlindo Rodrigues e Fernando Pamplona e também explicou sua tese ainda em processo de finalização sobre o desfile de Xica da Silva de 1967 do Salgueiro. Leonardo foi taxativo em relação a importância daquele carnaval.

“Xica da Silva pra mim é o mais importante desfile do carnaval. Consolida o carnaval como o espetáculo. Consolida a estética que hoje conhecemos e a forma do carnaval atual como um todo através da reunião de elementos como teatralização, alegorias e narrativa única. Inclusive, a forma como a Xica da Silva foi vista por aqui é definida neste desfile e inspira outras obras como o filme de Cacá Diegues”.

O terceiro a apresentar suas contribuições acadêmicas foi Vinícius Natal. Neto da famosa compositora da Vila Isabel Ivanizia e cria do bairro de Noel, Vinícius no passado já coordenou o departamento de cultura da agremiação. Em sua tese sobre os cenógrafos da cidade tocou em um tema difícil e polêmico: a escassez de carnavalescos negros comandando escolas dos grupos que desfilam na Sapucaí. Na pesquisa, Vinícius relembrou heranças européias que elitizaram algumas posições dentro das escola de samba.

“O modo de fazer visual é tão cristalizado que não se muda a questão visual do carnaval e nem os seus atores. Porque um aderecista não pode ser formado pela escola para ser carnavalesco? Eu sempre me perguntei. São casos raros. Hoje, nos grupos que desfilam na Marquês de Sapucaí, excluindo a Intendente, são poucos os negros que são carnavalescos. Aliás isso acontece nos carnavalescos e nos outros espaços da escola por onde passa o dinheiro”.

Já o pesquisador João Gustavo Melo pretende estabelecer uma relação entre o carnaval e uma outra grande manifestação cultural brasileira: O festival de Parintins. Jornalista de formação, com pesquisas no passado voltadas para a origem dos destaques de escolas de samba, João Gustavo trabalhou na Vila Isabel no último carnaval e utilizou a agremiação como estudo de caso com profissionais que viveram como ele a experiência de trabalhar no Carnaval do Rio e no Festival dos Bois. João ajudou a produzir uma das alegorias do Boi Caprichoso e acompanhou de perto o espetáculo amazonense. Gustavo, no entanto, em sua pesquisa, ainda em andamento, vem encontrando mais diferenças do que semelhanças entre as duas manifestações culturais.

“A gente vai com a cabeça do carnaval e algumas coisas a gente se assusta. Hoje, por exemplo, eles não usam madeira, só nos pisos. É um trabalho mais prático. Mas muito deficiente em acabamento para os nossos olhos do Rio de Janeiro. No espetáculo, não tem como você ver o boi com os olhos de ‘paisagem’. É um Maracanã gritando gol durante duas horas e meia”.

O Observatório de Carnaval vai continuar promovendo encontros acadêmicos de pesquisadores com trabalhos prestados para o mundo da folia. O intuito é incentivar jovens graduandos, mestrandos e doutorandos a usar aspectos do carnaval como objeto de suas teses. Em breve a coordenação vai divulgar os próximos encontros.

DEIXE UMA RESPOSTA

Por favor digite seu comentário!
Por favor, digite seu nome aqui